Rádio Câmara

Reportagem Especial

Cultura 1 - Lei de incentivo aumenta a desigualdade regional no Brasil (06'37'')

20/08/2007 - 00h00

  • Cultura 1 - Lei de incentivo aumenta a desigualdade regional no Brasil (06'37'')

Há 16 anos, a cultura brasileira passou a contar com lei de incentivo própria, a chamada Lei Rouanet. Pelas regras, os produtores interessados em captar recursos pela lei Rouanet, devem inscrever o projeto no MInistério da Cultura ou na Agência Nacional de Cinema. Depois de aprovados, os projetos entram num cadastro, onde podem ser contemplados por empresas interessadas em incentivar. O advogado Fábio Cesnik é também professor especialista em lei de incentivo à cultura, e explica como funciona na prática.

"A cultura é uma das atividades que pode receber até 4% do imposto de renda devido pelas empresas. Tem mais 1% que pode ser destinado ao esporte, tem mais 1% ao Fundo de Criança e Adolescente, e 4% pode ser destinado à atividade cultural. Isso do imposto de renda devido por cada uma das empresas brasileiras tributadas no lucro real. Ela pega os 4% desse imposto de renda e aplica num projeto cultural que esteja aprovado no ministério da Cultura."

É bom lembrar que as pessoas físicas também podem investir até 6% do imposto devido. Cesnik explica que o projeto pode ser aprovado com base em duas modalidades distintas, diferenciadas pela área cultural que se quer financiar. Uma delas prevê 100% de abatimento, ou seja, tudo o que é aplicado, retorna à empresa na forma de isenção do imposto de renda. A outra modalidade contempla abatimento parcial, explica Fábio Cesnik.

"Se ele é um projeto de música erudita ou instrumental, é de abatimento integral. Sé é de música popular, é de abatimento parcial. Sé é um projeto de teatro, é de abatimento integral. Se é um projeto de recuperação de arquivo, é de abatimento não-integral. Se ele é um projeto de exposição de arte, é de abatimento integral. Se é um projeto de revista cultural, é de abatimento não-integral. Então ele pega a área cultural, a área cultural em que o projeto é aprovado é que define se a empresa vai poder abater integralmente ou não."

O problema da lei, analisam os especialistas e reclamam os produtores, é que, da forma como está, a maioria das empresas investe maciçamente no eixo Rio-São Paulo, deixando o resto do Brasil a ver navios. O Tribunal de Contas da União - TCU - apresentou relatório criticando essa realidade. O ministro do TCU Ubiratan Aguiar destaca que, em 2006, os recursos empregados no Sul e no Sudeste representaram 95% do que foi captado pela Lei Rouanet. O Ministro Ubiratan Aguiar acha que o estado deveria ter responsabilidade de empregar melhor esses recursos, já que no final das contas, é o próprio governo quem arca com as despesas da lei Rouanet, na forma de renúncia fiscal das empresas.

"Então o Estado, a partir daquele momento, é quem tem a responsabilidade de gerir, de promover a gestão destes meios, para incentivar e alavancar a manifestação da cultura nas suas mais diferentes áreas e nas mais diferentes regiões. Inclusive, se for o caso de se adaptar a lei, de forma a que não se deixe margem a nenhuma interpretação, que o faça".

Para Ubiratan Aguiar, não há dúvidas que o texto da lei deve ser modificado. Na opinião do ministro, os recursos captados deveriam ser todos encaminhados ao Fundo Nacional de Cultura para que o governo planejasse a sua aplicação, atendida a diversidade regional brasileira. O advogado Fábio Cesnik também acha necessária uma modificação na lei. E ele considera que, ao invés de definir o abatimento do imposto de renda pela área cultural, a lei deveria premiar com maior abatimento quem investisse longe dos grandes centros.

A produtora teatral pernambucana, Paula de Renor, sente na pele as dificuldades em conseguir recursos da lei Rouanet, fora do eixo Rio-São Paulo. Paula conta que os recursos só chegam através de editais de empresas públicas, como a Petrobras e os Correios. Por isso, Paula acredita que o teor da lei deveria mudar, o que já foi tema de vários encontros no início do governo Lula, inclusive promessa de campanha. Ela lamenta que até hoje essa mudança não tenha sido colocada em prática.

"É um dinheiro público, a empresa resolve qual é o segmento cultural, que tipo de projeto e em que região. E o dinheiro não é dela, o dinheiro é do governo. Então eu acho que esse poder todo das empresas em cima do mecenato na rouanet, isso tinha que ser dosado, tinha que ser limitado por região."

Outra crítica feita pelo relatório do TCU é que o ministério não tem estrutura para fiscalizar devidamente a aplicação dos recursos da lei rouanet, explica o Ministro Ubiratan Aguiar.

"Pelo volume de processos que dependem do exame, num cálculo que nossos analistas fizeram, levariam 12 anos para examinar as demandas que se encontram lá no Ministério da Cultura. Então nós fizemos uma série de análises e avaliações e recomendações ao Ministério da Cultura, de forma que possa dar celeridade ao exame dessas contas, porque são milhões que estão empregados."

Procurado pela reportagem para responder às críticas, o Ministério da Cultura preferiu não se manifestar.
De Brasília, Adriana Magalhães.

A abordagem em profundidade de temas relacionados ao dia a dia da sociedade e do Congresso Nacional.

De segunda a sexta, às 3h, 7h20 e 23h