Rádio Câmara

Reportagem Especial

Especial Violência no Trânsito 1 - A dor por trás de números trágicos(06'49")

10/03/2008 - 00h00

  • Especial Violência no Trânsito 1 - A dor por trás de números trágicos(06'49")

A VIOLÊNCIA NO TRÂNSITO É O TEMA DA REPORTAGEM ESPECIAL DESTA SEMANA. ATÉ SEXTA-FEIRA, VAMOS APRESENTAR CINCO MATÉRIAS QUE MOSTRAM OS ESTRAGOS QUE A IMPRUDÊNCIA DOS MOTORISTAS E AS MÁS CONDIÇÕES DE RUAS E ESTRADAS PROVOCAM NO PAÍS. VOCÊ VAI CONHECER TAMBÉM AS PROPOSTAS PARA ENDURECER A LEGISLAÇÃO DE TRÂNSITO E A OPINIÃO DE ESPECIALISTAS, DE VÍTIMAS DE ACIDENTES E DE REPRESENTANTES DO EXECUTIVO E DO LEGISLATIVO PARA SOLUCIONAR O PROBLEMA.

NESTA PRIMEIRA MATÉRIA, O REPÓRTER JOSÉ CARLOS OLIVEIRA CITA OS NÚMEROS QUE ESTÃO POR TRÁS DE UMA TRAGÉDIA DIÁRIA QUE DILACERA FAMÍLIAS.

"Infelizmente, houve um acidente com morte na rodovia Washington Luiz, pista em direção ao Rio, na altura da Vila São Luís, dentro do município de Duque de Caxias. O corpo da vítima foi colocado, agora há pouco, sobre o canteiro. O congestionamento na Washington Luiz é grande para quem está vindo de Petrópolis e da região serrana em direção ao Rio. As retenções começam no trecho entre a Reduc e a ponte sobre o rio Sarapuí, se estendendo até a Vila São Luís. Na pista em direção a Petrópolis, o motorista também vai encontrar um pouco de congestionamento, mas esta retenção se deve única e exclusivamente aos motoristas curiosos, que reduzem a velocidade para ver a desgraça alheia, lá do outro lado..."

Fatos como este acontecem às centenas, diariamente, nas estradas brasileiras. O número de mortes em decorrência do trânsito assumiu contornos de endemia. Em 2006, cerca de 35 mil pessoas perderam a vida em acidentes nas estradas e ruas do país. Esta já é a maior causa de mortes de crianças entre cinco e 14 anos de idade, seja como pedestre, ciclista ou passageiro. No caso dos motoqueiros, houve um aumento de 80 por cento no número de mortos, entre 2002 e 2006.

Quem sobrevive também ajuda a ampliar estatísticas aterradoras. Os feridos em acidentes de trânsito beiram a casa dos 400 mil por ano. Nos hospitais da Rede Sarah, por exemplo, eles correspondem a quase 39 por cento das internações relativas à incapacidade física. Estima-se em 28 bilhões de reais o prejuízo anual do Brasil com a tragédia no trânsito. Neste valor, calculado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, o Ipea, estão incluídas as despesas com remoção, atendimento médico, perda de cargas e custas judiciais relativas a acidentes ocorridos nas ruas e estradas do país. Esta cifra atinge valores astronômicos se ainda for considerado o fato de que a maioria das vítimas de trânsito perde a vida ou fica fisicamente incapacitada numa faixa etária de plenas produções econômica e intelectual.

"Iracema, fartavam 20 dias pra o nosso casamento
Que nóis ia se casar
Você atravessou a São João
Veio um carro, te pega e te pincha no chão
Você foi para Assistência, Iracema
Paciência, Iracema, paciência."

Todos os números trágicos em torno de acidentes e mortes, no entanto, tornam-se mera estatística distante da realidade quando comparados com a dor real e profunda que se abate sobre as famílias das vítimas do trânsito. A psicóloga Maria José Amaral está acostumada a ouvir relatos dramáticos sobre mudanças súbitas nas vidas de sobreviventes de acidentes e de parentes de vítimas fatais. Segundo ela, é preciso humanizar essa discussão: passar da estatística fria para o realismo da dor.

"O carro é apenas uma máquina. É o homem que está por trás desse volante que precisa, de fato, se reeducar, repensar essa situação, porque uma vítima de trânsito não constitui somente uma vítima. Ela é muito mais do que isso. Ela é um ser psicossocial que tem família, que tem sonhos, que está engajada numa comunidade. Vamos pensar em pessoas que são ceifadas de forma violenta por conta dessa falta de respeito que a gente ainda vê no trânsito."

Maria José Amaral conhece bem essa história não apenas como psicóloga mas também como a mulher que, no auge de uma vida feliz e bem estruturada, perdeu repentinamente a única filha, de 4 anos de idade, e a mãe lúcida e ativa mesmo aos 67 anos. Ambas foram atropeladas e mortas por um ônibus enquanto atravessavam uma rua, na faixa de pedestre, na zona norte do Rio. Era dezembro do ano 2000.

"Eu tinha uma única filha. Vivíamos eu e essa filha, Carolina, e minha mãe, dona Josefa. Era época natalina e as duas foram atropeladas. Elas vieram a falecer e isso causou muito sofrimento à minha vida. E ali eu percebi que as pessoas precisavam de muito mais apoio."

Maria José Amaral superou a dor das perdas da única filha e da mãe por meio da solidariedade a pessoas que sofreram dramas semelhantes. Em 2003, ela criou o Núcleo de Apoio às Vítimas de Trânsito, que funciona no Detran do Rio de Janeiro e já prestou atendimentos psicológico e jurídico a quase 6 mil vítimas diretas e indiretas de acidentes de trânsito.

De acordo com as estatísticas, a esmagadora maioria dos acidentes de trânsito é causada por falha humana. Problemas mecânicos nos veículos e a má conservação das ruas e estradas representam um percentual relativamente pequeno em relação à origem dos acidentes. O chefe de comunicação da Polícia Rodoviária Federal, inspetor Alexandre Castilho, confirma que o motorista é mesmo o principal vilão dessa tragédia diária no trânsito.

"Em 2007, nós registramos mais de 2 milhões e cem mil casos de infração. Um número absurdo. Inclusive, é recorde histórico da Polícia Rodoviária Federal em 80 anos de existência. E todas essas infrações - ou pelo menos 90 por cento delas - estão relacionadas ao comportamento do motorista, à imprudência do motorista: excesso de velocidade, ultrapassagens indevidas, falta de atenção ao volante, enfim, condutas de trânsito que acabam antecipando o momento do acidente."

Motoristas que dirigem sob o efeito de bebidas alcoólicas lideram a lista de causadores de tragédias no trânsito. Diante do número crescente de acidentes, o governo federal está seguindo o exemplo de outros países para endurecer a punição contra aqueles que cometem infrações gravíssimas nas ruas e estradas do Brasil.

De Brasília, José Carlos Oliveira

AMANHÃ, A SEGUNDA MATÉRIA DA SÉRIE ESPECIAL SOBRE A VIOLÊNCIA NAS ESTRADAS VAI DISCUTIR AS AÇÕES DO GOVERNO E AS SUGESTÕES DOS ESPECIALISTAS PARA CONTER OS PEGAS E O CONSUMO DE ÁLCOOL DOS MOTORISTAS.

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