Norma sobre tratamento para homossexualidade gera polêmica
Psicóloga diz que a pessoa tem o direito de ser tratada; deputados criticam a afirmação e reclamam de preconceito.
28/06/2012 - 14:15
A audiência pública da Comissão de Seguridade Social e Família que discutiu a revogação de normas do Conselho Federal de Psicologia (CFP) que proíbem profissionais da área de proporem tratamento para curar homossexuais causou polêmica nesta quinta-feira.
O Projeto de Decreto Legislativo 234/11, do deputado João Campos (PSDB-GO), susta a aplicação de dois dispositivos da Resolução 1/99 do CFP, que orienta profissionais da área a não usar a mídia para reforçar preconceitos contra os homossexuais nem propor tratamento para curá-los.
Apenas duas pessoas, das cinco convidadas, participaram do debate, que ocorreu na data em que se comemora o Dia do Orgulho LGBT. Um dos palestrantes seria o presidente do CFP, Humberto Verona. A entidade, no entanto, enviou um manifesto de repúdio à comissão e classificou a audiência como “falso debate de cunho unilateral”, por ter apenas uma pessoa contrária ao PDC.
O relator da proposta na comissão e autor do requerimento para realização do debate, deputado Roberto de Lucena (PV-SP), refutou a crítica e disse que procurou ouvir todas as vozes no debate. “Não sou homofóbico, fundamentalista. Propus a construção deste espaço para debater o tema”, disse parlamentar, que lembrou ser pastor evangélico e filho de pastor. Segundo ele, há a possibilidade de haver mais audiências para a construção do parecer.
"Cura"
Marisa Lobo, escritora e psicóloga com especialização em psicologia da sexualidade, afirmou que não definir a homossexualidade como uma doença é um argumento questionável. Segundo ela, a retirada da homossexualidade da Classificação Internacional de Doenças (CID) em 1990 aconteceu por votação, o que indicaria um caráter não científico dessa decisão: “A ciência ainda não tem entendimento do que é a homossexualidade. Não há pesquisa que comprove que a homossexualidade é genética.”
Marisa Lobo defendeu a possibilidade de os profissionais permitir, às pessoas homossexuais, a busca de orientação sobre sua condição sexual. “É muito fácil jogar [a responsabilidade] na religião, na sociedade e na família. Deixa a pessoa ter o direito de ser tratada”, disse a psicóloga.
Manifestantes criticaram a fala de Marisa Lobo com cartazes dizendo que a “cura” da homossexualidade é uma forma de perpetuar a homofobia.
O coordenador da Frente Parlamentar Mista pela Cidadania LGBT na Câmara, deputado Jean Wyllys (Psol-RJ), ficou “constrangido” com a fala da psicóloga Marisa Lobo.“Orientação sexual e identidade de gênero são coisas que não confundem. Uma pessoa não pode se valer disso para querer curar uma pessoa por ser homossexual”, disse o parlamentar.
Segundo Jean Wyllys, a proposta da psicóloga só fortalece a egodistonia, ou seja, quando o indivíduo tem certeza de sua identidade sexual, mas quer ter outra. “É óbvio que alguém homossexual vai ter egodistonia, mas por viver numa cultura homofóbica que rechaça e subalterniza sua homossexualidade. O certo seria colocar o ego em sintonia com seu desejo, é sair da vergonha para o orgulho.” Essa classificação foi a utilizada por Marisa Lobo para justificar a “cura” de homossexuais.
A deputada Erika Kokay (PT-DF) também criticou o que considerou como parcialidade na audiência. “Não cabe estarmos fazendo esta discussão. Não cabe alimentarmos a homofobia e o ódio aqui”, disse.
Ela lembrou que resoluções semelhantes existem na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), no Conselho Federal de Medicina (CFM) e do Conselho Federal de Serviço Social.
Autonomia
João Campos defendeu seu projeto. “Faço um debate constitucional, jurídico”, disse. Segundo o parlamentar, que é líder da bancada evangélica na Câmara, as críticas à proposta foram motivadas por “ignorância ou incapacidade” de debater.
“Um dos princípios básicos da ética médica é a autonomia do paciente. É como se o Conselho Federal de Psicologia considerasse o homossexual um ser menor, incapaz de autodeterminação”, afirmou o parlamentar.
Para Campos, a imprensa fez uma leitura incorreta de sua proposta. “Você pode discordar de todos neste País, mas se discordar de militantes homossexuais você é homofóbico. Nós vivemos a democracia. É preciso que as pessoas respeitem as diferenças e os diferentes”, afirmou.
Reportagem - Tiago Miranda
Edição - Natalia Doederlein