Rádio Câmara

Reportagem Especial

Especial Paulo Freire 1 - O intelectual amoroso ... (07'30'')

04/06/2007 - 00h00

  • Especial Paulo Freire 1 - O intelectual amoroso ... (07'30'')

NESTA SEMANA, A RÁDIO CÂMARA HOMENAGEIA O MAIS RECONHECIDO PEDAGOGO BRASILEIRO, PAULO FREIRE, QUE MORREU HÁ DEZ ANOS. ELE FOI RESPONSÁVEL POR UMA VERDADEIRA REVOLUÇÃO NA ALFABETIZAÇÃO BRASILEIRA. PARA PAULO FREIRE, NÃO BASTAVA QUE O ALUNO JUNTASSE AS LETRAS AO APRENDER A LER. ERA PRECISO MAIS, ERA PRECISO QUE ELE REALMENTE FIZESSE DA LEITURA UM ATO DE LIBERTAÇÃO. VOCÊ VAI CONHECER UM POUCO MAIS SOBRE O MÉTODO PAULO FREIRE E VAI SABER TAMBÉM SE O BRASIL E O MUNDO UTILIZAM SUAS IDÉIAS NA ESCOLA. HOJE, NA PRIMEIRA REPORTAGEM, VOCÊ VAI SABER UM POUCO MAIS SOBRE QUEM ERA PAULO FREIRE.

"Eu sou um intelectual que não tem medo de ser amoroso. Eu amo as gentes e amo o mundo. E é porque amo as pessoas e amo o mundo que eu brigo para que a justiça social se implante antes da caridade."

Esse intelectual que se auto define amoroso nasceu em Recife, em 1921. Foi alfabetizado em casa, pelos pais, com palavras e frases ligadas à sua experiência, escritas com gravetos no chão de terra do quintal. Seu pai, um capitão da Polícia Militar, morreu quando Paulo Freire tinha 13 anos. A partir daí ele conheceu privações financeiras que o atrapalharam na conclusão dos estudos. Com 22 anos, ingressou na faculdade de direito, mas não conseguiu advogar porque se recusava a cobrar débitos das partes contrárias nos processos. Em 1947, Paulo Freire se tornava diretor de uma Divisão de Educação e Cultura do recém-criado SESI, o serviço social da indústria. Para ele, essa foi a oportunidade decisiva para que sua vida profissional tomasse o rumo de educador e filósofo da educação. O diretor do Instituto Paulo Freire, Moacir Gadotti, conviveu por 23 anos com Paulo Freire. Trabalhavam juntos e estavam envolvidos com os mesmos temas educacionais. Ele comenta a paixão de ensinar vivida por Paulo Freire.

"Paulo Freire era um apaixonado pelo ensino e pelo aprendizado. Kant dizia que a paixão é a enfermidade da alma. Refletindo um pouco sobre essa idéia, eu acho que o Kant tinha razão. O Paulo Freire era um apaixonado, mas um apaixonado no sentido de louco, insano pela mudança, pela transformação. E só os apaixonados são capazes de revolucionar, de mudar, porque eles ultrapassam, se arriscam para além da racionalidade, e se colocam a missões quase impossíveis como essa que Paulo Freire se colocou."

Paulo Freire passou a década de 50 envolvido nesse ambiente educativo, exercendo o magistério na Escola de Serviço Social de Pernambuco e na Escola de Belas Artes, da Universidade do Recife. Começou a experimentar uma nova proposta de alfabetização no final dos anos 50, até que, em 1962, no município de Angicos, no Rio Grande do Norte, Paulo Freire teve a grande experiência de seu novo método de ensino, que priorizava a realidade dos alunos. Em 1963, quando quase 40% da população brasileira não sabiam ler, Paulo Freire assumiu o Plano Nacional de Alfabetização no governo João Goulart. A idéia era criar 20 mil círculos de leitura, capazes de alfabetizar 2 milhões de adultos. Nessa época, ainda na democracia, foi chamado de subversivo pelo então ministro da Guerra de Jango, General Castelo Branco. Uma mostra do que viria quando a ditadura fosse imposta, no ano seguinte. Apenas 14 dias após o golpe de 64, o projeto de alfabetização de Paulo Freire foi extinto. O educador chegou a enfrentar 75 dias de detenção, em uma das duas vezes que foi preso. É o próprio Paulo Freire quem contou, nesta entrevista, sua experiência com a ditadura.

"Eu me lembro, por exemplo, quando eu fui preso pela primeira vez e que tive que atravessar uma rua. Eu estava parado em frente ao quartel onde eu tinha que ser metido. E estava havendo tráfego para cá e para lá. E eu fiquei parado com o sargento e um soldado, cada um com uma metralhadora em cima de mim. Inclusive eu ficava espantadíssimo, eu dizia: ´esse pessoal deve saber de coisas sobre mim que eu não sei, eles devem ter informações de que eu sou um líder extraordinário, que eu devia ter feito a revolução anteontem´. Como é que um cara como eu, um professor humilde, simples, precisava de um aparato como aquele em cima de mim, era fuzil muito para um cara só. Então eu me lembro que parado, cercado de balas para todos os lados, eu era a ilha das balas, você já imaginou, que coisa profundamente ridícula."

O exílio de Paulo Freire começou na Bolívia. Em seguida, ele, a esposa Elza e os cinco filhos foram para o Chile, onde viveram de 1964 a 1969. Paulo Freire relembra o aprendizado que representou esse momento de sua vida.

"Eu fui para a Bolívia, lá houve um golpe de estado, eu fui para o Chile. E fui sem Elza e sem os meninos. Uma vez eu levei 2 meses sem correspondência da Elza, ela punha a carta no correio, a carta não chegava. Uma malvadez desnecessária. Porque às vezes o sujeito tem uma malvadezinha necessária, mas há umas desnecessárias. E aí eu começo a aprender no exílio, em primeiro lugar, a conviver longe do país. Eu sempre pensei que, diante de um certo problema, ou de uma certa situação, você tem que aprender com as positividades e as negatividades da situação."

Em terras chilenas, Paulo Freire encontrou espaço político dinâmico, experimentando seu método num contexto completamente diferente. Em 1969, foi para os Estados Unidos, depois para Genebra. Em 1970, lançou a Pedagogia do Oprimido, sua principal obra. Em 1980, com a anistia, Paulo Freire enfim voltava ao Brasil. O amigo de décadas Moacir Gadotti recorda que Paulo Freire dizia, ao retornar ao país, que vinha reaprender o Brasil. Assim que voltou, assumiu o cargo de professor na PUC de São Paulo e na Universidade de Campinas. Entre 1989 e 1991, trabalhou como secretário de Educação da prefeitura de São Paulo, na gestão de Luiza Erundina. É Moacir Gadotti quem encerra o assunto, definindo o espírito do amigo Paulo Freire.

"Foi uma unanimidade como pessoa generosa, bondosa, era um consenso, porque ele respeitava muito as pessoas que pensavam inclusive diferente dele. Uma pessoa feliz, bem humorada. Eu sempre lembro dele rindo, ele dava muita risada, e risada das coisas corriqueiras que aconteciam, brincava com as palavras e reinventa."

Paulo Freire morreu de infarto em 1997, aos 75 anos.

De Brasília, Adriana Magalhães.

NA REPORTAGEM ESPECIAL DE AMANHÃ VOCÊ VAI CONHECER UM POUCO MAIS SOBRE O MÉTODO PAULO FREIRE DE ALFABETIZAÇÃO. VAI SABER TAMBÉM QUAL ERA A RELAÇAÕ DO EDUCADOR COM OS LIVROS.

A abordagem em profundidade de temas relacionados ao dia a dia da sociedade e do Congresso Nacional.

De segunda a sexta, às 3h, 7h20 e 23h