Reportagem Especial

Especial Presídios - O que leva uma pessoa ao crime (05' 24")

05/06/2006 - 00h00

  • Especial Presídios - O que leva uma pessoa ao crime (05' 24")

NA REPORTAGEM ESPECIAL DE HOJE, VAMOS CONHECER UM POUCO MAIS SOBRE OS MOTIVOS QUE LEVAM ALGUMAS PESSOAS AO CRIME.

Marcos Camacho, o Marcola, é apontado como líder da facção criminosa PCC, responsável pela onda de violência em São Paulo. Aos 10 anos de idade, Marcola já tinha perdido os dois pais: a mãe morreu afogada e o pai foi vítima de um acidente de carro. O criminoso, que hoje tem 38 anos de idade, foi criado por uma tia. É difícil estabelecer conexão, mas os traumas do passado podem ter sido um dos fatores que levaram Marcola a passar a maior parte da vida adulta na cadeia. E, nem todos os criminosos são levados a cometer delitos por causa de uma infância difícil. Esse é o ponto de vista do psiquiatra e pesquisador da Universidade de Brasília, Raphael Boechat. Ele cita exemplos como o de Suzane Richthofen, a jovem que chocou a opinião pública ao ser acusada de envolvimento no assassinato dos pais. Suzane, segundo o psiquiatra, tinha uma boa estrutura familiar, e ainda assim cometeu o crime.

Para explicar o que leva algumas pessoas ao crime, Raphael Boechat cita conceitos da Psicanálise. De acordo com a teoria psicanalítica, todos nós, seres humanos, somos movidos por dois princípios: o princípio de prazer e o princípio de realidade. O princípio de prazer, ou id, representa os nossos impulsos mais básicos - como os de sobrevivência e de alimentação - os instintos mais primitivos, a busca inconsequente do prazer. Por outro lado, o princípio de realidade, ou ego, é responsável por reprimir o princípio de prazer, para nos tornar pessoas capazes de conviver em sociedade.

Para Boechat, esses criminosos, como os responsáveis pela onda de terror em São Paulo, são pessoas em quem, por um motivo ou outro, os instintos mais primitivos fugiram ao controle. Essas pessoas não têm a capacidade de reprimir os seus impulsos mais básicos. Segundo o psiquiatra, a crueldade está presente em todos nós.

"Todo mundo tem uma parte perversa, uma parte cruel. Agora, a forma como a pessa lida com essa crueldade depende de uma série de fatores. Todos nós temos um lado mau, um lado perverso. E a gente tem instintos primitvos, e aí tá o lado bom e o lado mau que todo mundo tem. Agora, como a gente tem uma série de leis introjetadas, leis sociais, leis familiares, a gente não deixa esse lado mau exarcebar, esse lado mau prevalecer"

Quanto aos tipos de criminosos, Raphael Boechat os classifica em três: os que têm algum transtorno de personalidade, como Suzane Richthofen, ou o famoso bandido da "luz vermelha"; os que têm alguma doença mental específica, como o transtorno bipolar, e podem cometer crimes por conta dessa doença, e aqueles que não têm nenhuma patologia, mas sim uma situação de vida que os levem a cometer crimes. Boechat acredita que este último é o tipo mais comum de criminoso no Brasil.

"Aqui no Brasil, eu acho que, infelizmente, é esse terceiro grupo, esse grupo de pessoas devido à circunstância social do país. Aqui no Brasil eu considero que esse, sem dúvida, é o mais comum. Mas se você for em outros países desenvolvidos, não. Por exemplo, lá nos Estados Unidos, tem estudos que mostram que até entre 50 e 70% dos presos têm transtorno de personalidade como doença mesmo"

O palestrante motivacional Roberto Carlos Ramos pode ser enquadrado nesse terceiro grupo: o de pessoas que cometeram crimes por causa de uma situação social desfavorável. Hoje, Roberto Carlos é pedagogo e mestre em literatura infantil pela Universidade de Campinas. Em 2001, ele foi eleito um dos dez maiores contadores de histórias da atualidade em Seatle, nos Estados Unidos. Mas, quem o vê hoje não imagina que o pedagogo é recordista em fugas da Febem mineira. Dos 6 aos 13 anos de idade, Roberto Carlos fugiu 132 vezes da instituição. A princípio, ele foi internado na Febem pelos pais, que não tinham condições financeiras de sustentá-lo. Em seguida, Roberto Carlos começou a praticar roubos e a consumir drogas, como maconha e cola de sapateiro. Aos 13 anos de idade, o hoje contador de histórias foi adotado por uma francesa, que o alfabetizou tanto em francês quanto em português. A confiança que a mãe adotiva depositava nele foi, segundo Roberto Carlos, essencial para que ele abandonasse a delinqüência. Para ele, grande parte dos criminosos têm histórias parecidas: de falta de confiança e laços afetivos com outras pessoas.

"O que faz com que o ser humano tenha perspectiva de vida é que ele quer se dar bem para agradar as pessoas a quem ele é preso afetivamente. Eu não tinha nenhuma perspectiva nessas instituições. Não tinha ninguém que me prendesse. Então por que eu ia querer tirar 10 numa sala de aula, se não tinha ninguém para mostrar meu caderno depois, ninguém para elogiar, ninguém para falar que realmente valia a pena eu conseguir"

Hoje, Roberto Carlos Ramos mora em Minas Gerais, com 14 meninos que ele adotou. Eles moram em uma casa construída por eles mesmos, e Roberto Carlos viaja Brasil afora fazendo palestras sobre a história da vida dele. Ele já começou a construção de uma nova casa, que vai abrigar outros 14 meninos de rua. Para Roberto Carlos, é necessário que o Brasil tome consciência que só vai ser possível reverter a história dos criminosos quando as instituições penitenciárias servirem para cumprir não somente a tarefa de punir os delinqüentes, mas também a tarefa de ressocializá-los.

De Brasília, Paula Bittar

E NA REPORTAGEM DE AMANHÃ, SAIBA UM POUCO MAIS SOBRE AS HISTÓRIAS DAS FACÇÕES CRIMINOSAS, QUE ESPALHAM O TERROR POR TODO O PAÍS.

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