Rádio Câmara

Reportagem Especial

Especial Samba 2 - Mangueira, Portela e Império Serrano entram na "avenida da História" (07'12'')

03/12/2007 - 00h00

  • Especial Samba 2 - Mangueira, Portela e Império Serrano entram na "avenida da História" (07'12'')

ESTÁCIO, MANGUEIRA, PORTELA E IMPÉRIO SERRANO ENTRAM NA "AVENIDA DA HISTÓRIA" HOJE, NESTA SEGUNDA REPORTAGEM ESPECIAL SOBRE O SAMBA NA SEMANA EM QUE SE COMEMORA O DIA DESTE RITMO GENUINAMENTE BRASILEIRO

TRILHA: "Cochichando" (de Pixinguinha)

O chorinho e o samba, inicialmente marginalizados e perseguidos ou simplesmente ignorados pela sociedade, começam a despertar a atenção de intelectuais, ainda na década de 1920. O talento de Pixinguinha, Donga e João da Baiana os levou a serem conhecidos, mais tarde, como a "santíssima trindade do samba". Heitor dos Prazeres e Sinhô também contabilizavam elogios. Esse reconhecimento, ainda tímido, foi essencial para o lento processo de afirmação do samba como manifestação da música popular brasileira. O jornalista e escritor Sérgio Cabral cita as primeiras demonstrações de respeito da intelectualidade por esse ritmo contagiante.

"Alguns intelectuais já gostavam de samba e estimulavam os sambistas. Mário de Andrade, Sérgio Buarque de Hollanda, Prudente de Morais Neto, Gilberto Freire, quando estavam no Rio de Janeiro, se tornaram amigos dos sambistas. O Ismael Silva era um ídolo de intelectuais."

Ismael Silva é um dos fundadores da primeira escola de samba do Rio de Janeiro, a Deixa Falar, em 1928. A escola do morro de São Carlos, no Estácio, também é marco cultural por outros motivos, como explica o jornalista Luiz Fernando Vianna, autor do livro "Geografia carioca do samba".

"O samba, como se convencionou, com um determinado ritmo, uma determinada batida, vem realmente do bairro do Estácio de Sá, na segunda metade dos anos 20. Aí, é basicamente violão e instrumentos de percussão: o pandeiro; depois vem o surdo para ajudar no desfile das primeiras escolas de samba e dos blocos de carnaval. É um samba mais ritmado, mais batido, menos para dançar e mais desfilar e encantar."

Segundo Vianna, o samba urbano iniciado no Estácio se irradia pelos subúrbios cariocas, onde mantém os fundamentos africanos, mas ganha lirismo e uma certa dolência.

MÚSICA: "Mangueira chegou" (de José Ramos, com a Velha Guarda da Mangueira)
"Pan/pan/pan/pan
(Lúcio Pato, China e baiano,
Os criadores da batida
Da Estação Primeira de Mangueira. Que beleza!)
Quando ouvir essa batida
Foi Mangueira que chegou..."

A Estação Primeira de Mangueira seguiu o rastro da Deixa Falar do Estácio e, em 1929, já realizava seu primeiro desfile nas ruas do bairro e na Praça 11, com o samba "Deixa de demanda", escrito por Cartola, um de seus fundadores.

MÚSICA: "Chega de demanda" (de Cartola, com a Velha Guarda da Mangueira)
"Chega de demanda, chega
Com esse time temos que ganhar
Somos da Estação Primeira
Salve o morro da Mangueira..."

Os desfiles oficiais de carnaval começam em 1932 na Praça 11. No subúrbio ainda mais distante de Osvaldo Cruz, blocos que já animavam o carnaval da região se reúnem em torno da Portela, liderada por Paulo Benjamin de Oliveira, o Paulo da Portela. Ele é o autor de "Teste ao samba", considerado o primeiro samba-de-enredo. O estilo de criar sambas, alegorias e fantasias especificamente para contar uma determinada história durante o desfile ajudou a azul-e-branco de Osvaldo Cruz a ganhar o carnaval de 1939.

MÚSICA: "Teste ao samba" (de Paulo da Portela, com a Velha Guarda da Portela)
"Vou começar a aula
Perante a comissão, muito atenção
Eu quero ver se diplomá-los posso
Salve o ´fessor´, dá nota a eles, senhor
Quatorze com dois noves fora tudo é nosso..."

Silas de Oliveira, da Império Serrano, é um dos nomes mais respeitados na lista de autores de sambas-de-enredo clássicos. "Aquarela Brasileira" e "Apoteose ao samba" estão entre as obras-primas do gênero, recentemente declarado patrimônio cultural do país. Um dos fundadores da escola de samba de Madureira, Sebastião Molequinho, hoje com 87 anos de idade, se emociona ao lembrar outras pérolas menos conhecidas de Silas de Oliveira, usadas para animar os foliões nos ensaios. Eram os chamados sambas de quadra.

"Eram muito harmoniosos os sambas antigos. ´Meu Império/ Vamos caprichar nesse carnaval/ Nós iremos disputar/ A grande prova real/ Imperial!/ Quero te ver no jornal/ Como uma verdadeira glória/ Para ficar seu nome na história/ Para ficar seu nome na história.´"

Impulsionado pelo rádio e pelos talentos que surgiam em cada bairro do Rio, o samba se firmava como manifestação cultural, numa disputa sadia de criatividade, como nos conta o "poeta da Vila Isabel", Noel Rosa, em "Palpite infeliz".

MÚSICA: "Palpite infeliz" (Noel Rosa, João Gilberto)
"Salve Estácio, Salgueiro, Mangueira
Osvaldo Cruz e Matriz
Que sempre souberam muito bem
Que a Vila não quer abafar ninguém
Só quer mostrar que faz samba também..."

O samba passa a atrair os grandes intérpretes da chamada "era do rádio", como Francisco Alves e Orlando Silva. Carmem Miranda, com sua carreira internacional, leva o ritmo genuinamente brasileiro para o exterior. Mas a afirmação cultural do samba não veio acompanhada do devido reconhecimento aos sambistas. Os verdadeiros responsáveis pela técnica e pelo lirismo do samba não tinham noção do valor de suas obras e, muitas vezes, chegavam a dar ou a vender parcerias em suas composições em troca de muito pouco. Em entrevista à TV Cultura, em 1974, Cartola revelou uma prática que foi muito comum entre os grandes sambistas brasileiros.

"Esse samba ´Sim´ é meu. Eu dei parceria a um cara chamado Osvaldo Martins, mas ele não botou nenhuma vírgula no samba. Dei porque, naquela época, eu estava numa situação precária, ruim mesmo de vida, ruim de situação e afastado do meio artístico. Ele chegou, disse que ia arranjar para gravar, me pediu a parceria e eu dei para ele."

MÚSICA: "Sim" (de Cartola e Osvaldo Martins, Gilberto Alves)
"Sim, deve haver um perdão para mim
Senão, nem sei qual será o meu fim..."

"Sim" foi gravada por Gilberto Alves e fez grande sucesso. Mais tarde, Cartola e a mulher, Dona Zica, viriam a se tornar donos de uma das casas de samba mais importantes do Rio de Janeiro. É o que vamos saber amanhã, na terceira edição da série sobre o samba.

De Brasília, José Carlos Oliveira

A TERCEIRA REPORTAGEM ESPECIAL SOBRE O SAMBA FALA AMANHÃ DO TRADICONAL ZICARTOLA E DO FLERTE DO SAMBA COM OUTROS RITMOS.

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A abordagem em profundidade de temas relacionados ao dia a dia da sociedade e do Congresso Nacional.

De segunda a sexta, às 3h, 7h20 e 23h