Rádio Câmara

Reportagem Especial

O Natal ao redor do mundo - Solidariedade entre os povos africanos (07'58'')

20/12/2010 - 00h00

  • O Natal ao redor do mundo - Solidariedade entre os povos africanos (07'58'')

As inúmeras etnias e religiões genuinamente africanas não conservam mais a identidade cultural do passado.

Os europeus e os árabes impuseram à África seus costumes cristãos e islâmicos milenares. Alguns cultos afros politeístas, também milenares, ainda resistem a essa influência estrangeira, mas a maioria das religiões africanas perdeu-se ou se transformou em meio aos processos de catequização.

Vamos pegar o exemplo da Guiné Bissau, país da costa oeste africana colonizado por Portugal e que só teve a independência reconhecida em 1973. Seu território é relativamente pequeno. A Guiné Bissau abriga cerca de 30 grupos étnicos diferentes numa área menor do que a do estado do Rio de Janeiro.

Muitos desses povos são politeístas e suas celebrações eram muito ligadas a elementos da natureza e do cosmos, como o sol, a lua, a chuva e o vento.

O estudante guineense Gorki Joaquim pertence à etnia balanta, também presente em terras do Senegal e de Gâmbia. Ele pôde acompanhar de perto o declínio da tradição religiosa africana a partir da propagação das celebrações estrangeiras, inclusive o natal.

"Os povos africanos, principalmente da minha etnia, manifestam o dia de Natal, mas de uma outra forma que não é o Natal ocidental. Eles comemoram esse dia com a primeira chuva: a primeira chuva que cai na terra, eles fazem uma festa para chamar o Deus da Agricultura para que haja uma boa colheita nesse ano. Mas depois, com esse Natal ocidental, acabou que essas coisas de tradição perderam a tradição africana. Quando eu tinha nove ou 10 anos de idade, havia essa tradição da primeira chuva. Cada etnia da Guiné Bissau tem a sua tradição".

Gorki Joaquim tem hoje 28 anos e estuda sociologia na Universidade de Brasília. Como o Cristianismo lá da Guiné Bissau é o mesmo difundido em todas as ex-colônias européias espalhadas pelo mundo, Gorki não vê muita diferença entre o Natal comemorado aqui no Brasil e nas áreas urbanas de seu país.

"Natal não é uma cultura dos países periféricos. Foram os colonizadores que trouxeram o Natal. Guiné-Bissau foi colonizada por Portugal, aí a gente comemora o Natal como os brasileiros comemoram o Natal: a família tem que estar junto, convidam-se amigos para participar do Natal. É igual no Brasil: as pessoas compram roupas para as crianças, vão para o supermercado para comprar coisas para as crianças".

O quadro é o mesmo em Cabo Verde, arquipélago africano de colonização portuguesa. Quem conta é a estudante caboverdeana Denise Fernandes, que faz geografia na UnB.

"É a época que mais junta a família, porque Cabo Verde tem muitos emigrantes que, aí, aproveitam a época do Natal para ficar junto com a família e festejar o Natal em família. É bem baseado na culinária portuguesa: bacalhau, cabrito, porco."

MÚSICA: "Boas festas" (de Luis Morais/Cabo Verde)
"Boas festas!
Senhor São Silveste, mandans pa li ness casa
Ali ness casa do senhor e da senhora
Para tirar uma oferta grandiosa
Para repartir a todos nossos companheiros
O da ka, O da ka, s´bo ti ta da ka
S´bo ka ti ta da ka um ta manda Jorge pa remetê
E obrigada pess oferta grandiosa
Da nos vida e saúde pá otr´one pá no torna bem..."

Apesar de uma certa padronização mundial na comemoração do Natal, cada etnia ou grupo religioso africano acaba incorporando um ou outro pequeno elemento às celebrações do nascimento do filho de Deus.

Os coptas, que são os cristãos ortodoxos do Egito, fazem um jejum de carnes e laticínios nos 40 dias que antecedem o Natal. A compensação, porém, vem na ceia natalina, repleta de pão, alho, arroz, carne fervida e fata, que é um prato egípcio típico.

No Quênia, parte da população aproveita a data para visitas aos amigos ao longo do dia. Quem tem condições financeiras não deixa de oferecer bebida, pão e carne ao visitante durante o período natalino.

Já na emergente África do Sul, a ceia de Natal costuma acontecer no quintal ou no jardim de casa para espantar o calor de dezembro.

MÚSICA: "Sing noel"
"O come ye people gather here
To hear the news of good cheer
The King of Kings
The Lamb of God
Is born today in Bethlehen
Sing Noel! (Sing Noel, sing Noel, Noel, Noel)
Sing Noel, Noel, O sing Noel, Noel. O Sing!..."

Entre os balantas da Guiné Bissau, Senegal e Gâmbia, há o costume de se criar animais durante o ano, especialmente para que sejam saboreados na ceia, como conta o guineense Gorki Joaquim.

"A única coisa diferente que tem no interior do país é essa coisa de criar animais durante seis meses. Por exemplo, o cara cria galinha ou galo durante seis meses só para preparar esse galo para o Natal. Ou preparar um cabrito para o Natal. Só para o Natal. Aí, ele é intocável. Aí, os grupos, a juventude, também faz um trabalho comunitário, juntando dinheiro e esse dinheiro vai servir, no dia de natal, para comprar algumas coisas, como óleo, arroz e algumas coisas de necessidade básica para o natal".

Mas como será o Natal dos países mergulhados em guerra civil e assolados pela fome, pela miséria e pela Aids?

Bem, nesse caso, as lembranças festivas do nascimento de Cristo, da farta ceia natalina e dos presentes de Papai Noel não passam de pura ficção.

O Natal em algumas áreas de Uganda, Etiópia, Ruanda, Eritreia, Sudão, Zimbábue, República Democrática do Congo, entre outros, depende muito das ações humanitárias e solidárias desenvolvidas por organismos internacionais.

MÚSICA: "Noel" (de Selah)
"Kana nge zola ku zaba mwana
Nge fwiti kwisa ku fukama
Kana nge zola ku zaba mwana
Noel, Noel
Yesu me kwisa ku zinga ti beto
Noel, noel
Yesu me kwisa ku zinga ti Beto..."

Sob a crítica de alguns e o aplauso de outros, a comunidade cristã Jesus Mafa iniciou, ainda na década de 1970, uma representação africana do Novo Testamento.

Cenas marcantes do evangelho, como o nascimento de Jesus, por exemplo, foram pintadas com base nas formas físicas de moradores de uma pequena vila da República dos Camarões. O resultado dessa representação está disponível no site www.jesusmafa.com

MÚSICA: "Noel" (de Selah)
"Noel, Noel
Yesu me kwisa ku zinga ti beto
Noel, noel
Yesu me kwisa ku zinga ti Beto..."

De Brasília, José Carlos Oliveira

A abordagem em profundidade de temas relacionados ao dia a dia da sociedade e do Congresso Nacional.

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