Deputados ainda discutem propostas que coíbem o trabalho infantil
Vice-procuradora do Ministério Público do Trabalho lembra que, na década de 90, havia 9 milhões de crianças e adolescentes trabalhando. Hoje são 3,5 milhões e a meta é extinguir esse tipo de trabalho até 2020.
16/09/2014 - 12:59
O Brasil ainda tem 3,4 milhões de crianças e adolescentes que trabalham. Essa quantidade vem caindo, mas justamente na faixa etária em que o trabalho é totalmente proibido, até os 13 anos, o número de casos aumentou na última década: foram 10 mil registros a mais, de acordo com o Censo de 2010.
Um dos maiores entraves para a redução do trabalho infantil é o fato de ele ser aceito culturalmente no Brasil: muitos pais acreditam que, trabalhando desde cedo, os filhos podem estar mais bem preparados para o mercado e até para a própria vida. “A ideia de que o trabalho ajuda, de que é melhor do que estar nas ruas é um pensamento viciado, uma visão distorcida da pobreza e do que uma criança necessita”, explica a vice-procuradora do Ministério Público do Trabalho, Eliane Araque dos Santos.
Especialistas ouvidos pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga o trabalho infantil no Brasil corroboram a opinião da vice-procuradora e afirmam que o trabalho antes da hora traz efeitos negativos para a criança como inibir seu desenvolvimento e suas potencialidades e levar ao fracasso escolar. Isso porque o trabalho atrapalha o desenvolvimento psicológico e cognitivo, além de deixar a criança muito cansada para as atividades escolares. O fracasso escolar, por sua vez, também pode determinar que a criança permaneça no nível da pobreza.
Exploração em casa
Segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), em 2011, havia 258 mil crianças e adolescentes exercendo trabalhos domésticos no Brasil. Desse total, cerca de 67 mil tinham entre 10 e 14 anos; e 190 mil estavam na faixa de 15 a 17 anos.
O trabalho infantil doméstico é uma das atividades incluídas na Lista das Piores Formas de Trabalho Infantil criada por um decreto do ex-presidente Lula. Por estar nesta lista, o trabalho doméstico não pode ser exercido por pessoas com menos de 18 anos. O decreto teve como base uma convenção da Organização Internacional do Trabalho.
A CPI vai procurar mecanismos jurídicos para enfrentar o trabalho doméstico infantil. Segundo a relatora, deputada Luciana Santos (PCdoB-PE), o direito à inviolabilidade do lar, previsto atualmente, não pode servir para encobrir o desrespeito aos direitos humanos de crianças que trabalham em lares próprios ou de outras pessoas.
A CPI do Trabalho Infantil pretende concluir os trabalhos neste ano e deve sugerir mudanças no Código Penal, no Estatuto da Criança e do Adolescente, na Constituição e em leis que permitam punir empresas que explorem o trabalho infantil.
Propostas em análise
Na Câmara, já está em tramitação uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC 374/13) que proíbe as empresas que empreguem menores de 14 anos de firmar contratos com o poder público ou receber incentivos fiscais ou creditícios do governo.
Outra proposta em análise na Casa (PL 6257/13) aumenta a multa para quem usa trabalho infantil ou não respeita os direitos dos adolescentes em idade para trabalhar, como fazer corretamente as anotações na sua carteira de trabalho.
Há ainda um projeto de lei complementar (PLP 299/13) que permite aos estados abater, das suas dívidas com a União, os recursos que investirem na erradicação do trabalho infantil. A proposta permite a dedução de até 3% das parcelas mensais das dívidas.
Algumas propostas causam polêmica, como o projeto que regulamenta o trabalho artístico de crianças (PL 3974/12). Representantes do Judiciário e de emissoras de televisão ouvidos pela CPI do Trabalho Infantil têm posições opostas mas, concordam que o trabalho artístico infantil não deve ser proibido. A vice-procuradora do Ministério Público do Trabalho, Eliane Araque dos Santos, é categórica: isso também é trabalho infantil. “O ideal era que essas crianças estivessem treinando essa aptidão artística no ambiente escolar.”
Reportagem - Mariana Monteiro
Edição – Natalia Doederlein