Reportagem Especial
O casamento - História e símbolos (08'33'')
20/07/2010 - 00h00
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O casamento - História e símbolos (08'33'')
No Brasil, o início da colonização marca o início da história do casamento no Brasil, como explica Mary Del Priore, doutora em História Social pela Universidade de São Paulo.
"Bom, desde a chegada dos portugueses à nossa costa que a Igreja Católica vem junto. Então, há um esforço muito grande no sentido de que a nossa colonização seja feita, digamos, sob a égide, sob a bandeira do Catolicismo. E, portanto, essa preocupação com o matrimônio vai estar presente desde as cartas jesuíticas com os padres conclamando o rei de Portugal a enviar ao Brasil órfãs, ou meninas de ruas, enfim, prostitutas até para se casar com os portugueses."
Esses casamentos eram feitos à brasileira, ou seja, não eram feitos na Igreja, pois um casamento assim era muito caro, envolvia o trâmite de papéis que estavam lá em Portugal. Com isso, o Brasil passou a ter casos de bigamia e surgiu o famoso concubinato.
"A palavra que se usava, inclusive no século XVI, XVII e XVIII, era mancebia. As pessoas viviam amancebadas com índias, ou então com escravas africanas. E, para combater tudo isso, à medida que o estado português vai se organizando no Brasil, através da vinda de governadores gerais o que nós vamos vendo é que há toda uma legislação coibindo quem não é casado e valorizando quem é casado."
Eram poucos os padres no Brasil, mas era o suficiente para casar os amancebados. O curioso é que no Brasil Colônia algumas regrinhas básicas de etiqueta, digamos assim, não eram muito seguidas:
"As pessoas esperavam então a chegada do padre para se casar. Muitas dessas pessoas, já com famílias contituídas, vivendo juntos há muito tempo, com filhos já dessas uniões consensuais. E a festa era sempre uma festa com viola, uma grande comesaina, convidados que afluíam de toda parte, estavam instalados na casa dos recém-casados."
E, ainda hoje, muitos casamentos são uma grande, porém modesta festa comunitária. No Brasil Colônia, a vizinhança se envolvia nos preparativos, arrumava a casa para os noivos. E havia o hábito de plantar sementes no quintal para que os recém-casados começassem a nova vida com uma horta, além de galinhas, porcos,... Era como uma grande festa da colheita, mas significando o plantio da felicidade de um novo casal.
Da forma como a gente conhece hoje, o casamento teve sua origem na Roma Antiga. Na época, surgiram as primeiras cerimônias religiosas com a presença formal... de uma noiva.
Uma cerimônia de casamento naquela época trazia elementos similares aos que a gente encontra num casamento hoje em dia. A noiva também se vestia com trajes especiais para a ocasião, nos cabelos flores brancas, espinhos, no lugar dos atuais grampos, a fim de fixar o penteado.
Tudo tinha um significado, um motivo: as flores significavam a felicidade e os espinhos afastavam os maus espíritos. O véu? Este surgiu mais tarde, uma referência à deusa romana Vesta, protetora dos lares, símbolo da honestidade e da virgindade da noiva.
A simbologia que cerca o casamento é bastante interessante. O bouquet da noiva tem origem medieval. As mulheres levavam ervas aromáticas para afugentar maus espíritos. Com o tempo, surgiram os significados de cada flor. O uso do véu da noiva era costume na antiga Grécia, para proteger de mau-olhado. Havia troca de alianças, mas entre as famílias. A cor era diferente: o vermelho, símbolo do sangue novo da nova família. O branco surgiu depois. Aqui no Brasil, como explica Mary Del Priore, ele surgiu há menos de duzentos anos.
"Não se conhecia o uso do branco entre noivas. Então, o vestido branco e a flor de laranjeiras só vão entrar no Brasil por volta dos anos 1830, 1840, e também como modismo que essa aristocracia vai difundir entre as camadas mais favorecidas."
Na nossa tradição, o branco se firmou de vez, como explica a pesquisadora e professora de antropologia da Universidade de Brasília Lia Zanotta.
"Na nossa cultura de origem cristã, o branco representa a pureza, a virgindade. Em outras culturas, como a chinesa a cor é vermelha. Há variações conforme o local onde há essas festas de casamento"
O vestido de noiva como hoje o conhecemos surgiu com a Rainha Vitória, na Inglaterra do século XIX. Ela usou o primeiro vestido de noiva e também cometeu a ousadia de se casar com seu primo por amor, o príncipe Albert, uma novidade na época. E o pedido de casamento foi feito pela noiva.
A monogamia foi idéia dos romanos. E na Idade Média as mulheres perderam o direito de escolher seus maridos. A decisão passou a ser da família, que reservava as filhas desde cedo para determinado parceiro. E em época de carestia, isso tinha muita lógica. Os pais é que casavam os filhos, já que tinham que ceder uma parte do seu património para o sustento e a moradia da nova família, como explica Lia Zanotta.
"Onde tem um matrimônio há uma relação patrimonial. Tem correndo uma relação patrimonial, isto é, quem é, as famílias estão se relacionando e quais são os dotes ou serviços que serão feitos"
E o amor, onde entra o amor? O amor surgiu depois, bem depois. A idealização romântica passou a se concretizar em casos reais com o surgimento da indústria e o desenvolvimento do capitalismo. Pelo menos agora o jovem mancebo passou a escolher sua donzela. Ela, bom, ela era a escolhida, ou também, vá lá, escolhia quem tinha mais recursos, como ainda ocorre hoje.
A sociedade funcionou muito bem por muito tempo com os casamentos arranjados. Ainda hoje, em certas tradições e até mesmo no Brasil, há casos, como se sabe, de pessoas que se submetem a caprichos paternos e não são infelizes, como explica Lia Zanotta.
"Tem pessoas que sofrem absolutamente com os casamentos arranjados, mas tem outras pessoas também que constróem a idéia de que o amor se constrói. Então aquelas pessoas do mesmo status, da mesma família, das mesmas condições sociais, econômicas, educação,... Não é só onde tem uma prescrição de casamento que você não tem amor ou só onde nós acreditamos onde tem amor é onde tem a liberdade total de escolha"
O casamento acompanhou as mudanças de hábitos impostas pela evolução da História. E as relações pessoais também. Os problemas costumam aparecer quando um dos dois não encara a relação como o outro a enxerga. Mas isso é assunto para outro programa.
De Brasília, Luiz Cláudio Canuto