Rádio Câmara

Reportagem Especial

Panorama da Educação no Brasil - A falta de vagas nas creches e a baixa qualidade no Ensino Fundamental (08'51")

15/06/2011 - 00h00

  • Panorama da Educação no Brasil - A falta de vagas nas creches e a baixa qualidade no Ensino Fundamental (08'51")

Todos os dias, moradoras de Planaltina de Goiás acordam de madrugada porque precisam trabalhar. Como não conseguem vagas em creches públicas, elas deixam os filhos na casa de Maria Madalena de Moraes.

"As mães chegam aqui às 5h40 da manhã. O bebê vem dormindo e eu pego no carrinho e coloco na cama. Aí, pegam 7h da noite. Já sai todo mundo banhadinho, todo mundo jantado. A mãe traz e eu faço o alimento."

Atualmente, 12 crianças com até 7 anos de idade ficam sob os cuidados de Maria Madalena e de uma parente - nenhuma das duas fez qualquer curso em educação. A creche improvisada funciona na casa onde Maria Madalena mora de favor.

"Onde as crianças brincam aí, tem quintal?´ Tem um quartinho reservado para elas. ´Com brinquedo, assim, que elas ficam brincando?´ Não tem brinquedo, ´causa´ que eu não posso, assim, comprar... Às vezes, a mãe traz um brinquedo, quando devolve, ela leva de volta para casa."

Apesar da informalidade, mães como Jumária dos Prazeres Santos, não têm opção. É lá que a diarista, que ganha R$ 640 por mês deixa a filha de cinco anos para poder trabalhar.

"A Madalena, no momento, ela está sendo a solução pra gente que deixava nossos filhos na creche pública, porque a creche foi fechada e então é a única opção que a gente tem no momento e ela cobra um preço de acordo com que a gente pode pagar - eu mesmo só pago R$ 50 pra ela."

A realidade não era para ser assim. Dez anos atrás, o primeiro Plano Nacional de Educação tinha entre as suas quase 300 metas, uma que era colocar metade das crianças com até 3 anos em creches gratuitas.

O prazo acabou no ano passado e não chegamos nem perto disso. Hoje, apenas 17 em cada 100 crianças com até cinco anos de idade conseguem vagas em creches ou pré-escolas gratuitas, segundo a presidente da Undime, a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação, Cleusa Repulho.

"Hoje a gente já sabe que seriam necessárias pelo menos 20 mil unidades para atendimento de creche e pré-escola no Brasil. A partir de 2016, nós temos que ter todas as crianças de quatro anos na escola. Se nós não começarmos agora, vai chegar 2016 e nós não vamos ter vagas para todo mundo."

Para a representante dos secretários municipais de educação, o problema é que, apesar de as creches e pré-escolas serem uma obrigação das prefeituras, elas não têm dinheiro suficiente para oferecer o número de vagas necessárias.

"As crianças ficam na creche das 7h da manhã às 7h da noite. Cinco refeições por dia. O número de profissionais por grupo de crianças é menor. Só que hoje não é o maior valor de repasse no Fundeb."

A Câmara dos Deputados está discutindo o novo Plano Nacional de Educação, o PNE, que vai trazer as metas que o Brasil deve atingir na área até 2020. Entre elas, está que metade das crianças com até três anos devem ter vagas em creches gratuitas, exatamente a mesma meta de dez anos atrás.

O secretário-executivo adjunto do Ministério da Educação, Francisco das Chagas, fala das sugestões do governo federal para tirar esses objetivos saiam do papel.

"A União ajudar os municípios na construção de creches. Então essa é uma ação no sentido de ajudar os municípios. A outra é (aumentar) o valor mínimo per capita do Fundeb para a educação infantil."

Mas se por um lado faltam vagas para educação dos brasileirinhos com até cinco anos, quando se trata de ensino fundamental, a realidade se inverte.

Hoje, esta etapa é considerada universalizada, ou seja, 98% das crianças de 6 a 14 anos estão na escola. Mas para a presidente da Undime, Cleusa Repulho, esses 2% que faltam não podem ser esquecidos.

"Qualquer percentual no Brasil significa aí 600 mil, 700 mil crianças fora (da escola). O Unicef acabou de publicar quem são essas crianças: elas são negras, pobres, muitas em região metropolitana e crianças com deficiência."

É o que acontece na comunidade quilombola de Mumbuca, no Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, uma das regiões mais pobres do país. Lá, vivem 410 pessoas e a escola, com duas salas de aula em funcionamento, atende só crianças do 1º ao 4º ano do ensino fundamental. Depois disso, pouquíssimas continuam a estudar.

No caso de Wendel Ricardo Queiroz, de 16 anos, morador de Ceilândia, no Distrito Federal, o abandono da escola foi por pura falta de interesse. Ele conta por que parou de estudar na sétima série, depois de ser reprovado por três anos seguidos.

"Sei lá, não gostava mais da escola. Comecei a matar aula e não gostei mais da escola. Eu mais dormia que estudava."

Para o secretário-executivo adjunto do Ministério da Educação, Francisco das Chagas, é preciso atrair esses que estão fora da escola, por isso, o novo Plano Nacional de Educação prevê ações para incluir os indígenas, os deficientes e os muito pobres.

"É necessário ir atrás dessas crianças e colocar 100%, como diz a meta. Mas tem a questão da qualidade. E na qualidade tem a questão da repetência, da correção do fluxo... Por isso é importante ter metas sobre o Ensino Fundamental mesmo tendo atingido 98% de matrícula."

Para o presidente do Conselho Nacional de Educação, Antônio Carlos Ronca, a chave para aumentar a qualidade do ensino fundamental está no ensino integral, aquele em que as crianças ficam, no mínimo, sete horas na escola.

"Se você tem hoje 50 milhões de crianças, você tem mais ou menos três milhões de crianças em tempo integral. É muito pouco, porque essa, a meu ver, devia ser uma das metas para atingir 100% daqui a três anos. Porque é a meta que mais interfere na questão do combate à desigualdade."

Diane Cristine de Souza tem três filhos, um deles matriculado em uma escola pública integral. Pela manhã, o menino frequenta a escola normal e, à tarde, faz atividades extraclasse, como educação física, aulas de laboratório, etc.

Para Diane, a diferença entre a escola integral e a convencional se reflete pelo comportamento do filho que fica mais tempo na escola.

"É mais interessado nos estudos, vai revisar o que ele fez. E ela não. Ela chega e vai brincar. Ela só procura fazer as atividades de casa aí terminou, pronto. Ele não. Ele não. Ele já chega, já tenta procurar livros, se informar melhor do que está acontecendo, essas coisas."

A proposta do Ministério da Educação no novo Plano Nacional é que metade das escolas esteja oferecendo ensino integral até 2020. A meta também não é nova. Está prevista desde a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, a LDB, em vigor desde 1996, mas pouco se avançou.

A ampliação do ensino integral é apoiada pelos secretários municipais de educação. Mas a presidente da Undime, Cleusa Repulho, alerta: a meta pode não ser cumprida de novo em 2020.

"Hoje sequer eu tenho vaga para todo mundo na escola. Quem dirá em período integral. Então esse conceito de educação integral também precisa estar claro no plano."

Oferecer atividades educacionais por mais tempo pode ajudar a sociedade brasileira a vencer outros desafios, como acabar com o analfabetismo, que atinge 14 milhões de brasileiros com mais de 15 anos. Lembrando que essa meta já existe há 23 anos.

Para evitar que parcela da população continue sem saber ler e escrever, a proposta é que, até 2020, todas as crianças sejam alfabetizadas até oito anos, ou seja, até o 3º ano do ensino fundamental.

Isso evitaria o que hoje está acontecendo com Reildo de Oliveira, de 11 anos, morador da cidade de Central, na Bahia. Ele deveria estar no 6º ano, mas não consegue passar da 3ª série...

"Eu fui para a terceira e aí viram que eu estava muito lerdo para leitura, aí tive que voltar. ´Mas até agora você não consegue ler?´ Só um pouquinho´. Por exemplo, o seu nome você sabe escrever, o nome da sua mãe... 'não. 'não?' não.."

Segundo dados do movimento Todos pela Educação, se o pai é analfabeto, o filho tem uma chance em três de também não saber ler e escrever. Se os pais tiverem se formado na faculdade, essa probabilidade cai a praticamente zero.

De Brasília, Ginny Morais

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