Economia

Procurador diz que acordos não podem beneficiar todas as empresas em um cartel

25/03/2015 - 16:01  

Durante a audiência pública desta quarta-feira (25) da Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos Deputados, o procurador Júlio Marcelo de Oliveira, representante do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (TCU), elencou razões contrárias aos acordos de leniência feitos com as empresas investigadas pela Operação Lava Jato, que investiga irregularidades na Petrobras.

Para ele, a possibilidade do acordo, previsto na Lei Anticorrupção (12.846/13), não foi feita para oferecer benefícios a todas as empresas participantes de um cartel. “Só o primeiro a delatar os demais pode ser beneficiado, já que o acordo é um fator de instabilidade dentro da organização criminosa. Se todos puderem fazer o mesmo tipo de acordo, os integrantes da quadrilha não vão se preocupar com a traição de nenhum deles”, disse.

Ele acrescentou outro fator que, em sua avaliação, impede a formalização de acordos pelo governo federal, por meio da Controladoria-Geral da União (CGU), com empresas acusadas. “O acordo só pode ser feito pela empresa que efetivamente colaborar com informações novas para que o cartel seja desmantelado. E a CGU não tem condições de saber se aquilo que as empresas estão oferecendo é informação nova ou não, já que as investigações ainda estão sob sigilo”, disse.

O advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, rebateu as alegações do procurador. Ele separou as consequências penais das administrativas. Segundo ele, apenas a primeira empresa de um cartel a colaborar para sua dissolução pode ser beneficiada do ponto de vista penal. “Mas os acordos de leniência podem ser feitos pelas demais junto ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) com vistas à cessão das práticas ilícitas, sem repercussão na parte penal”, disse.

Cade
Há duas semanas, o Cade anunciou ter fechado um acordo de leniência com a Setal, uma das empresas envolvidas no cartel de construtoras que combinavam o resultado de licitações na Petrobras, segundo as investigações da Operação Lava Jato. Foi o primeiro do tipo firmado com empresa envolvida no esquema.

Os acordos de leniência fechados com o Cade não inviabilizam um possível trato a ser firmado com a CGU, feitos exclusivamente no âmbito administrativo – e não criminal. O acordo fechado com a CGU pode garantir à empresa continuar a assinar contratos com o governo e a participar de licitações públicas, além de ter multas reduzidas.

Outra empresa está negociando a formalização de acordo de leniência: a holandesa SBM Offshore iniciou entendimentos nesse sentido com a CGU e a Advocacia-Geral da União (AGU).

A interpretação do advogado-geral da União é que a lei não impede a formalização de acordos de leniência, mesmo com investigações penais sigilosas em curso. “Se a empresa aceita colaborar, ou seja, se aceita ser aberta ao processo de investigação, isso justifica o acordo. Se daqui a seis meses descobrirmos que ela escondeu uma prova, ela vai perder os benefícios do acordo”, disse.

Demissões
Adams acrescentou que uma empresa não pode ser condenada pela ação de um dirigente. “Aplicar as sanções de maneira absoluta significa a morte da empresa. Não se bota uma empresa na cadeia. Uma empresa é uma coletividade de pessoas que se associaram: bancos, fundos de pensão, empregados. Já tem mais de 30 mil pessoas demitidas dentro dessa realidade [da Operação Lava Jato]. É responsabilidade do Estado se preocupar com isso”, disse.

O procurador Oliveira rebateu preocupações de Adams quanto à saúde financeira das empresas em caso de aplicação das penas previstas na Lei Anticorrupção. “Temos que comparar o custo de punir com o custo de não punir. Quanto custa ao País manter um mercado de obras públicas contaminado por corrupção? O custo de não punir é mais alto que o custo de punir as empresas contaminadas”, disse.

O deputado Nilson Leitão (PSDB-MT) deu razão ao procurador. “Concordo que não dá para permitir a todas as empresas o benefício do acordo. Elas podem combinar entre si o que falar. Isso vai virar um cartel de informações”, disse.

Já o deputado Afonso Florence (PT-BA) deu razão a Adams a respeito da preocupação financeira com as empresas.

Reportagem – Antonio Vital
Edição – Marcos Rossi

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