Ex-ministra da Cultura minimiza denúncias de fraudes em beneficiárias da Lei Rouanet
18/10/2016 - 19:58 • Atualizado em 18/10/2016 - 20:26
A ex-ministra da Cultura Ana de Hollanda minimizou, nesta terça-feira (18), as denúncias de fraudes envolvendo empresas beneficiárias da Lei Rouanet (Lei 8.313/91) deflagradas pela Operação Boca Livre, da Polícia Federal (PF).
Essa investigação motivou a instalação, na Câmara dos Deputados, de comissão parlamentar de inquérito (CPI) para apurar o uso indevido de dinheiro público destinado à promoção cultural para financiar eventos privados. O depoimento da ex-ministra ocorreu nesta CPI.
Durante a reunião desta tarde, os parlamentares da oposição reforçaram o discurso de que o Ministério da Cultura (Minc) teria perdido o controle sobre a liberação do incentivo fiscal, o que teria ensejado a formação de organizações criminosas especializadas em fraudar contratos da Lei Rouanet.
Distorções
Aos parlamentares da CPI, a ex-ministra afirmou que “existiram distorções, muito mais que desvios” e que a fiscalização sobre os mais de 9 mil projetos analisados pela pasta ao ano foi prejudicada por deficiências estruturais, como a falta de funcionários e o elevado número de demandas.
“O que se percebia eram as dificuldades para a prestação de contas, porque pedíamos todas as notas. O problema, era checar”, disse.
“A gente só ia examinar essa prestação de contas anos depois de realizado (o evento), então não dávamos conta”, completou, ao informar que apenas os projetos encampados pelo Itaú Cultural geravam 15 mil notas fiscais.
Fragilidade da fiscalização
Para o relator da CPI, deputado Domingos Sávio (PSDB- MG), os comentários da ex-ministra demonstram o “grau de fragilidade enorme” da fiscalização do Minc.
Ele cobrou do ministério uma fiscalização mais rigorosa sobre projetos que captam um volume alto de recursos, mas não apresentam contrapartidas à sociedade. É o caso de shows de rock com ingressos caros.
“Se o dinheiro é curto, e a gente sabe que tem 100 projetos que não conseguem captar, a seleção dos beneficiários seria algo que deveria ser revisto, ou deveríamos modificar a lei para evitar que situações como essa se repitam”, afirmou.
O deputado Izalci (PSDB-DF) também apontou deficiências na fiscalização. “Há casos de um mesmo projeto ser apresentado por diversas empresas, porque não se têm controle do CNPJ, então liberam recursos para cinco ou seis projetos iguais”, disse.
Ele citou o caso do Grupo Bellini, um dos investigados na Operação Boca Livre, que captou recursos para 141 projetos culturais, mas realizou shows com artistas famosos, festas corporativas e um casamento.
Tomada de contas
Ana de Hollanda rebateu as observações dos deputados. Ela observou que o diagnóstico da Operação Boca Livre teve início na sua gestão por meio de uma tomada de contas especial que envolveu o ministério e a Receita Federal.
Segundo ela, a partir dessa força-tarefa os casos suspeitos foram encaminhados, na gestão de Marta Suplicy, para a Controladoria Geral da União (CGU). A ex-ministra reconheceu, entretanto, que é preciso revisar a legislação, sobretudo para aprimorar os mecanismos de fiscalização disponíveis ao ministério.
O cruzamento de dados fiscais (CNPJ e CPF) - um meio de identificar fraudadores –, por exemplo, só pode ser feito pela Receita Federal. Na sua avaliação, a falta de articulação com outros órgãos prejudica a tomada de medidas mais efetivas pela pasta.
O deputado Pompeu de Mattos (PDT-RS), que sugeriu o convite de Ana de Hollanda, e Érika Kokay (PT-DF) elogiaram a “postura firme da ex-ministra”. A petista comentou o esforço inicial para apurar “de forma efetiva e imediata” as suspeitas fraudes no fomento à cultura.
Sem caças às bruxas
A ideia da CPI era ouvir todos os ex-ministros de cultura, mas Ana de Hollanda foi a única que aceitou comparecer. Outros casos, como a ex-ministra Marta Suplicy (senadora pelo PMDB-SP) declinaram ou justificaram a ausência.
Segundo o presidente do colegiado, deputado Alberto Fraga (DEM-DF), é possível que as autoridades sejam convocadas, se as faltas persistirem: "Nós não queremos fazer uma CPI de caças às bruxas; agora, fica difícil em falar em não investigar os últimos anos, quando o governo era do PT; nós temos votos suficientes para aprovar os requerimentos, as convocações."
Reportagem – Emanuelle Brasil
Edição – Newton Araújo