Direitos Humanos

Camponeses pedem apoio da Câmara para reparação de danos da Revolta dos Perdidos

Conflito ocorreu em 1976, quando camponeses e outros moradores da região do Araguaia entraram em confronto com grileiros de terra e agentes de segurança. Confundidos com remanescentes da Guerrilha do Araguaia (1972-1974), eles acabaram presos, torturados e mortos em ações militares

27/08/2018 - 20:11   •   Atualizado em 27/08/2018 - 21:33

Najara Araujo/Câmara dos Deputados
Oitiva coletiva de familiares de camponeses da região do Rio Araguaia, que participaram da Revolta dos Perdidos, para registrar esse momento da história brasileira
Em reunião na Câmara dos Deputados, camponeses foram ouvidos sobre a Revolta dos Perdidos

Camponeses que lutaram na Revolta dos Perdidos pediram o apoio da Câmara dos Deputados para a reparação de danos morais e econômicos. A busca do reconhecimento da condição de anistiados políticos envolve ações na Justiça Federal e na Comissão de Anistia, vinculada ao Ministério da Justiça.

Quatro camponeses relataram nesta segunda-feira (27) à Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara os detalhes do conflito por terras ocorrido em 1976, no sudeste do Pará, e ainda pouco conhecido nos registros históricos do País.

Na ocasião, camponeses revoltados com desapropriações e outras decisões do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) entraram em confronto com grileiros de terra e agentes de segurança. Camponeses e outros moradores da região foram presos, torturados e mortos em ações militares, com base na Lei de Segurança Nacional.

Todos teriam sido confundidos com remanescentes da Guerrilha do Araguaia, um movimento liderado pelo PCdoB entre 1972 e 1974, na mesma região.

Sidney de Oliveira, então com 17 anos de idade, relembrou a violência da repressão militar e a acusação de que agricultores familiares eram guerrilheiros. "Tinha o tenente Walmari. Esse homem foi o que mais me bateu. Virava a coronha do fuzil, me batia e dizia: 'cadê seu pai, a gente quer pegar ele'. Dizia que meu pai era terrorista, que nós éramos terroristas", relatou, aos prantos.

Crispin Santana, hoje com 64 anos, detalhou a violência sofrida, inclusive contra as mulheres da região. "Além dos homens, houve tortura e estupro demais. Aquelas senhoras que não corriam para o mato e que eles pegavam foram estupradas e torturadas", afirmou.

Ações de reparação
A advogada dos camponeses, Irene Gomes, já apresentou as primeiras ações de reparação de danos à Comissão de Anistia. Segundo ela, cerca de 250 pessoas têm direito a algum tipo de reparação, pois acumulam sequelas das torturas, perderam suas lavouras e sofreram o constrangimento de responder a inquérito com base na Lei de Segurança Nacional até o fim dos anos 70.

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"O Estado brasileiro tinha muito medo de que a Guerrilha do Araguaia fosse reacesa, que tivesse ficado algum remanescente. Então, havia um monitoramento ostensivo na região. Tanto é que, quando houve essa briga por terra, o Estado brasileiro interpretou como sendo um ato contra a segurança nacional e que eles seriam subversivos, terroristas e querendo fazer ressurgir a Guerrilha do Araguaia", disse a advogada.

Atendendo a pedido da advogada, a assessoria da Comissão de Direitos Humanos da Câmara vai encaminhar um pedido de informações ao Superior Tribunal Militar (STM) e ao Arquivo Nacional em busca de documentos oficiais sobre a repressão à Revolta dos Perdidos.

A advogada também reclamou das secretarias de Segurança Pública do Pará e do Tocantins, que informam não possuir registro sobre a revolta.

A subcomissão da Comissão de Direitos Humanos que trata dos temas de "memória, verdade e justiça" realiza nesta terça-feira (28) audiência pública sobre a atual situação da Comissão Brasileira de Anistia. Irene Gomes é uma das convidadas da reunião, que está marcada para as 14 horas, no plenário 2 da Câmara dos Deputados.

Reportagem – José Carlos Oliveira
Edição – Pierre Triboli

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