Data: 16/06/2005
  Tema: Projeto de lei que reserva vagas em instituições federais para estudantes de escolas públicas
  Participante: Deputado Carlos Abicalil (PT-MT)


Confira abaixo as perguntas que foram respondidas pelo deputado Carlos Abicalil (PT-MT) a respeito da reserva de vagas em universidades públicas federais para alunos saídos de escolas públicas. Para facilitar o entendimento, o bate-papo foi dividido em três blocos: reserva de vagas, ensino básico e tramitação.

Reserva de vagas

(10:09) JoseAntonio: O senhor não acha que o sistema de cotas cria uma discriminação em relação às pessoas que não são atendidas por essas cotas?

(10:13) Dep Carlos Abicalil: José Antonio, existe uma situação de discriminação histórica em relação às pessoas de baixa renda, que em sua maioria estudam em escolas públicas. Pesquisas educacionais apontam que o acesso à universidade pública sempre esteve ao alcance da população de poder aquisitivo elevado. As políticas afirmativas, como a reserva de vagas, trabalham no sentido de diminuir as desigualdades e, portanto, a discriminação.

(10:12) adelaide: Pára com essa história de negros e cotas raciais!!! Aqui no Brasil somos 10% brancos, 4% negros, 1 % orientais e 85% de mestiços. Somos um país (graças a Deus!) miscigenado e essa conversa de raça não faz o menor sentido!!! Não existem fronteiras, somos uma função contínua. Quanto às cotas para alunos de colégio público, acho um absurdo também, pois ir para o colégio particular é uma necessidade, uma vez que o ensino público (na minha cidade, Rio de janeiro) está péssimo e perigoso.

(10:20) dep Carlos Abicalil: Adelaide, visto o fato de essa mesma população mestiça ser oriunda, na maior parte das vezes, de negros, as pessoas ainda as tratam de uma forma diferenciada com relação àquelas que não mostram seus traços originais negros, principalmente. Com isso, e também por essa cultura ser secular, políticas públicas devem ser criadas no intuito de diminuir, de minorar este abismo racial que se encontra arraigado em nosso país. E é nesse sentido que o PL 73/99 mostra sua importância. Como a maior parte da população de baixa renda também é mestiça e estuda em sua maioria em colégios públicos, o PL 73/99 vem no sentido de diminuir essa diferenciação.

(10:12) Rachel: A estipulação de mais de 50% das vagas para alunos egressos de escolas públicas não cria um ônus desproporcional e irrazoável para os alunos não inseridos nessa categoria? Especialmente alunos de classes sociais mais baixas, mas que estudam em escolas privadas em virtude de bolsa ou porque os pais trabalham na escola? Ou seja, o número de vagas colocadas "a livre concorrência" seria excessivamente reduzidos, e não desencadearia a desigualdade de oportunidades para eles?

(10:23) Dep Carlos Abicalil: Rachel, é importante ressaltar a racionalidade da proposta. Ela estabelece critérios universais a respeito da distribuição de renda e critérios específicos relativos às etnias. A proposta é uma forma de inserir os jovens que não teriam acesso à universidade pública, de acordo com estudos educacionais.

(10:14) Luiz: Deputado, parabéns pelo projeto! Embora assuste um pouco a classe média, pois parece que cada vez ela está mais distante da universidade pública. Além do grande esforço em se pagar um estudo particular aos filhos, visando uma vaga na universidade pública, com essa "redução" de espaço, embora por um motivo justo e nobre, parece que começa a sinalizar a "exclusão da classe média".

(10:23) dep Carlos Abicalil: Luiz, você conseguiu entender exatamente a função do referido projeto. O PL 73/99 tem como objetivo maior diminuir essa lacuna existente entre os que passam por dificuldades financeiras e os mais abastados.

(10:23) Rachel: Neste sentido, gostaria de saber se há o comprometimento do Estado no sentido de reconhecer as cotas como temporárias? No Projeto de Lei 3627/04, há a previsão da necessidade de revisão das cotas, mas é em caráter regressivo? Ou progressivo?

(10:34) Dep Carlos Abicalil: Rachel, as instituições terão um prazo de dez anos para se adaptar ao sistema. As políticas afirmativas requerem tempo para que o processo alcance os objetivos. O ProUni, por exemplo, que reserva vagas em universidades privadas, ofereceu educação superior para mais de cem mil alunos em 2005. O atendimento pode aumentar ou diminuir na medida em que mais instituições aderirem ao programa e um maior índice dos jovens seja atendido.

(10:23) Gustavo: Deputado, a reserva de vagas é para estudantes de escolas públicas. Mas a prioridade é de estudantes negros e indígenas. Afinal, o que é mais urgente: sanar as desigualdades sociais ou as raciais? Será que não existem mais pobres no Brasil do que negros ou índios?

(10:27) aquino: Gustavo, social passa pelo racial e vice-versa, não há como melhorar as questões sociais sem se defrontar com as questões raciais.

(10:37) dep Carlos Abicalil: Gustavo e Aquino, como a questão racial está intrinsecamente ligada com a social, o PL 73/99 visa a diminuir essa lacuna existente entre os que têm e os que não têm acesso ao ensino de qualidade, visto que este hoje ainda se encontra principalmente nas escolas particulares.

(10:23) René: Qual é o instrumento legal brasileiro que define o que é branco, pardo, negro, ameríndio?

(10:53) dep Carlos Abicalil: René, sobre o instrumento legal que define a característica étnica é a autodeclaração desde o registro de nascimento, passando por todos os registros civis.

(10:24) Audir: Deputado, o senhor não acha que está na hora de o País parar de tentar tapar o sol com a peneira? É obvio que esse sistema de cotas não resolve e nem ameniza o problema. Pelo contrário, tenta-se nivelar por baixo a coisa, indo na direção de diminuição do nível da única educação que "funciona" no País: o ensino superior.

(10:42) Dep Carlos Abicalil: Audir, o fato de a pessoa ser de baixa renda ou estar dentro dos critérios de etnia não significa que ela não tenha capacidade intelectual de cursar o ensino superior. O que exclui esses jovens de baixa renda do processo é, além de tudo, a falta de oportunidades proporcionada por uma situação de desigualdade histórica, que poderá ser modificada a partir de políticas como essa.

(10:25) Rachel: Gostaria que me respondesse se o percentual MÍNIMO de 50% não é irrazoável?

(10:30) Rachel: Acredito que o projeto deveria reconhecer a desigualdade de condições ofertadas pelo ensino público e pelo setor privado, acredito que o acesso à educação superior deve ser viabilizado às minorias através de ações afirmativas sim, a exemplo das cotas, mas ela não deve ser fundada na desigualdade social em caráter amplo ou na desigualdade étnicas, mas em uma desigualdade de preparo ofertado pelos níveis educacionais que antecedem o processo vestibular, sob pena de se querer resolver tudo com cotas, em vez de um compromisso sério com outras formas de redução das desigualdades sociais...

(10:58) dep Carlos Abicalil: Rachel, a reserva de vagas para escola pública de 50% não é nada razoável, pois, se fosse aplicada a razão direta, seria no patamar de 76% alunos que cursam ensino médio em escola pública e apenas 24% em estabelecimentos privados. É bom que se diga que as ações afirmativas no atual governo se associam a outras políticas de inclusão em emprego e renda, com vistas à garantia das condições das famílias. Por outro lado, há um conjunto de ações educacionais que visam à melhoria do material didático, da formação continuada dos profissionais e de equipamento das escolas que atuam na melhoria da qualidade. A reserva de vagas não elimina os processos seletivos. A experiência feita com o ProUni demonstrou que os alunos beneficiados pelo programa de bolsas tiveram média nos exames superiores ao conjunto do processo seletivo regular.

(10:25) aquino: A polêmica sobre o sistema de cotas está enraizada no coronelismo, corporativismo das classes abastadas que pressentem uma ameaça/invasão em seus domínios. Para essas classes, o público torna-se privado (ex. condomínios fechados que interditam ruas públicas). Qual a opinião de V.Ex.ª sobre o tema?

(10:49) Dep Carlos Abicalil: Aquino, você pode ter razão. A universidade ainda é um privilégio de poucos e a sociedade precisa perceber que a educação em todos os níveis é objeto de direito, independente da classe social e da forma de acesso. O acesso à universidade ainda é uma "competição" porque o Brasil ainda possui poucas instituições. O objetivo do governo federal e do Poder Legislativo, nesse sentido, é aumentar o acesso e universalizar o ensino superior. Realmente ainda existe uma disputa de interesse referente às desigualdades sociais.

(10:28) Liana: Deputado o senhor está levando em consideração o conceito de igualdade de consideração para relatar o projeto?

(10:50) Dep Carlos Abicalil: Liana, o que você quer dizer com igualdade de consideração?

(10:55) Liana: Deputado, o conceito de igualdade de consideração é um conceito muito debatido por pessoas como o Dr. Paul Singer e muitos teóricos mundiais. A igualdade de consideração é um critério diferente da igualdade de oportunidade, esta última baseia-se no conceito liberal de que todos têm as mesmas condições. A igualdade de consideração leva em conta a situação de cada indivíduo, é um conceito interessante para a abordagem do tema quotas, pois aborda a questão ética das medidas afirmativas. Penso que a forma de avaliação atual excluir por tratar o pobre e o rico da mesma forma, aí remonto a máxima de que não há nada mais desigual do que tratar os desiguais com igualdade.

(11:00) Dep Carlos Abicalil: Liana, a proposta das políticas afirmativas, de fato, trabalham com o conceito de igualdade de consideração, visto que o projeto visa à superação das desigualdades a partir de um tratamento diferenciado.

(10:30) aquino: Discordo de que as cotas nivelam por baixo, pois pelo que eu saiba não elimina o vestibular. Por outro lado, estudos demonstram que os cotistas têm melhor desempenho universitário que os não-cotistas. A questão da qualidade do ensino não passa pelo sistema de cotas, mas sim pelo melhoria do ensino em si mesmo (qualificação e valorização do corpo docente, infra-estrutura, pesquisas, sistemas de avaliação dos discentes, motivação, etc.)

(10:56) Dep Carlos Abicalil: Aquino, concordo com sua colocação a respeito do desempenho dos alunos que são beneficiados pelo sistema de reserva de vagas. A questão da qualidade realmente passa por tudo o que você mencionou. Mas o acesso é imprescindível e o sistema de reserva permite isso.

(10:32) Gonzaga: Estamos criando, com esse tipo de projeto, o verdadeiro racismo.

(11:02) dep Carlos Abicalil: Gonzaga, o verdadeiro racismo é o que impossibilita que cada brasileiro ou brasileira tenha a garantia do Estado de seu pleno direito, sempre que vinculada à verificação de suas capacidades. Se verifica no quadro educacional do País, no ensino superior, especialmente, é o que denuncia a intensidade do racismo velado há tantos séculos. Basta ler com atenção todas estatísticas sociais brasileiras em qualquer período da nossa história.

(10:32) Liana: Deputado o que o senhor acha de que o critério para as cotas seja o econômico?

(11:04) Dep Carlos Abicalil: Liana, o critério econômico está embutido na proposta de reserva de vagas. O direito social não pode ser pautado por uma leitura apenas sobre o critério de renda familiar.

(10:34) Gonzaga: Por que não um projeto que acabasse com todo e qualquer tipo de COTAS?

(11:04) dep Carlos Abicalil: Gonzaga, creio que essa proposição em 20 anos vai ser absolutamente plausível. Nós teremos um país muito diferente, provavelmente mais próximo da repartição da justiça cultural educacional, econômica, etc.

(10:34) Rachel: Neste sentido, gostaria de saber se há o comprometimento do Estado no sentido de reconhecer as cotas como temporárias? No Projeto de Lei 3627/04, há a previsão da necessidade de revisão das cotas, mas é em caráter regressivo? Ou progressivo?

(10:35) Liana: Rachel, as cotas são temporárias, até que a sociedade consiga amenizar a desigualdade existente, salvo engano o prazo de 10 anos, é isso deputado?

(10:41) Rachel: Obrigada, Liana. O meu receio é justamente que as cotas, em vez de serem adotadas com esse caráter de temporariedade, sejam implantadas a médio ou longo prazo, o que desvirtua a sua necessidade, haja vista que espera-se uma melhora do ensino público a médio prazo, e que tornaria desnecessária as cotas,;)?

(11:07) dep Carlos Abicalil: Rachel e Liana, é exatamente o prazo de 10 anos, inclusive para cumprir metas do Plano Nacional de Educação, aprovado em 2001, que deve ser acompanhado, da ampliação do investimento nas três esferas de governo e conseqüentemente da oferta de vagas nas universidades públicas de todo o País. Quero reiterar que também incluí o mesmo critério para o acesso aos cursos técnicos de nível médio das escolas federais.

(10:34) Daniela L.: Não acredito que uma medida que vá favorecer a redução das desigualdades raciais e sociais possa prejudicar o País. Mas tenho certeza de que irá dar um gostinho de exclusão aos que nunca foram excluídos, porque as vagas para os mais afortunados vai mesmo diminuir. Talvez isso sensibilize os eternos privilegiados para a crueldade das injustiças. Para haver mudanças, algo tem que sair do lugar. Nem que sejam os eternos herdeiros das oportunidades.

(11:06) Dep Carlos Abicalil: Daniela L., você tem razão quando diz que as reservas não vão prejudicar o País. Muito pelo contrário, a luta da parcela excluída da sociedade brasileira é pela igualdade.

(10:34) Leonardo Fontoura: As cotas na universidade são uma ótima alternativa para quem realmente quer estudar. Eu, por exemplo, estudei em escola particular e fiz Educação de Jovens e Adultos (EJA) e pude entrar no ProUni para fazer Medicina.

(11:17) dep Carlos Abicalil: Leonardo, fantástico, parabéns por ter aproveitado esse programa. Já fui professor de EJA e sei o que significa essa vitória. Cabeça erguida sempre, porque os vitoriosos merecem. Aproveite agora, se houver necessidade, os benefícios da bolsa de permanência, criada anteontem pelo presidente Lula, especialmente nos cursos de Medicina, que são muito caros.

(10:36) Leonardo Fontoura: As cotas não irão resolver o problema para os pobres, porque os ricos podem estudar no ensino público e no privado, sendo que irão apresentar as documentações do ensino público. Como evitar as fraudes no sistema de cotas?

(11:21) Dep Carlos Abicalil: Leonardo Fontoura, todos os projetos de políticas afirmativas prevêem a fiscalização por meio de comissões verificadoras dos processos.

(10:36) Rachel: Nesse projeto de lei, as cotas são entendidas como objetivos a serem alcançados ao longo do tempo ou como medidas "emergenciais" que devem ser suprimidas ao longo do tempo? É um fim ou um meio?

(11:23) dep Carlos Abicalil: Rachel, é um meio, um atalho, um acelerador de inclusão com temporalidade definida na lei. Lembro que esta lei só vale para as instituições federais. Em diversos estados, já há reserva de vagas definidas em leis estaduais para suas universidades públicas: RJ, MS, BA, PR.

(10:37) Eliane: Sr. deputado, concordo com as cotas desde que as mesmas sejam para alunos do ensino público independentemente de sua cor, pois acredito que tanto os alunos brancos quanto os negros da escola pública são discriminados e excluídos.

(11:23) Dep Carlos Abicalil: Eliane, o projeto prevê atendimento para alunos saídos de escolas públicas, respeitando a proporcionalidade étnica, porque as desigualdades incidem de forma mais nítida sobre os negros e indígenas, por exemplo.

(10:37) Luiz: Deputado, existe um paradigma de que a universidade pública tem a qualidade comentada em função do grau de qualidade dos alunos que entram na IE. Considerando-se o acesso de alunos não tão bem qualificados (em tese), quais seriam as medidas a serem adotadas para a "manutenção" da qualidade do ensino da IES pública?

(11:24) dep Carlos Abicalil: Luiz, não entrará nenhum aluno desqualificado. O processo de seleção para ingresso está mantido.

(10:38) René: Mas Deputado, o ProUni excluiu alunos bolsistas das filantrópicas e comprou vagas nas particulares, o que não é permitido pelo Art. 213 da Constituição.

(11:27) Dep Carlos Abicalil: René, o ProUni não comprou vagas nas universidades particulares. O ProUni reformulou a contrapartida dos incentivos fiscais que já existiam desde 1958 e não eram utilizados para fins de inclusão social. Foram aproveitadas vagas ociosas nas instituições particulares em todas as categorias, até mesmo as filantrópicas.

(10:38) Doniak: Acredito que o estabelecimento de cotas demonstra que o Estado não consegue êxito nas ações públicas. Garantir cotas em IFES não seria assumir a incompetência do sistema de ensino público?

(11:25) dep Carlos Abicalil: Doniak, não é assumir incompetência. Ao contrário, é fazer com que o Estado cumpra de maneira competente a sua tarefa constitucional de promover a superação da desigualdade.

(10:39) Liana: Deputado, o senhor tem alguma sugestão a título de substitutivo para abordar também a questão econômica, no item quotas?

(11:29) Dep Carlos Abicalil: Liana, como eu já havia respondido, a questão econômica está incluída no processo de reserva de vagas.

(10:40) adelaide: Em algum país do mundo, o sistema de cotas deu certo? Vários estudos dizem que isso é "um erro já testado".

(11:10) dep Carlos Abicalil: Adelaide, as experiências são absolutamente validadas. Nos Estados Unidos, no Canadá e agora mais recentemente nos países nórdicos, que recebem grande massa de imigrantes africanos e/ou de antigas colônias. Todos demonstram efeitos positivos.

(10:41) Gustavo: Deputado, essas categorias da população - pobres, negros e indígenas - não correspondem a mais da metade da população brasileira? Seria justo esse sistema?

(11:19) Dep Carlos Abicalil: Gustavo, o sistema de reservas respeita a proporcionalidade da população brasileira, e essas categorias correspondem a mais da metade dos brasileiros. O sistema é justo porque reserva 50% a fim de acelerar o ingresso, além de ser temporário e não esgotar a totalidade das vagas.

(10:41) adelaide: Como o senhor define uma pessoa de raça negra no Brasil? Aqui, esse conceito é muito subjetivo!!

(11:30) dep Carlos Abicalil: Adelaide, toda a legislação brasileira se fundamenta inicialmente pela autodeclaração já no nascimento e pela classificação fenotípica.

(10:42) adelaide: Que modelo o Brasil está seguindo para implantar essas cotas?

(10:42) Liana: Adelaide, as quotas funcionam como um recorte na sociedade onde se buscasse uma igualdade levando em conta a situação de cada um. Não sei se é a melhor opção, mas certamente da forma como é feita atualmente apenas se mantém o status quo de uma elite que não tem tido muito comprometido com a sociedade, tanto é que verificamos o afastamento da universidade publica das questões sociais e suas implicações.

(11:32) Dep Carlos Abicalil: Adelaide e Liana, todas as propostas de políticas afirmativas do Governo Lula contemplam contrapartidas por parte dos alunos atendidos no sentido de que eles prestem serviços à sociedade na área da educação. Dessa forma, a universidade pública estará contribuindo para mudanças profundas no contexto social e estará devolvendo à sociedade os benefícios recebidos. Este é o caminho para a universalização da educação.

(10:42) Gonzaga: Caro sr. deputado, o senhor foi discriminado quando estudava? Vossa Excelência teve dificuldades para completar os seus estudos? Se sentiu discriminado?

(11:33) dep Carlos Abicalil: Gonzaga, não, felizmente, não. Sou de família numerosa, o décimo de 14 filhos. Todos nós tivemos escolaridade superior à do meu pai (contador autodidata) e da minha mãe (4ª série fundamental). Isso não exclui, entretanto, a sensibilidade para o horizonte discriminatório em nossa volta. Venho de uma cidade industrial serrana no interior do RJ e a apartação dos afrodescendentes, filhos e netos de escravos do tempo das fazendas de café é visível até hoje.

(10:42) SeverinA: Ao admitir na universidade alunos que não têm formação adequada para fazer um curso superior, uma vez que não conseguiriam passar no vestibular por seus próprios méritos, não estaríamos baixando o nível intelectual dos cursos?

(11:35) Dep Carlos Abicalil: Severina, os alunos atendidos pelo sistema de reservas não estão excluídos do processo de seleção. O acesso à universidade pública ainda é feito pelo vestibular. As pessoas a serem atendidas pelo programa terão de competir para ingressar nas instituições e, para isso, deverão estar preparadas.

(10:43) Doniak: Corremos o risco de o mercado selecionar depois. O empresário irá perguntar: você é aluno cotista? Por qual cota você entrou? Não tenho dúvida de que as cotas poderão melhorar a vida de muitos cidadãos, mas estimularão a longo prazo a queda na qualidade de ensino.

(10:56) Helena: Concordo com a afirmação da sra. Donika. O mercado, posteriormente, irá excluir. Exemplo disso é o que acontece em Belo Horizonte, onde empresas se recusam a contratar alunos oriundos da Escola Plural. Neste caso exclusão vem em letras garrafais, publicamente, em uma placa: "Temos vagas, exceto para alunos da Escola Plural".

(11:37) dep Carlos Abicalil: Doniak e Helena, esse tipo de consideração discriminatória não sobreviverá. O acesso ao ensino superior também significa empoderamento das categorias sociais, capacidade de organização, de liderança, de representação, de denúncia, de transformação. Os exemplos que vocês apontam merecem o repúdio desde agora. São carregados de preconceitos. Por outro lado, o fator humanizador das relações econômicas e empregatícias são cada vez mais vigentes nos critérios de responsabilidade social das empresas nos mercados mais disputados e promissores. A propaganda nos grandes meios de comunicação já reflete claramente essa tendência.

(10:44) Eliane: Sr. deputado, sou bolsista e acredito ser este o melhor caminho para encurtar a exclusão e para promover uma igualdade. As escolas públicas contêm muitos problemas em relação a educação, sim, mas só o fato de permitir a entrada de alunos menos favorecidos em instituições de ensino superior, já é um grande avanço na questão de políticas públicas/sociais. Em relação ao "nível dos alunos bolsistas discordo dos meus colegas, pois sou uma das melhores alunas do meu curso e venho do ensino público. Acho que o que faz a diferença dentro da universidade é O DESEMPENHO E A RESPONSABILIDADE DO ALUNO!!!!

(10:45) Daniela L.: Os excluídos precisam ser incluídos por todas as medidas possíveis e constitucionais para garantir igual acesso às oportunidades. Isso é uma política efetiva por parte do governo. É uma coisa que já gerou resultados, por exemplo, nas cotas para mulheres no parlamento brasileiro e no argentino. Quanto à diminuição no nível educacional, os números de instituições como a UFBA e a UFRJ já demonstraram que a diferença entre cotistas e não-cotistas é irrelevante quanto à nota de corte e pontuação. As cotas, ao contrário do que muitos pensam, não vão favorecer apenas negros e negras, mas todo o País, que vai ter menos talentos desperdiçados e saberes, experiências diferenciadas compartilhados.

(11:37) Dep Carlos Abicalil: Daniela L., parabéns pela sua conclusão. Além dos exemplos de reservas que você citou, o ProUni já demonstrou resultados positivos. O caminho para a redução de desigualdades é esse.

(10:46) Doniak: Na condição de professor, teremos dificuldades em reprovar alunos sem bom desempenho. Teremos receio de repressões. Mas, naturalmente, um aluno sem bom desempenho no ensino médio terá dificuldades em relação aos alunos que entrarão pelo vestibular normal. A própria seleção dos bons alunos ampliará a qualidades dos não-cotistas. O que Vossa Excelência pensa sobre este aspecto?

(10:47) Liana: O que tem determinado a qualidade do aluno? A condição de pagar um cursinho? O poder econômico? Não acho que seja o critério mais favorável.

(11:41) Dep Carlos Abicalil: Doniak e Liana, os jovens que não podem fazer um curso preparatório para o vestibular, porque não têm condições econômicas ou porque estão no mercado de trabalho, ao serem beneficiados pelo sistema de reserva, ingressarão na universidade e certamente terão desempenho superior e/ou igual aos que não ingressaram pelo sistema de reservas.

(10:46) marceloa: Na minha opinião, se tivermos que implementar cotas não deveria ser pela cor da pele, e sim pela condição financeira.

(11:40) dep Carlos Abicalil: Marceloa, se você estudar com profundidade as estatísticas sociais do país, "IPEA, IBGE, INEP, FGV", você vai ter claro que as condições de renda são elementos que não se descolam das referências étnicas no caso da população brasileira. Entretanto, os mais pobres e excluídos entre os pobres são afrodescendentes e indígenas em todas as regiões brasileiras, dado que se repete décadas a fio na realidade nacional.

(10:49) marceloa: Hoje as universidades públicas têm a maioria de seus alunos oriundos de classes sociais mais elevadas e sobra para o estudante carente de recursos financeiros as instituições pagas.

(11:45) Dep Carlos Abicalil: Marceloa, a sua colocação de que a universidade ainda é um privilégio é o motivo que nos leva a apresentar propostas de mudanças dessa situação. Por ano, mais de 1,5 milhão de pessoas concluem o ensino médio. Menos da metade disso consegue ingressar numa instituição de ensino superior, seja pública ou privada. A proposta é expandir as ofertas e garantir o acesso.

(10:49) adelaide: Essa medida de cotas institucionaliza a exclusão: por que meus filhos serão cortados das universidades federais? Isso é justiça? O que vou dizer a eles? O erro foi meu que paguei (com muito sacrifício) colégios particulares?

(11:45) dep Carlos Abicalil: Adelaide, seus filhos não serão cortados de nenhum lugar. Se tiverem desempenho equivalente ou superior aos outros 50%, seguramente estarão disputando entre os mais capazes pelos critérios que serão válidos para todos.

(10:53) marceloa: Será que são só os negros que são excluídos, ou são os menos favorecidos que têm baixa renda e não tem condições de freqüentar boas escolas independente de sua cor?

(11:47) Dep Carlos Abicalil: Marceloa, os negros estão inseridos nessa parcela de excluídos economicamente.

(10:54) Audir: Sim, deputado, mas o fato de se tirar uma vaga de uma pessoa melhor classificada numa escola de excelência para dar a uma pessoa pior classificada unicamente pelo fato de ela ser de uma classe social inferior ou da raça negra ou indígena. Com certeza acontecerá de colocar pessoas que ainda não estão preparadas o suficiente para o curso, elas terão vaga em detrimento de pessoas já capacitadas. É como se desejasse que tudo ficasse ruim na média. Não acredito de forma alguma que essa seja a solução. A solução está na formação de base. Para que todos tenham iguais condições de competir. E ainda há outro problema. No Brasil, é negro quem se diz negro no censo. Certamente várias pessoas vão passar a se considerar negras para ter o ingresso no ensino superior facilitado. Acredito que somente quando o País se voltar para resolver nosso grave problema da educação de base conseguiremos resolver esse problemas da desigualdade no ensino superior.

(11:39) SeverinA: Está claro isso, deputado. Mas, se há cotas, significa que o resultado dessas pessoas no vestibular pode estar aquém dos alunos das escolas privadas e mesmo assim eles entram, com médias menores, até preencher a cota, não é este o objetivo das mesmas?

(11:55) dep Carlos Abicalil: Audir e Severina, a consideração de vocês é que todos que não alcançaram a classificação no exame estão despreparados. Esse dado, reitero, não coincide com o quadro de excelentes estudantes que por décimos ou milésimos de pontuação, com preparo consistente e continuado, ficam excluídos de oportunidades que muitas vezes foram garantidas aos treinados para as provas. Não necessariamente aos que conhecem melhor os temas. Há valores da vida que não são medidos pelos testes instantâneos de conhecimento. Sensibilidade, liderança, experiência de dificuldades de sobrevivência, de moradia, de mobilidade, que contribuem para o fortalecimento de espíritos desafiados a superá-las com criatividade, inventividade, práticas solidárias e organizativas são valores indispensáveis para sociedades mais solidárias e que poderão ascender com experiências de inclusão que os levem como valores também válidos para a ciência, a pesquisa, a convivência nesses ambientes ainda fechados, embora garantidos por esforços e recursos de todos.

(10:55) jorge: Qual é a real intenção deste projeto?

(11:51) Dep Carlos Abicalil: Jorge, a real intenção do projeto é garantir o direito que todos têm à educação. A proposta prevê igualdade de acesso independentemente de classe social e oferta de ensino em todos os horários para todos os cursos. O sistema de reservas é uma forma de acelerar o ingresso de pessoas que não teriam acesso à educação superior por meios considerados normais. O projeto prevê reserva de 50% das vagas em universidades públicas para alunos oriundos de escolas públicas, respeitando a proporcionalidade étnica. Por exemplo, se no seu estado existir 7% de população negra e 3% de população indígena, as vagas reservadas respeitarão essa proporcionalidade. Reiterando esses critérios não excluirão o processo seletivo (vestibular).

(10:56) Gonzaga: Teremos de, se aprovado esse tipo de projeto, Excelência, criar num futuro breve, cotas para todas as classes sociais: A, B, C, D, E. Para todas as religiões: católica e todas inumeráveis denominações existentes. Por que não pensar nisso agora e não deixar que se crie qualquer tipo de separação de pessoas. Por que não se buscar a unidade? Por que criar esse tipo de divisão?

(11:58) Dep Carlos Abicalil: Gonzaga, inseridos no critério de reserva poderão estar todas as pessoas contempladas nas "categorias" que você citou (católico, classes sociais). A intenção, baseada em pesquisas educacionais, é atender a essas mesmas pessoas, que incluídas no contexto de desigualdade, caso não sejam criadas políticas como essa, demorariam muito para alcançarem o acesso à universidade pública.

(11:09) Rachel: Qual a desigualdade existente entre um negro que cursou as melhores escolas privadas e um branco que identicamente cursou, para fins de acesso ao ensino superior?

(12:11) Dep Carlos Abicalil: Rachel, o projeto não se refere a negros que tenham acesso a escolas privadas, mas sim àquela parcela da população considerada excluída. Nesse contexto, a etnia ainda é um fator determinante de desigualdade e de preconceito por parte da sociedade.

(11:10) EduPeniche: Poxa, engraçado este debate, pois sempre quem tem acesso a estas discussões não são os necessitados e sim a classe privilegiada, aquela que já tem seus privilégios no dia-a-dia, portanto discriminar e marginalizar não pode. Tem o governo o papel fundamental de corrigir essas distorções para que tenhamos, num futuro próximo, a igualdade social.

(11:15) Gonzaga: Caro EduPeniche. É uma inverdade o que diz. Aqui e agora temos a condição de participar dessa discussão. Quando criança, a maioria dos que estão aqui - falo sem medo de errar - não tínhamos a condição atual. Éramos ou pobres ou, os mais abastados, de classe média. Dizemos o que vivemos concretamente. Posso até generalizar e dizer que todos.

(11:16) Rachel: Não é o objetivo de redução de desigualdades que se questiona, mas o necessário reconhecimento de que é a melhoria do ensino público fundamental e médio que repercutiria na desnecessidade das cotas, a médio prazo... é o que se deseja. E não que as cotas apenas prolonguem a necessidade deste compromisso sério.

(11:25) EduPeniche: Olha, Rachel, pensando na possibilidade de melhorar o ensino médio a curto prazo, é muito difícil entretanto criar cotas e é mais fácil para reduzir a emergência que se instala, porém concordo plenamente que se deve melhorar sempre a escola pública e gratuita, mas neste momento considero as cotas um paliativo necessário para reduzir as desigualdades sociais.

(12:19) dep Carlos Abicalil: EduPeniche, Gonzaga e Rachel, o chat não substitui o debate nas suas escolas, igrejas, congregações, enfim, comunidades de que participam. Cabe a cada um de vocês o papel de levar até esses locais de convívio a discussão ora tratada aqui.

(11:12) Elton (sinop): O sistema de cotas vai também proporcionar algum subsídio diferenciado aos estudantes que forem egressos por esse mecanismo?

(11:17) Gustavo: Deputado, sabemos que não basta garantir o acesso do aluno pobre ao ensino superior. É preciso mantê-lo na universidade, principalmente quando o curso é caro. O projeto do governo prevê alguma medida para que o estudante se forme no tempo correto ou que não abandone a universidade?

(12:16) dep Carlos Abicalil: Elton e Gustavo, o governo já instituiu a bolsa de permanência, ampliou o PET (Programa de Educação Tutorial) e prevê que 5% das verbas de custeio das universidades federais para os programas de assistência estudantil (alimentação, moradia, transporte, aquisição de equipamentos e bibliografia de uso individual). É a primeira vez que há recursos assegurados regularmente. Para além disso, se propõe uma extração da loteria federal específica aos programas de bolsas.

(11:20) René: O que fazer, deputado, no caso do candidato que tenha cursado o último bimestre de um ano em escola particular. Estaria excluído da concorrência por cota?

(12:22) Dep Carlos Abicalil: René, para concorrer no sistema de reserva, o aluno deverá ter feito todo o ensino médio em escola pública.

(11:23) Roberto: Bom dia, deputado. Uma outra idéia, ainda não ventilada: os beneficiários das cotas seriam aqueles cuja renda familiar anual seja menor que X e cujo patrimônio familiar seja menor que Y. Para comprovar o fato, o postulante deveria apresentar a declaração anual de imposto de renda. Além disso, esse sistema poderia funcionar ad eternum, sem precisar ser delimitado no tempo, como no caso das cotas para alunos de escolas públicas e cotas raciais. Esse sistema tem a vantagem de não criar novas injustiças, como estas últimas. Enfim, da forma como está posto, este PL pioraria a situação dos não-afrodescentes humildes e dos alunos pobres bolsistas de escolas privadas. No caso das cotas sociais referentes à renda familiar, isso não ocorreria.

(12:30) Dep Carlos Abicalil: Roberto, os critérios de renda familiar já estão contemplados nos projetos, visto que a proporcionalidade da população brasileira presente em escolas públicas diz respeito às pessoas com renda familiar considerada baixa. Como eu já havia respondido, o projeto prevê o atendimento de parte da população que está nesse contexto de rendimento familiar baixo. Inseridos na questão econômica e social estão os negros e indígenas, que terão acesso conforme a proporcionalidade em cada estado brasileiro. Quanto ao projeto funcionar eternamente, essa não é a proposta, visto que o processo de reserva juntamente com a contrapartida dos alunos pelos benefícios recebidos e com todas as propostas de mudanças na educação básica em um determinado tempo, alcançarão as metas necessárias a fim de que as políticas afirmativas deverão ser modificadas de acordo com os resultados.

(11:32) Gustavo: Deputado, caso o projeto seja aprovado e vire lei, o que aconteceria com programas de crédito educativo, como o Fies? Continuariam a existir? O ProUni também seria mantido?

(12:29) dep Carlos Abicalil: Gustavo, com relação à manutenção do ProUni, devemos esclarecer que o mesmo se destina às vagas ociosas das instituições particulares de ensino superior. Da mesma forma, o crédito educativo também tem a mesma destinação, não sendo afetados, desta forma, pelo projeto.

(11:33) aquino: V.Ex.ª mexeu num "vespeiro", mas acredito que sairás vitorioso, pois o importante é ter um meio mais justo para o ingresso no ensino superior, de preferência no ensino superior público, pago por todos os brasileiros, inclusive o menos favorecido (pobres) e usufruído por poucos, principalmente os mais favorecidos (os ricos), pois esses têm todas as benesses que o dinheiro pode comprar, enquanto aqueles nem sabem o que é dinheiro, tão somente contas, bolsa disso e bolsa daquilo.

(11:39) Rachel: Por favor, qual a dificuldade dos negros quanto ao acesso ao ensino superior? Não é o fato de a grande maioria ainda estar inserida em classes sociais mais baixas, que via de regra estudam em escolas públicas... e cuja QUALIDADE é inferior, o que inviabiliza o seu ingresso à universidades públicas, pelo alto grau de concorrência? Ou é em virtude da raça apenas?

(11:47) aquino: Ambas as situações, pois uma depende da outra. Como melhorar sua alimentação (comer verduras, legumes, carnes, etc.) se o que ganha não dá nem para o pão? Qual a grande maioria nas classes sociais mais baixas? Então torna-se, também, uma questão racial. Política e socialmente "correto" e não te discrimino pela cor. Entretanto, te discrimino economicamente. Ambos são a mesma coisa, ou seja, formas diferente de discriminar a mesma pessoa.

(12:36) dep Carlos Abicalil: Aquino e Rachel, é fato que a grande maioria da população menos favorecida, se não é negra ou indígena, descende das mesmas. Não há como dissociar o racial do social, pelo fato único de que através dos séculos, desde o dito descobrimento do Brasil, essas raças foram relegadas à escravidão e posteriormente à marginalidade social. Repito que o projeto em questão visa primeiramente diminuir este abismo social criado e mantido através dos séculos.

(11:37) Leonardo Fontoura: Se o projeto do nobre deputado não for revisto e inseridas regras claras de fiscalização, os menos favorecidos continuarão sendo menos favorecidos. Como evitar isso, sr. Deputado? Sou um exemplo vivo de uma pessoa, entre milhares, que burlou uma ótima idéia do governo.

(12:18) Dep Carlos Abicalil: Leonardo Fontoura, é importante esclarecer que eu sou relator do projeto, o autor é o Poder Executivo. Após a edição da lei, são criadas regulamentações para dispor sobre a fiscalização da aplicação da lei. Em se tratando de universidade, isso também pode ser atribuído aos conselhos superiores, que têm autonomia prevista no artigo 207 da Constituição Federal. A estes conselhos eu já havia me referido em outra resposta.

Ensino básico

(10:15) SeverinA: Não seria mais lógico investir na educação pública, melhorando o ensino, pagando bem os professores, aumentando o número de escolas, para que os seus alunos pudessem concorrer em igualdade de condições com os das escolas privadas?

(10:29) dep Carlos Abicalil: Severina, sem dúvida essa é a melhor solução. O governo federal vem construindo projetos no intuito de tornar o ensino público um ensino de qualidade, mas até esses projetos surtirem o resultado esperado, devemos atender, ainda que com paliativos, a população que hoje se encontra excluída das oportunidades de cursar um ensino superior público de qualidade. É nesse sentido que nós, parlamentares, criamos projetos como o PL 73/99, do qual sou relator.

(10:16) JoseAntonio: Por que, então, não melhorar o ensino fundamental em vez de nivelar por baixo o ensino superior? Não é mais razoável darmos condições dessas pessoas terem condições de competirem em condições de igualdade com outros que, simplesmente e demagogicamente, dar-lhes preferência em relação às vagas?

(10:17) renata: Concordo com o José Antônio, o ensino deveria melhorar.

(10:18) Rachel: As cotas não excluem a necessidade de investimentos sólidos nos níveis educacionais fundamental e médio... Mas parece-me uma medida emergencial e temporária, voltada à viabilização de acesso que efetivamente não vem ocorrendo.

(10:30) Dep Carlos Abicalil: José Antonio, Renata, Rachel e Aquino, certamente a reserva de vagas não deve excluir a necessidade de investimentos na educação básica. Por isso, o governo federal está criando o Fundeb - Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização do Profissional da Educação -, que vai atender da educação infantil ao ensino médio. O projeto já está no Congresso Nacional em forma de proposta de emenda à Constituição (PEC) e prevê políticas públicas com aumento gradativo de financiamento da União. A reserva de vagas pode ser considerada temporária, mas não emergencial, visto que a proposta do governo federal é criar mais universidades públicas federais e aumentar a oferta. Após dez anos sem criação de instituições federais de ensino, desde o ano passado já foram criadas quatro universidades e existem projetos de outras no Congresso.

(10:29) Helena: Com certeza este projeto será útil para protelar a verdadeira necessidade do País, que é de uma escola pública de qualidade.

(10:52) Dep Carlos Abicalil: Helena, como já foi respondido anteriormente, o Brasil possui projetos de garantia de qualidade nas escolas públicas. Vide resposta postada às 10h30.

(10:34) SeverinA: Existem experiências de escolas públicas, como a Escola Plural, em Belo Horizonte, nas quais o aluno nunca é reprovado, para evitar a evasão escolar. Esse sistema trouxe grandes distorções, obrigando o professor a ensinar conteúdos muito abaixo da série para a qual leciona. Como esse aluno, com uma média de conhecimento muito abaixo da desejada, vai ter bom rendimento no curso superior?

(10:43) Helena: Concordo com a Sra. SeverinA. Por conhecer de perto a realidade dos discentes da Escola Plural, afirmo que, com esse projeto, teremos em nossas faculdades, alunos analfabetos. A iniciativa, tanto dos parlamentares quanto da sociedade como um todo, deveria ser de uma ação em prol de uma boa escola pública, que prescinda iniciativas paliativas.

(11:13) Dep Carlos Abicalil: Severina e Helena, sobre o caso da Escola Plural, o projeto não exclui a participação do aluno no vestibular. Isso significa que só ingressarão na universidade os que tiverem melhor desempenho no processo seletivo.

(10:35) Helena: Tendo como base o nível atual dos alunos de escolas públicas, concordo com o Sr. Audir, pois a entrada de alunos despreparados nas faculdades só contribuirá para que o nível das mesmas (que já não está satisfatório) caia ainda mais. Assim teremos altos níveis de escolaridade, altos níveis de inserção das classes baixas nos programas de graduação sem, contudo, uma verdadeira formação intelectual.

(11:20) dep Carlos Abicalil: Helena, não estamos eliminando os exames de seleção. Se você e o sr. Audir verificarem os coeficientes de rendimento dos alunos classificados imediatamente após o último aluno aproveitado, você vai verificar uma fortíssima concentração na média, que inclusive interferiu no cômputo do critério geral para ingresso, chamado de desvio padrão na estatística.

(10:39) SeverinA: Os excluídos devem se incluir através de uma política efetiva por parte do governo para a melhor distribuição de renda, acesso ao mercado de trabalho, saúde e BOA educação. Incluir alguém na universidade sem base suficiente para tal só irá distorcer o ensino e adiar a exclusão.

(11:29) dep Carlos Abicalil: Severina, os resultados do ProUni desmentem a tese que você sustenta na sua pergunta. Há uma pesquisa muito interessante realizada pela USP, que comprova que os alunos que ingressaram por bonificação de pontos no vestibular por serem oriundos de escola pública alcançaram resultados médios melhores que os demais nos dois primeiros anos de curso e desempenho médio igual ao final dos cursos comparados. Na UEMS, pesquisa equivalente demonstra o mesmo resultado no início dos cursos.

(10:41) Doniak: Vemos que a qualidade dos alunos está diretamente relacionada ao bom desempenho dos cursos. Quando temos em sala de aula acadêmicos sem capacidade de leitura e interpretação de texto, infelizmente o nível de ensino cai. Devemos lutar pela melhoria da qualidade do ensino fundamental e médio e não garantir vagas a alunos que não passam no vestibular devido à deficiência de formação.

(11:14) dep Carlos Abicalil: Doniak, a melhoria da qualidade da educação básica é um desafio continuado. Qualquer patamar de qualidade será sempre insuficiente frente aos avanços tecnológicos, científicos e de bem-estar. Quando estamos falando de reserva de vagas no ensino superior, não estamos eliminando a universalização dos processos de verificação de aprendizagem de quem concluiu o nível médio e está apto a disputar uma vaga no ensino superior. As estatísticas de vestibulares demonstram que a primeira metade dos não-aproveitados por falta de vagas estão concentrados em coeficientes muito próximos da média de aprovação. Se você for ver na sua universidade, seguramente esse quadro se repetirá.

(10:47) Eliane: Sra. Helena, mesmo investindo na escola pública, os resultados só apareceriam daqui a mais ou menos dez anos, o que prejudicaria muito os alunos, uma vez que sempre que tem eleições mudam-se os governadores e seus objetivos.

(11:44) dep Carlos Abicalil: Eliane, há milhares de alunos oriundos de escola pública com médias similares aos aprovados dos cursinhos preparatórios particulares que têm currículos bem mais consistentes, embora não tenham recebido o treinamento intensivo para fazer uma prova, valendo pelos seus 11 anos de estudo. Cada vez mais, o percurso do estudante deve ganhar protagonismo frente ao momento instantâneo da prova. Vamos caminhar para isso, seguramente. Já existem diversas experiências que privilegiam a análise do currículo sobre a exclusividade do vestibular.

(10:56) rogerio: Acredito que o sistema de cotas, efetivamente não trará benefícios para a sociedade brasileira, que é extremamente pluralista e multiracial. Mesmo concordando com a necessidade de inclusão social, vejo que não podemos fazer por cima, mas oferecendo condições adequadas na base social. Graduação não se faz com facilitação de acesso, e sim com mérito acadêmico. Isso é fundamental para o fortalecimento do País frente aos demais países. Devemos sim, investir pesadamente em educação básica, reformular os critérios de aprovação, fazer uma reforma do ensino de maneira profunda. Sistema de cotas, na minha opinião, é tampar o sol com a peneira.

(11:59) dep Carlos Abicalil: Rogério, o investimento em educação básica será um desafio continuado em qualquer sociedade, em especial entre as mais desiguais, como é a brasileira. O olhar sobre a escola básica também deve ser plural como você sugere. Cada vez mais, a relação entre este olhar e a visão elaborada pela universidade e pela pesquisa acadêmica devem reconhecer esta pluraridade. O mesmo deve se passar nas áreas de saúde, direito, economia. Não há via mais rápida e qualificada para passar a este novo quadro do que permitir que essa pluralidade esteja presente na universidade não apenas como objeto da pesquisa mas orientando e definindo seus métodos, seus critérios de verdade e de validação, e o mais fundamental, os seus temas.

(10:59) luciano: Será que o sistema de cotas não é o reconhecimento e confirmação da deficiência do ensino público no País?

(12:03) Dep Carlos Abicalil: Luciano, o conceito de qualidade da educação passa por temas muito complexos, que vão desde as formas de financiamento público em estados e municípios até o modo com que os recursos são aplicados no ensino, entre outras questões. A proposta do Fundeb, por exemplo, prevê mudanças na distribuição dos recursos e aumento gradativo desses recursos, no sentido de estabelecer planos de carreira para os profissionais das escolas públicas e formação continuada dos educadores, o que incidirá diretamente sobre a qualidade da educação. O sistema de reserva de vagas é uma forma de apressar o processo de garantia da educação pública, enquanto são realizadas mudanças no ensino básico.

(11:00) SeverinA: Ao funcionar o esquema de cotas, a procura por escolas publicas será consideravelmente aumentada, haverá cotas também para o ingresso no ensino básico?

(11:01) Gonzaga: Boa pergunta, Severina. Haverá cotas para o ingresso no ensino básico? Também pergunto.

(11:03) marceloa: No ensino básico, salvo raras instituições de ensino, nenhum dos pais de alunos da elite que hoje freqüenta as universidades públicas quer colocar seus filhos.

(11:04) SeverinA: Tendo a garantia de que seus filhos terão mais chances de ingressar na universidade via cotas? Duvido que não queiram...

(12:10) dep Carlos Abicalil: Severina, Gonzaga e Marceloa, as escolas técnicas federais e centros federais de educação tecnológica desmentem esse preconceito de determinados setores de classe média frente à educação pública. Em muitos estados, as escolas públicas de ensino médio, consideradas as mesmas condições de escolaridade dos pais, de acesso a bens culturais, especialmente a leitura e a renda das famílias, têm desempenho compatível com as melhores escolas privadas das mesmas regiões. Só se podem comparar resultados acadêmicos dentro dos seus contextos. Há péssimas escolas públicas e privadas com excelentes alunos, por outro lado. O mais fundamental é conhecer dados, ter curiosidade sobre eles, fazer comparações e desafiar novas soluções. Nunca serão definitivas e nem sem problemas. Essa realidade de superação total está ainda fora da temporalidade e da limitação humanas.

(11:00) adelaide: E se todos tentassem migrar para a rede pública? Daria uma convulsão social, pois, além de ruim, não oferece vagas para todos...

(11:01) Gustavo: Deputado, para concorrer no sistema de cotas proposto, o aluno interessado deve ter cursado todo o ensino médio em escola pública. O senhor acredita que haverá um retorno da classe média à escola pública caso o projeto de lei seja aprovado?

(12:08) Dep Carlos Abicalil: Adelaide e Gustavo, reiterando o que eu já havia mencionado, 76% dos alunos brasileiros estão em escolas públicas. Se houvesse uma migração para essas escolas, os prejudicados seriam os proprietários de escolas particulares. Mas, se 50% das vagas são direcionadas para os 24% de alunos que estudam nas escolas particulares, não haveria necessidade de mudanças desses alunos para as escolas públicas.

(11:27) SeverinA: Mas será seleção dentre os alunos das escolas públicas...se elas não melhorarem o ensino os selecionados, serão menos aptos que os da escola privada...

(11:27) René: Embora creia que não ingressem alunos desqualificados, ingressarão e têm ingressado candidatos menos qualificados, ferindo o princípio único do exame da capacidade, regra constitucional.

(11:34) Rachel: O critério do mérito/capacidade não pode ser interpretado isoladamente. A educação está constitucionalmente comprometida com a justiça social e com a igualdade de condições para o acesso, que precisam ser efetivados, inclusive através de medidas afirmativas.

(12:27) dep Carlos Abicalil: Severina, René e Rachel, conforme já foi dito anteriormente, medidas necessárias para a melhoria do ensino médio têm sido implementadas em todo o País. Da mesma forma que ocasionalmente poderão ingressar pessoas menos qualificadas pelo método proposto, temos a certeza pelos dados estatísticos já citados, que isso já vem acontecendo mesmo entre aqueles que passam pelos exames ainda utilizados como forma de acesso ao ensino público superior. O que está sendo proposto é exatamente a diminuição da disparidade do acesso vigente.

Tramitação

(10:17) René: Sr. deputado: Os líderes na Câmara assinaram um pedido de tramitação de urgência do PL 3627/04, no final de 2004, desconhecendo dados das pesquisas/estudo dos Pro-Reitores e mesmo no INEP, divulgadas em março de 2005, que, na pior das hipóteses (INEP) informam que brancos (52% da população) ocupam 62% das cadeiras nas IFES e 72,9% no Campus Brasil; pretos (5,9 da população): 3,6 nas IFES e 4,4% nas IFES; pardos(41% na população):30,4 nas IFES e 20,5% no Campus Brasil; índios: 1,0% no C. Brasil e 1,8% nas IFES; que 46% de estudantes da rede pública já ocupam vagas nas universidades e que o próprio IBGE (Sínteses 2003) registra um considerável atraso na educação de pretos e pardos que se encontravam em 2003 no ensino fundamental e no ensino médio. Esses dados inviabilizam ação afirmativa de reserva de vagas. PERGUNTO: Além das questões constitucionais do PL 3627/04, que precisam ser melhor examinadas, é correto, ético usar agora este requerimento de urgência?

(10:53) dep Carlos Abicalil: René, não é verdade que desconhecemos a pesquisa. Os dados se referem à totalidade de matrículas, não foram estratificados por cursos. Medicina, Odontologia, Veterinária, Direito e Comunicação, é fortemente discricionária a entrada de alunos. Sobre o requerimento de urgência, ele é absolutamente legítimo, visto que as matérias em tramitação sobre reserva de vagas têm origem desde 1996, o que significa oito anos de debate parlamentar. Por outro lado, se alguma instituição já supera hoje em algum curso a reserva de vagas proposta no substitutivo, seus efeitos já estão consolidados e a aplicação do substitutivo apenas fará uma melhor equalização da sua distribuição pelo território nacional.

(10:25) Elton (sinop): Esse sistema de cotas vai começar a funcionar quando?

(10:40) dep Carlos Abicalil: Elton, a partir do momento em que o PL 73/99 for aprovado pelo Congresso, começam as providências cabíveis para que o mesmo seja implantado em todas as universidades federais brasileiras.

(10:50) René: Por que, deputado, ao invés de simples projeto de lei ordinária, não se emenda a Constituição? O próprio governo, através da SEPPIR, está fomentando uma Convenção de Combate ao Racismo na OEA, com ênfase nos direitos de afrodescendentes, de certo modo desconfiando do êxito das propostas internas ou querendo impor externa. Há um equívoco, uma vez que qualquer Convenção de Direitos Humanos deverá passar por votações que seguem o rito de emendas.

(11:47) dep Carlos Abicalil: René, a convenção não segue o rito das emendas e é oriunda de acordos internacionais que entram em vigência a partir da sua assinatura ad referendum do Congresso.

(10:59) adelaide: Que tal um referendo popular?? Pelo que sei, com raras exceções, todos são contra. Por que o governo não consulta a população???

(12:04) dep Carlos Abicalil: Adelaide, o referendo é uma hipótese. São raras as práticas no Brasil consultadas por referendo. Temos enorme desafio do tema desarmamento, por exemplo. Você acompanha as dificuldades para aprová-lo aqui no Congresso. Também creio que o referendo pressupõe a ampliação dos espaços de debate e a garantia de que os setores que não dispõem dos meios econômicos da propaganda possam expressar-se com a veemência e a intensidade das suas representações reais. Não acredito que todos sejam contra. A menos que a sociedade pudesse ser retratada por aqueles que tendo os meios econômicos à sua disposição, continuam acumulando os melhores espaços assegurados pelos esforços de todos. A sociedade brasileira avança, felizmente, na direção de repudiar privilégios, exigir transparência e ampliar direitos