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A morte do presidente americano John Kennedy repercute na Câmara dos Deputados ( 14' 00'' )

26/11/2006 - 00h00

  • A morte do presidente americano John Kennedy repercute na Câmara dos Deputados ( 14' 00'' )

"Assassinado o presidente Kennedy. Olha, olha, edição extra do Jornal do Brasil."

Há 43 anos, no dia 22 de novembro de 1963. O presidente norte-americano John Kennedy foi assassinado em Dallas, no Texas. A notícia abala os norte-americanos. No Brasil, o presidente João Goulart decreta três dias de luto.

Dias depois da morte, na Câmara dos Deputados, o deputado Padre Godinho, vice-líder da UDN, discursa em homenagem póstuma ao mais jovem presidente norte-americano.

"Quando a Câmara reverencia o tributo de sua dor pela perda que o mundo acaba de sofrer, não é certamente a hora para recolher os admiráveis pensamentos desse jovem que colocou corajosamente as idéias a serviço da ação. Num mundo em que pseudo-ideologias estão apenas à serviço da subversão, seus discursos e pronunciamentos ficarão como os de Lincoln, como os de Jefferson, os de Churchill, os de Rui (Barbosa) transformados num roteiro de liberdade, válidos para todos os tempos e para todas as gentes"

Para o deputado Gustavo Capanema, do PSD de Minas Gerais, o carismático Kennedy era um modelo de estadista.

"Ali em Dallas ficou bem claro que o alvo era ele só. a sua pessoa frágil, esguia, com aquela fragilidade do herói diante dos gigantes. Kennedy deu ao nosso tempo a figura moral, a figura intelectual, a mentalidade política do perfeito homem de Estado"

O deputado Wilson Martins, da UDN do Mato Grosso, na tribuna elencou vários atentados contra presidentes dos Estados Unidos.

"Desde a sua fundação como país soberano, em 1776, os Estados Unidos da América tiveram a governar 36 presidentes. Nada menos de quatro: Abrahan Lincoln, James Garfield, William McKinley e John Kennedy sucumbiram sob as balas de seus gratuitos agressores. Outros dois, Franklin Roosevelt e Harry Truman, saíram ilesos dos atentados, morrendo contudo as pessoas que os acompanhavam"

O atentado fatal contra Kennedy até hoje está envolto sob um manto de mistério. Pela versão oficial, Lee Oswald, foi quem deu o tiro fatal do sexto andar de um depósito de livros contra o presidente que desfilava pelas ruas da cidade. Dias depois Oswald foi assassinado diante de policiais por Jack Ruby, um dono de boate no Texas, sem nunca ter admitido ter sido ele o atirador.

Plinio Salgado, deputado pelo PRP de São Paulo, discursou sobre o atentado suspeito.

"Um magnicida, um paranóico, um desequilibrado pratica atentados à plena luz, no meio do povo. Mas esse atentado foi premeditado. Alugou-se uma sala, usou-se uma teleobjetiva. Há alguma coisa por detrás disso. O próprio assassinato do suposto assassino nos leva a suspeitas graves. Não teria sido receio de que ele confessasse e comprometesse certas organizações? Mas que organizações são essas? É tudo mistério"

(Fala de Kennedy)

Eleito em 1960, aos 43 anos, a vitória de John Kennedy, do Partido Democrata, sobre Richard Nixon, do Partido Republicano, foi mais uma vitória pessoal do que partidária, diz o jornalista Carlos Eduardo Lins da Silva, jornalista e membro do grupo de análise de conjuntura internacional da USP.

"Na verdade, Kennedy se elegeu por uma diferença muito apertada. Ele teve pouco mais de 100 mil votos que o Nixon, num colégio de mais de 60 milhões de pessoas. Kennedy representava uma renovação de partido, uma renovação em relação à questão racial e uma renovação de estilo. As diferenças de programa entre Nixon e Kennedy não eram muito relevantes. Pode se dizer que foi um passo na direção menos conservadora. mas não se pode dizer que a eleição de Kennedy tenha significado uma revolução na política norte-americana"

Kennedy como presidente foi contemporâneo a Jânio Quadros e João Goulart no Brasil. (Jingles de Jânio e Jango). Nesse período, a relação entre os dois países azedou algumas vezes. Primeiro foi com Jânio, que não aceitou o pedido de um emissário do governo norte-americano para participar de ação militar contra o governo cubano. Jânio defendeu uma política externa independente para o país.

A famosa operação da Baía dos Porcos, tentativa de tomada do poder em Cuba por militantes anticastritstas com apoio da CIA e do governo americano foi um fracasso do governo Kennedy.

Para piorar, Jânio condecorou Che Guevara, antes de renunciar.

De João Goulart, também o governo norte-americano guardou distância, como explica Lins da Silva.

"O Brasil, a partir de 1961, passou a ser governado pelo João Goulart., que era visto como uma pessoa de esquerda, embora não o fosse realmente. E havia aquele receio por parte do stablishment norte-americano de que o Brasil pudesse pender para a esquerda"

O tempo de Kennedy, Jânio e Jango era um tempo em que o Brasil despontava para o mundo nos esportes, ganhando títulos mundiais de futebol, basquete, e de boxe, com Eder Jofre. Era um tempo em que a Bossa Nova, nova onda musical brasileira, ganhava Nova York.

Mas era um momento de grande tensão política no mundo. A Guera Fria entre as duas superpotências, Estados Unidos e União Soviética, estava no auge. Foi um momento em que todo o mundo foi vítima das decisões das duas superpotências que insistiam em dividir o mundo e viver em confronto permanente.

Era também o tempo da corrida espacial. Com os norte-americanos gastando imensos recursos financeiros para alcançar a vantagem inicial soviética, que colocou o primeiro homem no espaço. (Música)

O Brasil retoma relações com a União Soviética, rompidas 15 anos antes. Os EUA questionam a política externa independente do Brasil, a presença de comunistas no governo e a nacionalização de empresas norte-americanas por Leonel Brizola, governador do Rio Grande do Sul e cunhado de João Goulart.

Jango se negou também a apoiar a ação intervencionista norte-americana. Mas nutria uma admiração intensa por Kennedy.

Em abril de 1962, João Goulart visita Kennedy na Casa Branca. O jornalista Carlos Eduardo Lins da Silva fala sobre a relação entre os chefes de Estado.

"A relação Kennedy-Goulart foi curta. Mas foi uma relação humana e cordial. Eles se encontraram uma vez na Casa Branca. Mas tudo deve ser visto dentro das circunstâncias históricas do momento em que havia um grande receio de que o Brasil se tornaria um país comunista."

A relação entre os países era difícil, mas era mantida em equilíbrio pela sensibilidade política dos dois presidentes.

Com a morte de Kennedy, a relação azeda de vez. O presidente norte-americano Lyndon Johnson adota uma doutrina de relações estáveis com governos militares que começam a se estabelecer em países da América Latina.

Washington também suspende recursos da "Aliança para o Progresso" para o país, mas firma acordos com governadores hostis a Jango.

Carlos Eduardo explica a "Aliança para o Progresso".

"Era uma tentativa de relações públicas, no sentido de impedir que o comunismo se alastrasse pelo hemisfério. Coisa muito parecida com a política de boa vizinhança que o Roosevelt estabeleceu para evitar que as Américas caíssem na órbita do nazismo. Era uma relação social muito filantrópica. E também havia o envio de artistas e intelectuais. Uma coisa parecida com a que o Roosevelt fez na Segunda Guerra, adaptada para a Guerra Fria. "

A regulamentação da Lei de remessa de lucros, em janeiro de 1964, no Brasil obriga a permanência no país de lucros de empresas estrangeiras.

O governo norte-americano passa então a acompanhar a intriga conspiratória contra João Goulart.

Em 31 de março, tem início a ação militar contra Goulart. Em Washington, o Departamento de Estado monitora o golpe e guarda em segredo a "Operação Brother Sam", de possível ajuda militar aos golpistas em caso de guerra civil. A "Operação Brother Sam" foi revelada ao mundo, doze anos depois, em 1976.

O jornalista Carlos Eduardo acredita que mesmo se Kennedy estivesse vivo, ele também apoiaria o Golpe Militar no Brasil.

"Eu acredito que, se o Kennedy não tivesse sido assassinado, ele teria feito da mesma forma que o Johnson depois o fez. Não havia muita alternativa naquele tempo para o presidente dos EUA. Havia a impressão de que o Goulart poderia abrir espaço, ou ele próprio tornar-se um governo comunista. E isso era intolerável."

Em tempos bicudos, em que se elevou um Muro separando os alemães de Berlim, em que se assistiu a uma crise de mísses nucleares em Cuba que chegou próximo a uma guera nuclear, e com uma selvagem Guerra do Vietnã despontando no Sudeste Asiático, talvez fosse mesmo difícil não ser consevador em política externa.

Este programa Câmara é História teve como trilha musical tema solene do filme JFK, de Oliver Stone e a música "A Lua é Camarada", cantada por Ângela Maria.

Consultoria musical de Marcos Brochado
Trabalhos técnicos: Francisco Mendes
Produção, texto e apresentação de Eduardo Tramarim
Coordenação de Jornalismo: Aprígio Nogueira.

O Câmara é História é uma produção da Rádio Câmara retransmitida por centenas de emissoras em todo o país As produções podem ser reproduzidas gratuitamente por qualquer emissora do país.

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