Direito e Justiça

Empresas podem ser inidôneas mesmo com acordo de leniência, dizem TCU e MP

Controladoria Geral da União e deputada petista que solicitou a audiência defenderam os acordos de leniência. No entanto, Ministério Público (MP) e Tribunal de Contas da União (TCU) disseram que empresas que fizerem esses acordos podem ser impedidas de fazer contratos com o poder público.

15/04/2015 - 15:01  

Luis Macedo / Câmara dos Deputados
Audiência pública sobre a paralisação de obras urbanas da construção civil no país, a situação dos acordos de leniência com as empresas envolvidas na Operação Lava-Jato
A Comissão de Desenvolvimento Urbano discutiu as consequências econômicas da Operação Lava Jato, que investiga corrupção na Petrobras.

Representantes do Tribunal de Contas da União (TCU) e do Ministério Público Federal disseram nesta quarta-feira (15), na Câmara dos Deputados, que, mesmo com o acordo de leniência homologado pelo tribunal, as empresas não estão livres de serem consideradas inidôneas e ficarem, assim, impedidas de celebrar contratos com o poder público.

“O acordo de leniência não afasta as competências do TCU e nem impede a aplicação das penas previstas na Lei Anticorrupção”, disse o consultor Sandro Granjeiro, do TCU. “Eventual aprovação do acordo pelo TCU não inibe que o tribunal apure as irregularidades nem que declare a empresa inidônea”, completou o representante do TCU.

As afirmações foram feitas em audiência pública da Comissão de Desenvolvimento Urbano que discutiu as consequências econômicas da Operação Lava Jato, que apura corrupção na Petrobras, e os acordos de leniência negociados por empresas investigadas nesse esquema foram tema de audiência pública na Comissão de Desenvolvimento Urbano.

Além do consultor jurídico do TCU Sandro Granjeiro, participaram do debate o Secretário Executivo da Controladoria-Geral da União, Carlos Higino Ribeiro de Alencar e o Procurador Regional da República Lafayete Josué Petter.

Colaboração
Previsto na Lei Anticorrupção (12.846/13), o acordo de leniência exige que as empresas colaborem com as investigações para serem beneficiadas com a redução de multas ou a garantia de continuar a participar de licitações do governo.

Os acordos são defendidos pelo governo como forma de manter as empresas em funcionamento enquanto correm as ações penais da Operação Lava Jato. Há um mês, em audiência pública sobre o mesmo tema na Comissão de Fiscalização Financeira e Controle (CFFC), o advogado-geral da União, Luiz Inácio Adams, afirmou que a paralisação das obras das empresas investigadas já causou a demissão de 30 mil pessoas.

Os acordos propostos pelo Executivo, por meio da Controladoria Geral da União (CGU), são criticados pelo Ministério Público. A CGU é o órgão responsável pela apuração desse tipo de crime no âmbito do Executivo e já instaurou processos contra 29 empresas mencionadas na Operação Lava Jato. Quatro delas propuseram ao órgão o acordo de leniência, propostas que estão sendo analisadas pelo TCU. Os processos são sigilosos.

Punição
O procurador da República Lafayete Josué Petter disse que eventuais acordos com a CGU não eximem as empresas de punição. “Os acordos feitos com o Cade, na área administrativa, impedem a aplicação de multas, mas não impedem ações de indenização civil contra a empresa que firmou o acordo, em decorrência do abuso do poder econômico. Ou seja, o acordo de leniência não protege as empresas disso”, disse.

Segundo o procurador, eventuais riscos de paralisação de obras não podem servir de justificativa para a não aplicação das penas previstas na Lei Anticorrupção.

Dúvidas jurídicas
Os convidados da audiência pública foram unânimes em dizer que o mecanismo do acordo de leniência é novo e está sendo discutido pela primeira vez na legislação brasileira, o que permite interpretações conflitantes que serão decididas pela Justiça.

Dois pontos em especial estão sendo discutidos. O Ministério Público defende que apenas a primeira empresa do cartel que aceitar colaborar e formalizar o acordo pode ser beneficiada. Defende ainda que ela só pode ser beneficiada se colaborar com novidades para a investigação. A CGU discorda dos dois pontos.

CGU defende
Carlos Higino Ribeiro de Alencar, secretário executivo da Controladoria-Geral da União, defendeu os acordos de leniência. Segundo ele, o mecanismo permite que o poder público seja ressarcido por eventuais desvios de recursos praticados por estas empresas.

Ele argumentou que, caso a empresa entre em processo de falência ou recuperação judicial, em decorrência da falta de crédito relacionada a esse tipo de investigação criminal, dificilmente os cofres públicos serão ressarcidos.

Um exemplo citado por ele foi o caso da construtora Delta, acusada de formação de cartel e corrupção em obras públicas há quatro anos. “Até hoje a empresa não conseguiu sair dessa situação e não devolveu nada ao Erário”, disse.

Higino disse que a CGU não concorda com a posição do Ministério Público. “No âmbito da Lei Anticorrupção, defendemos que mais de uma empresa do cartel possa celebrar acordos de leniência”, disse. Ele defendeu ainda que a lei não condiciona expressamente os acordos a supostas novidades levadas pelas empresas à investigação. “O requisito da novidade não está presente nos acordos. É uma interpretação doutrinária dos membros do MP. Mas a lei não fala desse requisito”, disse.

Não é a posição do procurador Petter. “A empresa que quiser celebrar o acordo tem que trazer novidades (à CGU). Isso já torna os acordos difíceis. Se no âmbito do Cade já existe o acordo de leniência e se já há as investigações do MP, que novidades podem haver em acordo de leniência com a CGU?”, perguntou.

A deputada Moema Gramacho (PT-BA), autora do requerimento de audiência, defendeu os acordos. Ela considerou que a paralisação das atividades das empresas investigadas pela Lava Jato podem comprometer projetos importantes para o País, como de infraestrutura e até obras sociais. “É mais importante a devolução do dinheiro desviado aos cofres públicos”, disse.

Reportagem - Antônio Vital
Edição - Newton Araújo

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