Rádio Câmara

Reportagem Especial

Especial Religiosidade 2 - A dificuldade de se conciliar anseios individuais e coletivos com dogmas (05'23")

24/12/2007 - 00h00

  • Especial Religiosidade 2 - A dificuldade de se conciliar anseios individuais e coletivos com dogmas (05'23")

A SEGUNDA MATÉRIA DA SÉRIE DE REPORTAGENS ESPECIAIS SOBRE A RELIGIOSIDADE DO BRASILEIRO MOSTRA O QUANTO É DIFÍCIL CONCILIAR OS ANSEIOS INDIVIDUAIS E COLETIVOS DA POPULAÇÃO COM OS DOGMAS RELIGIOSOS.

As mais recentes pesquisas de opinião feitas no Brasil revelam inquietações entre a vida cotidiana e a prática religiosa. O Ibope centrou suas sondagens nos dogmas mantidos há vários séculos pela igreja católica. Apesar das orientações mais conservadoras do papa Bento 16, a esmagadora maioria dos jovens católicos, com idades entre 18 e 29 anos, defende maior abertura em relação a práticas hoje condenadas ou consideradas "pecado" pela igreja. Eles são favoráveis, por exemplo, ao sexo antes do casamento e ao uso da camisinha e de outros métodos anticoncepcionais. Já o Datafolha revelou que os espíritas são os mais liberais em temas como divórcio, uso de preservativos e casamento entre homossexuais. A maioria dos católicos ouvidos se diz favorável à pena de morte, enquanto a eutanásia é defendida por quase 30 por cento dos evangélicos.

MÚSICA: "Santo Antônio", c/ Maria Bethânia
"Que seria de mim meu Deus
Sem a fé em Antônio?
Antônio querido
Preciso do seu carinho
Se ando perdido
Mostre-me novo caminho..."

O cientista político e sociólogo da Universidade Federal de Pernambuco, Joanildo Burity, reconhece o dilema desses anseios da população diante do conservadorismo das religiões.

"O discurso religioso predominante é moralmente conservador. Em termos de orientação geral, não distoa se a gente estiver falando de católicos, evangélicos ou espíritas. O que aparece socialmente é um discurso muito preocupado com a recuperação, o resgate, a proteção de valores tradicionais."

Uma pesquisa recente da Unesco apontou que 20 por cento dos jovens brasileiros não têm uma religião definida e procuram atividades esotéricas. Ao mesmo tempo, quando se engajam em alguma religião, os jovens costumam ser muito assíduos, como explica um dos coordenadores do estudo, o professor de sociologia da UFRJ, Alexandre Brasil.

"É um quadro comum que a pesquisa encontra, em que o jovem participa pouco, mas, quando participa, participa de religião, principalmente nas igrejas católicas e evangélicas."

Outra pesquisa da Fundação Getúlio Vargas mostra que o número de mulheres é maior do que o de homens em todas as religiões, com exceção do catolicismo. O pesquisador da FGV, Marcelo Neri, atribui esse fato ao choque entre os anseios femininos e o rigor religioso.

"Talvez porque a religião católica é de corte mais patriarcal. Com a revolução feminina dos últimos 35 anos, talvez as mulheres não tenham encontrado muito eco de suas necessidades na doutrina católica quanto a anticoncepcionais e participação no mercado de trabalho."

A empresária Nádia Ali, de 52 anos e moradora de Brasília, é um bom exemplo da busca de conciliação entre religiosidade e modernidade. Ela teve formação católica e hoje é evangélica, mas já freqüentou outros cultos, como Espiritismo, Budismo, Santo Daime, Umbanda, Xamanismo e Seicho-no-ie. Nádia explica o que a incomoda em algumas religiões em geral.

"Eu detesto me sentir presa. Qualquer igreja que tente me agarrar, me prender com normas de ´tem que fazer isso, tem que fazer aquilo, tem que participar do grupo esse ou aquele´, eu me assusto e saio. Eu tenho que ir pela minha vontade e não por forçação de barra de ninguém."

O conflito entre os anseios do mundo moderno e o culto ao sagrado tem sido enfrentado de várias formas pelas religiões. Joanildo Burity identifica a atuação de minorias mais progressistas e críticas, como os setores remanescentes da Teologia da Libertação, no catolicismo; a ala ecumênica do protestantismo mais tradicional; e um setor moderado das igrejas pentecostais.

"Esses são os campos em que o discurso mais ético e preocupado com as bases, com a organização popular, com manifestações de ação coletiva, podem dar uma contribuição bem mais interessante para a solução desses grandes problemas nacionais e globais que estão colocados."

O cientista político e sociólogo Joanildo Burity também identifica a tendência crescente de pessoas que, embora creiam em Deus e cultuem o sagrado, preferem não se vincular a nenhuma religião formal.

De Brasília, José Carlos Oliveira.

NA TERCEIRA REPORTAGEM ESPECIAL SOBRE A RELIGIOSIDADE DO BRASILEIRO, VOCÊ VAI VER AMANHÃ COMO A RELIGIÃO SE RELACIONA COM O PODER, A POLÍTICA E A MÍDIA.

A abordagem em profundidade de temas relacionados ao dia a dia da sociedade e do Congresso Nacional.

De segunda a sexta, às 3h, 7h20 e 23h