Saúde

Familiares reivindicam acesso a alimentos especiais em audiência na Câmara

Consumo de proteína pode colocar em risco a vida de pessoas com doenças genéticas causadas por erros no metabolismo ou provocar sequelas e deficiências graves

05/11/2015 - 14:22   •   Atualizado em 06/11/2015 - 17:51

A audiência pública promovida na quarta-feira (4) pela Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência da Câmara dos deputados sobre o acesso à alimentação especial foi marcada por relatos emocionados de familiares presentes e que acompanhavam o debate pelo portal e-Democracia. O debate foi solicitado pelos deputados Eduardo Barbosa (PSDB-MG) e Mara Gabrilli (PSDB-SP).

Alex Ferreira / Câmara dos Deputados
Audiência pública sobre alimentos para fins especiais: condições e medidas para seu acesso. Dep. Mara Gabrilli (PSDB-SP)
Mara Gabrilli questionou por que o Brasil ainda não produz alimentos especiais em escala industrial e lembrou que a Lei de Inclusão, a partir de 2016, garantirá o acesso a esses alimentos

De acordo com a Portaria 29/98, da Secretaria de Vigilância Sanitária, do Ministério da Saúde, os alimentos especiais são aqueles formulados ou processados, nos quais se introduzem modificações no conteúdo de nutrientes, adequados à utilização em dietas diferenciadas que atendam às necessidades de pessoas em condições metabólicas e fisiológicas específicas.

Em seus depoimentos, pais explicaram aos deputados por que seus filhos sentem fome. São crianças com doenças genéticas causadas por erros no metabolismo, em que o consumo de alimentos com proteína pode colocar a vida em risco. As doenças mais conhecidas nesse espectro são a fenilcetonúria e homocistinúria. Sem tratamento adequado, essas doenças podem provocar sequelas neurológicas e deficiência intelectual.

“O principal passo é tirar qualquer alimento que tenha proteína: carnes de qualquer espécie, tudo que tem farinha de trigo, pão, macarrão, bolos, feijão, lentilha, soja, qualquer tipo de leguminosa, leites e derivados, queijos, chocolate”, enumera a nutricionista Beatriz Grangipani, da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), que acompanha seus pacientes há mais de 20 anos. Segundo ela, mesmo os alimentos permitidos precisam ser consumidos criteriosamente, para não comprometer a saúde dos pacientes, pois também têm aminoácidos que precisam ser quantificados.

Necessidade x luxo
Mesmo com condições financeiras restritas, a presidente da Associação Brasileira de Homocistenúria, Simone Arede, passou a comprar esses produtos depois que flagrou o filho na cozinha de madrugada, com fome. Ela contou que, mesmo todo o esforço em pesar e restringir a alimentação dele, que é paciente de homocistenúria, suas taxas eram sempre altas. Simone cobra do Ministério da Saúde que os pacientes tenham acesso a alimentos com baixo teor de proteína. “Não é luxo, é uma necessidade. Eles têm direito a uma vida normal como qualquer outra pessoa. Nenhuma mãe quer ver um filho com fome.”

Pessoas com essas disfunções precisam também ingerir uma fórmula de aminoácidos que é oferecida em poucos programas de saúde na rede pública. Para garantir o acesso, as famílias têm entrado na Justiça. A deputada lembrou que a Lei Brasileira da Inclusão (Lei 13.146/15), que entra em vigor em janeiro de 2016, explicou que o poder público será obrigado a oferecer a fórmula.

"A Lei Brasileira da Inclusão traz a obrigatoriedade expressa que as pessoas tenham acesso à fórmula nutricional. Mas a gente não conseguiu fazer com que elas tivessem acesso expresso a alimentos especiais, ainda."

Ao ser indagado por Mara Gabrilli sobre o motivo de não haver produção no País, o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Alimentos para fins especiais (Abiad), Carlos Eduardo Gouvêa, disse que a produção em baixa escala e a matéria-prima cara desencorajam os empresários. Gouvêa sugeriu medidas concretas, incluindo isenção fiscal na importação e a criação de uma cesta básica de alimentos com baixo teor de proteína, a ser distribuída aos pacientes. Segundo ele, com mais acesso à variedade de alimentos, a pessoa adere ao tratamento, tem menos internações e menos sequelas.

Isenção tributária
O deputado Mandetta (DEM-MS) defendeu que o Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) deve estabelecer a isenção tributária desses alimentos e não considera-los supérfluos. O parlamentar propôs também que a comissão envie um requerimento de informação ao Ministério da Saúde, para que o órgão se posicione sobre a oferta dos alimentos especiais, elaborando uma lista que possa ser enviada ao Confaz. "Eu acho que esses alimentos estão sendo rotulados como supérfluos e por isso a carga tributária é tamanha."

Para agilizar esse estudo, o presidente da Abiad se comprometeu a submeter uma lista de produtos importados para análise do Ministério da Saúde e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

O representante da Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição do Ministério da Saúde Eduardo Nilson disse que a Anvisa deve elaborar essa lista de alimentos especiais com evidências científicas, critérios técnicos e a participação dos setores sociais envolvidos.

No entanto, a representante da Gerência Geral de Alimentos da Anvisa Antônia Maria de Aquino foi mais reticente sobre a elaboração dessa lista para ser submetida à isenção de impostos. “Eu concordo com a mãe da criança quando ela diz que não se deve importar a marca e sim a categoria do alimento, mas é preciso ter cuidado ao fazer a lista”, disse ela. Antônia disse acreditar que isentar categorias inteiras pode ser um incentivo para que esses cheguem ao Brasil a um custo mais barato.

Da Redação - AR
Com informações da Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência

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