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Câmara é História

Saiba mais sobre Carlos Lacerda e sua paixão pela polêmica (07' 01")

03/09/2006 - 00h00

  • Saiba mais sobre Carlos Lacerda e sua paixão pela polêmica (07' 01")

Falar sobre Carlos Lacerda é falar sobre o gosto pela polêmica.
Orador irônico, dono de um contundente poder verbal, o jornalista e político carioca se impôs no cenário político entre 1945 e 1965, demolindo a reputação de autoridades.
Mas Carlos Lacerda foi também um golpista inveterado, que ficou conhecido como "Corvo" por suas atuações conspiratórias.
Impiedoso, não poupou governos. Atacou Getúlio Vargas e Juscelino Kubitschek. Não poupou nem mesmo o único presidente que a UDN levou ao poder, Jânio Quadros, a quem qualificou como "a UDN de porre". Se insurgiu inclusive contra o governo militar, que inicialmente apoiou.
Em março de 1957, Carlos Lacerda, deputado federal pela UDN do Distrito Federal, na época a cidade do Rio de Janeiro, leu um documento secreto na tribuna da Câmara, escrito em código cifrado e proveniente da Embaixada brasileira em Buenos Aires.
O telegrama se referia a um inquérito realizado pelo Exército da Argentina, que revelava uma transação comercial entre os governos cujo pagamento teria sido revertido para a campanha presidencial de Getúlio Vargas, anos antes.
Já líder da UDN na Câmara, Lacerda foi acusado pelo governo de fornecer elementos para a decifração do código secreto do Itamaraty.
O Ministério das Relações Exteriores enviou mensagem à Câmara acompanhada de um ofício da Procuradoria Geral da Justiça Militar, pedindo à Câmara Federal licença para processar o deputado por crime contra a segurança nacional.
O "caso Lacerda" ganhou intensa repercussão na sociedade.
Na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, o parecer do deputado Martins Rodrigues, pela licença para processar o deputado, foi aprovado, o que permitia a quebra da imunidade parlamentar de Lacerda.
A defesa apresentada pelo deputado Carlos Lacerda, no dia 15 de maio de 1957, durou dez horas. Ele respondeu às acusações.
Sonora:
"Senhor presidente, impedido de votar, estou no dever de depor. Não como acusado. Porque não vejo acusação digna de honesta consideração. Até agora tenho ouvido apenas as razões do lobo de uma alcatéia faminta. Cujos argumentos, La Fontaine tornou clássicos. Venho a esta comissão como testemunha de um tempo de subversão de valores no qual, como na sátira de George Orwell, fala-se em liberdade para matá-la, em democracia, para destruí-la, em legalidade, para negá-la na sua própria essência."
O depoimento de Lacerda também tinha o objetivo de revidar o que denominou ação esmagadora da maioria contra a oposição.

Sonora:
"O castigo que me querem impor, não é somente densecessário, como é injusto. Mas a consequência dele é que mais nos preocupa. Pois a partir do momento em que o governo conseguir que a maioria lhe obedeça na Câmara, rasgando o artigo 44 da Constituição, o Poder Legislativo não será mais um poder, e sim um simples serralho. E o Presidente da República estará transformado em um usurpador, pela destruição do equilíbrio dos poderes, graças à capitulação daqueles que dentro de um deles se submetem aos interesses e caprichos tirânicos do outro."
Impiedoso em suas críticas, corajoso em suas afirmações, o udenista Carlos Lacerda afirma que despertava medo entre seus oponentes.
Sonora:
"Detesto dizer que inspiro medo a certos homens, senhor presidente, mas esta é a verdade. Felizmente, não aos homens de bem. Apenas aos outros. E são esses outros que se mexem, se danam, e se redanam nessa dança de fórmulas, de processos, de perseguições, que me atormentam a inteligência. Me castigam o corpo, mas me deixam limpo, lavado, o coração impenitente. No fundo de tudo isso, o que é que se agita. Qual a lição que esse parecer, esse ambiente tragicômico, essa mobilização de ódios e de irresponsabilidades álacres, num clamor de festa bárbara, num tropel orgíaco vem dar ao povo aturdido. É que se procura, a minha custa, convencer o povo de que é inútil ter um ideal, e de que é vã toda a esperança."
No depoimento, Carlos Lacerda não poupa o governo de Juscelino Kubitschek.
Sonora:
"O governo é hoje, com seu monstruoso aparelho de propaganda, de deformação da verdade, e de pressão econômica e política, o cíclope que eu ousei desafiar nessa odisséia. Ceguei-o de ódio, e ele procura no fundo dessa gruta em que está transformada essa Comissão de Constituição e Justiça esmagar-me em suas manoplas, ajudado por certas mãozinhas habituadas a outro tipo de serviço."
Condenado inicialmente por seus pares, o deputado carioca acabou sendo absolvido pelo Plenário da Cãmara, no mês de maio. A Câmara decidia assim por não dar licença para que o deputado fosse processado.
Em 1968, Lacerda foi preso pelos militares. Solto, não voltou mais à política. Carlos Lacerda morreu em 1977, aos 63 anos, no Rio de Janeiro.

Este programa Câmara é História teve como trilha a música "Sua Fraqueza", cantada por Maísa.
Consultoria musical de Marcos Brochado
Trabalhos técnicos de
Produção e Apresentação: Eduardo Tramarim
Coordenação de Jornalismo: Aprigio Nogueira.
O Câmara é História é uma produção da Rádio Câmara retransmitida por centenas de emissoras em todo o país. O programa resgata discursos e momentos relevantes do Parlamento e da política brasileira, situando-os no contexto histórico da época em que foram proferidos.
Para ouvir este e outros programas da rádio, acesse o endereço eletrônico www.radio.camara.gov.br. Repetindo: www.radio.camara.gov.br As produções podem ser reproduzidas gratuitamente por qualquer emissora do país.

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