A Voz do Brasil
CCJ adia debate sobre demarcação de terras após conflito entre policiais e indígenas
22/06/2021 - 20h00
-
CCJ adia debate sobre demarcação de terras após conflito entre policiais e indígenas
- CCJ adia debate sobre demarcação de terras após conflito entre policiais e indígenas
- Deputados divergem sobre condução do governo no enfrentamento à pandemia
- Plenário conclui votação da MP da Eletrobras, que segue para sanção presidencial
O Plenário da Câmara concluiu a votação da medida provisória que abre caminho para a desestatização da Eletrobras. Os deputados analisaram as mudanças feitas pelo Senado na MP, que, agora, segue para sanção do presidente Bolsonaro. O repórter Antonio Vital acompanhou a votação e tem mais detalhes.
A Câmara dos Deputados aprovou a medida provisória (MP 1031/21) que permite a desestatização da Eletrobras. Essa MP foi votada um mês atrás pela Câmara e aprovada semana passada, com mudanças, pelo Senado. Ela perderia a validade nesta terça (22) se não fosse votada novamente pelos deputados.
O relator da proposta, deputado Elmar Nascimento (DEM-BA), recomendou a aprovação de 21 das 28 alterações feitas pelo Senado. A medida provisória permite a emissão de novas ações da Eletrobras que serão vendidas no mercado, o que fará com que o governo perca o controle acionário, ou seja, o comando da empresa. Mas a União terá o poder de veto em decisões da assembleia de acionistas, uma maneira de evitar que um grupo de acionistas detenha mais de 10% do capital votante da empresa.
A oposição classifica isso como uma privatização e aponta como consequência o aumento da conta de luz para o consumidor.
O líder do governo na Câmara, deputado Ricardo Barros (PP-PR), negou que a desestatização da Eletrobras, responsável por 30% da energia gerada no país, vá provocar aumento das contas de luz.
Ricardo Barros: Esta medida não aumenta o preço da energia elétrica. Isso é uma falácia. Pelo contrário: teremos mais investimento, mais geração de empregos, mais competência no sistema e, obviamente, teremos mais capacidade de atender, com a capitalização da Eletrobras, inúmeros locais onde hoje é difícil o acesso de energia. Esta medida provisória privilegia muito a Amazônia, que é o local onde nós temos mais dificuldade de fornecimento.
Deputados da oposição também criticaram emenda do Senado que permite o início das obras das linhas de transmissão da hidrelétrica de Tucuruí, que ligará o sistema elétrico de Roraima ao resto do país. A linha de transmissão cortará mais de 100 km da terra indígena dos Waimiri-Atroari.
Outro ponto que gerou polêmica na votação foi o trecho aprovado na Câmara que obrigava o governo federal a contratar, pelos próximos 15 anos, usinas termelétricas a gás natural em regiões do interior onde não existem gasodutos. O Senado manteve esta previsão, mas tirou essa condição para o processo de desestatização.
Para muitos deputados, essa exigência beneficia interesses privados, como explicou o deputado Alexis Fonteyne (Novo-SP).
Alexis Fonteyne: O que nós temos agora é uma deturpação do processo todo. Nós temos reserva de mercado, nós estamos privilegiando grupos econômicos privados. E aí a gente até se junta à esquerda: se é para privatizar dessa forma, dando para grupos privados, como se fosse a la Vladimir Putin, a gente também não quer. A gente quer fazer uma privatização clara, transparente, que não privilegie ninguém, que dê concorrência e que faça com que o cidadão brasileiro tenha os melhores preços, os melhores serviços, fruto de uma boa concorrência.
As exigências de compromissos financeiros por parte da Eletrobras depois da desestatização fizeram com que deputados favoráveis à privatização da empresa criticassem a medida provisória. O deputado Hildo Rocha (MDB-MA) disse que as obrigações serão maiores que a arrecadação.
Hildo Rocha: Da forma como se encontra o texto, você vai pegar seu veículo usado, vai reformar ele, vai gastar R$ 80 mil para reformar seu veículo e vai vender por R$ 20 mil, ou seja, você vai ter um prejuízo de R$ 60 mil. E o pior é que quem vai pagar a conta desse prejuízo da Eletrobras é o cidadão brasileiro que vai pagar com o aumento da tarifa de energia. É simples a conta.
A medida provisória permite que a energia seja vendida ao consumidor pelo preço de mercado e não mais pelo modelo de cotas, uma espécie de tabelamento de preços, definida pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), como é hoje.
Para diminuir as resistências à proposta, o relator da MP, deputado Elmar Nascimento, estabeleceu que parte do lucro com a venda da energia a preço de mercado seja incluído em uma conta, chamada Conta de Desenvolvimento Energético, ou CDE.
A CDE é abastecida com recursos das empresas de distribuição de energia e, entre outras finalidades, serve para compensar descontos nas tarifas. Elmar Nascimento destinou R$ 8 bilhões dos R$ 25 bilhões previstos na capitalização para abater as tarifas dos pequenos consumidores. Destinou ainda quase R$ 9 bilhões dos recursos novos para a revitalização das bacias do São Francisco e da região de Furnas. Elmar Nascimento comemorou a aprovação da MP.
Elmar Nascimento: Recuperar a capacidade de investimento da Eletrobras no momento da maior crise hídrica da história. Fizemos a redução da tarifa por meio de intervenção na CDE. Fizemos a prorrogação dos fundos que estavam previstos por apenas dez anos. Todo mundo fala em revitalização do São Francisco, mas efetivamente, pelas nossas mãos, agora virou um fundo que será ad infinitum, até a recuperação do São Francisco, da ordem de R$ 350 milhões por ano.
Elmar Nascimento concordou em manter emenda aprovada pelo Senado, que obriga o Poder Executivo a contratar os empregados da Eletrobras demitidos sem justa causa nos 12 meses seguintes à desestatização em cargos e salários parecidos.
A MP também permite que os empregados da Eletrobras que forem demitidos comprem ações da empresa a preços anteriores ao da desestatização, mas limita este total a 1% das ações em poder da União. A MP que permite a desestatização da Eletrobras vai agora para sanção presidencial.
Da Rádio Câmara, de Brasília, Antonio Vital
Economia
Arlindo Chinaglia (PT-SP) lamenta a aprovação da medida provisória que autoriza a privatização da Eletrobras. Ele afirma que a estatal vale cerca de 370 bilhões de reais, mas a previsão de arrecadação com a sua venda é de 25 bilhões de reais. O deputado considera absurdo se desfazer da empresa por um preço muito abaixo do valor real.
Para Joseildo Ramos (PT-BA), a privatização da Eletrobras significa a entrega das águas do Rio São Francisco à iniciativa privada que, segundo ele, só visa o lucro. O parlamentar salienta que o setor privado não tem responsabilidade social e que a venda de estatais estratégicas do País vai aumentar a desigualdade no Brasil.
De acordo com Célio Moura (PT-TO), os parlamentares que votaram a favor da venda da Eletrobras terão que explicar por que optaram pela entrega de um patrimônio que dá lucro e garante a soberania nacional no setor energético. Ele lembra que, nos últimos três anos, a empresa deu lucro de mais de 30 bilhões de reais.
No entendimento de Frei Anastacio Ribeiro (PT-PB), a privatização da Eletrobras é um crime contra o patrimônio público e contra a população brasileira. O parlamentar acha incoerente a pretensão do governo de arrecadar 25 bilhões de reais com a venda de uma empresa que está avaliada em 370 bilhões.
Contrário à privatização da Eletrobras, Valmir Assunção (PT-BA) afirma que a medida é prejudicial à população, porque vai provocar o aumento das contas de luz e, com isso, restringir o acesso da população mais vulnerável à energia elétrica.
Para Nilto Tatto (PT-SP), o Congresso contraria os interesses da sociedade ao aprovar a privatização da Eletrobras. Ele explica que a empresa gerencia o sistema energético brasileiro e que sua venda coloca em risco a soberania nacional. O parlamentar acrescenta que a estratégia, além de ir na contramão das decisões globais, deixará a conta de energia mais cara.
Ivan Valente (Psol-SP) também afirma que a venda da Eletrobras terá como consequência o aumento da tarifa de energia elétrica. Segundo ele, a aprovação da proposta por meio de medida provisória é uma vergonha para o Congresso Nacional, pois significa a entrega de um patrimônio público à iniciativa privada.
Segundo Bira do Pindaré (PSB-MA), enquanto o Brasil está preocupado com a pandemia, o governo faz avançar projetos que destroem direitos sociais e direitos trabalhistas. O deputado cita como exemplo a aprovação da medida que permite a desestatização da Eletrobras e a reforma administrativa.
Na avaliação de Paulo Ramos (PDT-RJ), a política econômica do governo Bolsonaro promove a exclusão social, deixando milhares de pessoas abaixo da linha da pobreza. Ele entende que a venda de estatais e a reforma administrativa, retirando direitos de servidores públicos, visa promover o desmonte do Estado.
Saúde
Perpétua Almeida (PCdoB-AC) lamenta a marca de 500 mil mortes causadas pela pandemia no Brasil e diz que esse número deixa uma mancha de luto na bandeira nacional. De acordo com a deputada, se o governo tivesse possibilitado a chegada da vacina com mais rapidez, milhares de mortes poderiam ter sido evitadas.
Vicentinho (PT-SP) registra, com pesar, as mais de 500 mil vidas perdidas por causa da covid-19 e volta a defender o afastamento do presidente da República. Segundo ele, a CPI da Pandemia, no Senado, já mostrou, pelo menos, 20 crimes de responsabilidade cometidos pelo presidente Jair Bolsonaro.
Erika Kokay (PT-DF) também lamenta as mais de 500 mil vidas perdidas para a covid-19. Na opinião da deputada, o presidente Jair Bolsonaro é o principal responsável pelo agravamento da crise sanitária no Brasil, por ter sido negligente em relação à compra de vacinas e às medidas de distanciamento social.
Ao lamentar as mortes causadas pela covid-19, Coronel Tadeu (PSL-SP) lembra que mais de 16 milhões de pessoas conseguiram se recuperar da doença. De acordo com o parlamentar, é preciso valorizar a vida desses brasileiros que se reestabeleceram e hoje ajudam a devolver a normalidade ao País.
Coronel Tadeu exalta ainda o Plano Nacional de Imunização que, segundo ele, conseguiu vacinar quase dois milhões de pessoas em apenas um dia. Para ele, esse número mostra a força do Sistema Único de Saúde e o comprometimento do governo com a proteção da população.
Direitos Humanos
A reunião deliberativa da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania marcada para esta terça-feira foi cancelada após confronto entre indígenas e policiais em frente ao anexo 2 da Câmara dos Deputados, onde se localizam as salas das comissões.
Os indígenas se manifestavam contra a votação, prevista para a reunião da CCJ, de proposta que trata da demarcação de terras indígenas. A reportagem é de Paula Bittar.
De acordo com a Polícia Legislativa, o grupo era formado por cerca de 500 indígenas, em sua maioria armados com flechas e tacapes, que tentaram invadir o Anexo 2. De início, segundo a polícia, eles derrubaram os gradis da entrada do edifício e logo depois, várias flechas foram disparadas contra os policiais, ainda na tentativa de invasão do anexo.
Os policiais legislativos repeliram os indígenas com bombas de efeito moral, gás de pimenta e gás lacrimogêneo. Ainda de acordo com a polícia legislativa, não houve disparo de tiros ou qualquer tipo de agressão física contra os manifestantes. Um policial legislativo foi atingido na perna por uma flecha e um servidor da área administrativa da Polícia Legislativa foi flechado no tórax. Ambos foram transferidos para um hospital privado do Distrito Federal. Um policial militar foi flechado no pé, mas foi atendido no Departamento Médico da Câmara e passa bem.
O ocorrido repercutiu no Plenário da Câmara. O deputado Carlos Jordy (PSL-RJ) criticou a atuação dos indígenas.
Carlos Jordy: Índios... índios não, porque não são todos os índios que apoiam esse tipo de ato de vandalismo e tentativa de homicídio. Pessoas ligadas ao movimento indígena que são massa de manobra de partidos de esquerda e que estão sendo inflamadas para vir à Câmara dos Deputados para fazer atos de vandalismo e invasão da Câmara dos Deputados, para pressionar, na forma do grito, da agressão e da violência, para que os Deputados não votem esse projeto. E o que fizeram? Tentaram invadir a Câmara dos Deputados, jogando flechas.
Já segundo o deputado Alencar Santana Braga (PT-SP), a polícia militar do DF jogou as bombas, e as flechas foram revide por parte dos indígenas. Ele disse que acompanhou o confronto desde o início e, enquanto a postura da Polícia Legislativa foi de negociação, a da PM foi de confronto.
Alencar Santana Braga: Quero aqui parabenizar a Polícia Legislativa, sob o comando do Barros, que foi muito bem. Depois, ele foi lá fora, negociou, acalmou a situação, negociou mais com a PM, conosco e ali junto com a comunidade indígena. A Polícia do Distrito Federal, a PM, mesmo depois de eu me identificar como Parlamentar desta Casa — eu estava tão somente filmando —, mira a arma, manda eu abaixar o celular. Essa foi a conduta da PM do Distrito Federal: de ataque, de confronto, desde o primeiro momento.
O líder da Minoria, deputado Marcelo Freixo (Psol-RJ), disse que vai procurar o governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha, para uma conversa com parlamentares da oposição a respeito da atuação da PM.
A deputada Joenia Wapichana (Rede-RR) comparou o confronto desta terça a uma guerra.
Joenia Wapichana: Já são mais de 521 anos perseguindo os povos indígenas. Só tem uma palavra que eu posso descrever o que aconteceu hoje aqui nessa Casa, que diz que é a casa do povo: covardia. Foi mais de uma hora de bombas de efeito moral, balas de borracha, gás de pimenta, parecia uma guerra. Essa Casa representa o povo ou não? Porque, se representa, por que tem tanto medo dos povos originários desse País? Por que não enfrentam no diálogo? A gente sabe que esse PL 490 ele veio com interesse que não é dos povos indígenas.
Segundo Wapichana, 14 indígenas foram feridos no confronto.
O presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP-AL), disse que havia feito um compromisso de criar um grupo de trabalho para discutir o tema, mas criticou a atuação dos indígenas.
Arthur Lira: Querem invadir, porque não querem que vote uma matéria. É desse jeito que vamos resolver? Então, amanhã, nós vamos votar uma matéria que vá de encontro aos interesses de um setor, e o setor vem aqui à Câmara, quebra a Câmara, dá em deputado. E desse jeito, resolvemos. Então, não será desse jeito. Se é para criarmos um GT para analisarmos a situação, eu já tinha me comprometido com isso. Agora, na pressão, na violência, na truculência, seja de qual parte for…Eu não quero reputar aqui que a Polícia Militar veio deliberadamente para brigar. Não, ela veio para manter a ordem.
O parecer à proposta que trata da demarcação das terras indígenas foi apresentado na última quarta-feira (16) pelo relator, deputado Arthur Oliveira Maia (DEM-BA). Um pedido de vista adiou a votação do projeto para esta semana.
Maia apresentou um texto substitutivo aos 14 projetos que tramitam em conjunto sobre o tema. O principal (PL 490/07) submete a demarcação de terras indígenas ao Congresso Nacional.
O texto apresentado pelo relator é mais amplo, não trata de demarcação por lei, porém traz outros temas polêmicos como o chamado marco temporal e mudanças no usufruto pelos povos originários, com a possibilidade, por exemplo, de instalação de bases militares, expansão da malha viária, e exploração de alternativas energéticas de cunho estratégico.
O texto busca, entre outros pontos, consolidar em lei a tese do marco temporal: a proposta garante como terras tradicionalmente ocupadas pelos indígenas brasileiros apenas aquelas em que eles viviam na promulgação da Constituição de 1988, com uma série de requisitos para comprovação.
A proposta está na pauta da CCJ desta quarta-feira (23).
Da Rádio Câmara, de Brasília, Paula Bittar.
O confronto entre índios e policiais nos arredores da Câmara repercutiu no Plenário da Casa.
Maria do Rosário (PT-RS) culpa a Presidência da Comissão de Constituição e Justiça, pelo conflito entre policiais e índios. Segundo ela, ao colocar em votação o projeto que prevê a revisão das demarcações de terras indígenas, o comando da CCJ incentivou o confronto. Ela entende que votar a proposta durante a pandemia, quando a Câmara está fechada à população, é cercear o direito ao debate democrático.
Jandira Feghali (PCdoB-RJ) lembra que os índios estão acampados em Brasília há duas semanas para defender seus direitos constitucionais. Ela avalia que as bombas de gás atiradas contra os manifestantes fazem parte do clima de violência que se estruturou no Brasil, recentemente. A deputada defende a negociação permanente em vez da intimidação.
Contrária à proposta que dá ao Congresso o poder de demarcação das terras indígenas, Professora Rosa Neide (PT-MT) salienta que a ganância fez com que as terras indígenas virassem alvos de mineradores e garimpeiros. Ela também reprova a ação policial, argumentando que as comunidades indígenas são pacíficas e merecem respeito.
Na avaliação de Leo de Brito (PT-AC), a proposta que altera as regras de demarcação visa acabar com qualquer possibilidade de consolidar os direitos dos povos indígenas às suas terras e à sua cultura. O deputado também acusa o governo federal de incentivar garimpeiros a invadirem as terras indígenas e a atacar os índios.
De acordo com análise de Leonardo Monteiro (PT-MG), os índios vieram à Brasília porque estão sendo atacados em suas aldeias por milicianos disfarçados de garimpeiros e latifundiários. Para ele, são legítimas as reivindicações dos indígenas, que deveriam ser ouvidos no Congresso.
Alice Portugal (PCdoB-BA) lamenta as cenas de violência entre índios e policiais. A deputada afirma que os povos originários não podem ser tratados como párias da sociedade. É preciso, segundo ela, que se abram as portas para negociar com aqueles que podem ser afetados com a aprovação da proposta que trata da demarcação de terras.