Política e Administração Pública

Juristas apontam ilegalidades no uso da delação premiada

Para os debatedores, a legislação precisa ser aprimorada para garantir transparência e prestação de contas em relação às negociações, de modo a evitar abusos

21/11/2017 - 17:12  

Luis Macedo/Câmara dos Deputados
Audiência Pública Interativa (REQ 272/17). Professor titular da Universidade Federal do Paraná, Jacinto Nelson de Miranda Coutinho; Ex-Procurador da República, Eugênio José Guilherme de Aragão
O ex-ministro Aragão apontou ilegalidades na força-tarefa da Lava Jato

Especialistas ouvidos nesta terça-feira (21) em audiência pública da CPI mista da JBS, apontaram o que consideram ilegalidades na maneira como estão sendo negociadas pelo Ministério Público e homologadas pelo Judiciário delações premiadas relacionadas à Operação Lava Jato.

Os convidados afirmaram que presos e acusados estão se tornando delatores sob ameaça e que delações estão sendo corroboradas por outras delações, e não por provas. Afirmaram ainda que o Judiciário tem homologado os acordos por meio de pressão da mídia.

No centro do debate estava a Lei das Delações Premiadas (lei 12.850/2013), aprovada há quatro anos pelo Congresso.

Para os debatedores, a legislação precisa ser aprimorada para garantir transparência e prestação de contas em relação às negociações, de modo a evitar abusos e o que consideram ilegalidades na aplicação da lei, como a redução de pena oferecida aos delatores pelo Ministério Público, atribuição que seria do Judiciário.

Irmãos Batista
Eles criticaram, por exemplo, a imunidade penal oferecida pelo Ministério Público Federal aos irmãos Wesley e Joesley Batista, controladores do grupo J & F, e cláusulas de acordos de delação premiada que teriam poupado o sequestro de bens obtidos de forma ilícita por colaboradores em troca de informações – e apontaram casos concretos ligados às colaborações do doleiro Alberto Youssef e do ex-gerente da Petrobras Pedro Barusco.

O ex-ministro da Justiça Eugênio Aragão, procurador da República aposentado, apontou ilegalidade na formação de uma força-tarefa formada pelo Ministério Público, polícia e “um juiz”. “São três autores muito empoderados, sobre os quais não existe nenhum controle de fato. Neste caso, para quem o investigado vai se queixar? Ele está entregue ao arbítrio”, disse.

Ele citou nominalmente, neste contexto, o procurador da República Deltan Dallagnol, coordenador da força tarefa da Lava Jato em Curitiba. Segundo ele, o Ministério Público, por ser o fiscal da lei, tem também como função pedir a absolvição do réu que considerar inocente, o que, segundo ele, não aconteceria no Brasil. “Aqui só tem acusadores. O Ministério Público não deveria ter espaço para dallagnois”, disse.

Luis Macedo/Câmara dos Deputados
Audiência Pública Interativa (REQ 272/17). Professor titular de Processo Penal na Universidade Federal de Santa Catarina e Juiz de Direito em Santa Catarina, Alexandre Morais da Rosa
Juiz Alexandre Morais da Rosa: delação premiada se tornou um mercado

Para o juiz Alexandre Morais da Rosa, professor de Processo Penal na Universidade Federal de Santa Catarina, a delação premiada se tornou um mercado em que o papel principal tem sido desempenhado pelo Ministério Público.

“Joesley Batista não poderia nunca ter recebido imunidade. Isso está na lei, que prevê redução da pena em dois terços e, no máximo, à metade. Mas o Supremo foi constrangido a não cumprir a lei”, disse, se referindo à homologação do acordo pelo ministro Edson Fachin, do Supremo tribunal Federal.

Ele cobrou mais transparência no processo de negociação, com regras claras sobre as cláusulas do acordo e formalização da proposta.

Já o advogado Aury Celso Lima Lopes Jr., professor de Direito Processual Penal na Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Rio Grande do Sul, criticou acordos de delação feitos com acusados presos. “No Brasil, se você delatar terá benesses; se não delatar terá penas altíssimas. É uma ameaça. E estão usando as prisões cautelares para pressionar sim”, disse.

Inconstitucional
Ele defendeu decisão recente do ministro Ricardo Lewandowski, do STF, que recusou delação premiada do marqueteiro Renato Pereira sob o argumento de que o Ministério Público não poderia ter oferecido por conta própria a pena e a multa atribuídas ao colaborador. “O Ministério Público não pode dizer que a pena será de no máximo 2 anos. Quem estabelece pena é o juiz. E é ilegal o juiz homologar isso”, disse Lopes Jr.

Já o professor Jacinto Nelson de Miranda Coutinho foi além e disse que toda a lei das delações premiadas é inconstitucional. “É preciso normatizar as delações para tornar a lei constitucional. Porque do jeito que vai ela não tem jeito”, disse.

Reportagem – Antonio Vital
Edição – Roberto Seabra

A reprodução das notícias é autorizada desde que contenha a assinatura 'Agência Câmara Notícias'.