Rádio Câmara

Papo de Futuro

EP#55 - Direito autoral em IA, propaganda eleitoral e exploração comercial da infância na agenda de 2024

06/02/2024 -

  • EP#55 -Direito autoral em IA, propaganda eleitoral e exploração comercial da infância na agenda de 2024

Tendências, perspectivas, agenda, pauta, prioridades. O que esperar de 2024 em termos de tecnologia, comunicação e telecomunicações? Aqui você vai ouvir uma pauta convergente, em meio a tantas outras que poderiam surgir.

Temos várias pautas paralelas acontecendo, dependendo do prisma, dos interesses e do tamanho do poder de cada um dos atores.

2024 será tão intenso quanto os anos anteriores em termos de telecomunicações, isso é certo! Se as palavras fossem nuvens, certamente o nome "inteligência artificial" traria as nuvens mais intensas. Muito falado em 2023, na verdade, o tema avançou pouco em termos regulatórios, enquanto o uso da IA generativa, como o ChatGPT, avança sem muitas restrições éticas ou legais.

O que 2024 trará de novo é a briga do jornal New York Times para cobrar do ChatGPT o treinamento dos algoritmos com conteúdo jornalístico. Isso representa uma transposição do debate que ocorre na internet para o ambiente mais sofisticado dos modelos de linguagem de inteligência artificial (1). Ou seja, o jornalismo busca remuneração não apenas pelas redes sociais, devido ao seu conteúdo altamente acessado, mas também pelas plataformas de aprendizagem de máquina. Isso é de extrema importância e deve ser discutido no Congresso.

 

Lembro que o PL 1354/2021 (2) é um dos pontos críticos de discussão porque obriga as plataformas digitais a compartilhar receita publicitária com a mídia tradicional.

Rafael Grohman, brasileiro e cientista social que discute a precarização do trabalho em plataformas e é professor na Universidade de Toronto, relatou no podcast Código do Caos (3) que as notícias desapareceram das redes sociais da Meta no Canadá, onde reside atualmente, após a aprovação da lei que remunera os intermediários de notícias digitais. As redes sociais, dominadas por danças e filtros de beleza, ficaram ainda mais pobres em conteúdo?

A questão dos direitos autorais do jornalismo foi o ponto mais destacado no PL 2630/2020 (4), que aguarda votação na Câmara dos Deputados desde maio do ano passado, quando foi atacado pela campanha de desinformação patrocinada pelas plataformas no ambiente digital.

Embora trate de transparência, ética e combate às contas falsas na internet, as empresas como Alphabet e Meta, donas do Google, Youtube, Facebook e Instagram, resistem a mudar as regras do jogo devido ao lucro crescente. Conforme divulgado em 01 de janeiro, a Meta triplicou o lucro e anunciou pagamento de dividendos, o que levou suas ações a subirem 14%.

Como fica, então, a tentativa de regular as plataformas quando a saúde financeira dessas empresas está indo muito bem? Na semana passada, em 31 de janeiro, o presidente da Meta, Mark Zuckerberg, enfrentou uma das maiores humilhações da história ao ser questionado no Senado americano pela responsabilidade de não ter evitado a exposição de crianças de 13 a 15 anos a conteúdo sexual ou assédio em suas plataformas digitais. O Senador Josh Hawley fez a pergunta crucial: "A Meta também compensará as famílias das crianças que sofreram danos devido ao uso viciante do Facebook ou à exposição a conteúdo pornográfico e abusos nas redes sociais, nas mãos de pedófilos? (5) O senador Graham disse: “Zuckerberg, você tem sangue nas mãos.” (5) Mas quem decide as políticas desses plataformas não são os seus dirigentes, ou seja, os CEO da Meta (Facebook, Instagram e WhatsApp), X (antigo Twitter), TikTok, Discord e Snap, que estavam sendo interrogados no Senado americano. Quem decide são os acionistas, e não os seus executivos, entende?

Portanto, a agenda da regulação da internet, ou seja, a responsabilidade das empresas lideradas pelo Google e Facebook quanto ao conteúdo nocivo na rede, continua sendo a grande agenda da comunicação convergente, e as empresas provavelmente não farão isso, porque as crianças estão entre as maiores consumidoras de produtos e de conteúdo digitais. Isso seria dar um tiro no pé.

Olha, já falamos de remuneração para empresas jornalísticas, de direitos autorais para uso do ChatGPT, e de responsabilidade das plataformas digitais em indenizar famílias de crianças que sofrem linchamento digital como a menina mineira Jéssica Vitória e assédio sexual na internet, além do fim da exploração comercial de crianças e adolescentes, denunciada pelo instituto Alana (6), como pauta urgente, prioritária e notavelmente atrasada para 2024.

Indução à automutilação e ao suicídio; crimes contra o Estado democrático; contra a saúde pública; racismo; violência contra a mulher; pedofilia e pornografia, são crimes que já existem. O que a regulação prevista no PL 2630 fará é responsabilizar as plataformas se não removerem estes conteúdos preventivamente. E por que isso? Porque só elas, podem fazer isso, de maneira instantânea, como a internet exige!

E já vejo que vou ter que fazer o programa número 2 para tratar da agenda de telecomunicações, como a assimetria entre o streaming, ou seja, a Netflix e outras, e as TVs por assinatura, e também a discussão sobre o fair share, ou seja, a assimetria de tratamento entre os provedores de rede de comunicação e os provedores de redes sociais e conteúdo, pois os primeiros pagam a conta dos investimentos, e os últimos apenas usufruem das redes sem pagar nada.

Mas há um fator primordial que condiciona tudo neste ano de 2024, para o bem ou para o mal, depende da coragem de quem está do lado de cá para enfrentar a força econômica e o poder político das plataformas digitais. E nós estamos falando das eleições municipais, que, é claro, serão fortemente impactadas com o uso das deep fakes, em que os vídeos ou áudios feitos por IA imitam perfeitamente as pessoas reais, como aconteceu com o célebre médico Dráuzio Varella falso vendeu produtos de mentira na internet (7). Imagina o estrago que o deep fake pode fazer na reputação de candidatos sérios nas eleições.

Na ausência de uma regulação feita pelo Parlamento brasileiro, o TSE já se adiantou e vai lançar duas resoluções, regulando a propaganda eleitoral na internet, e sinaliza com medidas duras, cassando a candidatura ou o mandato de quem usar fake news nas eleições, seja com uso de inteligência artificial ou não (8).

O Consultor Roberto Carlos Pontes, da Câmara, afirma que a solução para termos eleições limpas é proibir a recomendação de conteúdo eleitoral durante os 45 dias de campanha. Por que isso é importante? Porque impede que as eleições sejam determinadas pelos algoritmos das plataformas, como aconteceu no famoso caso Cambridge Analytica, em que uma empresa de dados criou perfis falsos a partir de dados coletados ilegalmente do Facebook e, aparentemente, decidiu a eleição norte-americana em favor do presidente Donald Trump em 2016.

Ou seja, a agenda de 2024 é, mais uma vez, sobre quem vai controlar a economia, a política e os governos: se serão os Estados, por meio de leis e regras específicas, que valem para todos, ou se serão os termos de uso e a inteligência artificial embarcados nos algoritmos e no deep learning das empresas mais lucrativas do mundo, Alphabet/Google, Meta/Facebook, Apple, Amazon, Microsoft, dona da OpenAI (9).

Lembrando que o Supremo Tribunal Federal está aguardando a Câmara dos Deputados se manifestar sobre o art. 19 do MCI, o Marco Civil da Internet, que trata as plataformas como distribuidores de conteúdo, isentando-as de responsabilidade editorial sobre o mesmo (10).

É claro que o Brasil tem milhões de desafios nessa área da comunicação convergente, como discutir a neutralidade de rede, o acesso significativo ou real dos brasileiros à internet, a conectividade das escolas via 5G, a votação da lei que estabelece princípios para o uso da IA, como a proibição de vieses algorítmicos...

Mas o susto do “8 de janeiro” ressoa...ou seja, precisamos combater os massacres nas escolas que continuam acontecendo devido ao culto ao herói que viraliza nas redes sociais, a exploração do trabalho nas plataformas, à revelia da Constituição e das leis trabalhistas e os atentados ao Estado tramados nas redes sociais.

Esses eventos não deixam dúvidas sobre o que é realmente importante, urgente, relevante e necessário encarar em 2024... O que é para ontem... Afinal, a lição de “8 de janeiro” é: a democracia não pode esperar." (11)

Você ainda pode enviar a sua sugestão de tema, crítica ou sugestão para o WhatsApp da Rádio Câmara (61) 99978-9080 ou para o e-mail papodefuturo@camara.leg.br.

Comentário – Beth Veloso
Apresentação – Marcio Achilles Sardi

Coluna semanal sobre as novas tendências e desafios na comunicação no Brasil e no mundo, da telefonia até a internet, e como isso pode mudar a sua vida.

Terça-feira, às 8h