Rádio Câmara

Reportagem Especial

Código de Mineração: um raio-x do setor e a necessidade de reformas

25/11/2013 - 13h45

  • Código de Mineração: um raio-x do setor e a necessidade de reformas

O novo marco da mineração no Brasil, analisado em comissão especial da Câmara, enfrenta intenso e amplo debate na Casa. A proposta é polêmica, complexa e mexe com os mais variados interesses. Este é o tema da reportagem especial desta semana, em cinco capítulos. Neste primeiro capítulo, o repórter José Carlos Oliveira apresenta um raio-x do setor de mineração no Brasil e explica a necessidade de reforma do atual Código, que está em vigor desde os tempos da ditadura militar.

MÚSICA: "Itamarandiba" (Milton Nascimento)
"No meio do meu caminho sempre haverá uma pedra
Plantarei a minha casa numa cidade de pedra..."

Das profundezas da Terra Brasilis, muita riqueza já foi retirada desde que Pedro Álvares Cabral aqui aportou no ano de 1500. A corrida pelos diamantes do Arraial do Tijuco, já no século 18, ajudou a erguer a futura cidade de Diamantina e a fazer das Minas Gerais o epicentro da mineração no Brasil colonial. Essas terras mineiras eram também ricas em ouro, tanto o preto, manchado de óxido de ferro, quanto o branco, coberto do mineral paládio.

O chamado Ciclo do Ouro levou os bandeirantes a expandirem a fronteira brasileira inicialmente traçada pelo Tratado de Tordesilhas, entrando nos atuais estados de Goiás e Mato Grosso. Outra frente abria caminho pelo norte, via Pará e Amapá. Mas, até o fim do Império, nossa riqueza mineral serviu somente para enriquecer os cofres da Coroa portuguesa e da Inglaterra, sua escudeira.

MÚSICA: "Itamarandiba" (Milton Nascimento)
"No caminho dessa cidade passarás por Turmalina
Sonharás com Pedra Azul, viverás em Diamantina..."

Muito tempo se passou até que a República do Brasil começasse, de fato, a usufruir de suas riquezas minerais. A criação da Companhia Vale do Rio Doce, por Getúlio Vargas, em 1942, é um desses marcos. A antiga estatal está hoje nas mãos do capital privado, mas mantém a fama de uma das maiores mineradoras do mundo. Atualmente, a mineração desempenha papel fundamental na moderna economia brasileira. É um dos setores produtivos mais pujantes, mas depende de ajustes para a plena exploração e distribuição de suas riquezas, como afirma o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão.

"O Brasil necessita vencer o desafio de destravar um dos setores mais importantes da vida econômica brasileira para que ele possa gerar mais riquezas, empregos e renda para o nosso povo".

Hoje a mineração é responsável por 4,3% do total das riquezas do país, expressas no Produto Interno Bruto. O chamado PIB mineral brasileiro acumulou, ao longo de 2012, 82 bilhões e 300 milhões de dólares. O saldo comercial do setor é extremamente favorável: as exportações superaram as importações em mais de 30 bilhões de dólares em 2012. E olha que apenas uma minúscula parte do potencial brasileiro está devidamente mapeada, segundo o diretor-geral do Departamento Nacional de Produção Mineral, Sérgio Dâmaso de Sousa.

"Na mineração, nós apenas arranhamos. Conhecemos muito pouco do nosso potencial, uma vez que estamos explorando só o que estamos vendo. Ainda não temos conhecimento total do potencial que é o país".

Vamos a mais alguns números importantes, com base em dados oficiais do Ministério de Minas e Energia, que mostram a presença da mineração em praticamente todos os municípios brasileiros.

Atualmente, o país possui 7.195 minas em operação. Delas, são extraídas 80 substâncias minerais diferentes. Mais de 200 minas são consideradas de grande porte, com produção superior a um milhão de toneladas por ano.

O Brasil é o líder mundial na produção de minério de ferro, nióbio, caulim, tantalita, bauxita, grafita e rochas ornamentais. Também desempenha papel crescente na extração das chamadas terras raras, um conjunto de minérios de valor estratégico devido ao uso em produtos de alta tecnologia.

Esse contexto leva o diretor da estatal Amazônia Azul Tecnologias de Defesa, Leonan Guimarães, a rebater com veemência as críticas que associam a mineração a uma "economia do passado".

"O fato de existir uma nova economia - e estamos falando de tecnologia da informação, comunicações, energias alternativas, células fotovoltaicas, energia eólica - faz parecer que essa nova economia não precisa de minério. E é tudo ao contrário: essa nova economia é uma grande consumidora daqueles minérios já tradicionais e aumenta o consumo de outros que a gente nem ouvia falar. Quanto mais as novas tecnologias se desenvolvem, mais elas são acessíveis à população mundial e mais vão demandar produtos como o nióbio, as terras raras. A mineração é a base de sustentação do desenvolvimento econômico".

Porém, segundo especialistas, o setor enfrenta uma série de barreiras que impede a exploração dessas potencialidades.

O DNPM, Departamento Nacional de Produção Mineral, por exemplo, carece de pessoal e de recursos tecnológicos. Não há sintonia entre os órgãos que tratam de mineração e os que cuidam dos licenciamentos ambientais. O orçamento é reduzido. Além disso, o marco legal do setor estaria desatualizado. O atual Código de Mineração (Decreto-Lei 227/67) é de 1967, baixado pela ditadura militar.

Para atualizá-lo, o governo federal enviou ao Congresso Nacional uma nova proposta de Código de Mineração (PL 5807/13), que se juntou a outros seis projetos de lei (PL 37/11 e apensados) que já tramitavam na Câmara dos Deputados desde 2011. O texto cria o Conselho Nacional de Política Mineral e transforma o DNPM em Agência Nacional de Mineração.

O Ministério de Minas e Energia avalia que esses novos instrumentos aprimoram a fiscalização e a transparência do setor. A proposta também dobra os royalties pagos aos municípios mineradores por meio da CFEM, a Compensação Financeira sobre Exploração Mineral. Após licitação, as minas serão exploradas em regime de concessão com validade inicial de 40 anos. O ministro Lobão cita a expectativa do governo com o novo Código de Mineração.

"Esse instrumento legal consiste na definição sobre a melhor forma de aproveitar as riquezas do nosso subsolo, as quais, como estabelece a Constituição, são patrimônio de todo o povo brasileiro. Estamos todos conscientes de que, em função de uma legislação ultrapassada, burocrática e centralizadora, o Brasil ainda não se beneficia adequadamente de suas riquezas minerais".

Só tem um probleminha: o Executivo elaborou esse projeto de lei ao longo de dois a três anos, mas o enviou à Câmara com urgência constitucional, o que obrigava os deputados a votá-lo em 45 dias, sob pena de paralisar as votações do Plenário da Câmara.

Os parlamentares, com o apoio da sociedade civil, se rebelaram diante desse curto prazo e decidiram promover audiências públicas em todas as regiões do país para colher a opinião dos vários setores interessados sobre possíveis alterações na proposta de novo Código de Mineração. Afinal de contas, trata-se de um tema polêmico, complexo e que reúne interesses diversos, já que a mesma mineração responsável por alavancar a economia brasileira também causa impactos socioambientais desastrosos.

MÚSICA: Itamarandiba (Milton Nascimento)
"Itamarandiba, pedra corrida, pedra miúda rolando sem vida
Como é miúda e quase sem brilho a vida do povo que mora no vale..."

Confira, amanhã: as sugestões de ambientalistas e da população afetada pela exploração mineral.

Da Rádio Câmara, de Brasília, José Carlos Oliveira.

A abordagem em profundidade de temas relacionados ao dia a dia da sociedade e do Congresso Nacional.

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