Rádio Câmara

Reportagem Especial

Economia Verde: a construção do conceito

28/05/2012 - 00h01

  • Economia Verde: a construção do conceito (bloco 1)

  • Economia Verde: o exemplo de produtores brasileiros que acreditaram na agricultura verde (bloco 2)

  • Economia Verde: a história de empresas e empreendedores que toparam o desafio (bloco 3)

  • Economia Verde: a redução da pobreza e a segurança do trabalhador (bloco 4)

  • Economia Verde: renda e preservação no trabalho de agricultores familiares e extrativistas (bloco 5)

Hoje, na primeira matéria, entenda como o debate sobre Economia Verde ganhou corpo a ponto de ser um dos principais eixos da Rio+20, além de tema das comemorações do Dia Mundial do Meio Ambiente, em 05 de junho.

TEXTO

Economia verde, sustentabilidade, desenvolvimento sustentável, meio ambiente. Você já deve ter ouvido uma dessas palavrinhas na TV, no jornal, no rádio, na escola, no supermercado, na feira. E é bem possível que tenha uma opinião sobre o assunto.

O agente comunitário de saúde José Kenedy da Cruz, de Lagoa do Itaenga, Pernambuco, tem a sua.

"A economia verde é você estar trabalhando com o meio ambiente de forma solidariamente e estar trabalhando de forma unificada. A questão do desmatamento, das florestas e estar cuidando do meio ambiente no nosso próprio dia a dia."

O aposentado Elson Quintino, da mineira Ibiá, também.

"Está muito maltratado nosso ecossistema. Os países ricos não vão querer parar com a economia deles por causa da poluição. Vão continuar poluindo da mesma forma e os países subdsenvolvidos é que vão arcar com essas consequências."

Para o estudante de ensino médio de Brasília Lucas Brendon, economia verde não está muito no seu dia a dia, não.
"Eu acho que economia verde é sobre plantações, florestas, não desmatar mais, arrancar árvore."

De Resende, Rio de Janeiro, Marcos Osório de Carvalho acabou de concluir o segundo grau e pensa diferente.

"Economia verde para mim é alguma coisa relacionada ao meio ambiente, reciclagem, você colaborar para o meio ambiente, separar os lixos, evitar o máximo de poluir o meio ambiente."

A verdade é que economia verde é um conceito em construção e não tem mesmo uma única definição. Apesar de estar entre os temas principais da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio +20, prevista para junho, e ser o mote das comemorações do Dia Mundial do Meio Ambiente, em 05 de junho, um dos poucos consensos que se têm hoje sobre o assunto é de que não existe um único caminho para "esverdear" a economia.

Nos últimos anos, crises econômicas, financeiras, climáticas, de energia, de acesso a água e alimentos têm atingido diferentes nações, ricas e pobres. A desconfiança em relação ao modelo econômico atual e a sua capacidade de autogerir os problemas motiva a busca por soluções que levem em conta não apenas a geração do lucro, mas também a melhoria do bem-estar social e a busca pela redução da escassez ecológica e dos riscos ambientais.

Para o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, o PNUMA, a economia verde pode ser considerada como aquela que emite poucos gases de efeito estufa, que seja eficiente no uso de recursos, além de socialmente inclusiva.

No discurso, talvez pareça simples. Mas não é.

Há 20 anos, na Rio-92, os países já haviam indicado a necessidade de um caminho para o desenvolvimento sustentável. Mas acordos não foram cumpridos. Os Estados Unidos, por exemplo, até hoje não aderiram ao Protocolo de Kyoto, compromisso com raízes na Conferência de 1992 que estipula metas para redução das emissões de gases estufa.

A expectativa é de que a Rio +20 possa, então, firmar rumos de ação, como explica a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira.

"Um dos caminhos sugeridos são o Objetivos do Desenvolvimento Sustentável. Porque você sugeriu no passado - e agora em 2015 a gente fecha uma etapa- os chamados Objetivos do Milênio, que são objetivos que mensuram avanços na pobreza, no meio ambiente em torno da inclusão social, proteção ambiental, educação. Isso é só para país em desenvolvimento. Se a gente quer ser ambicioso e falar em desenvolvimento sustentável para o planeta como um todo, a ideia que está na mesa em negociação é que você possa ter esses objetivos com uma métrica a ser definida e que envolva todos os países do planeta."

No meio diplomático, no entanto, os negociadores de nações em desenvolvimento não escondem a preocupação de que a economia verde sirva de pretexto para barreiras comerciais, imposições tecnológicas ou condicionalidades para ajuda externa.

O presidente da Comissão de Meio Ambiente da Câmara dos Deputados, Sarney Filho, do PV Maranhense, acompanhou a Eco-92 e vai participar da Rio +20. Ele alerta que, por trás dos debates sobre a economia verde, existe a tensão política deste momento de crise.

"Importante ressaltar que a chamada economia verde também está sendo usada para renovar a economia dos países desenvolvidos, que já está exaurida. Essa é uma faceta que se esconde atrás da questão ambiental, mas que tem que ser levada em conta e clarificada. Quer dizer, as coisas têm que ser muito transparentes, os ganhos transparentes, as transferências transparentes para que a gente possa avaliar se temos condições de efetivamente colocar a economia verde como um dos parâmetros de desenvolvimento no nosso século XXI."

Segundo o PNUMA, em 25 anos, a economia mundial quadruplicou, mas com um alto custo para o ambiente.
Um exemplo: atualmente, 52% das espécies de peixes comerciais estão sobre-exploradas e 8% estão esgotadas.

Na agricultura, as práticas de cultivo usam mais de 70% dos recursos de água doce do mundo, contribuem com mais de 13% das emissões de gases de efeito estufa e estão relacionadas a 3 a 5 milhões de casos de envenenamento por pesticidas.

A forte presença dos combustíveis fósseis, como o petróleo, nas economias mundiais torna o setor responsável por dois terços da liberação de gases estufa na atmosfera, contribuindo para o aquecimento do planeta.

Mudar a lógica do sistema atual é complexo, mas possível.

Consultor de várias agências do sistema ONU e professor de Economia e Administração na Pós-Graduação da PUC/SP, Ladislau Dowbor dá um exemplo.

"A Coreia do Sul lançou um programa de US$ 36 bilhões de financiamento de transporte coletivo melhorado nas grandes cidades. Isso está gerando 960 mil empregos. E não só geram empregos e melhora situação social como conectam o financiamento com exigência de sistemas de transporte limpo, o que reduz emissões. Como é transporte coletivo, reduz o uso dos automóveis, o que contribui também para a redução das emissões. E como as empresas são obrigadas a inovar em termos tecnológicos promovem o salto tecnológico da Coreia do Sul para um novo patamar tecnológico já de século XXI e não de um sistema sujo do século passado."

O importante, segundo Dowbor, é aliar iniciativas individuais com políticas públicas adequadas em nível local, nacional e internacional.

"Estamos enfrentando uma mudança de cultura do desenvolvimento. Isso envolve desde como a pessoa disponibiliza o lixo e separa e leva latinha de conserva e joga separada para poder ser reaproveitada como envolve também atitude de uma prefeitura, de uma organização social da cidade. Eu, por exemplo, vou dar uma palestra e vou pegar meu carro. Eu gostaria de usar transporte coletivo. Quando trabalho em Paris ou outra cidade, eu ando de metrô. Aqui preciso pegar meu carro porque a infraestrutura de transporte é lamentável porque os prefeitos são eleitos com dinheiro das empreiteiras e montadoras."

Segundo o PNUMA, seria necessário um investimento de 1% a 2% do PIB mundial para colocar a economia mundial em um caminho de crescimento com baixos índices de emissões de carbono. Os recursos são equivalentes aos subsídios direcionados aos combustíveis fósseis em 2008, de aproximadamente 1% do PIB do planeta.

De Brasília, Ana Raquel Macedo

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