Direitos Humanos

Familiares de desaparecidos políticos criticam composição da Comissão da Verdade

01/07/2011 - 19:51  

Durante duas audiências públicas realizadas pela Câmara dos deputados, no fim do mês passado, diversos deputados e parentes dos desaparecidos políticos criticaram o Projeto de Lei 7376/10, do Executivo, que institui a Comissão Nacional da Verdade.

Entre as críticas feitas pelos familiares estão a possibilidade de militares participarem do colegiado, o pequeno número de integrantes previstos (sete) e o período histórico analisado pela comissão.

Segundo a vice-presidente do grupo Tortura Nunca Mais do Rio de Janeiro, Victória Grabois, a possiblidade de participação de militares é “antiética”, porque a hierarquia das Forças Armadas comprometeria a isenção da investigação. “A comissão deve ser formada por especialistas, parlamentares afetos à questão, professores e pesquisadores. Até poderia ter alguém do governo, mas é muito importante que esse número de sete integrantes seja aumentado, porque eles não teriam nenhuma condição de investigar as mais de 50 mil prisões políticas”, disse.

Composição em outros países
Essa composição também é considerada insatisfatória pelo coordenador do Grupo de Trabalho Memória e Verdade da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, Marlon Weichert. “O bom funcionamento de uma Comissão da Verdade reclama recursos humanos numerosos, qualificados e interdisciplinares. Por esse motivo, a Comissão da Verdade da África do Sul teve mais de 200 integrantes, a da Guatemala entre 100 e 200 e as da Argentina, Chile e Haiti, entre 51 e 100 pessoas”.

Weichert sugere que a comissão seja composta, entre outros profissionais, por psicólogos, “para apoio às vítimas e testemunhas”; técnicos em bancos de dados, “para registro e compilação das informações”; e seguranças, “para proteção do acervo, dos membros e colaboradores”.

Em relação ao período a ser analisado pela comissão – 18 de setembro de 1946 a 5 de outubro de 1988 – tanto o procurador quanto a representante dos desaparecidos políticos consideram excessivo.

“Além de ser um período muito longo [42 anos], recai sobre momentos históricos que são diversos e sem interligações que justifiquem a análise conjunta”, disse Weichert. “Esse prazo tão grande inviabiliza o funcionamento da comissão”, acrescenta Victória Grabois.

Negociação política
A negociação política para a discussão da comissão especial também é foco de controvérsia, especialmente entre os parlamentares. Entre alguns, há o receio de que o governo pressione pela aprovação de um requerimento de urgência para a proposta, o que dispensaria a instalação da comissão e restringiria as discussões sobre mudanças no texto.

"No caso de a proposta ser votada em regime de urgência, o parecer será dado na própria sessão do Plenário e votado sem tempo para fazer emendas e destaques que familiares das vítimas acham necessários, e assim corrigir aspectos considerados inadequados", alerta a deputada Luiza Erundina (PSB-SP).

O deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ), que costuma se manifestar favoravelmente à postura das Forças Armadas militares durante o regime militar, também critica a possibilidade de o projeto não ser debatido na comissão especial. “Estou sabendo que o governo está colhendo assinaturas para aprovar a urgência ao projeto, sem discussão na comissão, e isso não pode, porque quero ser indicado para compor o colegiado”, declarou.

Ele quer incluir entre as atribuições da comissão a de apurar supostos crimes cometidos pelas pessoas que adotaram a luta armada para combater o regime. “Sem essa análise, o relatório da comissão será tendencioso e vai colocar os militares como praticantes de horrores no currículo escolar brasileiro”, disse.

Reportagem - Rodrigo Bittar
Edição – Regina Céli Assumpção

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