Direitos Humanos

A pedido de CPI, governo pode criar plano para reduzir homicídios de jovens negros

Medida está prevista em umas das 14 propostas sugeridas pela recém-encerrada comissão da Câmara que investigou casos de violências contra jovens negros e pobres no Brasil

24/07/2015 - 07:34  

O relatório final da CPI da Violência contra Jovens Negros, aprovado no último dia 15, propõe a criação de um plano nacional de enfrentamento ao homicídio de jovens. Pelo texto, as ações do plano deverão priorizar a população negra e pobre e a oferta de políticas públicas adequadas e suficientes em seus territórios. O plano terá a duração de 10 anos e será coordenado e executado por órgãos do governo federal responsáveis por programas ligados à juventude e à igualdade racial.

Gabriela Korossy / Câmara dos Deputados
Deputada Rosângela Gomes
"A razão primordial do genocídio institucionalizado de jovens negros e pobres é o racismo", diz Rosangela

Como a competência para definir objetivos, programas e recursos financeiros é do Poder Executivo, o projeto de lei sugerido pela CPI traça apenas as diretrizes do plano. “Uma das principais sugestões é um recorte racial para que as ações do plano priorizem a população negra”, explica a relatora da CPI, deputada Rosangela Gomes (PRB-RJ).

Entre as metas que deverão constar do plano estão a redução do índice de homicídios para o padrão de um dígito por 100 mil habitantes, o aumento da elucidação de crimes contra vida e o desenvolvimento de ações afirmativas em locais com altas taxas de violência juvenil.

A CPI sugere ainda, por meio de uma proposta de emenda à Constituição (PEC), a criação do Fundo Nacional de Promoção da Igualdade Racial, Superação do Racismo e Reparação de Danos, como forma de assegurar recursos para políticas públicas voltadas à população negra. De acordo com a PEC, o fundo será abastecido pela destinação de 2% da arrecadação do Imposto de Renda (IR) e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI).

Auto de resistência
Em resposta a um dos temas mais debatidos na CPI, o suposto tratamento desigual das polícias em abordagens a pessoas negras e pobres, os parlamentares decidiram apoiar o Projeto de Lei 4471/12, do deputado Paulo Teixeira (PT-SP), que cria regras rígidas para a apuração de mortes e lesões corporais decorrentes da ação de agentes do Estado, como policiais. A proposta acaba com o chamado auto de resistência.

“O auto de resistência significa a produção de um documento oficial que pressupõe a morte em questão como decorrente da resistência à autoridade policial, como se tivesse havido confronto, como se o agente de Estado que efetuou o disparo o tivesse realizado para se defender. O que nem sempre é corroborado por evidências”, diz o relatório.

Controle das polícias
Outra proposta defendida pela CPI é a PEC 381/09, que cria o Conselho Nacional de Polícia. O objetivo da proposta, que já está em análise na Câmara dos Deputados, é realizar um controle mais eficiente da atividade policial. Sem retirar a atual atribuição constitucional do Ministério Público de exercer o controle externo da atividade policial, o texto da PEC remete ao Conselho Nacional de Polícia o controle da atuação administrativa, funcional e financeira das polícias federal, dos estados e do Distrito Federal.

O órgão será composto por magistrados, membros do Ministério Público, advogado, cidadãos representantes da população e delegados das polícias federal, dos estados e do Distrito Federal. A ideia é compor um órgão autônomo, independente e imparcial.

Mayke Toscano/Secom MT
Segurança - Policiais - operação policial auto de resistência abordagem
Projeto da CPI quer disciplinar uso da força em atividades policiais

Uso da força
Por meio de um projeto de lei, a CPI pretende ainda disciplinar o uso progressivo da força no exercício da atividade policial. O texto detalha a conveniência de se estimular a adoção de um modelo de uso progressivo da força, por cada órgão legitimado, para que a ação se dê em obediência aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, usando, sempre que possível, instrumentos menos letais durante as atividades.

Normalmente, as chamadas regras de intervenção só são conhecidas dentro das forças de segurança que as devem aplicar. Como a ideia do projeto é defender a vida e a restringir o uso da força, o texto pretende dar publicidade a muitas dessas regras de intervenção, a fim de facilitar o controle externo tanto pelos órgãos legitimados, em especial o Poder Judiciário e o Ministério Público, quanto pela opinião pública.

Perícia Criminal
Outra iniciativa defendida pela CPI foi sugerida na forma de uma PEC que institui a perícia criminal como órgão de segurança pública, separando a perícia oficial da estrutura das polícias civis e federal. O relatório aprovado pela CPI sustenta que a investigação pericial envolve ciência, isenção, imparcialidade e objetividade, o que confere à prova por ela produzida o mais alto grau de confiança e credibilidade.

Observatório
Entre os projetos de resolução sugeridos pela CPI, um deles cria, no âmbito da Câmara dos Deputados, o Observatório de Combate à Discriminação Racial, Intolerância e Outras Formas de Violências. O objetivo é coletar dados em nível nacional sobre práticas de racismo, intolerância e outras formas de violências para a elaboração de políticas públicas.

Também caberá ao observatório encaminhar aos órgãos competentes denúncias de desigualdade racial, em virtude de raça, sexo, cor, descendência ou origem nacional e étnica, bem como monitorar os procedimentos instaurados por órgãos públicos em razão de denúncias de racismo, intolerância e outras formas de violência.

Arquivo/ Reinaldo Ferrigno
Direitos Humanos e Minorias - Negros - Quilombolas - Sessão Solene em homenagem ao Dia da Consciência Negra
Proposta da CPI pune município que não incluir ensino da cultura afro-brasileira no currículo escolar

Cultura afro-brasileira
Outra proposta considera inadimplente – de acordo com a Lei de Responsabilidade Fiscal - o município que não incluir o ensino de história e cultura afro-brasileira no ensino fundamental e médio, conforme exige a Lei 10.639/13.

Entre as recomendações gerais da CPI destaca-se o incentivo à ação contínua de ações para a eliminação do racismo em instituições públicas e privadas, assegurando o cumprimento e a divulgação do Estatuto da Igualdade Racial (12.288/2010). O texto fala ainda na aplicação de pelo menos de 5% dos recursos no Plano Plurianual (PPA) de estados e municípios em políticas de promoção da igualdade racial.

Reportagem – Murilo Souza
Edição – Natalia Doederlein

A reprodução das notícias é autorizada desde que contenha a assinatura 'Agência Câmara Notícias'.