Radioagência

Muita gente acha que a origem de Brasília está onde hoje fica a rodoviária do plano piloto porque ali foi feito o primeiro cruzamento de avenidas no meio do cerrado. Mas, na verdade, o marco zero da capital federal é outro. Fica a quarenta quilômetros dali, em Planaltina. Não é fácil chegar lá. Não há placas indicativas e um pedaço da estrada é de terra. A pedra fundamental de Brasília, um obelisco, está distante. Distante também da memória, como ressalta o historiador Xico Mendes.

"Infelizmente ela não tem mais nenhuma importância para os moradores do Distrito Federal e do Brasil, por falta de divulgação, por falta de prioridade em políticas públicas para criar uma infraestrutura turística aqui na área. Agora ela tem um outro significado que é muito triste. Aqui, as pessoas usam esse ponto para prostituição, para uso de drogas... e isso revela muito o descaso institucional do país com esse monumento"

O descaso não faz jus à história que o marco zero tem pra contar.... Ele foi inaugurado em 1922, fruto de um projeto de lei dos deputados Rodrigues Machado e Antonio Americano do Brasil. Este último, médico e intelectual respeitado, era um grande nacionalista. Lutou muito para que fosse cumprida a transferência da capital do Rio de Janeiro para o interior, já prevista na Constituição desde 1823. É o que conta a sobrinha do parlamentar, Vilma Americano do Brasil.

"Ele sempre dizia que enquanto a Capital não viesse para o interior do Brasil, o potencial verdadeiro do Brasil não apareceria. O verdadeiro potencial de crescimento, de expansão, enfim, de produção. Não era só porque ele era de Goiás e queria que a capital viesse para Goiás. Ele achava que a capital vindo para o centro do Brasil haveria uma outra dinâmica de desenvolvimento. Foi por isso que ele batalhou tanto."

E a ideia de construir um monumento para marcar a construção da capital no planalto central virou lei. O obelisco serviria também para homenagear os 100 anos de independência do brasil. Mas a autorização da obra foi dada apenas 10 dias antes da data comemorativa. Era preciso escolher um lugar e, o mais difícil, levar o material de construção. A estrada de ferro mais próxima terminava a mais de 300 quilômetros. Começava aí uma verdadeira aventura, como explica José Roberto Sfair, dirigente do SESC, que organiza uma exposição sobre personagens que fizeram parte da história de Brasília.

"Os caminhões na época não asseguravam condições de tráfego, as estradas praticamente não existiam... Foi uma saga."

E foi mesmo. Nove automóveis e seis caminhões transportaram 40 pessoas e todo o material de construção. O local escolhido foi o morro do centenário. Lá, foi construído o obelisco de concreto, com 3 metros e 75 centímetros de altura. As quatro quinas alinhadas com os pontos cardeais. Foi corrido, mas o engenheiro responsável pela obra, Ernesto Balduíno,conseguiu, como lembra o historiador Casimiro Neto.

"O decreto dizia que tinha que ser até o meio dia de 7 de setembro de 1922. E ele cumpriu isso. Às 10 horas da manhã do dia 07 ele terminou a obra e daí duas horas inaugurou. Essa pedra fundamental fala tanto de Brasília. Ela é o primeiro ato concreto. Anteriormente eram leis, coisas escritas, não tinha ato concreto. A pedra... o lançamento da pedra é esse ato. Isso é fundamental para entender pra entender a história de Brasília"

Na inauguração, não teve nenhum político de renome. Mas havia toda uma esperança de desenvolvimento e crescimento do interior do país. A esperança virou realidade menos de 40 anos depois, em 1960, junto com toda a história que viria.