Saúde

Oncologistas defendem derrubada do veto à ampliação de quimioterapia oral nos planos de saúde

Deputada defende diálogo com o governo para que o veto seja derrubado de forma consensual

12/08/2021 - 20:29  

 

Oncologistas e representantes de entidades de pacientes de câncer mostraram, na Câmara dos Deputados, “perplexidade” e “indignação” com o veto integral do presidente Jair Bolsonaro ao Projeto de Lei 6330/19, que ampliava a cobertura dos planos de saúde para a quimioterapia oral e o consequente tratamento domiciliar da doença.

Deputados decidiram intensificar a mobilização pela derrubada do veto, que deve ser apreciado em sessão do Congresso Nacional em setembro. O debate ocorreu nesta quinta-feira (12), na Comissão Especial de Combate ao Câncer.

De acordo com a proposta vetada, os planos de saúde seriam obrigados a fornecer os medicamentos orais em até 48 horas após a prescrição médica, desde que estivessem registrados na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

Presidente do Instituto Vencer o Câncer, o oncologista Fernando Maluf disse que a medida seria fundamental para reduzir a espera no uso desses medicamentos orais, que hoje dependem de avaliação prévia da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), com duração em torno de seis meses.

“Seja no cenário preventivo ou no cenário avançado, seis meses absolutamente é tempo longo demais para quem tem a doença. Só sabe disso quem lida com essas pessoas, cuidando delas no dia a dia, e não os burocratas que ficam atrás da cadeira", observou Maluf.

Atualmente, os medicamentos endovenosos, aplicados em ambiente hospitalar, não dependem da avaliação prévia da ANS, desde que liberados pela Anvisa. Fernando Maluf reclama que o Brasil é o único país do mundo que ainda submete a quimioterapia oral a essa análise mais demorada.

Maior eficácia
Além de serem cômodos por permitirem o tratamento domiciliar, os medicamentos orais têm demonstrado maior eficácia no controle dos 20 tipos de tumores mais comuns. Cerca de 70% dos medicamentos contra câncer já são orais e esse índice tende a aumentar, segundo o oncologista.

Hoje, os planos de saúde já são obrigados a fornecer 58 remédios orais e outros 23 seriam automaticamente incorporados à lista, caso o projeto de lei tivesse sido sancionado.

Presidente da Aliança Pesquisa Clínica Brasil, o também oncologista Fábio Franke defende a ampliação desse tratamento, sobretudo diante da previsão de maior diagnóstico de câncer após a pandemia de Covid-19.

“Câncer é uma doença em crescimento: vai atingir mais de 650 mil brasileiros a cada ano. Sabemos que vamos enfrentar uma epidemia de câncer por causa da Covid-19, devido ao atraso nos diagnósticos. Então, nós queremos estar preparados com todas as armas possíveis para tratar bem os nossos pacientes”, disse.

Já pelo lado dos pacientes, a presidente do Instituto Lado a Lado pela Vida, Marlene Oliveira, reclamou do impacto do veto na vida de quem está enfrentando a doença.

“São mais de 50 mil vidas que poderiam ser beneficiadas. Eu gostaria muito de estar aqui discutindo como o paciente do SUS também poderia ter a possibilidade desse acesso, mas hoje a gente está aqui focando o paciente que tem o plano de saúde: ele já paga por esse plano e merece [o tratamento]”, afirmou.

Segurança jurídica
Na justificativa do veto integral, Bolsonaro afirma que o projeto de lei “contraria o interesse público por deixar de levar em consideração aspectos como a previsibilidade, a transparência e a segurança jurídica” dos planos de saúde.

A Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde) divulgou artigo em apoio à decisão do governo, afirmando que “o veto preserva a governança do sistema de saúde e prioriza critérios técnicos que garantem a segurança dos tratamentos e dos próprios pacientes”. A entidade vê riscos sanitários na incorporação de medicamentos orais sem eficácia comprovada em avaliação prévia da ANS.

Representante da Associação Brasileira de Linfoma e Leucemia, Eduardo Fróes contestou os argumentos do veto que apontavam prejuízos financeiros para os planos de saúde, em caso de transformação da proposta em lei.

“Em 2020, as operadoras de saúde tiveram lucro de 49,5%: R$ 17,5 bilhões. Então, não seria a incorporação da quimio oral que iria trazer esse desequilíbrio financeiro”, disse.

Derrubada do veto
O projeto de lei que amplia a cobertura da quimioterapia oral pelos planos de saúde é de autoria do senador Reguffe (Podemos-DF). Relatora do texto na Câmara, a deputada Silvia Cristina (PDT-RO), paciente oncológica, não vê argumentos para a manutenção do veto em futura sessão do Congresso.

“O nosso objetivo é a derrubada do veto e vamos conseguir. Começamos esse trabalho agora em agosto e a previsão é que, em setembro, o veto venha para análise do Congresso. Estaremos preparados para vencer essa batalha”, afirmou.

A coordenadora da Frente Parlamentar da Saúde, deputada Carmen Zanotto (Cidadania-SC), disse que o governo estuda editar uma medida provisória sobre o tema. Ela sugeriu reunião dos deputados com os ministros da Saúde, Marcelo Queiroga, e da Secretaria de Governo, Flávia Arruda, em busca de consenso para a derrubada do veto.

“Acredito que a gente possa fazer uma derrubada de veto acordada com o governo. O tema merece esse acordo. Foi realmente uma infelicidade – para não dizer outro termo – esse veto. Com o líder do governo e outros deputados da base do presidente, a gente pode construir uma derrubada de veto consensual e aí fica bem para todo mundo”, observou a deputada.

O deputado Weliton Prado (Pros-MG), presidente da Comissão Especial de Combate ao Câncer, reforçou a proposta.

“Vamos fazer muito corpo a corpo. Já estamos ligando para os deputados e líderes e vamos fazer uma grande mobilização na Casa pela derrubada do veto”.

Representantes da Sociedade Brasileira de Cancerologia e da ONG Oncoguia também participaram dos debates na Comissão Especial de Combate ao Câncer.

Reportagem - José Carlos Oliveira
Edição - Roberto Seabra

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