Rádio Câmara

Reportagem Especial

Reabertura política do Brasil sofreu artimanhas do destino, com a morte de Tancredo (08'49'')

13/04/2009 - 00h00

  • Reabertura política do Brasil sofreu artimanhas do destino, com a morte de Tancredo (08'49'')

Passada a derrota da emenda Dante de Oliveira na Câmara, que visava restabelecer eleições diretas para o presidente do Brasil, a classe política passou a articular os passos seguintes para a reabertura política.

Esperidião Amin era governador eleito de Santa Catarina pelo PDS, partido do governo militar, na época das Diretas Já.

Quando a emenda Dante de Oliveira foi derrotada, Esperidião Amin disse ter vislumbrado espaço para que o próprio sistema propusesse as eleições diretas.

Como havia evidências de que o seu partido, o PDS, ficaria dividido no colégio eleitoral para eleger indiretamente o presidente da República, Amin aconselhou ao presidente Figueiredo que propusesse a volta das eleições diretas.

"Eu ponderei ao presidente Figueiredo, na presença de outros governadores, em junho de 1984, depois, portanto de a emenda Dante de Oliveira ter sido derrotada em abril de 84 ..., eu disse: 'quem deve propor eleição direta é o senhor, o senhor proponha isso como presidente da república, sairá nos braços do povo e vai desvalorizar os traidores. Vai retirar esse poder de barganha de pessoas que não são ideologicamente a favor da eleição direta, pessoas que vão negociar cargos com o candidato Tancredo Neves. O senhor vai desvalorizar os traidores, vai desvalorizar os oportunistas e vai melhorar a qualidade da política brasileira se o senhor permitir a eleição direta. Faça isso, preserve a sua memória, dê ao Brasil este presente', foi isso o que eu defendi perante o próprio presidente Figueiredo. Infelizmente, ele alegou que não poderia afrontar as forças armadas, foi uma conversa dramática."

Mas os rumos de um novo colégio eleitoral para eleições indiretas para presidente da república já estavam sendo traçados.

No dia 19 de junho de 1984, Tancredo Neves foi indicado candidato da oposição à sucessão presidencial. No mês seguinte, José Sarney aceitava ser o vice de Tancredo Neves pela Frente Liberal.

Em agosto, o PDS elegeu Paulo Maluf como candidato do partido à presidência da República.

No dia 15 de janeiro de 1985, o Congresso Nacional se reuniu novamente para uma sessão histórica: o colégio eleitoral, que decidiria a disputa entre Tancredo Neves e Paulo Maluf pela presidência da República.

Na ocasião, falando em nome do candidato das oposições, Ulysses Guimarães alardeou as mudanças que estavam para acontecer no país:

"O governo democrático tem parceiros, e não súditos. Os parceiros são o governo, os trabalhadores e os empresários. O governo democrático não se esgota e nem se confina nos palácios. Não se esconde porque é visível e transparente, convive, anda, fala e ouve, decide pela autoridade do argumento e não pelo argumento da autoridade".

O mineiro Tancredo Neves foi eleito, aos 74 anos, para a Presidência da República, com 480 votos no Colégio Eleitoral, contra 180 de seu oponente Paulo Maluf.

O presidente do Congresso Nacional, senador Moacyr Dalla, anunciou o resultado.

"Proclamo eleito Presidente da República Federativa do Brasil, para o período a iniciar-se em 15 de março de 1985, sua excelência, o dr. Tancredo de Almeida Neves."

Mas o destino tinha outros caminhos para o Brasil. Um dia antes da posse, em 14 de março, Tancredo passou mal e foi internado no hospital de Base de Brasília.

O vice, José Sarney, foi empossado interinamente, sem receber a faixa presidencial de João Figueiredo, que se recusou a praticar o ato.

No dia 21 de abril de 1985, o secretário de imprensa da Presidência da REpública, Antônio Britto, deu a notícia que ninguém queria ouvir:

"Lamento informar que o excelentíssimo sr. presidente da república, Tancredo de Almeida Neves faleceu esta noite, no instituto do coração, as dez horas e vinte e três minutos. Acrescento o seguinte; nos últimos cinquenta anos a vida pública de Tancredo Neves confundiu-se com os sonhos e com os ideais brasileiros de união, de democracia, justiça social e de liberdade. Nos últimos meses, pela vontade do povo e com a liderança de Tancredo Neves, estes ideais se transformaram na nova república. A emocionante corrente de fé e solidariedade das últimas semanas, enquanto o presidente Tancredo Neves lutava pela vida, só fez crescer o sentimento de união, que foi sempre ação, exemplo e objetivo de Tancredo Neves. Com a mesma fé, com a mesma determinação, o Brasil haverá, a partir de agora, de realizar os ideais do líder que acaba de perder, Tancredo Neves".

Passados 25 anos dos primeiros comícios das Diretas Já, o Brasil é uma democracia, exercitada pelos brasileiros em cinco eleições diretas para Presidente da República.

O cientista político da Universidade de Brasília, Octaciano Nogueira, faz uma análise do legado desse período histórico para a atual realidade brasileira.

Ele destaca que a rejeição da emenda Dante de Oliveira pela Câmara provocou grande frustração na população, mas ajudou ainda mais a mobilizar os cidadãos em torno da democracia.

"Isso foi o estopim que fez disseminar essa aspiração pela volta do país à democracia e pelo restabelecimento das eleições diretas. Mesmo porque, é preciso lembrar, desde 1982, tinha voltado as eleições diretas, já tinham sido adotadas, para os governos estaduais. Então isso cristalizou na opinião pública a necessidade de que o país não voltaria à democracia enquanto não tivesse o direito de eleger seu presidente da república."

Para Octaciano Nogueira, nos dias de hoje não existe mais espaço para um movimento tão grande quanto o das Diretas Já, porque o país vive uma democracia plena.

"Em condições normais, essas mobilizações extraordinárias perdem o sentido. Porque hoje você tem os canais institucionais, você tem um judiciário independente, você tem o Congresso funcionando com absoluta liberdade, você tem o executivo sob controle, não só da opinião pública, como também dos demais poderes do estado."

O jornalista Ricardo Kotscho é autor de um livro sobre as Diretas e foi repórter oficial da Folha de São Paulo dos comícios.

Ele espera que nosso país não tenha que passar por um movimento tão intenso novamente, porque era característico de uma ditadura, muito diferente de nossa realidade hoje.

"Eu acho muito difícil, espero que não seja necessário, enquanto eu estiver vivo, que o Brasil se mobilize de novo como na campanha das Diretas."

O Datafolha realizou recentemente uma pesquisa sobre as Diretas já. Embora a maioria da população tenha ouvido falar do movimento, apenas 35% sabem dizer exatamente o que foi o Diretas Já.

Entre os entrevistados de 16 a 24 anos, 60% disseram nunca ter ouvido falar desse movimento, que marcou uma quebra na história de nosso país.

De Brasília, Adriana Magalhães.

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