Reportagem Especial
Vinte anos do Plano Real: o truque dos economistas para combater a inflação
01/07/2014 - 00h01
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Vinte anos do Plano Real: o truque dos economistas para combater a inflação (bloco 1)
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História: confira como foi a reação do Congresso Nacional diante do Plano Real (bloco 2)
Neste primeiro de julho a moeda brasileira, o Real, está fazendo 20 anos. Ela foi criada no governo Itamar Franco, em 1994, para resolver uma das maiores crises inflacionarias do mundo, quando os preços subiam 3.000% ao ano. O plano foi um sucesso, trouxe a inflação para níveis civilizados. Mas a estabilização não foi suficiente para deslanchar o crescimento econômico – que continua fraco até hoje. Este é o tema da Reportagem Especial desta semana. Confira, com João Arnolfo.
Os governos Sarney e Collor tentaram, sem sucesso, acabar com a inflação herdada dos militares. Ao assumir a presidência , após a queda de Collor, Itamar Franco convidou Fernando Henrique Cardoso para ministro da Fazenda, com a missão de reorganizar a economia.
Reuniram um grupo de economistas, coordenado por Pedro Malan, do Banco Central, o plano de ação econômica que eles escreveram foi publicado no final de 1993. Na época, a inflação batia recordes, prejudicando principalmente os mais pobres.
Ouça o que diz o ex-ministro Pedro Malan 20 anos depois.
“A inflação é um imposto. Ele incide, fundamentalmente, sobre aqueles menos capazes de se defender, que são aqueles que não têm acesso à indexação, à proteção de moedas indexadas, que carrega no bolso a sua moeda, que vai sendo comida pela inflação. Essa é uma base que eu não espero estar equivocado. A maioria da população brasileira exige e exigirá do governo que ele não tenha uma atitude complacente em relação à inflação porque a inflação é um tributo que incide sobre o seu salário.”
No inicio de 1994, a inflação estava em 40% ao mês, ou 3.000% cento ao ano. Os preços subiam sem parar – gasolina, alimentos, prestações... A cada hora o cruzeiro valia menos em relação ao dólar. Era o caos da hiperinflação. O truque dos economistas foi criar em fevereiro uma espécie de dólar virtual, a URV, Unidade Real de Valor.
A roda-viva dos preços continuava corroendo o Cruzeiro, mas não atingia a URV.
Em julho, a URV perdeu as letras U e V, permanecendo o R, de Real. A nova moeda nascia sem a doença da hiperinflação.
Finalmente, tínhamos uma moeda forte: um real valia o mesmo que um dólar.
Aos poucos, sem congelamento de preços, chegaríamos a uma inflação de país desenvolvido: apenas 1,5%, em 1998.
Mas os juros continuavam de terceiro mundo: o Banco Central jogou a taxa básica nas alturas, desestimulando o consumo e atraindo investidores para equilibrar as contas externas.
Inflação baixa e juro alto resultaram em pouco crescimento econômico, sustentado em boa parte pelas exportações. O Produto Interno Bruto, que mede a riqueza produzida no país, crescia quase 6% no lançamento do real.
Quatro anos depois, em 1998, a economia brasileira praticamente parou de crescer.
A estagnação coincidiu com as crises externas da Ásia e da Rússia, entre 97 e 98.
Antônio Palocci, ex-ministro da Fazenda no governo Lula, avalia o real.
“O plano real foi o mais talentoso dos planos de estabilização porque, ao invés de controlar todos os preços, ele decidiu controlar um único preço, o preço do câmbio. Então, ele teve um talento de composição muito grande. Mas ele também foi estendido além do prazo. A paridade cambial não deveria ter sido mantida por um prazo tão prolongado.”
Com a queda nas exportações e o fantasma da recessão, o governo desvalorizou fortemente o real no inicio de 1999.
O dólar que custava R$1 passou a custar mais de R$2, voltando depois para R$1,75.
O Banco Central adotou o câmbio flutuante e o sistema de metas para a inflação.
A professora da Universidade de Brasília, Maria de Lourdes Mollo, doutora em economia pela Universidade de Paris, diz que agora é preciso fazer a economia voltar a crescer.
"Temos hoje uma moeda estável. E mesmo hoje não temos nem de perto nada parecido com o que é a inflação daquela época. É preciso centrar em aumentar o investimento, de maneira a garantir um crescimento elevado. Para isso, a taxa de juros alta não é bom.”
Até hoje a retomada do crescimento econômico, de maneira sustentada, ainda está por acontecer.
Confira amanhã: passados 20 anos, qual é o balanço que governo e oposição fazem do plano real?
Da Rádio Câmara, de Brasília, João Arnolfo