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JK: a cassação, o exílio e a morte (09' 51")

13/08/2006 - 00h00

  • JK: a cassação, o exílio e a morte (09' 51")

Não deixem o Juscelino falar, diziam seus opositores. Seus inimigos sabiam que o ex-presidente da República entusiasmava o povo com sua personalidade cativante e seus discursos em favor do desenvolvimento do país.

Sabedores de seu poder pessoal, os inimigos de JK foram implacáveis. Após dois meses do golpe de força que levou à queda do presidente João Goulart, o governo militar cassou os direitos políticos do ex-presidente mineiro.

Juscelino foi cassado pela força política que representava no cenário nacional e, portanto, pela ameaça aos donos do poder.

Ele tinha saído consagrado de seu governo junto ao eleitorado popular. Meses depois de deixar o governo, foi eleito senador por Goiás, com mais de 90 por cento dos votos.

Para as eleições presidenciais que estavam previstas para 1965, JK era apontado pelas pesquisas como o mais forte candidato na opinião popular. O que atrapalhava o desejo das Forças Armadas de criar e eleger um candidato que se amoldasse às diretrizes do golpe militar.

No Golpe de 64, Juscelino tinha feito um acordo político com os militares. Se comprometeu em apoiar o general Castello Branco até este terminar o mandato do presidente deposto João Goulart. JK esperava voltar ao poder nas eleições seguintes.

Mas o compromisso político não evitou que no dia 8 de junho de 1964, os direitos políticos de Juscelino fossem cassados por Castelo Branco e as eleições diretas de 65 fossem canceladas.

Aos 62 anos de idade, ao tomar conhecimento de que seria cassado, o predestinado senador pelo PSD discursou no Senado cinco dias antes do ato que o afastou definitivamente da vida política brasileira.

"Senhor presidente, na previsão de que se confirme a cassação dos meus direitos políticos, que implicaria na cassação de meu direito de cidadão, julgo ser meu dever dirigir algumas palavras à Nação Brasileira. Faço agora para que se o ato de violência vier a consumar-se, não me veja eu privado do dever de denunciar o atentado que na minha pessoa vão sofrer as instituições livres. Este ato é um ato de usurpação, e não um ato de punição. Será um ato de traição às promessas da revolução que ofereciam a oportunidade a todos os brasileiros de colaborarem na obra comum de reconstrução do país. Muito mais do que a mim, cassam os direitos políticos do Brasil"

No mesmo discurso, Juscelino prevê que o governo militar endureceria o regime nos anos seguintes, com sérias conseqüências para o povo brasileiro.

"Neste momento, com ou sem direitos políticos, prosseguirei na luta em favor do Brasil. Sei que nessa terra brasileira as tiranias não duram. Que somos uma nação humana penetrada pelo espírito de justiça. Homem do povo, levado ao poder sempre pela vontade do povo. Adianto-me apenas ao sofrimento que o povo vai enfrentar nessas horas de trevas que já estão caindo sobre nós. Mas dela saíremos para a ressurreição de um novo dia. Dia em que se restabelecerão a justiça e o respeito à pessoa humana. O ato das forças tirânicas que ameaçam apossar-se da revolução, de banir-me da vida pública, terá consequências que dificilmente poderão ser previstas"

JK viveria por alguns anos no exílio entre Paris, Lisboa e Nova York. Mas a saudade da terra natal angustiava o ex-presidente, ressaltou o deputado Tancredo Neves, em discurso na Câmara dos Deputados, na sessão solene do dia 24 de setembro de 1976, em memória do ex-presidente.

"Os interrogatórios inquisitoriais não demoliram o seu ânimo. As ameaças do terror não o abalaram, mas do exílio ele se entibiou. No exílio, ele sofreu. A saudade da pátria distante. O pavor de que não pudesse mais revê-la o angustiava e penetrava no seu coração com a agonia. De Nova Iorque ele escreve para um amigo palavras de dor e sofrimento. O dia de Natal amanheceu triste. Sentia uma solidão mortal."

Para Tancredo, grandes personagens da história como Cícero, Napoleão, Vitor Hugo e Rui Barbosa também pagaram o preço da glória com o exílio.

"O exílio é o preço que os grandes homens pagam para conseguir um lugar no coração do povo. Eles são supliciados, antes de serem glorificados. Mas o exílio realmente glorifica. Não há grande homem que não o tenha conhecido."

Juscelino volta ao Brasil em abril de 1967. É vigiado e proibido de atuar na política.

Em 1968, JK apóia a Frente Ampla, movimento que em busca da restauração da democracia no país reuniu um inusitado conjunto de políticos de tendências opostas como João Goulart e Carlos Lacerda. Mas o movimento foi proibido pela censura política militar.

Em 1975, Juscelino sofreu sua única derrota eleitoral, por uma cadeira como imortal na Academia Brasileira de Letras, que perdeu para o escritor goiano, Bernardo Ellis.

Angustiado pela mordaça que o obrigava a se calar, Juscelino Kubitschek, agora apenas um velho fazendeiro, morre a 22 de agosto de 1976 em um acidente automobilístico na Via Dutra, próximo à cidade de Rezende, no Rio de Janeiro.

O acidente nunca foi bem aceito pela opinião pública que até hoje levanta a suspeita de uma possível sabotagem, já que semanas antes do acidente, havia se espalhado pela mídia um boato sobre a morte de JK em condições semelhantes ao que aconteceu a seguir.

O sepultamento do político mineiro em Brasília uniu milhares de pessoas que lotaram a via W3.

O calor da emoção nas ruas de Brasília, na maior manifestação que a cidade teve até aquele momento, também foi lembrado pelo deputado Tancredo Neves em discurso.

"Na tarde e noite do último 23 de agosto, contemplamos uma multidão imensa que se agitava no coração desta capital e se colocava por extenso ao longo das ruas e avenidas aguardando horas a fio respeitosamente o instante de prestar sua última homenagem ao presidente, ao servidor do povo, ao amigo de todos, que horas antes a morte nos arrebatara tragicamente"

Neste ano de 2006, portanto, Juscelino Kubitschek é lembrado duplamente. Pelos 50 anos de sua posse como presidente da República e pelos 30 anos de sua morte.

Este programa Câmara é História teve como trilha sonora a música "Peixe Vivo", por Lui Coimbra, no início, e por Milton Nascimento, no final.

Consultoria musical de Marcos Brochado
Trabalhos técnicos de Milton Santos
Produção, texto e apresentação: Eduardo Tramarim
Coordenação de Jornalismo: Aprigio Nogueira.

O Câmara é História é uma produção da Rádio Câmara retransmitida por centenas de emissoras em todo o país. O programa resgata discursos e momentos relevantes do Parlamento e da política brasileira, situando-os no contexto histórico da época em que foram proferidos.

O programa pode ser baixado e reproduzido gratuitamente por qualquer emissora do país.

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