Congresso pode votar regulamentação de comissão que fiscaliza Abin
O assunto foi debatido nesta terça-feira no seminário "Atividade de Inteligência e Controle Parlamentar: Fortalecendo a Democracia".
01/12/2009 - 16:08

Uma proposta para regulamentar a Comissão Mista de Controle das Atividades de Inteligência pode ser votada na forma de resolução em sessão do Congresso da próxima semana. A comissão foi criada pela mesma lei (Lei 9.883/99) que instituiu a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e funciona como órgão de controle externo do colegiado.
O deputado Severiano Alves (PMDB-BA), que foi presidente da comissão até este ano, anunciou que há um acordo para a votação e que os parlamentares estão trabalhando para tornar essa fiscalização mais eficiente. O assunto foi debatido nesta terça-feira no seminário "Atividade de Inteligência e Controle Parlamentar: Fortalecendo a Democracia".
Atualmente, os líderes da Minoria e do maior partido aliado ao governo fazem parte da comissão, assim como os presidentes das comissões de Relações Exteriores da Câmara e do Senado. "Mas essas pessoas já são muito ocupadas, precisamos ampliar a participação e garantir o acesso aos parlamentares interessados no assunto", disse Alves.
Além disso, de acordo com o texto, a Abin deve enviar relatórios semestrais de atividades, e a comissão poderá convidar autoridades para prestar esclarecimentos sobre a atuação dos serviços de inteligência. As sugestões foram encaminhadas para o vice-presidente da Câmara, deputado Marco Maia (PT-RS), que é o relator da resolução.
Severiano também defendeu a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 398/09, que institucionaliza o sistema de inteligência brasileiro ao equipará-lo, na Constituição, ao sistema de Defesa.
Abin
Durante o seminário, os dois últimos comandantes do Gabinete de Segurança Institucional, generais Jorge Félix e Alberto Cardoso, estiveram juntos para falar da Abin. Félix participou da reestruturação recente do órgão, enquanto Cardoso participou de sua criação, em 1999. Ambos concordaram que o sistema tem respondido bem, e está se consolidando após uma década.
Além da Abin, que centraliza uma inteligência estatal, para o planejamento de ações de Governo existem no sistema órgãos de inteligência em segurança pública, para o combate ao crime; de inteligência financeira, para combater lavagem de dinheiro, entre outros crimes; e a inteligência das Forças Armadas, sobre ameaças à segurança nacional.
Modelos
Na avaliação do professor da Naval Postgraduate School, dos Estados Unidos, Thomas Bruneau, o sistema de fiscalização de seu país pode servir de base ao Brasil para comparação, uma vez que os dois países são federações presidencialistas e seus congressos têm funções semelhantes.
Ele é especialista em controle das agências de segurança, que nos EUA somam 16, com um orçamento anual na casa dos 50 bilhões de dólares (cerca de R$ 88 bilhões). Embora seja apenas uma parte do sistema, a Abin teve orçamento de R$ 226 milhões em 2008.
Segundo Bruneau, o parlamento americano tem um time de mais de 2 mil pesquisadores para fazerem relatórios sobre temas específicos, entre eles Inteligência. Mas a maior parte do controle é exercido por meio das legislações que são votadas pelos parlamentares, e pelo orçamento. "Como as agências querem ter mais recursos, têm uma boa relação com o Congresso, e sempre prestam informações", disse.
Críticas
Mesmo assim, as críticas existem. A comissão do congresso americano que investigou os acontecimentos de 11 de setembro concluiu que o congresso não cumpriu seu papel, tendo deixado de fiscalizar as agências estatais. "O 11/09 foi uma falha de Inteligência, que continua a ter importância crítica para evitar novos ataques", disse.
Bruneau ressaltou ainda que as invasões do Afeganistão e do Iraque expuseram a falta de informações confiáveis no sistema. Ao não encontrarem armas de destruição em massa no Iraque, nem qualquer ligação entre Saddam Hussein e a rede Al-Qaeda, os serviços de informação ficaram em xeque, mas também a falta de acompanhamento por parte do congresso, de maioria Republicana. "A fiscalização não funcionou nos primeiros 6 anos do governo Bush", destacou Bruneau.
Controle interno
A partir das eleições de 2006, quando os Democratas retomaram o controle do Congresso, houve uma preocupação especial com o controle da Inteligência. "Claro que há um componente político, mas isso é normal na democracia", disse.
Mas os EUA apostam ainda mais no controle interno. Há conselheiros e inspetores apenas para essa função, e nenhuma agência monopoliza as informações de que dispõe. Além disso, para Bruneau, o papel de jornalistas, ongs e pesquisadores é fundamental para descobrir onde há abusos.
Experiências
O professor da Universidade de Manchester Peter Gill explicou que também há comissões que fiscalizam as atividades de Inteligência no Reino Unido, onde queixas podem ser enviadas a um tribunal especial. Mas, segundo ele, atualmente há uma disputa entre tribunais e o governo sobre a divulgação de informações que não tem deixado claros os papéis de cada um.
Já o professor da Universidade Simon Fraser Stuart Farson disse que a construção do modelo canadense, tido como inspirador do funcionamento do sistema brasileiro, não foi fácil. Inicialmente, o Congresso deveria fazer uma revisão dos processos a cada 5 anos, mas logo os parlamentares viram que não seria possível examinar todas as operações. "Havia um problema para que os agentes pudessem falar com os parlamentares e ficou claro que o parlamento não teria acesso aos processos secretos", disse. Atualmente, porém, há pesquisadores independentes com acesso às informações secretas, e o parlamento faz um controle pelo meio de análises desses relatórios.
O seminário prossegue nesta tarde no auditório Nereu Ramos.
Reportagem - Marcello Larcher/SR