Rádio Câmara

Papo de Futuro

EP#80 - Propaganda eleitoral: saiba o que pode e o que não pode ser feito

27/08/2024 -

  • EP#80 - Propaganda eleitoral: saiba o que pode e o que não pode ser feito

As eleições são um grande teste para a democracia. Se não forem limpas, o país pode entrar em crise institucional. Quando a democracia não é respeitada, como vimos em 8 de janeiro, ocorrem fatos como quando a sede dos poderes da República em Brasília foi invadida e depredada. Minha geração não passou pela ditadura, mas viver sob o risco de ser preso a qualquer momento não é uma perspectiva agradável.

Agora, na era digital, as eleições se tornaram ainda mais importantes. Além da campanha realizada por influenciadores, que cada vez mais se candidatam à política, temos um exército de marqueteiros, publicitários e empresas que fazem qualquer coisa por um cargo político. Como a internet é muito grande, a psicologia da rede dá a sensação de que ninguém será pego se mentir ou espalhar notícias falsas. Mas não é bem assim, e eu vou te explicar por que: a maior parte das denúncias é feita por adversários políticos. E o candidato pode chegar a ter o mandato cassado.

Para tratar desse assunto, conversei com um dos maiores especialistas do Brasil em direito eleitoral, o consultor legislativo da Câmara dos Deputados, Roberto Carlos Pontes. Ele explicou que a eleição é o momento crucial em que a democracia é renovada. Diante do histórico de várias tentativas de fraudar eleições no passado, com disparos em massa de notícias falsas, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) resolveu endurecer o jogo, até com a previsão de cassação de diploma ou perda do mandato, se o candidato fraudador chegar a ser eleito, como explica Roberto Carlos.

"A legislação é dura. Deve-se analisar sob a ótica do bem jurídico tutelado. Crimes contra a honra ocorrem na vida comum, mas nas eleições o bem jurídico tutelado é a própria democracia. Muitas vezes, o candidato não quer ofender o outro; ele só não quer que o outro se eleja. E isso fere a democracia de forma grave. Do ponto de vista dos candidatos, aqueles que forem identificados praticando a desinformação e atingindo a democracia podem ser multados e, em um estágio até mais grave, podem perder o mandato."

Uma coisa é o que a lei diz, outra é a sua aplicação. Isso não parece uma medida extrema demais? Como você vai provar?

Estamos vivendo tempos extremos, que pedem respostas urgentes e drásticas. O remédio da justiça passa não apenas pela cassação, e essas medidas geralmente são definitivas, não dá para reverter. Um exemplo foi uma fake news contra as urnas eletrônicas. Ou seja, quem denuncia tem que ter provas. Os crimes vão desde atentado à democracia até crimes contra a honra, calúnia, injúria ou difamação, dependendo do conteúdo que é disseminado na rede. O importante é que, tanto o candidato quanto o eleitor, podem ser responsabilizados, e não adianta dizer que não sabia. É cassação mesmo, como explica Roberto Carlos.

"Há precedentes de parlamentares no nível estadual que chegaram a perder o mandato pela gravação de um vídeo em que faziam manifestação de fraude nas próprias urnas eletrônicas, e isso acabou gerando a perda do mandato. É importante que o eleitor fique atento para não disseminar esses vídeos. Há um conjunto de recomendações para que as pessoas confirmem os elementos das informações e não as disseminem de forma indiscriminada, espalhando informações falsas. Eles também podem estar sujeitos a sanções, como multas, por exemplo."

 E o que os estudos dizem sobre o impacto das notícias falsas nas eleições? Elas podem realmente mudar a opinião ou o voto de uma pessoa?

O impacto das notícias falsas nas eleições é tremendo, e eu vou te dar três razões: a primeira é que as pessoas tendem a acreditar mais no que veem do que no que ouvem. A segunda é que a desinformação é uma onda que não deve passar tão cedo, enquanto não tivermos a responsabilidade civil das plataformas para remover antecipadamente o conteúdo falso. Imagine se eu publicasse no jornal qualquer mentira que chegasse para mim, como jornalista. Na segunda mentira, ninguém mais acreditaria no jornal. As plataformas devem ser responsabilizadas por conteúdo falso disseminado na sua rede. A terceira razão é que a desinformação hoje é muito bem produzida e mascarada. Ela parece muito ser uma verdade, porque apela para emoções e crenças. Aliás, esse é o conceito da Universidade de Oxford para o termo “pós-verdade”.

Roberto Carlos explica o impacto da desinformação.

"O impacto é enorme. O conteúdo falso, que a pessoa não comunicou, que não disse aquelas palavras, enquanto se está tentando proteger a democracia, cria um elemento de descrédito. Não se pode mais acreditar em ninguém. O eleitor fica com a sua liberdade de formação da sua convicção comprometida, por conta desse conjunto de informações que, para ele, é muito difícil detectar que se trata de um vídeo falso. É quase impossível perceber que aquele vídeo foi produzido por inteligência artificial e fazer essa diferença... Para ele, é aquela pessoa que está produzindo aquelas palavras. A tecnologia é muito precisa."

E o deepfake, vai ser quase impossível detectar entre a verdade e a mentira. Como enfrentar esse dilema?

Então, é o momento de falar das novidades dessa eleição. A primeira é a proibição dos deepfakes. O candidato que usar essa inteligência artificial para criar vozes ou imagens atribuindo a uma pessoa algo eu ela nunca fez corre o risco de não chegar até o fim da corrida eleitoral. Roberto Carlos explica quem pode ser responsabilizado, nesse caso:

"A produção do vídeo em si não é algo vedado, o que é vedado é a divulgação do material no âmbito das redes sociais. Eu acho que houve uma evolução grande, prevendo uma responsabilização civil e administrativa das próprias plataformas, porque a própria plataforma tem meios tecnológicos de filtrar isso. Dado o volume enorme de notícias falsas e vídeos falsos, é impossível que o poder judiciário possa se debruçar sobre cada caso... É fundamental essa participação proativa das plataformas. Caso elas não façam isso e essas manifestações falsas vão a público, as plataformas também podem ser responsabilizadas."

Além da vedação absoluta ao uso de deepfakes, também não se pode: 1) usar chatbots e avatares;  2) conteúdo feito por IA precisa ser rotulado como tal e 3) qualquer conteúdo inverídico pode ser punido. O disparo em massa de mensagens por aplicativos como WhatsApp e Telegram, que contenham desinformação, falsidade, inverdade ou montagem em benefício de algum candidato ou candidata, ou em prejuízo de algum adversário, pode configurar abuso do poder econômico e uso indevido dos meios de comunicação.

Este episódio vai ficar no YouTube da Câmara dos Deputados, volte lá para rever essas regras e pesquise na internet a Resolução 23.732, de 2024, do TSE.

Essas eleições serão um grande balão de ensaio sobre o uso de IA nas eleições gerais em 2026, para presidente, deputados e governadores. É preciso ficar atento e usar também os checadores de fatos, verificar o conteúdo antes de compartilhar, conferindo se a fonte é segura, se a informação não é sensacionalista e se há indícios de fraudes, como muitos erros de português ou exageros na informação.

Você ainda pode enviar a sua sugestão de tema, crítica ou comentário para o WhatsApp da Rádio Câmara (61) 99978-9080 ou para o e-mail papodefuturo@camara.leg.br.

Coluna semanal sobre as novas tendências e desafios na comunicação no Brasil e no mundo, da telefonia até a internet, e como isso pode mudar a sua vida.

Terça-feira, às 8h