Rádio Câmara

Reportagem Especial

História das CPIs: as CPIs que deram resultado

12/04/2013 - 17h14

CPI dos Correios, CPI do PC, CPI do Orçamento, CPI do Narcotráfico, CPI da Pirataria e CPI da Pedofilia são alguns exemplos de comissões parlamentares de inquérito que tiveram resultados concretos. Confira as CPIs que não terminaram “em pizza”.

TRILHA INSTRUMENTAL

NARRAÇÃO DE MULHER:

"Quero dizer que o fato de ele ter me despido na cama da própria esposa e ter me bolinado enquanto eu chorava e pedia para parar ainda é um fato que me enoja e me dói, mas isso não me derrotou. Eu hoje tenho 21 anos, sou uma mulher, uma adulta que passou por muitas coisas, sou dependente de antidepressivo e apesar de tudo isso, estou aqui hoje, mesmo que por meio de palavras pronta pra lutar por justiça. Porque se o medo e a vergonha me calaram durante 12 anos, não me calam mais. Mais forte do que a vergonha, o medo, a dor de lembrar tudo aquilo, mais forte do que tudo isso está a minha vontade de fazer justiça. Já fiz na água, quando duvidaram de mim e agora anseio por justiça na vida. Porque nenhuma criança, aliás, nenhum ser humano merece ser tocado daquela forma. Pedofilia é uma doença e é triste que um homem não tenha tido a capacidade de se controlar diante de uma criança. Se eu disser que não tenho mágoas do que sofri, vou estar mentindo, sou humana e não consegui até hoje me libertar desses sentimentos que vez por outra me tomam o sono e me deixam presa num pesadelo que infelizmente eu vivi na vida real. Só peço que pelo amor de Deus, peço que a Justiça não deixe esse homem encostar em mais nenhuma criança."

Este é um trecho do relato feito por escrito pela nadadora Joanna Maranhão, em 2008, quando ela resolveu denunciar que foi vítima de abuso sexual por parte de seu próprio treinador, quando tinha 9 anos. A denúncia da atleta não serviu para prender o abusador, porque na época, o crime já tinha prescrito. Mas incentivou senadores da CPI da Pedofilia para que propusessem mudanças na lei. E essa alteração acabou virando realidade. Desde maio de 2012, a prescrição de crimes sexuais contra crianças e adolescentes só começa a contar no momento em que a vítima completa 18 anos. Antes a vítima só tinha seis meses para denunciar. Agora, dependendo do caso, em estupro, por exemplo, a vítima tem até 20 anos para denunciar o agressor.

TRILHA

Este é um dos exemplos de resultado concreto do trabalho de uma Comissão Parlamentar de Inquérito: propostas de novas leis ou de mudanças nas regras já existentes para corrigir problemas detectados durante as investigações. E isso é considerado uma das mais importantes contribuições que as CPIs podem dar ao país, segundo o mestre em ciência política Wellington Oliveira.

"O resultado que é possível medir são as proposições legislativas, que dependem do próprio Congresso, as mudanças legais que podem ser feitas pra fazer cessar um desmando, uma corrupção."

A crítica é quanto à falta de efetividade desses projetos de lei. Oliveira fala dos resultados das propostas das comissões de inquérito da Câmara entre 1999 e 2007.

“Nos últimos 16 anos, tivemos um projeto de lei aprovado, aquele que não prescreve crime de abuso sexual. Foi oriundo de CPI que foi votado e aprovado. Desde a 50ª legislatura, primeiro mandato de FHC, tivemos um projeto de lei, o que é um absurdo.”

Isso acontece porque as propostas de CPIs tramitam como todas as outras propostas, o que geralmente leva tempo. Para se ter uma ideia, a CPI do Tráfego Aéreo terminou os trabalhos em 2007. Só agora, cinco anos depois, um dos projetos de lei propostos pela comissão foi finalmente aprovado pela Câmara. E ainda precisa ser avaliado pelo Senado.

E como a tramitação de uma proposta leva tempo, ela esbarra em outra dificuldade burocrática: todas as propostas da Câmara, assim como as das CPIs, são arquivadas de 4 em 4 anos, no final dos mandatos, e só são desarquivadas a pedido de um membro da CPI. Como nem sempre isso acontece, muitas sugestões de CPI acabam abandonadas.

TRILHA

Mas quando o tema causa mobilização geral da sociedade, e por consequência de nossos representantes no Congresso Nacional, a tramitação pode ser bem mais rápida e mudar toda uma realidade. Foi o que aconteceu em 1993, depois do escândalo conhecido como Anões do Orçamento.

TRILHA ORÇAMENTO

A denúncia veio de um ex-assessor da Comissão Mista de Orçamento, José Carlos Alves dos Santos. Parlamentares estariam recebendo propina para incluir emendas no Orçamento para beneficiar empresas- fantasmas. Também usariam influência política para favorecer empresas em concorrências públicas. Tudo para engordar os próprios bolsos. O chefe do esquema seria o relator do Orçamento, deputado João Alves. Em depoimento, para explicar o enriquecimento ilícito, ele chegou a alegar que era um sortudo que tinha ganhado 56 vezes na loteria só em 1993.

DEPOIMENTO JOÃO ALVES

Mas a suposta sorte não adiantou. A CPI do Orçamento trabalhou 3 meses. Neste período, quebrou 395 sigilos bancários, 267 sigilos fiscais e 43 telefônicos, além de colher 79 depoimentos. E concluiu que havia sim um esquema criminoso. Terminou com o pedido de cassação de mandato de 18 parlamentares e o envio de vários dossiês para a Receita Federal e o Ministério Público. No fim, seis deputados foram cassados e dois renunciaram para não perder os direitos políticos, entre eles, João Alves. A cientista política Argelina Figueiredo analisa a importância dessa comissão.

“Eu duvido que tenha na história do Parlamento do mundo inteiro uma investigação tão profunda como foi a CPI do Orçamento, que terminou cassando o mandato do presidente da Câmara. A CPI do Orçamento não só puniu como mudou o processo orçamentário. A partir de 1995 o processo orçamentário foi totalmente diferente do que era antes.”

TRILHA

Como a Argelina disse, outra consequência direta da CPI do Orçamento foi a lei 8.666, a nossa atual Lei das Licitações, que tem lá os seus defeitos, mas é considerada uma das mais avançadas no mundo na área pública. Se hoje há espaço para fraudes, imagina sem essas regras... Foram elas que permitiram economizar mais de 25 bilhões de reais só com o uso de pregão eletrônico nos últimos seis anos, segundo dados do Governo Federal.

De Brasília, Ginny Morais.

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