Papo de Futuro
A saúde física e mental na era da hiperconectividade. Em outras palavras, celular faz mal à saúde?”
14/11/2022 -
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Papo de Futuro (14/11/2022):
Nesta edição do programa Papo de Futuro, a consultora Beth Veloso fala sobre mitos e questões que nos ligam ao desafio de nos mantermos conectados e saudáveis ao mesmo tempo. Então, Beth, conta aí, como isso é possível?
Bora lá, vamos fazer um teste. Olhe ao seu redor e conte quantos dispositivos você tem conectados. O roteador do wi-fi, um ou dois celulares na bolsa, a smart TV, a assistente virtual que fala consigo, e mais um computador de mesa, um notebook. Se olhar pela janela, além do horizonte de edifícios, uma antena enorme bem acima da sua cabeça!
Afinal, será que a minha saúde aguenta tanta exposição a campos eletromagnéticos? Ou seja, em outras palavras, colocadas de maneira simplista: celular faz mal à saúde? Celular dá câncer? Eu vou recolocar a pergunta, porque aqui no Papo de Futuro, a gente não busca respostas. A gente busca qualidade de vida.
Por isso, o que eu posso fazer para me proteger do excesso de exposição a dispositivos conectados eletronicamente?
Mitos e dilema
Em primeiro lugar, ao começo. Os celulares e outros dispositivos emitem ondas eletromagnética. Muitos acreditam que seja por isso que o aparelho esquenta, mas, na realidade, o aquecimento é devido a dissipação de energia que ocorre na bateria do aparelho quando em uso. Muitos também acreditam que seja por isso que a mão adormeça quando ficamos muito com o aparelho, mas a causa desse desconforto não envolve as ondas eletromagnéticas, e sim a compressão de nervos. Há uma interação física e real entre a onda eletromagnética e a pessoa, assim como entre o uso do aparelho e a pessoa, sendo comum associarem possíveis efeitos a possíveis causas de forma equivocada. Eu conversei com um dos maiores especialistas no Brasil sobre o tema, Agostinho Linhares. Ele fez a tese de Doutorado sobre isso e assina artigos cheios de fórmulas e métricas para medir a radiação[1][2]. Não há evidências de que os aparelhos provoquem doenças graves, e os estudos vem sendo realizados há mais de 30 anos.
Princípio da precaução
A ciência não é feita para descartar o problema, mas sim para encontrar provar o problema. Qual a diferença? É que os estudos nunca podem assegurar que a radiação não produz resultados nocivos, mas sim, podem atestar que não dá para ter uma resposta definitiva. Em outras palavras, não encontrar o problema não quer dizer que ele não existe. Até que haja mais pesquisas, a depender de haver ou não resultados que associem doenças à radiação não ionizante, o que vale é o princípio da precaução.
Ou seja, o que podemos fazer para conviver de maneira saudável com os aparelhos sem os quais, na verdade, não podemos abrir mão?
Vamos, então, ao momento “dicas do Papo de Futuro[3]”:
- Menor a exposição ao telefone, menor o risco;
- Use viva voz quando possível;
- Use fones de ouvido quando possível;
- Afaste os aparelhos telefônicos quando for dormir;
- Desligue ou coloque no modo avião;
- Carregue o celular em que a luzinha não perturbe o seu sono;
- Evite usar o celular quando o sinal estiver fraco, pois isso potencializa o transmissor que está embutido nele;
- Por isso, evite usar o celular quando entrar no elevador;
- Não fique longas horas falando no telefone com o mesmo encostado à cabeça;
- Use apenas aparelhos certificados, talvez essa seja a dica mais importante, pois isso aumenta a garantia de que os limites de radiação previstos nas normas estão sendo respeitados
- A dica acima vale para todos os aparelhos eletrônicos procure aqueles que têm o selo da Anatel.
Muita gente não sabe que os aparelhos móveis também têm antenas, que ficam, em geral, embutidas na parte superior do aparelho, ou seja, microantenas. Agostinho lembra que o 5G não vai, em razão das faixas de frequência mais alta que é utilizada, a dos 3,5GHz, oferecer maior risco à saúde. Esse argumento foi usado em vídeos de fake News em 2020 e deu trabalho aos especialistas para desmentir o fato. Sempre que chega uma nova tecnologia, é compreensível e esperado que há uma onda de boatos e uma certa resistência à novidade que se instala.
Na verdade, conforme o site Teleco, o Brasil tem, além de 250 milhões de aparelhos celulares ativos, 100 mil antenas de estações radio base de telefonia móvel em operação, que leva o nome de ERB no jargão técnico da comunicação. Essas ERB produzem um efeito guarda-chuva, fazendo com que a potência se propague, se espalhe, mais na horizontal, e menos na vertical, o que faz com que a exposição máxima de radiação é encontrada de 50 metros até 200 metros de distância da ERB, sendo menor ao redor da antena.
Antenas e a sensação de insegurança
Novamente, essas questões são técnicas e não são conclusivas. Há mais de 70 anos convivemos com antenas de rádio e torres de TV, e não se fala mais em risco à saúde. Mas a ciência é dinâmica e o mercado usa critérios de avaliação que vão mudando com o tempo. Por exemplo, em termos de conteúdo, sabe-se que o celular gera estímulo, positivo ou negativo, a depender do teor.
Segundo notícia do Canaltech[4], de acordo com o National Câncer Institute, nos Estados Unidos, “não há atualmente nenhuma evidência consistente de que a radiação não-ionizantes aumente o risco de câncer em humanos.
Mas isso implica dizer que todos os equipamentos, dos maiores aos menores, devem estar operando com absoluta regularidade, dentro das normas técnicas, obedecendo os limites de exposição recomendados pela OMS. Em recente artigo publicado em 2022[5] em revista especializada estrangeira, sob o nome “campos eletromagnéticos de radiofrequências, Agostinho, Azevedo e Fernandes reconhecem que medir os campos eletromagnéticos de todas a antenas nem sempre é viável, além de levar muito tempo. É preciso saber como é feita a fiscalização pelo órgão regulador, no caso, a Anatel, e quão séria é a indústria para respeitar as regras da Organização Mundial de Saúde e a União Internacional de Telecomunicações (UIT), dentro dos padrões adotados pela ICNIRP, a Comissão Internacional de Proteção contra Radiação não Ionizante.
No mesmo artigo, os autores explicam que amostragem feita em Brasília demonstrou que o limite de exposição não excedeu o permitido. Muito pelo contrário, segundo Agostinho, dentro da regularidade, a exposição a que estamos expostos atualmente é de 1 a 2% do limite previsto mundialmente. Ou seja, essa radiação não seria suficiente para provocar alterações celulares que pudessem levar ao desenvolvimento de doenças como o câncer, diabetes ou outras doenças crônicas.
Em 2009 foi aprovada a Lei 11.934[6], que estabeleceu os limites de exposição no Brasil, alinhado as recomendações da OMS, buscando uniformizar os limites de exposição em todo o País, uma vez que existiam várias leis municipais e estaduais que definiam diferentes regras e limites ao definido pela Anatel.
5G e a radiação não ionizante
Apesar de a maior parte dos estudos validarem as normas atuais, existem pesquisas que associam os celulares ao aumento da ansiedade[7], que é a principal porta de entrada para outros problemas de saúde.
Segundo pesquisa feita em Angola[8], “dos efeitos causados pelo uso do telefone, identificamos a dor de cabeça, boca seca, pouca saliva, insônia (distúrbios do sono), tontura, esquecimento, dor nos olhos e nos ouvidos”. Ademais, o estudo mostrou igualmente que a ansiedade e a nomofobia, são efeitos advindos do uso de telefone, com maior incidência em época de confinamento.
A OMS endossa os limites de exposição estabelecidos pela ICNIRP, que se estende até a frequência de 300 Ghz, e o 5G no Brasil está chegando em torno de 30 GHz[9], segundo Agostinho, o que ratifica que os limites estabelecidos também protegem em relação ao 5G e suas novas radiofrequências.
Enquanto os estudos avançam, a gente usa a máxima “o seguro morreu de velho”, ou seja, dá um tempo para o seu corpo se recompor de tudo que não lhe pertence, seja açúcar, bebida, ginástica ou celular.
Afinal, o tempo da Internet das Coisas (IoT)[10], aquele em que tudo vai estar conectado, da cortina ao aspirador de pó, da geladeira à temperatura do chuveiro, ainda não chegou. Até lá, dê preferência à Internet das Pessoas, e não à Internet das Coisas. Eu falo da internet “olho no olho”. Pois, como todo brasileiro bem sabe, nada substituiu um bom e apertado abraço.
Mande suas dúvidas, críticas e sugestões para papodefuturo@camara.leg.br
[1] Retirado de: https://ieeexplore.ieee.org/document/8121072
[2] https://www.scielo.br/j/jmoea/a/BmvfQkj3w5QqWmZx3NM85ky/?format=pdf&lang=en
[3] As medidas citadas são voluntárias e algumas exemplificadas em documentos da OMS, como o Fact Sheet 193 - WHO.
[4] Retirado de: https://canaltech.com.br/saude/celular-causa-cancer-198403/.
[5] https://ieeexplore.ieee.org/document/9532004
[7] Retirado de: https://www.researchgate.net/profile/Analcisio-Rodino-2/publication/350810702_Efeitos_da_radiacao_eletromagnetica_emitida_pelos_telefones_um_estudo_transversal_em_epoca_de_confinamento_em_Angola/links/6074179f4585150fe99f9a14/Efeitos-da-radiacao-eletromagnetica-emitida-pelos-telefones-um-estudo-transversal-em-epoca-de-confinamento-em-Angola.pdf.
[8] Idem.
[9] Retirado de: https://ieeexplore.ieee.org/document/9532004
[10] https://www.gov.br/mcti/pt-br/acompanhe-o-mcti/transformacaodigital/internet-das-coisas
Comentário – Beth Veloso
Apresentação – Marcio Achilles Sardi