Ministério Público propõe que crime de superfaturamento seja especificado em nova lei de licitações
Segundo procurador, o superfaturamento de obras é um dos principais mecanismos para desvio de recursos públicos
27/03/2018 - 14:48
O Ministério Público Federal (MPF) propôs nesta terça-feira (27) que a nova lei de licitações, que está sendo discutida na Câmara dos Deputados, torne o superfaturamento de compras públicas um crime específico, a fim de combater desvios no setor público. A proposta foi feita pelo procurador da República Leonardo Andrade Macedo, que integra um grupo de trabalho sobre licitações do MPF.
Macedo participou da audiência pública promovida pela comissão especial que discute a reformulação do marco legal das licitações (PL 1292/95 e apensados). O foco da discussão tem sido o PL 6814/17, do Senado, um dos apensados. A comissão é presidida pelo deputado Augusto Coutinho (SD-PE). O relator é o deputado João Arruda (PMDB-PR).
Penas
A proposta do Ministério Público é que o crime de superfaturamento em obras públicas preveja pena de reclusão de 4 a 12 anos, e multa, e em aquisições de bens e serviços, pena de reclusão de 4 a 8 anos, e multa. Segundo o procurador, o superfaturamento de obras é um dos principais mecanismos para desvio de recursos públicos. “O TCU [Tribunal de Contas da União] identificou que pelo menos ¼ das obras fiscalizadas dizem respeito a superfaturamento. Daí a relevância de termos um tipo penal que contemple o superfaturamento de obras públicas”, disse Macedo.
Atualmente, não existe na legislação penal um dispositivo específico para este tipo de conduta. Gestores públicos e empresários flagrados acabam sendo processados por crimes como peculato, estelionato ou fraude à licitação, que têm penas menores. Macedo propôs ainda que a nova lei de licitações incorpore as definições de superfaturamento e sobrepreço presente da Lei de Responsabilidade das Estatais (Lei 13.303/16).
Sugestão da OEA
O procurador lembrou que sugestão semelhante foi dada no último dia 15 pela Organização dos Estados Americanos (OEA), ao aprovar o relatório sobre o Brasil referente a políticas de combate à corrupção. Ele disse ainda que a “tipificação” do crime de superfaturamento deve abranger todas as condutas relacionadas a este delito, como o jogo de planilha (alterações dos contratos licitatórios, por meio de aditivos, que acabam superfaturando as obras).
Macedo também defendeu uma nova redação para o crime de dispensa indevida de licitação, para acabar com as posições divergentes dos tribunais. Atualmente, uma parte da jurisprudência entende que o crime só existe quando há dano ao erário. Para o MPF, o crime deve independer dos eventuais prejuízos. Estes, se existirem, devem entrar como agravantes da pena.
Portal
Também presente à audiência pública, o diretor de Auditoria de Governança e Gestão do Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União, Valmir Gomes Dias, sugeriu aos deputados a criação de um portal nacional de licitações, englobando os certames realizados por todos os órgãos públicos do País. “Não temos um local único que consolide essas informações. Seria útil para empresários e para os gestores públicos”, afirmou Dias. O portal, segundo ele, dispensaria a publicação dos editais de licitação em jornais locais, reduzindo custos para a administração pública.
Já o consultor-geral da União, Marcelo Augusto Carmo de Vasconcellos, representante da Advocacia-Geral da União (AGU) no debate, propôs um aumento do seguro-garantia para obras de grande vulto (com valor estimado superior a R$ 100 milhões), que no projeto do Senado está em 30%. Ele afirmou que países como França e Estados Unidos já adotam o seguro-garantia de 100% do valor do empreendimento. Chamado no mercado de performance bond, o seguro garante indenização a uma das partes pelo não cumprimento de um contrato.
Simplificação
Durante o debate, diversos deputados alertaram para a necessidade de aprovar um projeto que simplifique as normas atuais de licitação. Vitor Lippi (PSDB-SP) afirmou que a Lei de Licitações (Lei 8.666/93) é ineficiente e penaliza o bom gestor. “Os gestores de boa-fé estão engessados e têm uma dificuldade muito grande na aplicação da lei”, disse. Ele propôs ainda uma legislação licitatória específica para as compras da saúde, como remédios e equipamentos.
O deputado Bebeto (PSB-BA) disse que a comissão precisa tratar de assuntos que hoje não estão bem delineados na legislação, como o alcance da responsabilidade de gestores ou empreiteiras pelo atraso das obras. Já o deputado Assis Carvalho (PT-PI) defendeu a simplificação das normas. “Uma lei não pode ter controles superiores à capacidade do gestor de prover os serviços”, disse.
Reportagem - Janary Júnior
Edição – Roberto Seabra