Rádio Câmara

Reportagem Especial

REPRISE - Especial Brasília 1 - No princípio, era o ermo ... (11'58'')

21/04/2008 - 00h00

  • REPRISE - Especial Brasília 1 - No princípio, era o ermo ... (11'58'')

A RÁDIO CÂMARA APRESENTA NESTA SEMANA UMA SÉRIE DE REPORTAGENS ESPECIAIS EM HOMENAGEM À BRASÍLIA. DE HOJE À QUINTA-FEIRA, VAMOS MOSTRAR AS DIFICULDADES QUE A CAPITAL BRASILEIRA ENFRENTA AO COMPLETAR 47 ANOS DE FUNDAÇÃO. A PRESERVAÇÃO COMO PATRIMÔNIO DA HUMANIDADE E A INFLUÊNCIA DISSO NO DIA A DIA DA CIDADE. QUEM SÃO OS HABITANTES DE BRASÍLIA QUASE MEIO SÉCULO DEPOIS DA EPOPÉIA DE SUA CONSTRUÇÃO. QUAIS SÃO OS MAIORES PROBLEMAS ENFRENTADOS PELA POPULAÇÃO E OS DESAFIOS PARA O FUTURO.

NESTA PRIMEIRA MATÉRIA, VAMOS RELEMBRAR A PRÉ-HISTÓRIA DA CAPITAL, QUE CULMINA NA INAUGURAÇÃO, EM 21 DE ABRIL DE 1960.

SINFONIA DA ALVORADA - "No princípio, era o ermo..."

A história de Brasília começou muito tempo antes da inauguração, em 1960. Na verdade, começou mais de um século antes, quando o patriarca da independência, José Bonifácio, em 1823, começou a defender a transferência da capital para o interior. Também no século 19, em 1833, o padre italiano Dom Bosco teve seu famoso sonho, em que imaginava uma terra pródiga surgindo entre os paralelos 15 e 20, exatamente a localização de Brasília. A constituição de 1891 previa a demarcação da área da futura capital, no desabitado planalto central do Brasil. Dessa forma, criou-se uma comissão chefiada pelo astrônomo Luís Cruls para definir o melhor lugar para a construção da nova capital. Foi escolhido um local banhado por inúmeras nascentes e cursos dágua.

SINFONIA DA ALVORADA - "Eram antigas solidões sem mágoa, O altiplano, o infinito descampado...No princípio era o agreste: O céu azul, a terra vermelho-pungente. E o verde triste do cerrado."

A idéia de construir uma nova capital não foi esquecida no século vinte. Mas ela realmente ganhou força e uma promessa de realidade com um discurso do candidato à Presidência Juscelino Kubitscheck, em 1955, na cidade goiana de Jataí. Lá, ele prometeu cumprir a Constituição e trazer a capital para o interior do país.

Em 1956, já com JK presidente, a localização exata da nova capital já estava definida. Dentre os vários aspectos estudados e analisados, o clima e a hidrografia foram preponderantes. Juscelino elegia Brasília como um retrato de seu governo voltado ao desenvolvimento do país. Em setembro daquele ano, foi sancionada a lei que dispunha sobre a mudança da capital federal e criava a Companhia Urbanizadora da Nova Capital do Brasil, a Novacap. O Coronel Affonso Heliodoro, que era sub-chefe do Gabinete Civil de Juscelino na época da construção, lembra que logo depois de inaugurado o Catetinho, as obras começaram.

"Porque Juscelino tinha pressa em fazer. Ele iniciou o Palácio da Alvorada antes de aprovada a mudança para Brasília... Realmente eram distâncias, hoje, essas distâncias que a gente percorre aí, a gente percorria isso aí no mato praticamente. Então você saia do Palácio do Alvorada, na obra, para ir à granja do Torto, era uma viagem."

SINFONIA DA ALVORADA - "Sim, era o Homem, Era finalmente, e definitivamente, o Homem. Viera para ficar. Tinha nos olhos A força de um propósito: permanecer, vencer as solidões E os horizontes, desbravar e criar, fundar E erguer. Suas mãos Já não traziam outras armas Que as do trabalho em paz. Sim, Era finalmente o Homem: o Fundador.”

Mesmo antes de se escolher o projeto que iria dar corpo à nova capital do Brasil, começaram a chegar ao ermo planalto central do Brasil ônibus e mais ônibus trazendo gente. Gente que via naquela terra vermelha e naqueles horizontes abertos uma promessa de vida melhor. Gente que vinha de cada canto do país, querendo emprestar à nova capital seu sotaque, seus costumes, escrevendo, com seu próprio suor, a história do Brasil. Gente que trabalhava incansavelmente nas várias obras que surgiam a cada dia, como lembra o coronel Heliodoro.

"Você saía de casa por um caminho, quando você voltava, aquele caminho já era uma obra. Ou era um buraco, um muro já levantando. Era uma coisa de um dinamismo nunca imaginado e nunca visto."

“E ao crespúsculo, findo o labor do dia, as rudes mãos vazias de trabalho e os olhos cheios de horizontes que não têm fim, partem os trabalhadores para o descanso, na saudade de seus lares tão distantes e de suas mulheres tão ausentes.” (cd sinfonia)

Naquele mesmo ano de 1956, era lançado o edital do concurso para a escolha do melhor projeto para a Nova Capital do Brasil. Era um concurso aberto a profissionais brasileiros, com júri internacional. A filha de Lúcio Costa, Maria Elisa, ainda era uma estudante de arquitetura na época em que seu pai escrevia, na varanda do apartamento, a história do Brasil, na forma dos desenhos e croquis da nova capital, hoje conhecidos por todos os brasileiros.

"E aí, ele se inscreveu, ninguém sabia, ele fez Brasília absolutamente sozinho, em casa, é uma coisa impressionante. Ninguém sabia que ele tinha se inscrito, como é que ia ser, nada. Então, aconteceu uma coisa que eu só percebi o tamanho do que estava acontecendo uns 20 anos depois. Um dia ele me chamou. Ele trabalhava numa varanda de fundo que a gente tinha no apartamento, chamava terraço de trás, me chamou como filha e como estudante de arquitetura, quer dizer, uma ótima cobaia para fazer essa experiência. Ele me explicou, ele tinha um primeiro esboço do plano, ainda não completo, e me explicou como Brasília ia ser. Imagina você, eu escutei isso. Eu achei tudo normal... Quando ele acabou de me explicar como ia ser aquela cidade, ele estava com a camisa encharcada de suor. De emoção, porque foi a 1ª vez que ele verbalizou uma idéia que estava na cabeça."

Maria Elisa lembra que foi uma correria a entrega do material, já que o projeto de Lúcio Costa foi entregue dez minutos antes do encerramento do prazo final do concurso. A família toda participou da montagem final do projeto, em casa. Maria Elisa conta que ficou sabendo, anos depois, da expectativa da comissão organizadora do concurso, pois, até a chegada do projeto de Lucio Costa, nenhum trabalho havia despertado o interesse dos examinadores.

"Quando eles abriram o pacote, que eles viram isso, que para a gente é uma coisa tão comum, que é a forma de Brasília, eles botaram a mão na cabeça, eles acharam que Lucio tinha viajado, surtado, porque a expectativa era para alguma coisa que tivesse uma cara um pouco mais conhecida como cidade, seja moderna, seja tradicional. E aí a gente percebe quanto Brasília é uma criação."

Participaram do concurso 41 projetos apresentados por 26 concorrentes. Um dos examinadores foi Oscar Niemeyer, escolhido pessoalmente por JK para assinar os projetos arquitetônicos dos prédios da nova capital. Dentre os projetos, havia de tudo. O projeto que ficou em terceiro lugar, por exemplo, previa que a população de Brasília moraria em edifícios residenciais gigantescos, de 70 andares, com 16 mil residentes cada com. O projeto vencedor, o de Lúcio Costa, representou o casamento entre a monumentalidade que a capital merecia e as características naturais do sítio em que ela seria construída. São as palavras do próprio Lucio Costa que explicam a essência de Brasília.

PALAVRAS DE LÚCIO COSTA - "nascida do gesto primário de quem assinala um lugar ou dele toma posse: dois eixos que se cruzam em ângulo reto, ou seja, o próprio sinal da cruz."(cd sinfonia)

É é ainda o próprio Lucio Costa, morto em 1998, quem explicou nesta entrevista o processo de criação da Praça dos 3 Poderes.

"me ocorreu aquela idéia de concentrar os 3 poderes ... não um Versailles do monarca".

Lucio Costa, em uma das últimas entrevistas que fez antes de morrer, revelou que Brasília não foi feita no formato de um avião, como é lenda na história da cidade. Ele disse que seria imbecil fazer uma cidade na forma de um avião, e afirmou que Brasília se parece mais com uma borboleta. Os edifícios de Brasília têm a assinatura e a cara de Oscar Niemeyer. Nas palavras do arquiteto está a definição da relação entre o concreto e a luz, que se revezam nos principais monumentos da cidade e dão personalidade própria à cidade.

PALAVRAS DE NIEMEYER - "em que a arquitetura se destacasse branca, como que flutuando na imensa escuridão do planalto..." (CD SINFONIA).

NO dia 21 de abril de 1960, o sonho que começou em Dom Bosco e tomou força com JK foi concretizado com a inauguração de Brasília.

DE BRASÍLIA, ADRIANA MAGALHÃES.

NA EDIÇÃO DE AMANHÃ DA SÉRIE DE REPORTAGENS ESPECIAIS EM HOMENAGEM AOS 47 ANOS DE BRASÍLIA, AS CRÍTICAS, AS MUDANÇAS E ADAPTAÇÕES DA CIDADE, 47 ANOS DEPOIS DA INAUGURAÇÃO.

A abordagem em profundidade de temas relacionados ao dia a dia da sociedade e do Congresso Nacional.

De segunda a sexta, às 3h, 7h20 e 23h