Rádio Câmara

Reportagem Especial

Tecnologias assistivas - Recursos que garantem acesso à cultura (09'57'')

09/07/2011 - 00h00

  • Tecnologias assistivas - Recursos que garantem acesso à cultura (09'57'')

Estamos ouvindo ao fundo um trecho do filme "Quarteto Fantástico", com uma diferença em relação à versão que a maioria de nós provavelmente assistiu: aqui, as cenas que acontecem enquanto nada é dito pelos personagens estão sendo narradas através de um recurso chamado audiodescrição. Quem explica o funcionamento dessa ferramenta de acessibilidade é a atriz e audiodescritora Graciela Pozzobon.

"Trata-se de um recurso extra de áudio, onde um audiodescritor vai narrando, vai descrevendo, tudo que está acontecendo. No caso de um filme, por exemplo, são todas aquelas cenas que acontecem no silêncio, as ações dos personagens que entram e saem, os cenários, os figurinos, o contexto, a movimentação cênica, então, por exemplo, um personagem que entra num quarto, abre uma gaveta, retira um bilhete, lê, se emociona, toda essa ação está acontecendo no silêncio. Se não tem o audiodescritor, a pessoa cega fica sem saber o que está acontecendo nesse momento."

Com a inovação trazida pelo DVD, a colocação de audiodescrição em filmes e vídeos em geral ficou tecnicamente muito mais simples, já que esse formato de mídia oferece a possibilidade de se ter várias pistas de áudio. Com isso, basta adicionar a pista com a audiodescrição e colocar no menu principal do DVD essa opção. Caberá a quem assiste definir se quer ou não esse recurso.

Mas a audiodescrição não funciona apenas para o cinema, o vídeo ou a televisão. Peças de teatro, espetáculos de dança, eventos esportivos, todo tipo de acontecimento que possa ter uma grande quantidade de imagens importantes para sua compreensão podem contar com a audiodescrição.

Neste ano de 2011, por exemplo, o evento "X-Motors", promovido em Brasília para a exibição de manobras radicais em motocicletas, contou com esse recurso. A pessoa cega que foi ao evento recebeu um receptor sem fio com fone de ouvido para que pudesse ouvir a descrição de cada manobra executada pelos pilotos.

Em países como Estados Unidos e Espanha, a audiodescrição já era um recurso utilizado mesmo antes do DVD. A dificuldade era que, para ter acesso ao recurso, a pessoa precisava adquirir uma fita de VHS separadamente.

No Brasil, o recurso começou a ser utilizado há menos de dez anos e ainda não está muito difundido. Recentemente, uma portaria do Ministério das Comunicações obrigou os canais de TV aberta que transmitem em sistema digital a disponibilizar o recurso em sua programação, começando com duas horas semanais. Graciela Pozzobon se mostra otimista quanto ao crescimento da utilização desse recurso no país.

"O que eu percebo é que, ano após ano, há um novo interesse. O recurso é muito novo, a grande maioria da população não conhece, não sabe que existe, e por isso, a cada evento, a cada novo filme, nova peça de teatro ou novo evento que nós fazemos audiodescrição, nós percebemos que novas pessoas ficam sabendo e isso vai se disseminando. Por enquanto, no Brasil, ainda são muito pontuais os acontecimentos que disponibilizam os recursos de acessibilidade. Poucas peças de teatro, poucos filmes, mas já há um crescimento considerável."

Antes de gravar uma audiodescrição ou fazê-la ao vivo, como numa peça de teatro, a pessoa responsável por esse recurso prepara um roteiro. Muitas vezes, o espaço entre as falas dos personagens pode ser muito pequeno, obrigando o audiodescritor a escolher que elementos serão descritos dentro da cena, como explica Graciela Pozzobon.

"Nós temos um olhar para a cena, para a ação, para entender o que é primordial naquela cena. Então, por exemplo, nós temos uma cena de briga, em que um dos personagens retira uma faca (digamos assim) e ameaça o outro. E temos em volta, uma série de pessoas assistindo, digamos que eles estejam num bar, que tenha um balcão com muitas garrafas em cima... Se eu tenho pouco espaço para descrever, eu vou descrever apenas o que é o mais importante, que é... a pessoa tirou uma faca e ameaçou o outro. Se eu tenho mais espaço para descrever, então eu vou descrevendo esses outros detalhes, que são, digamos assim, menos importantes, no que diz respeito à ação, ao entendimento daquela cena. Então, o audiodescritor tem que ter esse olhar, ele tem que saber priorizar o que é fundamental, o que é secundário, para ele poder ter o discernimento e escolher o que eu vou descrever no momento em que eu tenho pouco espaço."

Além dos cegos, os surdos também podem aproveitar melhor os produtos audiovisuais através de recursos como a tradução de todo o conteúdo por um intérprete da Língua Brasileira de Sinais, ou ainda o recurso do Closed Caption, que mostra na tela, por escrito, as informações sonoras.

TEC- TRILHA (01-Dave Brubeck Quartet _ Take Five)

Mas as tecnologias assistivas estão presentes nas artes de várias maneiras, não só nas manifestações audiovisuuais. Mesmo nas artes plásticas, os recursos são vários.

Em Nova York, o Museu de Arte Moderna, Moma, disponibiliza um guia específico de obras que podem ser tocadas pelos visitantes cegos, com a utilização de uma luva plástica, que não prejudica a percepção e evita que impressões digitais sejam deixadas nas peças.

No Brasil, a preocupação com a acessibilidade começa a ganhar cada vez mais espaço. Em São Paulo, o Centro Cultural Banco do Brasil possui um grupo de arte-educadores específico para pesquisar e desenvolver soluções em acessibilidade, como explica o educador Felipe Lira.

"No momento, nós temos aqui no nosso grupo, inclusive, educadores que falam Libras, no caso a Língua Brasileira de Sinais, que são capacitados para atender pessoas com deficiência auditiva, ou seja, os surdos. A cada exposição, nós temos tentado desenvolver também materiais táteis, para deficientes visuais. Então são peças com relevos, peças que são sonoras, auditivas, para que as pessoas possam escutar e ter informações sobre a exposição..."

Muitas das obras expostas no CCBB são gravuras, pinturas, fotografias, enfim, obras que não podem ser percebidas com outro sentido que não seja a visão. De acordo com Felipe Lira, mesmo algumas esculturas não podem ser tocadas, dependendo do material de que são feitas, idade e outros fatores. Assim, o grupo prepara peças táteis que ajudam a pessoa a compreender o conteúdo da exposição.

"A exposição não tem uma iniciativa educativa, então, toda a parte educativa, é trabalhada por nós. As exposições mudam de dois em dois meses, mais ou menos, então nós temos que criar, a cada dois meses e meio, mais ou menos, uma série de novas peças, relacionadas à exposição, que não são as peças originais da exposição, então nós criamos peças adicionais, às vezes peças tridimensionais, para auxiliar essa inclusão das pessoas com deficiência."

TEC- TRILHA (Folha-1.wmv)

Produzir material educativo e informativo, em várias mídias, mas sempre com acessibilidade. Esse é o objetivo da ONG Vez da Voz, que tem o foco principal do seu trabalho na comunicação plenamente acessível que atenda a necessidade de todos os públicos, independentemente de ter ou não alguma deficiência.

Desde contações de história a um telejornal atualizado duas vezes por semana, a ONG disponibiliza todo o seu material gratuitamente. A presidente da Vez da Voz, Cláudia Cotes, explica como são feitos os vídeos e faz uma crítica à produção midiática atual.

"Nos nossos vídeos, a gente mistura todos os modelos de comunicação. Então é importante até a gente conversar que hoje, a mídia é pensada para quem escuta e para quem enxerga. E, no Brasil, a gente tem 17 milhões de pessoas cegas, 6 milhões de pessoas surdas, pessoas que têm direito à informação, à cultura, à educação, por isso a gente coloca nos vídeos legenda, porque tem pessoas com deficiência auditiva que lêem, coloca Libras, a Língua Brasileira de Sinais, porque a maioria dos surdos se comunica nessa língua, e coloca audiodescrição, para que os cegos entendam o que está acontecendo no vídeo."

A Vez da Voz também faz parcerias para inserir os recursos de acessibilidade em vídeos institucionais, como no caso de uma série produzida pelo jornal Folha de São Paulo. Cláudia Cotes explica porque a Internet é utilizada como principal canal de divulgação do trabalho da ONG.

"A Internet hoje é a mídia mais democrática que a gente tem. As pessoas têm bastante acesso... A gente acredita que, na verdade, a televisão brasileira também deveria cumprir esse papel, e a gente espera que, com o crescimento da TV digital, isso aconteça no país, mas enquanto isso não acontece, a gente usa a Internet para disseminar isso para todo o Brasil e até para outros lugares, outros países."

Todos os vídeos produzidos pela ONG Vez da Voz podem ser baixados gratuitamente do site da instituição, no endereço: WWW.vezdavoz.com.br. Repetindo: WWW.vezdavoz.com.br.

De Brasília,

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