Rádio Câmara

Reportagem Especial

Especial Água 3 - Parlamento das Águas - debate de questões ligadas aos recursos hídricos - ( 06' 19" )

19/03/2007 - 00h00

  • Especial Água 3 - Parlamento das Águas - debate de questões ligadas aos recursos hídricos - ( 06' 19" )

NA TERCEIRA MATÉRIA DA SÉRIE, A REPÓRTER MONICA MONTENEGRO EXPLICA O QUE SÃO OS COMITÊS DE BACIAS, FÓRUNS CRIADOS PELA LEI DAS ÁGUAS E QUE SÃO CONSIDERADOS UM DOS PRINCIPAIS INSTRUMENTOS DE GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS NO PAÍS.

Um parlamento das águas. É assim que os comitês de bacias costumam ser definidos pelos especialistas em recursos hídricos. Previstos pela Lei das Águas - que completa 10 anos agora em 2007 - esses fóruns são considerados um dos pilares da gestão dos recursos hídricos no país. Isso porque entre os fundamentos da lei está a gestão descentralizada, com participação do poder público, dos usuários e das comunidades. O superintendente de planejamento da Agência Nacional de Águas, Ney Maranhão, destaca as principais funções de um comitê de bacia.

"O principal papel dele é o de um fórum onde se discutem os problemas que envolvem os usos das águas. Então a primeira contribuição que um comitê dá é juntar os interessados e discutir os temas relativos aos usos dos recursos hídricos naquela bacia. Em um segundo momento, o comitê é também um órgão de apoio, por ter interlocução com a Agência Nacional de Águas, com os órgãos gestores estaduais, levando as demandas e os consensos estabelecidos nas discussões. Em terceiro lugar, o comitê tem o papel de planejar. Ele ajuda, apóia e no final aprova o plano de recursos hídricos da bacia hidrográfica onde está instalado"

Atualmente, existem 118 comitês de bacias funcionando em todo o país. Cento e dez são estaduais e oito são relativos a rios de domínio da União, ou seja, aqueles que atravessam dois ou mais estados, como o São Francisco. Mas até agora apenas dois comitês conseguiram implantar a cobrança pelo uso da água. Na Bacia do Rio Paraíba do Sul, os grandes usuários pagam pela captação de água desde 2003. E na bacia dos rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí, também chamada de PCJ, a cobrança começou em janeiro de 2006.

O secretário-executivo do comitê PCJ, Luiz Roberto Moretti, explica a resistência à cobrança diminui à medida que os usuários entendem porque estão pagando.

"Essa cobrança tem por objetivos dar um valor à água. É aquela velha história: tudo que é de graça as pessoas não dão valor. Na hora que você dá um valor pra água, ela passa a ser vista de forma diferente e aí se espera que se consiga dar um uso racional à água, evitando o desperdício. E um outro objetivo é: como o comitê aprova um plano de obras para recuperar a qualidade e preservar os mananciais, a cobrança também tem, dentre os seus objetivos, arrecadar uma pequena parte dos recursos necessários para serem investidos em estações de tratamento de esgoto, em recomposição de matas ciliares, em controle de perdas de água nas redes de distribuição das cidades. Enfim, ações na linha na recuperação e preservação dos mananciais"

Em pouco mais de um ano de cobrança, o comitê PCJ já arrecadou quase 11 milhões de reais, totalmente aplicados na bacia dos rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí. Luiz Roberto Moretti ressalta que a cobrança veio depois de mais de um ano de discussão entre os setores envolvidos e que os valores foram definidos por consenso e unanimidade. O resultado é uma taxa de inadimplência de menos de 1%. Além disso, já é possível verificar mudanças de comportamento em relação à água em diversos setores, que passaram a reduzir o consumo e reaproveitar o recurso natural. O secretário-executivo do comitê de bacia destaca ainda um ditado que sempre é citado nas discussões.

"A água mais cara é aquela que você não tem"

Mas a articulação dos dois comitês que já promovem a cobrança pelo uso da água não se repete pelo resto do país. O coordenador do Núcleo de Estudos Ambientais da Universidade de Brasília, Gustavo Souto Maior, relata que até hoje o Distrito Federal não conseguiu criar um comitê de gestão para a única bacia totalmente inserida na cidade, a do Lago Paranoá. Apesar da mobilização de pesquisadores, agricultores, pescadores e demais envolvidos desde o ano 2000, segundo Souto Maior ainda não houve vontade política para a formalização do fórum. Vale ressaltar que para instituir um comitê de bacia, a proposta precisa ser submetida ao Conselho Nacional de Recursos Hídricos e, se aprovada, ser efetivada por um decreto presidencial.

Além da dificuldade para a criação desses fóruns, especialistas apontam outro problema: divergências entre as decisões tomadas no âmbito dos comitês e as prioridades do governo. O engenheiro agrônomo e pesquisador da Fundação Joaquim Nabuco, João Suassuna, afirma que isso é o que acontece hoje no âmbito do Comitê da Bacia do rio São Francisco, devido ao polêmico projeto da transposição.

"A gente tem que considerar a importância de se trabalhar levando em consideração as propostas do Comitê da Bacia Hidrográfica do São Francisco. O comitê foi criado para deliberar o que acontece dentro da bacia do rio, o que não está sendo feito. Existe hoje um mal estar enorme entre o governo federal e o Comitê da Bacia do rio São Francisco"

Mesmo com a forte oposição do Comitê da Bacia do rio São Francisco, o governo federal decidiu dar início às obras da transposição.

Apesar das dificuldades enfrentadas para a criação e fortalecimento dos comitês de bacias, tanto especialistas da sociedade civil, quanto integrantes do governo são unânimes em destacar a importância desses fóruns para a democratização da gestão dos recursos hídricos no país, principalmente em áreas onde há conflitos pelo uso da água e forte degradação, como no caso do Velho Chico.

De Brasília, Mônica Montenegro

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