Rádio Câmara

Reportagem Especial

A busca pela beleza - Padrão de magreza e juventude se impõe a ricas e pobres (07'35'')

22/03/2010 - 00h00

  • A busca pela beleza - Padrão de magreza e juventude se impõe a ricas e pobres (07'35'')

Querer ser bonito é uma busca universal. No mundo animal, os mais belos tem a primazia na busca por um parceiro.

As flores mais bonitas e cheirosas atraem insetos que podem ajudar na reprodução da planta. Ser bonita nesse caso é questão de sobrevivência. Com homens e mulheres não é diferente. Como destaca a psicóloga e professora da Universidade de Brasília, Sueli Guimarões, ser bonito está relacionado com se sentir bem.

"Em se falando do ser humano atrair o ser humano inclui também atrair um parceiro, criar uma família, ter uma estabilidade emocional, nós percebemos que a beleza efetivamente media o alcance do bem estar entre as pessoas."

Se buscar a beleza não é novo e nem sequer um problema, a questão que se coloca hoje é a padronização do que seja o belo.

O padrão de hoje valoriza a magreza e a juventude materializada nas modelos de revista. A beleza desejada hoje parece ter saído da beleza normal, comum.

Segundo a coordenadora do Núcleo de Doenças da Beleza da PUC do Rio de Janeiro, Joana Novaes, mulheres de barracos na favela até as de mansões em bairros nobres buscam a malhação e os procedimentos estéticos para atingir esse padrão.

As mais pobres improvisam aparelhos de ginástica e entram na fila das cirurgias gratuitas, e dizem claramente que desejam ficar bonitas para impressionar os homens.

Já as mulheres de classe média e alta adotam o discurso de ficarem bonitas para si mesmas. No entanto, parece haver uma maneira mais livre na maneira como as mulheres pobres lidam com o próprio corpo.

Depois de quase quinze anos de pesquisas, Joana Novaes destaca que as mulheres com mais dinheiro, ao ganhar um pouco de peso, já começam a restringir as idas à praia, o tipo de roupa que usam e até o namoro com os parceiros.

Já as mais pobres até se percebem fora do padrão, mas não ficam prisioneiras do corpo acima do peso.

"Tem um advérbio aí que é muito interessante, parece que as mulheres pobres ainda usam e que a coisa se perdeu no caso das mulheres das classes mais abastadas: eu não me limito, eu desfruto da minha sexualidade, apesar de. Que é o grande peso, a grande exclusão socialmente validade de se estar gordo, você não poder usufruir de uma série de benesses e de aspectos da vida social cotidiana."

Mas essa busca pela beleza permite a imperfeição e o envelhecimento? É possível estar fora do padrão e ser feliz? A empresária Ana Pimenta é uma voz dissonante em meio ao padrão. Ela conta que estar acima do peso nunca a limitou, e até conheceu seu marido quando estava de biquíni.

Apesar de se dizer realizada, ela admite que percebe os olhares de julgamento por causa de sua forma física.

"A sociedade trata o gordo como uma pessoa sem caráter, uma pessoa fraca, como alguém que sucumbe a todo tipo de desejo, de tentação, mas eu enfrento isso e me sinto uma pessoa muito bem sucedida, em todos os aspectos da minha vida."

E se a busca da beleza desde sempre atendeu aos anseios por encontrar um parceiro, Ana destaca que nunca ficou sozinha.

Casada e com um filho, ela brinca e diz que agora está na reserva. Mas explica porque sempre teve facilidade de se relacionar.

"Eu nunca fiquei sozinha, graças a Deus eu sempre me relacionei, nunca tive problema com isso. Mas eu nunca sonhei em me relacionar, em buscar algo que não era possível pra mim, que não era real pra mim. Como eu tenho uma percepção muita clara da realidade, que sou uma pessoa real, que sou cheia de defeitos, eu sempre busquei me relacionar com pessoas reais, pessoas tolerantes, pessoas cheias de defeitos, pessoas normais como eu."

Se a magreza hoje é um dos principais valores associados à beleza, o que dizer da juventude? Em busca desse frescor, estrelas do cinema como Meg Ryan, Chér e outras, fizeram intervenções no rosto que mudaram completamente suas feições.

Segundo o psiquiatra Raphael Boechat, essa busca exagerada é uma marca dos tempos de hoje. Só que o exagero na busca da imagem perfeita geralmente vem acompanhada de outros distúrbios: depressão, ansiedade, abuso de álcool e drogas.

Ele aponta que as pessoas que mais sofrem são aquelas que têm a beleza como o maior valor de suas vidas.

"E aquelas pessoas que basearam a sua vida toda ela sobre a beleza física, não fizeram mais nada de muito importante, isso vai ser um sofrimento muito grande, porque a beleza física mais cedo ou mais tarde vai passar, por esse estereótipo de beleza física que a gente tenta colocar, esse estereotipo de beleza sem rugas, magrinha, etc. Isso não tem como brigar contra o tempo, isso vai passar. Algumas não aceitam isso porque investiram a sua vida toda em cima dessa beleza."

Raphael Boechat destaca o desafio dos pais de hoje, para transmitir aos filhos valores mais amplos do que a beleza física.

Ele aponta que esse é o caminho mais eficaz para que, ao envelhecer, as pessoas aceitem as marcas do tempo.

Para Tércia Guimarões, essa aceitação não é sinônimo de comodismo. Aos 54 anos, loira e muito bonita, ela não abre mão de cuidados com o corpo e com o rosto.

Depois de ter criado os quatro filhos, aos 45 anos fez plástica na barriga e nos seios. Tércia diz que não pretende fazer outras, mas que desfruta os efeitos da cirurgia até hoje.

No rosto, ela não dispensa os cremes anti-idade. Mas sobre as marcas do tempo, ela mostra uma visão bem tranquila.

"Você tem que aprender a gostar de você e aprender que o tempo, algumas marquinhas no rosto, representam a sua história. Essas marquinhas representam os filhos que você teve, a trajetória profissional que você teve, as coisas legais que você fez."

Além dos cuidados, Tércia conta um outro segredo de beleza.

"E eu acho que não é só você se cuidar não.Bom humor é uma plástica fantástica todos os dias."

Hoje, homens e mulheres têm a tecnologia a seu favor para driblar a correria do tempo. Envelhecer com sabedoria é um dos desafios da modernidade. Mas para conviver bem com o corpo, a melhor técnica é estar bem por dentro. E nesse lugar, o bisturi e os cremes ainda não conseguem atuar.

De Brasília, Daniele Lessa

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