Rádio Câmara

Reportagem Especial

Especial Objetivos do Milênio 2 - Cooperativa Canabrava (06'47")

25/06/2007 - 00h00

  • Especial Objetivos do Milênio 2 - Cooperativa Canabrava (06'47")

NA SEGUNDA MATÉRIA SOBRE PROJETOS DE DESTAQUE PARA ATINGIR OS OBJETIVOS DO MILÊNIO, VOCÊ VAI CONHECER UMA COOPERATIVA QUE NASCEU NO MEIO DO LIXO E DOS PORCOS E HOJE DÁ CIDADANIA A UMA COMUNIDADE DE SALVADOR.

Antes de 1995, Canabrava era um lixão a céu aberto localizado na cidade de Salvador. Reunia centenas de catadores, misturados a urubus e porcos, que disputavam alimentos e materiais que não serviam mais para a sociedade. Eram condições sub-humanas, em que os catadores não tinham alternativa a não ser negociar com atravessadores de material reciclável, que chegavam a trocar o resultado de um dia de trabalho deles por cachaça. Naquele ano de 1995, o programa de saneamento ambiental da região metropolitana de Salvador acabou com o lixão, construindo um aterro sanitário no lugar. Apesar de ter resolvido o problema ambiental, o fim do lixão deixou dezenas de famílias de catadores sem sustento. Foi desenvolvido, então, um projeto, encabeçado pelo Pangea - Centro de Estudos Socioambientais - e patrocinado pela União Européia, reunindo numa cooperativa os catadores que ficaram órfãos do lixão. Surgiu, então, a Cooperativa de Catadores Agentes Ecológicos de Canabrava - Caec. Antônio Bunchaft é coordenador do projeto Pangea e explica que, atualmente, os catadores trabalham na coleta seletiva dos recicláveis.

"Eles trabalham desenvolvendo programas de coleta seletiva em condomínios, empresas, faculdades, universidades e escolas. Coletam esse material reciclável, levam para a cooperativa, fazem a triagem dos diversos resíduos, enfardam e vendem para a indústria recicladora. Como eles têm muito volume de material reciclável, eles já conseguem ter uma escala que ultrapassa atravessador, intermediários e conseguem se relacionar diretamente com a indústria, aumentando os preços e o nível de renda. Além do aspecto mais produtivo, dentro da cooperativa são desenvolvidas ações de alfabetizaçaõ, de inclusão digital, de apoio de assistência social, foram incluídos nos programas de renda mínima do governo."

A Dona Sônia dos Santos, presidente da Caec, lembra que, na época do fim do lixão, ela passou a catar restos nas lixeiras das ruas. Quando soube que os catadores seriam organizados numa cooperativa, Sônia não sabia nem mesmo o que era isso. Mas se cadastrou na esperança de mudar de vida, deixar a realidade de humilhações que vivia. E é dona Sônia quem ilustra o que realmente representou a cooperativa na vida desses antigos catadores.

"A gente trabalha na rua sem luva, sem nenhuma segurança, e aqui, além de ter nossa segurança, temos nosso meio de sobrevivência, porque a gente tem nossa remuneração todo mês certo, temos nossa alimentação, temos nosso dinheiro no dia certo, nós mesmos dependemos da nossa renda, nós não trabalhamos para ninguém, a cooperativa é nossa mesmo. O modo da gente sobreviver é muito diferente, hoje eu busquei minha auto-estima, que eu tinha vergonha de tudo, eu tinha vergonha de ir a certos lugares, de dizer onde eu trabalhava. Até para alguns parentes que não sabiam que eu trabalhava no lixão ou catava nas ruas, eu tinha vergonha. Inclusive, uma vez eu estava numa lata de lixo, avistei uma prima e tive que me esconder até ela passar. Então para mim, esse trabalho, essa cooperativa é o tudo."

O papel do Pangea no projeto é dar assistência técnica à cooperativa, com os cursos de capacitação e, principalmente, a incubação. Esse é o tempo que a cooperativa, que tem cerca de duzentos cooperados, precisa para aprender a caminhar pelas próprias pernas. Hoje, com o apoio também da Petrobras, Antônio revela que a cooperativa já está passando por uma segunda etapa, que é produzir materiais a partir dos reciclados.

"Então ela está se preparando para industrializar o plástico, transformar em garrafas de água sanitária, que serão vendidas numa rede de supermercados WalMart, e também está se preparando para agregar valor ao papelão, fazendo caixas de papelão. Ou seja, já não é mais somente coletar o material reciclável, triar, separar e vender, é já industrializar propriamente os recicláveis."

Antônio Bunchaft destaca que, antes da cooperativa, o ganho desses catadores não passava de 60 dólares por mês. Agora, eles ganham entre um salário mínimo e um salário e meio. O que esse aumento na renda mudou na vida de Dona Sônia, agora que ela deixou a realidade do lixão e passou a ser uma cooperada? Ela responde dizendo que, não apenas a vida dela, mas a vida dos filhos também mudou para melhor, porque hoje eles não se alimentam somente de restos, como no passado.

"Só melhoria, até minha casa eu reformei, eu comprei televisão porque meus filhos assistiam na casa dos outros, hoje eu vou no mercado, final do mês, eu tenho meus dias certos de fazer as minhas compras. Se tiver uma festa, eu já levo meus filhos na loja, para comprar roupa, coisa que não acontecia, porque o que ganhava catando na rua não dava para comprar nada, só mesmo mal dava para um quilo de cada coisa. Eu me alimentava do resto, das sobras do lixão quando eu trabalhava. E hoje, graças a Deus, essa vida acabou. Hoje eu me sinto orgulhosa da minha cooperativa, do meu trabalho, eu resgatei a minha cidadania e minha auto-estima."

E o mais importante, para dona Sônia, é que seus filhos estão recuperando na escola os estudos perdidos para o lixão. Ela conta que seus filhos mais velhos, que nasceram na época em que ainda estava catando restos, não estudavam. Com a mais nova, é diferente, revela Sônia, com orgulho. Ela tem 10 anos e está na quinta série.

De Brasília, Adriana Magalhães.

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