Reportagem Especial

Especial Presídios - A história das facções criminosas brasileiras (05' 50")

05/06/2006 - 00h00

  • Especial Presídios - A história das facções criminosas brasileiras (05' 50")

NA REPORTAGEM ESPECIAL DE HOJE, VAMOS CONHECER UM POUCO MAIS A HISTÓRIA DAS FACÇÕES CRIMINOSAS BRASILEIRAS QUE, SE NÃO FOREM DETIDAS A TEMPO, PODEM SE TORNAR TÃO PERIGOSAS QUANTO AS ORGANIZAÇÕES MAFIOSAS.

Amigos dos Amigos, Comando Vermelho, Terceiro Comando, Primeiro Comando da Capital, Primeiro Comando Mineiro, Paz, Liberdade e Direito, Comando Norte/Nordeste. São todos nomes de facções criminosas espalhadas de Norte a Sul do país. Não é preciso muito estudo para se perceber que o crime organizado vem crescendo no Brasil: basta acompanhar o noticiário. Mas é um pouco mais difícil entender os motivos que levaram ao fortalecimento das facções criminosas, especialmente no eixo Rio-São Paulo.

Os números são muito vagos quando o assunto é crime organizado no Brasil. Não existem estatísticas de quanto dinheiro as facções criminosas movimentam no país, mas sabe-se que os valores são milionários.

O PCC, Primeiro Comando da Capital, foi o responsável pelas rebeliões e ataques que causaram mais de uma centena de mortos em São Paulo. Antes disso, em 2001, a facção organizou rebeliões em mais de 20 presídios paulistas e, no ano seguinte, em sete penitenciárias.

A facção foi criada em 1993, a partir de um time de futebol na Casa de Custódia de Taubaté, que era considerada a prisão mais segura do estado. Os objetivos principais do grupo eram reagir ao massacre do Carandiru, de 92, que matou 111 presos, e exigir melhores condições de vida dentro da prisão. Hoje, o grupo tem até estatuto próprio.

Uma outra grande facção criminosa, o Comando Vermelho, foi formado por reincidentes da antiga facção Falange Vermelha, que durante a década de 70 lutava pelo fim da tortura e dos maus tratos aos prisioneiros. Hoje, o grupo é conhecido especialmente pelo comando do tráfico de drogas no Rio de Janeiro.

Robson Robin da Silva é diretor do departamento de Políticas, Programas e Projetos da Secretaria Nacional de Segurança Pública, ligada ao Ministério da Justiça. Ele avalia que o crescimento das facções criminosas no Brasil está ligado a falhas no sistema prisional.

"Eles não são tão organizados assim na rua. O problema é a falta de estratégia dentro do sistema prisional. Eles vão para dentro do sistema prisional, e essas pessoas já estavam na rua, desassistidas de estrutura, desassistidas de família, desassistidas de oportunidade. Essas pessoas já não têm sentimento de pertencimento. Essas pessoas já procuram alguma coisa, algum referencial na vida. Na medida em que encontram o crime, e vão para o encarceramento, não encontram um sistema adequado, um sistema capaz de recuperá-los, não encontram o estado lá dentro. Eles são entregues tão somente ao aspecto punitivo da questão, estão encarcerados, e tem todo o tempo do mundo para pensarem no que quiserem. É como se diz: a cabeça vazia e todo o tempo do mundo, vira oficina do diabo"

O sociólogo da Universidade Estadual do Rio de Janeiro e especialista no assunto, Ignacio Cano, explica que as facções brasileiras surgem dentro dos presídios, como maneira de reivindicar um melhor tratamento dentro das penitenciárias. As facções conseguem arregimentar muitos membros porque os presos, ao entrar nas penitenciárias, se unem aos grupos por proteção. Eles pagam essa proteção com mensalidades e serviços. Segundo o sociólogo, o agrupamento dos presidiários por si só não é um problema.

"Na minha avaliação, o fato de os presos se organizarem, terem líderes coletivos etc, não é negativo, acontece em todas as prisões do mundo. Inclusive é positivo para poder negociar com os presos em caso de tensão. O problema é essa vinculação com as redes criminosas de fora, e as organizações de presos dentro dos presídios"

Ignacio Cano afirma que, enquanto as facções criminosas do Rio de Janeiro estão envolvidas basicamente com o tráfico de drogas, as de São Paulo trabalham, principalmente, com roubos. Ele acredita que não é possível comparar, por enquanto, o crime organizado brasileiro com o internacional, como a máfia italiana. Segundo ele, enquanto a máfia é extremamente organizada, as facções brasileiras só conseguem se organizar efetivamente dentro das prisões. Mas, diz o sociólogo, o nível de organização dos ataques de maio em São Paulo não torna difícil descartar a possibilidade de, no futuro, o crime organizado brasileiro atingir o nível das organizações internacionais. Inácio Cano também acha difícil prever que, no curto prazo, as facções criminosas brasileiras se transformem em uma organização como as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia, as Farc.

"Acho que existe no Brasil um medo muito grande de que a violência, a delinqüência, adqüiram um componente político. Acho que há um medo de que a exclusão social, tradicional no Brasil, venha a se traduzir em violência política, como o que acontece na Colômbia. Acho que estamos muito longe dessa situação. Os grupos criminosos no Brasil não aspiram a tomar o poder, não têm um projeto político, eles querem o lucro, e eles trabalham parasitando o estado, corrompendo o estado, e não derrubando o estado"

Para combater o crime organizado no Brasil, Ignácio Cano afirma que não basta neutralizar os supostos líderes dessas facções, como Marcos Camacho, o Marcola, e Luiz Fernando da Costa, o Fernandinho Beira-Mar. O sociólogo defende a necessidade de se desvendar lideranças ainda superiores que, segundo ele, são responsáveis, por exemplo pela venda de sentenças judiciais, e que permitem que o crime continue a se organizar impunemente no Brasil.

De Brasília, Paula Bittar

E AMANHÃ, NA REPORTAGEM ESPECIAL, ACOMPANHE AS INVESTIGAÇÕES SOBRE OS POSSÍVEIS ABUSOS E DESRESPEITO AOS DIREITOS HUMANOS DURANTE A RESPOSTA POLICIAL AOS ATAQUES DE SÃO PAULO.

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