Rádio Câmara

Reportagem Especial

Constituição chega aos 25 anos enfrentando pressão por reformas

01/10/2013 - 17h02

  • Constituição chega aos 25 anos enfrentando pressão por reformas (bloco 1)

  • Para especialistas, a Constituição de 88 ampliou o exercício da cidadania (bloco 2)

  • Os direitos sociais da Constituição Cidadã: educação, saúde e habitação (bloco 3)

  • Reforma tributária e os avanços e retrocessos na legislação trabalhista (bloco 4)

  • Após 25 anos, 112 pontos do texto constitucional aguardam regulamentação (bloco 5)

A Constituição comemora um quarto de século neste 5 de outubro. Elaborada com a participação da sociedade, deu garantias aos cidadãos brasileiros, que viviam o fim da ditadura. O resultado fez com que a lei máxima de nosso País seja considerada uma das mais avançadas do mundo. Para comemorar esses 25 anos, a Rádio Câmara produziu uma série especial de cinco matérias abordando alguns aspectos de nossa Constituição.

Vamos saber o que de fato mudou, porque ela é considerada a Constituição Cidadã, os novos direitos sociais. Conheça também os artigos que não funcionam na prática por ainda não terem sido regulamentados. Neste primeiro capítulo da série especial sobre os 25 anos da Constituição, você vai ouvir que ela é bastante elogiada por assegurar direitos. Mas, ainda assim, sofre muita pressão por mudanças. A reportagem é da jornalista Ginny Morais.

A história da atual Constituição começa com o fim da ditadura militar em 1985. Um ano depois, foram eleitos os deputados federais e senadores responsáveis por escrever uma nova lei soberana para um Brasil democrático. E assim foi feito. Durante 2 anos, os debates foram intensos. A participação popular também. Todos os dias, dez mil pessoas circulavam pelos corredores do Congresso. Cada grupo com um pedido especial. O resultado de tanta agitação política foi a chamada Constituição Cidadã, promulgada em 5 de outubro de 1988.

A nova Constituição foi firme em garantir os direitos fundamentais dos cidadãos, como o de ir e vir, o de liberdade de expressão, entre outros. E colocou esses direitos como impossíveis de serem mudados. O texto também traz várias regras gerais para a organização do estado brasileiro. No fim, foram 250 artigos. Um texto elogiado pelos avanços, mas criticado pelo detalhismo.

Ao longo desses 25 anos, a Constituição sofreu mais de 70 mudanças. Entre elas, a que permitiu a privatização da telefonia nos anos 90 e a que deu aos trabalhadores domésticos os mesmos direitos que os demais trabalhadores do país. Alterações que refletem o país, segundo o cientista político da Universidade de Brasília, João Paulo Peixoto.

"O fato de existir 70 emendas já é demonstração de que aquela original em 1988 não atende mais a realidade brasileira."

Por pensarem assim, vários grupos da sociedade passaram a reivindicar mudanças na nossa lei maior. Até agora, a essência da Constituição ainda está preservada. Mas o que não falta é pressão para mudar. E vem de todos os lados. Cada proposta é um cabo de guerra.

Todas as lideranças partidárias da Câmara dos Deputados dizem que existem pontos a serem mudados na Constituição. Mas há quem defenda mais que isso. Uma revisão total, como o líder do PR, deputado Anthony Garotinho, do Rio de Janeiro.

"Eu só não tiraria as cláusulas pétreas e os direitos fundamentais do cidadão, que estão garantidos na Constituição. Fora isso, muitas mudanças são necessárias //// Eu apresentei uma proposta, ... para que nós façamos um plesbicito e perguntemos ao povo o seguinte: vamos fazer a revisão constitucional que está prevista na própria Constituição e não foi feita?"

Mas alguns especialistas não gostam nada dessa ideia. Entre eles, Carlos Ranulfo, cientista político da Universidade Federal de Minas Gerais.

"Em hipótese alguma, colocaria a Constituição em discussão. Eu acho que nós podemos fazer boa parte das mudanças que nós precisamos fazer, são mudanças por lei ordinária. E mesmo que nós tivermos que fazer uma eventualmente, uma mudança ou outra na constituição isso é normal. É diferente de colocar a constituição em questão."

Mudar um trechinho da Constituição é uma batalha que, muitas vezes, dura anos e anos. Por isso, a ideia de fazer uma revisão total é descartada pela maioria dos líderes. O que os partidos defendem são mudanças pontuais. E algumas delas são unanimidades. A que altera a cobrança de impostos no país, a tão falada reforma tributária, é uma delas, como destaca o líder do Democratas, deputado Ronaldo Caiado, de Goiás.

"A reforma tributária é fundamental. O Brasil hoje está asfixiado com esse peso todo que o cidadão trabalha 4 meses e 10 dias só para pagar impostos e no entanto ele não se sente beneficiado daquilo tudo que ele é obrigado a entregar para o estado brasileiro. ele não tem saúde de qualidade, segurança, educação."

Existe outro ponto em que políticos e especialistas concordam: é preciso mudar a forma de eleger representantes - a famosa reforma política. Para o professor de Ciências Políticas da Universidade de São Paulo, José Álvaro Moisés, esta é a parte da Constituição que mais precisa ser alterada.

"Há uma série de coisas do sistema político que estão funcionando mal.Aapareceram com toda clareza agora nas manifestações que tomam conta do Brasil. O Brasil é um dos países que têm campanhas eleitorais mais caras do mundo, e isso não faz sentido nenhum em um país que tem tanta necessidade ainda de resolver questões ainda de desigualdade."

Mas se todo mundo concorda que as reformas tributária e política precisam ser feitas, por que elas não saem do papel? O problema é que cada um defende uma coisa diferente. Há interesses econômicos, ideológicos.... Como ninguém cede, a coisa não anda.

Bom, mas além das reformas política e tributária, existem outras propostas de mudar a Constituição bastante citadas por lideres partidários. Entre elas, a que permite a população participar mais das decisões políticas fora do período eleitoral. É o que destaca a coordenadora da bancada feminina, deputada Jô Moraes, do PcdoB mineiro.

"Temos que reconstruir um projeto de participação popular, onde a população possa não apenas através de Projetos de iniciativa legislativa, popular, mas através de outros mecanismos interferir, acionar plebiscito mais, referendo também, acionar mecanismos que façam a consulta direta porque as ruas mostraram que o povo quer mobilidade urbana, quer melhoria dos serviços públicos, mas quer sobretudo falar, interferir, na construção do Estado brasileiro."

Mais de mil propostas de mudanças na Constituição aguardam avaliação só da Comissão de Constituição e Justiça, a mais importante da Câmara. Apesar de tantas sugestões e de tanta pressão para mudar a Constituição, há quem defenda que o mais importante não é isso. Como o líder do PT na Câmara, José Guimarães, do Ceará.

"Antes de fazer qualquer mudança nós temos tanta coisa para regulamentar. Vamos aperfeiçoar o que já existe. Votar mais coisa e deixar a regulamentação dessas coisas para depois? Eu prefiro o caminho da consolidação. Nós temos uma Constituição boa, tem avanÇos extraordinários. Nós temos que preservar tudo isso e avançar em outros."

Com isso, até adversários políticos concordam. Como mostra o deputado Nilson Leitão, líder da Minoria na Câmara, a maior bancada de oposição ao governo.

"A Constituição garantiu tantos direitos para o cidadão e esses direitos não estão sendo assegurados - na saúde, na educação, na segurança. Se você lê o texto da Constituição, ele é perfeito. Ele garante à população o acesso à educação, e uma boa parte não tem acesso à educação. (...). Então precisa mudar é a cabeça dos governantes. Mudando a cabeça dos governantes, pouca coisa precisa ser mudada."

Uma coisa é certa: a pressão popular pode fazer diferença - tanto para mudar a cabeça dos políticos, como para fazer virar realidade algumas mudanças na Constituição.

Da Rádio Câmara, de Brasília, Ginny Morais

A abordagem em profundidade de temas relacionados ao dia a dia da sociedade e do Congresso Nacional.

De segunda a sexta, às 3h, 7h20 e 23h

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