CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ

Sessão: 1705/08 Hora: 14:49 Fase:
Orador: Data: 03/12/2008



DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO


NÚCLEO DE REDAÇÃO FINAL EM COMISSÕES


TEXTO COM REDAÇÃO FINAL


COMISSÃO ESPECIAL - LEI DA ANISTIA

EVENTO: Reunião Ordinária N°: 1705/08 DATA: 03/12/2008

INÍCIO: 14h49min TÉRMINO: 16h39min DURAÇÃO: 01h50min

TEMPO DE GRAVAÇÃO: 1h50min PÁGINAS: 51 QUARTOS: 22



DEPOENTE/CONVIDADO - QUALIFICAÇÃO


JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Tenente da Reserva do Exército brasileiro. Ex-Chefe do Grupo de Combatentes.



SUMÁRIO: Tomada de depoimento.



OBSERVAÇÕES


Houve intervenção fora do microfone. Inaudível.


O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - Declaro abertos os trabalhos da 14ª reunião da Comissão Especial destinada a acompanhar a aplicação de leis de anistia.

Indago dos Srs. Deputados sobre a necessidade de leitura da ata da reunião anterior, dado que foi distribuída com antecedência.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Justamente, por isso, Sr. Presidente, solicito dispensa da leitura da ata, tendo em vista o seu prévio conhecimento.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - Dispensada a leitura da ata, consulto os Srs. Deputados sobre se há alguma retificação a fazer no texto distribuído.

Não havendo quem queira discutir, coloco-a em votação.

Os Srs. Deputados que a aprovam permaneçam com se encontram. (Pausa.)

Aprovada a ata.

Esta reunião de audiência pública foi convocada com o objetivo de ouvir o Tenente José Vargas Jiménez, a quem convido para compor a Mesa.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Sr. Presidente, a respeito da prorrogação do nosso trabalho, houve alguma definição?

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - Foi solicitada a prorrogação dos trabalhos da Comissão e o Presidente deferiu pedido de prorrogação por igual período. Portanto, os trabalhos da Comissão vigorarão até 30 de julho de 2009.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Parabéns, Presidente.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - Bem, passamos, então, a palavra ao expositor, Sr. José Vargas Jiménez, que terá o tempo que considerar necessário para fazer sua exposição. Recomendamos um tempo de até 20 minutos, mas, se for necessário um tempo mais extenso, V.Sa. fique à vontade.

V.Sa. foi convidado pela Câmara dos Deputados a comparecer a esta Comissão, na condição de convidado, em função de 2 matérias divulgadas, na revista ISTOÉ, que dão conta de informações e documentos que estariam em seu poder. A Comissão considerou que essas informações e esses documentos podem ser úteis no sentido da aplicação da Lei de Anistia, especialmente, da Lei nº 10.559, dado que existem dúvidas a respeito de pessoas, de provas, de fatos que ocorreram na conhecida Guerrilha do Araguaia.

Então, como V.Sa. foi convidado, gostaríamos que, ao fazer a sua exposição, trouxesse elementos no sentido de criar condições para a aplicação da Lei da Anistia, tendo em vista que o objeto desta Comissão Especial é o acompanhamento da aplicação da legislação que se refere à anistia no Brasil.

Com a palavra o Sr. José Vargas Jiménez.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Sr. Presidente, Deputado Daniel Almeida, Srs. Deputados, boa tarde.

Fui convidado em cima da hora, em razão de entrevista que dei à revista ISTOÉ. Porém, há um ano, lancei o livro Bacaba - Memórias de um Guerreiro de Selva da Guerrilha do Araguaia, no qual relato todos os acontecimentos dos quais eu participei, desde a preparação até a minha a minha (ininteligível.)

A resposta para muitas perguntas que, acredito, os senhores farão está no livro, com provas documentais. O livro não é só ficção, é uma realidade. No período em que eu estive atuando na guerrilha - eu era 3º Sargento, comandava 10 homens e trabalhei com o Curió - morreram 32 guerrilheiros. Alguns camponeses que entraram na guerrilha e outros que apoiavam os guerrilheiros foram presos. No meu livro, constam todos esses relatos, com fotos.

S. Presidente, recebi o requerimento da Câmara dos Deputados, de autoria do Deputado Daniel Almeida, e vou basear a minha exposição na última parte do requerimento, que diz assim:

"Esta convocação se justifica em 2 aspectos distintos:

1- pelos direitos que os familiares das vítimas têm de conhecer o paradeiro de seus entes queridos e para reunir provas com o intuito de identificar formalmente os trabalhadores rurais vítimas dos arbítrios da ditadura. E, com isso, conceder aos seus familiares os direitos que lhe conferem;

2 - pela necessidade de reescrevermos a nossa história e deixarmos às futuras gerações um exemplo de compromisso com a verdade e com a liberdade, respaldadas no valor à democracia.

Sala das sessões, 18 de novembro de 2008. Deputado Daniel Almeida."

Bem, senhores, no meu livro relato os planos de Busca e Apreensão e Captura e Destruição. No Plano de Busca e Apreensão constava a lista dos camponeses que foram feitos prisioneiros - há alguns camponeses citados aqui que eu posso afirmar e confirmar. Nesse documento, os povoados onde se encontravam os camponeses a serem presos estavam assim relacionados: em Bom Jesus: José Salim - o Salu -, Leonel, Severino, Oneide, João Merim e Luiz, todos com prioridade 1 para sua captura. E Luizinho, Leônidas e Salomão, com prioridade 3. Em Santa Rita: Manoel Cícero. Em Itamerim: André e Zé de Tal - o guia Jerônimo é quem conhece. Em Brejo Grande: Bernardino e Vicente, capataz de Zé Oliveira. Em Cristalândia: José Murada. Em Centro de Osorinho: mulher e filho com 18 anos, prioridade 3. Estes estão relatados no livro, com provas.

No entanto, quando estivemos lá na primeira missão, eu, Curió e mais 2 grupos de combate - cada grupo era integrado por 10 homens, éramos 30 -, no dia 3 de outubro de 1973, fomos para o povoado de Bom Jesus. Lá nós chegamos e prendemos todos... minto, quase todos os camponeses. Além dos que estão relacionados, também aqueles que tinham condições de ajudar a guerrilha e os filhos jovens que também poderiam ajudar os guerrilheiros. Só deixamos as esposas e as crianças. E continuamos na selva. Passamos no "Mané das duas mulheres", um camponês que era amigado com 2 irmãs.   

Nesse primeiro dia, nós prendemos 40 camponeses. Era difícil deslocar na selva com 40 camponeses e mais 30 que constituíam o nosso grupo. Então, o Curió designou 2 grupos de combates, 2 sargentos com curso de guerra na selva, como eu, para que levassem os 40 camponeses para a base de operações de combate Bacaba - nós ainda não conhecíamos a base. Eu fiquei com o Curió na selva fazendo emboscadas e capturando mais camponeses. Em relação aos camponeses, eram 3 grupos. Outros grupos de combate também atuaram na região de São Domingos, Bom Jesus - em Bom Jesus eu atuei - Chega com Jeito. Então, vários lugares. E na região de Xambioá os pára-quedistas também fizeram esse trabalho. Agora, a relação dessa gente eu não... só tenho essa de que falei, a qual consta no meu livro.

Se alguém quiser fazer alguma pergunta sobre esse primeiro tema, O Paradeiro, por favor, pode fazê-lo.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - Não, vamos lhe dar todo o tempo para fazer a exposição e, logo após, passaremos às perguntas sobre toda a exposição.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Bem, com relação a esse primeiro item - Dos Familiares e Vítimas -, é isso que posso falar.

Segundo item: Pela Necessidade de Rescrevermos a nossa História.

Hoje em dia, a mídia e as pessoas que estão no poder divulgam que nós, os militares, na época do regime militar, da ditadura militar, fomos os vilões e que eles lutaram contra o regime, contra a ditadura, pela democracia que temos agora. Isso é uma mentira enorme.

Tenho aqui um documento de um dos partidos de esquerda - um estudo do PCdoB para a implantação da guerrilha rural no Araguaia, de 1968 a 1972 -, que se chama A Guerra Popular no Araguaia. Esse documento está comigo há 35 anos. Eu o peguei no dia em que foram mortos os 8 guerrilheiros que comandavam, entre eles Maurício Grabois, com quem estava o documento. Esse documento está aqui e vou entregá-lo ao Presidente da Mesa. Nele, eu provo que o PCdoB treinou muitos membros do Partido Comunista do Brasil, na China, em Cuba, para lutar contra nós.

Então, eles estavam preparados.

O documento está aqui. Por que a região foi escolhida? Vou ler algumas páginas.

"A escolha da região não foi espontânea, nem realizada empiricamente, resultou de um profundo trabalho de pesquisa e de estudo minucioso, objetivando    determinar uma área em que a luta armada pudesse ser iniciada em que fosse assegurada a sobrevivência dos grupos combatentes. A região satisfaz plenamente as exigências para início e desenvolvimento da guerra popular, particularmente a guerra de guerrilha.

Outros povos utilizam o sucesso das florestas - por isso que eles utilizaram a selva - como palco de suas ações guerrilheiras, a exemplo do que ocorre no Vietnã, Malásia, Angola e outros países."

Aqui diz:

"Por outro lado, aponta certas vantagens para o revolucionário, porque o adversário ficará exposto a seus ataques de surpresa ao longo de uma extensa rodovia localizada na mata.

O grosso da população é constituída de camponeses do Maranhão, Piauí, Ceará, Bahia, Goiás e Estados do Nordeste. Os habitantes da região não têm outra saída para solucionar os seus problemas, a não ser a revolução. O objetivo das Forças Armadas Revolucionárias do PCdoB, a Fogueira - Força, Guerrilheira do Araguaia - é assegurar a sua sobrevivência e garantir um crescimento constante para formar um exército regular.

Mesmo que o inimigo coloque, em muitos pontos dessa área, postos fixos e realize patrulhamento, não conseguirá impedir que os guerrilheiros ali vivam, combatam e se organizem em massa e se fortaleçam continuamente. A luta das guerrilhas tem possibilidade de crescer na região devido ao fato de a população ser pobre e sofrida. Dependendo da circunstância da luta, afluirão para a região revolucionários de todas as partes do País a fim de ingressar nas forças guerrilheiras. A guerrilha poderá acumular forças, realizar intenso trabalho político, engrossar suas forças combatentes, mantendo-se com recursos locais."

E vai por aí.

"Para o inimigo... a região é hostil e desconhecida; suas tropas serão trazidas de fora. A mata, embora generosa com os guerrilheiros adaptados à região, e que conhecem bem, será madrasta para o soldado (ininteligível) acostumado com a placidez dos quartéis, desconhecedor do segredo em selva. A vida na mata apresenta dificuldades. Para enfrentar doenças, mosquitos e intempéries é necessária elevada consciência e espírito de abnegação que somente os guerrilheiros do PCdoB possuem.

As Forças Armadas ficarão isoladas e cercadas pelo ódio do povo."

Então, esse documento foi preparado pelo PCdoB durante 4 anos. E realmente, eu que estive lá sei que tudo que eles previram aqui deu certo na primeira fase da guerrilha, quando o Exército colocou pessoas despreparadas, recrutas de Goiás, de Brasília, como eles escreveram aqui. Então, na primeira fase da guerrilha os guerrilheiros ganharam a primeira batalha.

Aí o Exército tirou todo mundo e realizou a Operação Sucuri, usando o pessoal do Serviço de Inteligência para fazer o levantamento da área. Mas só descobriu também porque, na primeira fase, prenderam o Deputado José Genoíno. Graças a ele, que passou essas informações para o Exército, se conseguiu fazer o levantamento de quantos eram os guerrilheiros e as armas.

Dizem que as Forças Armadas faziam parte da ditadura militar. Eu concordo, mas ela lutava para voltar à democracia. Agora, os partidos de esquerda diziam que estavam lutando contra a ditadura militar para implantar a democracia. É mentira, tanto que o documento está provando isso. Isso, na guerrilha rural.

Até hoje, por isso que estou aqui, não se encontram mais nenhum. Eu mesmo capturei 2 guerrilheiros vivos. Um deles é o Piauí. Tenho prova aqui no meu livro, tenho documentos provando. Capturei também um camponês de nome Cezinho, e hoje eles constam como desaparecidos.

Só para os senhores terem uma idéia, quanto à guerrilha urbana aqui tenho um texto:

"Os terroristas dos anos 60 e 70 recorreram à luta armada e envolveram-se em atentados, assaltos e assassinatos na tentativa de derrubar o governo militar. Beneficiados pela Lei de Anistia de 79, se reintegraram à vida política. Foram transformados de criminosos a heróis e hoje estão nas altas esferas onde militam pelas mesmas idéias, na esperança de colocar o País sob um regime idêntico àquele que malogrou no leste da Europa.

Vejam onde estão!"

Então, o objetivo da luta armada... Quem respondeu isso aqui... Tem uma frase do Daniel Araão Reis, um ex-terrorista do MR8, atualmente professor de História Contemporânea da Universidade Federal Fluminense. Olha o que ele diz:

"As ações armadas da Esquerda brasileira não devem ser mitigadas nem para um lado nem para outro. Não compartilho da lenda de que, no fim dos anos 60 e no início de 70, inclusive eu, fomos o braço armado de uma resistência democrática. Acho isso um mito surgido durante a campanha da anistia, ao longo do processo de radicalização, iniciado em 1961.

O projeto das organizações de esquerda que defendiam a luta armada era revolucionário, ofensivo e ditatorial. Pretendia-se implantar uma ditadura revolucionária. Não existe um só documento dessas organizações em que elas se apresentam como instrumento da resistência democrática.

As esquerdas radicais se lançaram na luta contra a ditadura não porque a gente queria uma democracia, mas para instalar o socialismo no País, por meio de uma ditadura revolucionária como existia na China e em Cuba. Mas evidentemente elas falavam em resistência, palavra muito mais simpática, mobilizadora, aglutinadora. Isso é um ensinamento que vem dos clássicos sobre a guerra."

Então, esse é um texto do Daniel Araão Reis, um ex-terrorista.

Dentre esses terroristas nós temos aqui... Eu, como vim preparado, trouxe um dossiê dos anos 70. O Ministro Tarso Genro usava o nome de Carlos e Rui - era um dos terroristas da época. Aqui temos outro: Paulo (ininteligível), que foi militante da Ação Libertadora Nacional, onde se familiarizou com as ações terroristas, com seqüestro político, assalto. Não vou ler todo o dossiê, porque vou entregá-lo aqui. Carlos Minc era conhecido pelos codinomes de Jair, José e Orlando, do Palmares - Vanguarda Armada Revolucionária de Palmares. Terroristas dos anos 60. Dilma Rousseff, na clandestinidade, atendia pelos codinomes de Estela, Luísa, Patrícia e Vanda; participou de vários eventos. José Genoíno foi preso. José Dirceu filiou-se ao Partido Comunista, quando universitário, na corrente revolucionária.

Então, senhores, são alguns nomes. Trouxe esses nomes, tendo em vista eu ser militar. Arrisquei minha vida. Era terceiro-sargento, não era politizado, mas defendi a Pátria. Tanto que consta no livro um documento do Exército, elogiando-me, condecorando-me, por eu estar defendendo a Pátria. Hoje em dia sou politizado, sou Bacharel em Ciências Jurídicas, trabalhei no serviço de inteligência. Hoje vejo que temos que apresentar a história verdadeira, não a falsa história que está aí.

Há um depoimento, no Jornal do Brasil, do Curió, com quem trabalhei, em que ele diz que ninguém gostou do que eu coloquei aqui: "Onde estão os mortos e desaparecidos da Guerrilha do Araguaia que nós exterminamos". Ninguém gostou. O Exército até abriu sindicância e me chamou lá, me ouviu, por causa desse livro, mas não me prendeu; abriu o inquérito, mas não me prendeu.

"Curió diz que tem respeito pelos guerrilheiros que tombaram em confronto". Também tenho respeito, porque lutamos. Era uma guerra, cada um lutava por seu ideal. Eles lutavam pelo ideal comunista e nós, eu era militar, lutávamos pela ditadura ou democracia, que, depois, os militares passaram para o povo.

"Curió diz que tem respeito pelos guerrilheiros que tombaram em confronto e não gosta da palavra "extermínio", com a qual um de seus subordinados, o Tenente José Vargas Jiménez, se refere à ofensiva final das Forças Armadas". Aí ele diz que não gosta. Agora olhem o que ele diz. Segundo ele, a ordem para que nenhum guerrilheiro saísse vivo, a partir de 1973, partiu do ex-Presidente Emílio Garrastazu Médici. Olhem o contraste: eu falo "extermínio", ele fala que houve ordem para matar. Matar e exterminar é a mesma coisa.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Sr. Presidente, acho que o tempo do orador já passou do limite. Já ouvimos bobagem demais aqui.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - Deputado Arnaldo Faria de Sá, gostaria de informar que, realmente, estamos há 20 minutos da exposição de nosso convidado. Gostaria de indagar se V.Sa. considera satisfatória sua intervenção, se teria algo a complementar, para que pudéssemos voltar a palavra aos Srs.    Parlamentares.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Sr. Presidente, me foram dados 20 minutos. Tenho mais coisas a falar, mas é melhor os senhores perguntarem. Acredito que haja muitas perguntas. Dentro do possível, irei respondê-las.

Muito obrigado.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - Pois não.

Passo a palavra imediatamente ao Relator, Deputado Arnaldo Faria de Sá.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Sr. Presidente, Sras. e Srs. Parlamentares, gostaria de saber do Sr. José Vargas Jiménez qual o seu objetivo em fazer essas denúncias.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Estou seguindo o que foi pedido no requerimento, são 2 itens. Isso não é denúncia.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Não, não, não. Estou falando do requerimento. O início de suas denúncias para a revista ISTOÉ, qual foi o objetivo de fazer essas denúncias?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Na revista ISTOÉ?

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Qual foi o objetivo de fazer essas denúncias?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Falar a verdade. Tanto é que falei a verdade.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Ou foi para vender seu livro, A Lei da Selva?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Não, não é meu livro A Lei da Selva. Tanto é que nem cita meu nome no livro. Não cita o nome no meu livro.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Você disse que a ordem que tinha era para exterminar. Você confirma isso?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Confirmo. Está no meu livro, está com provas. O meu livro tem os documentos com provas.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - As provas que você tem são do seu livro ou você tem isso em apartado?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ -    Eu tirei cópias; tenho no livro e tenho as originais.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Sr. presidente, eu quero requerer que esses originais que ele tem sejam apresentados à Comissão.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - É, eu não trouxe.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - V.Sa...

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Trouxe cópia. Trouxe cópia.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Cópia agora e, posteriormente, a Comissão aprenda esses documentos originais.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - V.Sa. tem cópias desses documentos que possa disponibilizar à Comissão?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Esse é um caso no qual vou pensar.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - V.Sa. tem os documentos.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Porém, na hora em que o senhor entrar em contato comigo, se eu já publiquei a cópia... já não publiquei a cópia? Então, não tenho o que esconder.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Tá. Você disse que participou junto com 120 guerreiros na selva. Você confirma isso?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Sim. E mais 100 pára-quedistas - eram 220.    Os 100 pára-quedistas atuaram em Xambioá e nós atuamos em Bacaba.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Tá. E, além desses 100 pára-quedistas, tem mais 30 agentes do CIEX?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Eu não sei. Eu sei que tinha, do Centro de Informações do Exército tinha, mas eu não sei quantos eram.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Tem uma frase sua na revista, que está ente aspas, que diz: "Fomos para matar e matamos. Se alguém sobreviveu foi porque colaborou com a gente e hoje vive com outra identidade".

Você confirma essa frase?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Confirmo pelo seguinte. Eu não tinha conhecimento. O Coronel Lício Maciel entrou em contato comigo e eu tenho até um...

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Repete o nome do coronel para    mim.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Lício Maciel. Dr. Asdrubal. Eu trouxe até um documento dele e vou passar aqui para os senhores. É um e-mail onde ele diz que pode ter sido... Aliás, ele diz assim. Posso ler só essa pequena frase?

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Pode, leia à vontade.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ    - "Você entregou o prisioneiro Piauí e não sabe mais o que lhe sucedeu". Porque eu capturei vivo o Piauí, certo?

E continua:

"Será que os 5 guerrilheiros arrependidos que o General Bandeira conseguiu empregar no serviço público em Brasília, por intermédio do Ministro Jarbas Passarinho, o Piauí não é um deles? Foram declarados mortos para não serem justiçados pelo PCdoB. Vivem sob nova identidade. E ai deles se se revelam. Serão assassinados como Celso Daniel e outras testemunhas mais, como o Toninho do PT."

E aí vai. Essa é a resposta.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Você disse que tem uma lista de todos aqueles que foram presos e alguns exterminados. Você tem essa lista ainda?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ    - Não. Tá no meu livro. Eu tenho em casa.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Em casa você tem essa lista?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Tenho. Dois prisioneiros - Plano de Busca e Apreensão, Captura e Destruição - secretos que me entregaram no dia em que eu entrei na selva, que era para buscá-los.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Isso você já colocou no seu livro e também tem em casa?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Isto.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Tem uma outra expressão que você usa também entre aspas aqui. Eu vou ler e quero que você desminta ou confirme: "Eles eram colocados descalços, em pé, em cima de latas, só se apoiando com um dedo na parede. Tomavam telefone, tapas nos ouvidos e choques elétricos." É verdade isso?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Eu vi isso aí.

(Intervenção fora do microfone. Inaudível.)

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Quem está falando aí?

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Não. Diz que...

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Tá começando a ficar bagunçado aqui.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Eu não estou bagunçando nada.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - A Mesa está coordenando os trabalhos. As indagações e as intervenções se restringem aos Deputados e V.Sa. deve se limitar a responder aquilo que for indagado pelos Srs. Deputados.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Estão me questionando por fora!

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Tem outra afirmação entre aspas sua aqui que eu queria que você em esclarecesse: "Prendi mais de 30. Um deles eu coloquei nu em um pau-de-arara com o corpo lambuzado de açúcar em cima de um formigueiro". É verdade isso?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - É verdade.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Sr. Presidente, não tenho mais nada que falar.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - Passo a palavra ao Deputado Fernando Ferro.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Bom, Sr. Presidente, Srs. Parlamentares, Sr. José Vargas, o fato de que estamos tratando aqui vem depois de mais de 30 anos. O mundo vivia um outro período, outras motivações político-ideológicas ditavam as disputas políticas. Não quero fazer uma transferência daquele tempo para hoje, até porque o mundo evoluiu, nós estamos vivendo no País a experiência de uma democracia, e essa fase representa para nós parte da história. Até que as Forças Armadas tragam a público as informações sobre isso, teremos de conviver com depoimentos como esse, que pode ter uma completa verdade ou podem ser fatos distorcidos. Mas de qualquer jeito quero dizer ao Sr. José Vargas Jiménez que o fato de S.Sa. falar traz uma contribuição. Acho que é importante se falar sobre esses assuntos. O pior é o silêncio, que cria uma cortina de sombras sobre um período da nossa vida política que, para não se repetir, precisa ser conhecido.

Quero considerar, de início, que acho válido e importante o seu depoimento, a despeito de me reservar o direito de discordar frontalmente dos seus conceitos sobre democracia e sobre aquelas pessoas que militaram naquele período, há mais de 30 anos, e que hoje fazem parte da memória da luta política do País e da história do País. Quem julga é a história também. Mas quero entender que essas pessoas, que muito bem V.Sa. observou, lutavam por idéias - diferentemente de V.Sa., que diz que não tinha consciência política -, lutavam por outras motivações, talvez por ingenuidade; outras lutavam por dinheiro, mas eram motivadas por outras maneiras. E aqueles que morreram ali, que foram torturados, acreditavam num conceito de sociedade que imaginavam que era o certo e lutavam por isso. Exatamente por isso merecem o respeito. Para mim não são terroristas, porque se formos colocá-los nessa categoria, nós teremos que rever conceitos: aqui estaremos diante de um terrorista e um torturador, como V.Sa. confirmou aqui diante de nós.

Feitas essas considerações, gostaria de saber de V.Sa. algumas informações, se possível.

V.Sa. citou 2 que prendeu e que posteriormente desapareceram. Esses presos, esses detidos nesse processo para onde eles eram levados? V.Sa. tem conhecimento do destino que foi dado a essas pessoas? Para que área? Para que lugar? Ou se teve informações posteriores sobre o paradeiro dessas pessoas.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Posteriores? Escrevi no livro que o Piauí, que eu capturei vivo, era um dos chefes, cuja prioridade...    Depois que José Carlos morreu ele ficou comandando o grupo do José Carlos, do André Grabois, e ele era prioridade 1 para captura. Tive oportunidade, se eu quisesse matá-lo, eu o mataria, mas entrei em combate com ele porque ele estava desnutrido. Sabia que tinha condições de prendê-lo vivo e o prendi. Ele estava junto com outro camponês. Nós éramos combatentes, nossa base era em Bacaba. O pessoal do Serviço de Inteligência ficava na Casa Azul, em Marabá, no Bairro Amapá. Entregávamos para eles. Então, é por aí, foi entregue para os...

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Eles quem?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Para o Serviço de Inteligência, para os nossos chefes que ficavam lá.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Quem era que comandava esse Serviço de Inteligência?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Eu não sei, porque na época eu não sabia. Eu só sei com quem eu trabalhei junto, o Curió... Os nomes das outras pessoas com quem trabalhei estão aí. Agora, eu era pequeno, terceiro-sargento, eu não sabia...

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Serviço de Inteligência do Exército.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Eu não era, eu era combatente.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Não, esses que recebiam eram do Serviço de Inteligência?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Isso, tinha, é evidente.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Quem recolhia os prisioneiros?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Tinham alguns do Serviço de Inteligência e outros não. Na chefia, havia vários tipos, e nós entregávamos para eles e não sabíamos mais...

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Quantos foram entregues nessa situação?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Bom, eu sei que entreguei esses 2.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Só 2?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Que eu capturei. Agora os outros...

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Mas que V.Sa. presenciou, viu que outros capturaram, tem alguma informação sobre isso?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Não, não.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Então, o senhor só responde... só tem conhecimento de fato de 2?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - De 2... Não, e no tempo que eu passei lá, 32 guerrilheiros morreram. Inclusive aqueles 8 do comando, aqueles 4...

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Morreram nos combates?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Nos combates.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Mas que foram presos.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Aí eu não posso dizer quais foram presos. Eu só sei daqueles que eu prendi. E tenho prova de tudo, porque há depoimento de outros militares. Quando fui agraciado com a medalha - esta medalha que está aqui -, foi feita uma sindicância para comprovar todos os fatos narrados. Então, foram ouvidos. Todos os que estiveram na guerrilha confirmaram tudo o que falei. Então, por isso que estou com credibilidade.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Um minutinho só.   

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Sim.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Desses 32 que morreram, quantos você matou?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Quantos eu matei?

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - É.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Nenhum.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Os 2 que o senhor afirma aí, o Piauí e o Cesinha, se não me engano, não é, foram detidos.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Capturei vivo.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Capturados. Qual é o paradeiro deles?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Consta que o Piauí sumiu em março de 1974. Eu saí da região em fevereiro de 1974. Quando eu saí ele estava lá ainda.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Ainda estava preso?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Não, foi entregue à Casa Azul, agora não sei.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Casa Azul. O que era a Casa Azul?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Eram nossos comandos.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Era esse comando que recebia os presos, os detidos?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Isso, é. Por que não ficavam nas bases.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Que ficavam em Marabá.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Em Bacaba e Xambioá só ficavam os combatentes, entendeu? Agora, para interrogar, ficavam lá, eram entregues para eles.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - O senhor era subordinado ao Curió?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Sim.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Qual era o papel do Curió nessas operações?

O SR JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Combatente.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Não, qual era o papel dele de comando? Qual era a função dele nesse período em que o senhor esteve lá?

O SR JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Às vezes, ele saía com meu grupo para combater, para emboscar, para destruir bases e patrulhas. Esse era o nosso trabalho.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Mas ele era quem comandava um contingente de...

O SR JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Não, não. Ele comandava o meu grupo. Na primeira operação ele comandou 3 grupos, quando nós prendemos 40.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Quantas pessoas por grupo?

O SR JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Eram 30 homens.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Três grupos?

O SR JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Três grupos de combate. Os 2 outros sargentos já estão mortos, que estiveram comigo na guerrilha, que fizeram guerra na selva comigo.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Quem eram eles?

O SR JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Sargento Brito morreu lá, na selva, num combate do fogo amigo com a polícia. A polícia o confundiu com um guerrilheiro, e ele confundiu a polícia com guerrilheiro, porque o André Grabois tinha atacado um posto policial, e eles andavam fardados. Então, houve um fogo amigo. E esse amigo meu, que viveu a guerra na selva comigo, morreu lá, o Sargento Brito.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - E o outro?

O SR JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - E o sargento Eliseu, agora, dia 28 de agosto, eu soube que ele faleceu. Estava querendo entrar em contato com ele. Aí a família dele me ligou dizendo que ele tinha falecido.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Todos eram...

O SR JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Não, esses foram os 3 grupos que o Curió comandou, quando nós prendemos 40.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Então, o Curió era o comandante desses 3 grupos de operação de combate?

O SR JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Isso, mas só naquele momento, só naquele momento, porque, depois, voltávamos; às vezes, saíamos sós, outras vezes ele saía comandando. Mas ele saía muito com meu grupo de combate.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - O senhor falou que prendeu, se não me engano, numa comunidade chamada Bom Jesus, um grupo de camponeses, só deixou esposa e filhos. Quantos camponeses o senhor disse que prendeu?

O SR JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Mais ou menos 30.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Trinta. E qual foi o paradeiro desses camponeses?

O SR JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Eles foram levados para Bacaba.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - E depois?

O SR JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Por aqueles 2 grupos de combates desses 2 sargentos que já morreram, que eu acabei de falar. Lá, em Bacaba, dependendo do levantamento que havia sido feito na primeira operação de inteligência, se esse camponês... se ficasse levantado que ele apoiava os guerrilheiros, ele era mandado para a Casa Azul. Se não - em Bacaba, onde nós ficávamos, tinham vários barracões -, eles ficavam ali, onde tinha um grupo de militares que começavam a politizá-lo para dizer o que é Bandeira Nacional, o que é Hino Nacional, o que é Presidente da República. Porque eles não sabiam. Era assim que funcionava. Eles ficavam ali.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - O senhor pode informar se desses camponeses presos alguns foram mortos ou desaparecidos?

O SR JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Os camponeses? Ah, tem, tem... Na minha relação, tem o Alfredo, que morreu, que era camponês.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - E foi preso dessa vez?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Não, não foi preso. Ele morreu na primeira...

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Não, mas desses que o senhor prendeu, qual o destino deles depois de detidos? Eles foram soltos, mortos ou foram torturados?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Bom, eu acredito que tenham sido soltos, porque eu fui embora antes de terminar. Eu saí em fevereiro de 1974 e a operação continuou até o final de 1974, início de 1975. Eu já não estava mais lá.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - O senhor ficou em que período nessa...

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Eu preparei os 60 homens lá em Clevelândia do Norte. Eu e mais esses 3 sargentos, com guerra na selva e o capitão, preparamos 60 homens lá na fronteira com a Guiana Francesa, no Oiapoque. Começou em setembro essa preparação.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Setembro de que ano?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - De 1973. Agora nós fomos, chegamos em Marabá no dia 2 de outubro de 1974 e no dia 3 nós saímos para as missões.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - E saiu da região em que data?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Eu saí de lá dia 27 de fevereiro de 1974. Passei praticamente 6 meses. E nesses 6 meses morreram 32 guerrilheiros, 3 militares e outros 2 ficaram feridos. O Curió foi ferido pela guerrilheira Sônia, e o Dr. Asdrúbal, o Lício Maciel.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - O senhor falou que participava de grupos de 30, de 3 grupos de 10, e agora fala que treinou 60.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Sim, eram 6 grupos de combate. Sessenta foram treinados por nós do Comando... da 8ª Região Militar, com sede em Belém. E os outros 60 foram treinados em Manaus. Eram 120, eram 120.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Então, o senhor era do grupo de treinamento de preparação para o combate na selva?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Claro! O melhor grupo, o melhor curso que existe no mundo. Se alguém quiser tomar nossa selva, os militares estão preparados para não deixar.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Mas o senhor foi preparado quando?

(Intervenção fora do microfone. Inaudível.)

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Eu vou embora, Comandante, se continuar assim.

(O Presidente faz soar a campainha.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - V.Sa...

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Eu vou embora. Se começar assim, eu vou embora e não vou responder mais nada.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - V.Sa...

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Falta de respeito isso.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Eu queria concluir.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - Deputado Fernando Ferro, eu gostaria de solicitar aos convidados, todos são bem-vindos, mas a intervenção é atribuição dos Deputados. Se alguém tiver alguma manifestação a fazer, algum questionamento, alguma indagação, dirija-se a um dos Deputados e ela será encaminhada ao convidado.

Nós queríamos apelar no sentido de preservarmos o ambiente que permita o debate. Eu sei do posicionamento e da indignação que podem certas declarações provocar, mas nós gostaríamos de apelar no sentido de garantir o ambiente adequado para que possamos buscar o maior nível de esclarecimento possível.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Eu queria concluir, Sr. Presidente.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - Pois não, Sr. Deputado Fernando Ferro.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Veja bem: eu também compreendo a indignação de muitas pessoas, mas nós não estamos aqui para fazer nenhum bate-boca, nenhum processo de agressão contra ninguém. Nós queremos buscar a verdade. E pode ser que aqui esteja um pedaço de verdade, ou esteja uma fantasia. Ninguém sabe. Nós temos que buscar isso.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Sr. Deputado, só 1 minutinho, por favor. O meu livro é verdade, porque tem provas, documentos sigilosos e secretos provando tudo que eu falei. E tudo que eu estou falando aqui tem prova. Porque não tem só depoimentos meus, tem depoimentos de outros militares que confirmam isso que eu falei.

Então, não é sou eu, a história não é só minha.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Então, concluindo, Sr. Presidente, primeiro quero perguntar para o nosso depoente: o senhor compreende que as famílias desses desaparecidos têm o direito de saber onde estão, até por uma questão humanitária, onde estão essas pessoas? O senhor entende assim?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Concordo.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - O senhor está disposto a ajudar nisso?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Estou.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - De que forma o senhor poderia ajudar, além desse depoimento?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Ué, me levem àquela região! Agora, depois de 35 anos, eu solicitaria que fosse um camponês da área, que trabalhou conosco, o Vanu, que mora em Marabá. Trinta e cinco anos depois, eu vou desconhecer a região. Agora, ele está lá. Se ele for comigo, nós vamos encontrar os locais. No meu livro, consta que ele enterrou.

Estive, em maio, em outra Comissão, na Comissão de Direitos Humanos. Falei com ele, e até o levei ao aeroporto. Disse a ele: "Você mentiu dizendo que tinha enterrado aqueles três guerrilheiros, o André Grabois, o Alfredão e o... Você mentiu". Ele disse: "Não, mandaram eu enterrar, aí eu joguei palha em cima" - porque no meu livro conto que os encontrei no meio da selva já em estado de putrefação. E continuei fazendo a minha missão. Depois, quando eu voltei por lá, estavam eles cobertos com palhas - isso está no meu livro. Questionei-o: "Você disse que enterrou? Você não enterrou!" "Eu disse que enterrei, mas não enterrei." Então, mais ou menos, ele sabe e sei também onde podemos encontrar.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Qual era o posto do Curió nesse período que comandou?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Era capitão.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Era o capitão?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Isso.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Era ele quem comandava vocês nessas operações?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Não, não era. Ele também era subordinado.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - A quem?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Não sei, tinha mais chefes. Não é um capitão que comanda aquilo ali. Nós éramos 120 guerreiros de selva e 100 pára-quedistas. Tinha um grande comando.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Onde ficava esse comando?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Lá na casa azul.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Em Marabá?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Em Marabá, no bairro Amapá. Era do INCRA, se não me engano.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Por que vocês não sabiam quem era o comando? Era uma questão...

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Eu não sei. Eu, por exemplo, servia na fronteira. Fui convocado, em primeiro lugar... Mentiram para nós que era... Treinaram-nos para uma competição de patrulha. Depois que treinamos todo mundo nos    disseram: "Não, vocês vão lutar." E já tinha a primeira fase. Já havia alguns que tinham ido a Marabá lutar. "Vocês vão lutar contra o PCdoB, contra os guerrilheiros comunistas." E aí você não podia mais dizer nada! Fui voluntário para ir.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Vou encerrando, Sr. Presidente.

O senhor tem consciência, o senhor confessou aqui que torturou. O senhor tem consciência também que pode ser processado pelo crime de tortura, que é imprescritível?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Com certeza.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - E o senhor, junto com outros, torturaram pessoas presas ou pessoas suspeitas naquelas operações, não é isso?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Com certeza. Se eu estou me acusando, eu não posso acusar os outros?

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Não...

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Agora, se eu estivesse acusando os outros e não falando o que eu fiz, aí seria uma coisa desleal, não é? Mas guerra é guerra. É hipocrisia dizer que não tem tortura. Até hoje tem! Polícia Federal pega narcotraficante; a milícia prendeu jornalistas lá no Rio de Janeiro. Hoje, tudo... Essa hipocrisia de dizer que "não, não tem tortura". Isso é um absurdo! Em guerra? Não existe!

É evidente que vocês têm o seu comportamento, a sua formação social, a sua formação familiar, a sua formação religiosa, que não permite que você se exceda.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Obviamente, nós sabemos que existe tortura nos presídios do Brasil, mas é um crime! E as pessoas que fazem isso podem e devem ser chamadas à responsabilidade, inclusive aquelas que confessam, como foi o seu caso.

De qualquer jeito, Sr. Presidente, acho que a Comissão tem uma série de informações que pode aproveitar.

Inclusive, a última pergunta que eu deixaria é a seguinte: se ele pode declinar o nome de pessoas que podem ajudar nessa investigação; se alguém mais, como ele, estaria disposto a falar sobre esse assunto.

Conhece alguém mais do seu tempo que trabalhou e que operou nessa área, que teria possibilidade de trazer informações sobre esse período?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - O senhor acha que alguém teria a coragem que eu tenho?

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Não sei, não sei.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Não tem, não tem.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Não sei.

Muito obrigado, Sr. Presidente.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - Agradecemos ao Deputado Fernando Ferro.

O Deputado Arnaldo Faria de Sá quer retornar ou podemos passar a palavra para o Deputado Claudio Cajado?

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Na verdade, recebi umas perguntas e queria fazê-las, subseqüentemente.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - Com a palavra o Deputado Arnaldo Faria de Sá.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Quero perguntar para ele qual é o preço do livro.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Quarenta reais.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Dos prisioneiros de 1974, quais o senhor viu, além do Antônio de Pádua, do Piauí e do camponês Zezinho?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Eu vi os que estavam mortos, como eu falei.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Você sabe os nomes deles, não?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Tem que ler o livro, está tudo no livro.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - Pode ficar à vontade, se V.Sa. quiser citar os nomes.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Está bem, vou abrir aqui. (Pausa.)

André Grabois, João Gualberto Calatroni (Zebão), Antônio Alfredo de Lima (Alfredo); e o Nunes, que saiu ferido, mas quase morto. Depois ele morreu na Casa Azul, porque ele já foi ferido. Também tem a Sônia e o Osvaldão. Tem vários.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - O que vocês fizeram com o Osvaldão?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - O Osvaldão foi morto.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Mas, depois da morte, o que vocês fizeram com o corpo dele?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Ele foi para Xambioá. Foram os pára-quedistas que o mataram.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Sim, mas o que foi feito com o corpo dele? Você comentou que houve a exposição do corpo do Osvaldão.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Exposição onde?

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Você comentou, na sua entrevista, que houve a exposição do corpo do Osvaldão depois de morto.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Ah, ele passou... Ele foi... Ele é grandão, caiu do helicóptero e foi levado puxado, porque caiu do helicóptero.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Qual das áreas no período da guerrilha em que o senhor mais atuou?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - As áreas onde atuei?

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Sim.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Foi na região de Bom Jesus, São Domingos... Porque era divida. O pessoal dos pára-quedistas atuavam na área de Xambioá, e nós atuamos na área de Bacaba.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Bacaba?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Isso.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - E qual era a recomendação para o destino dos corpos dos guerrilheiros?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Não tinha recomendação. Aqueles que foram mortos?

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Sim.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Ficavam lá, ninguém os enterrava. Agora, os nossos, nós os levávamos e os enterrávamos.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Você disse em uma entrevista que os corpos ficaram abandonados, que os animais os comeram.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Isso, isso.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Que vocês não tinham obrigação de carregar corpo de guerrilheiro nem de entregá-los. E você disse que, quando não eram suficientes os documentos para identificação, vocês cortavam as cabeças e as mãos para reconhecimento em Marabá. Isso é verdade?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Foram três exceções. Foram feitos três guerrilheiros, que não foram identificados. E não se pode carregar um corpo na selva, não é? Então, vinha uma ordem para cortar a cabeça e as mãos, para tirar as impressões digitais.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Quem fez isso?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Eu não sei. Era ordem. Eu soube.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Você soube?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Eu soube, porque eu estava lá. Agora, lembrar do nome...

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Quem era o responsável por Bacaba?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Também não sei. Eu sei que Curió que levava a gente para lá, para cá. Tinha um outro capitão lá também. Não vou nem mais citar meu livro, porque já estão rindo: "Está no meu livro, está no meu livro." Então, deixa quieto.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Quem estava no comando da Casa Azul?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Não sei.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Quem era o Comandante- Geral das Forças Militares em 1974?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Não sei.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Quem estava no comando de Xambioá?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Não sei.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Em que ano o senhor reivindicou documentos para o recebimento da Medalha do Pacificador?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Em 1990, 16 anos depois.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Por que seu apelido Chico Dólar?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Eu comandava dez soldados, que me apelidaram, porque não atuamos fardados, nós atuamos descaracterizados, barbudos, cabeludos, igual a guerrilheiro. Então, ninguém sabia quem era sargento, quem era capitão. Todo mundo tinha um codinome. Se alguém ouvisse, não sabia quem comandava. Tanto era assim que, por estarmos descaracterizados, as nossas baixas foram de fogo amigo.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Por que seu apelido é Chico Dólar?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Não sei. Apelidaram-me, foram os meus solados que me apelidaram.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Você andava com dólar?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - (Risos.) Dólar? Que dólar?

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Obrigado, Sr. Presidente.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - Deputado Claudio Cajado.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - Sr. Presidente, Sr. Relator, Sr. José Vargas, o Deputado Fernando Ferro acabou por fazer a minha pergunta, que é justamente quanto à questão da responsabilidade dos atos praticados por S.Sa.

Naquele momento em que o senhor participava dessas operações, o senhor tinha consciência de que essas operações eram ilegais ou achava que eram elas legais?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Bom, quando eu entrei no Exército e fiz o juramento de defender a Pátria, eu tinha que defender a Pátria; e eu fiz isso.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - Qual é a escolaridade do senhor, Sr. José Vargas?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Na época ou agora?

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - Na época.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Na época eu não tinha nem a sétima série, tinha a sexta série.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - E hoje?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Hoje sou Bacharel em Direito.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - Pois não.

E o senhor não tinha consciência de que uma lei, emanada por autoridade superior, mesmo sendo legal, não é obrigatório cumpri-la. O senhor sabe disso hoje, na qualidade de bacharel?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Na lei? Não entendi a sua pergunta.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - Uma ordem que não seja legal, o subalterno hierarquicamente não tem obrigação de cumpri-la. O senhor tem conhecimento disso, hoje em dia, na qualidade de bacharel?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Não. Lá se é sargento, cumpre; não sabe.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - Mas, hoje em dia. O senhor tem essa noção hoje em dia?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Na qualidade de advogado, sei.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - Pois não. Na época, não.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Na época, não. Na qualidade de advogado, sei que existem leis que têm de ser cumpridas.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - Mas, na época, o senhor não achava essas ordens discutíveis, injustas, ilegais? Não tinha essa percepção?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Não. Tanto é que eu tinha a minha formação religiosa, como acabei de falar. Eu podia ter matado o Piauí, e não o fiz. Procurei-o e o capturei vivo. Se a ordem era matar, atirar... A ordem era: atira primeiro e pergunta depois. Mas eu não fiz isso, porque tinha minha formação religiosa, familiar e social.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - O senhor comandava um grupo de dez.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Dez homens.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - E os seus comandados, chegaram a matar? O senhor viu, presenciou?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Se eles estavam comigo, como? Eu que comandava.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - Não teve morte no seu pelotão, no seu grupo?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Não. Só captura.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - Só captura?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Isso.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - Mas o senhor tinha conhecimento de que os outros...

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Claro. Porque quando chegávamos na base, um comentava com o outro: "Ah, eu consegui fazer isso, eu consegui..." Então, eram comentários.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - Para o senhor isso era normal. Não havia uma intuição pessoal de que essa era uma atitude que não deveria ser tomada. O senhor achava que deveria ser feito e estava correto. É isso?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Eu cumpria ordens.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - É isso. Em função do cumprimento de ordem. Então, o senhor achava que esse procedimento era correto, por estar cumprindo ordens. Não é isso?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Cumpria ordens. O militar cumpre ordens.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - E não tinha nem interesse ....

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Não se tem livre arbítrio - com raras exceções.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - Pois não.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Há exceções. Aí dentro, como V.Exa. acabou de dizer, se a pessoa acha que não deve ser feito aquilo, e a mandam fazer, a pessoa não faz. V.Exa. acabou de dizer isso.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - Lógico que não era o caso. Porque o senhor achava que estava no cumprimento do dever, da Pátria.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Não era o caso. Na época, não.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - O senhor disse o seguinte: "a gente atira para depois perguntar". Se você matou, vai perguntar para quem, para o defunto?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Bom, é suposição sua. "Se você matou." Não sei. "Se você matou."

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ -    O senhor disse que a ordem era atirar....

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - É V.Exa. quem está falando.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ -    Não, o senhor que falou: "atirar, depois perguntar". Se o senhor atirou e matou, ia perguntar para quem?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Claro que não. Mas tanto é que eu tenho prova de que peguei o cara vivo; não atirei nele. Então, a minha formação, o meu trabalho lá não foi do jeito que eles queriam, senão, eu teria matado o Piauí e o Zezinho.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - O senhor não tem receio de ser processado atualmente?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - É a vida. É a vida. Qual é o problema?

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - O Deputado Relator, Arnaldo Faria de Sá, fez uma pergunta ao senhor.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Não tenho medo nem de ser "justiçado", assassinado. Podem fazer o que quiserem comigo aí. Façam. Estão no poder mesmo.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - O Deputado Arnaldo Faria de Sá fez uma pergunta que eu também gostaria de fazer. O senhor teve qual motivação para vir hoje em dia a público, estar aqui num depoimento importante - pelo menos uma informação importante numa Comissão da Anistia -, sendo filmado, fotografado publicamente?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Gravado.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - Gravado, publicamente relatando esses fatos. O que motivou o senhor a trazer a público todos esses fatos?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Bem, inicialmente eu lancei meu livro. Eu tenho que começar a história.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - Foi para vender o livro que o senhor fez isso?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Não, porque se eu quisesse, eu já teria... Já não tenho, só tenho 10, já vou para a próxima edição. Compra quem quiser, ninguém é obrigado a comprar. Mas as respostas estão ali, para quem quiser.

Antes de lançar o livro - passei 2 anos escrevendo -, companheiros militares disseram: "Você é maluco, você é louco. O Exército vai te processar."

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Mas é mesmo.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - "O Exército vai te processar. A família dos guerrilheiros que foram mortos lá vão matar você", etc. Depois que eu lancei o livro, disseram: "Você é herói, você é valente". Bom, até aí, eu estava tranqüilo.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - O senhor se acha herói?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Eu não estou falando. Por que não? Eu sou herói. Eu sou herói do Araguaia.       

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - O senhor diz que não tem medo de ser processado. Tem medo de ser torturado?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Não. Nem morto. Posso terminar?

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - Por favor.

JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Então... Onde eu estava? Não dá para conversar assim.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - Relatando a origem da motivação que o senhor teve para poder trazer a público os fatos.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Sim. Aí eu já não estava mais vendendo livro. Pela Internet, tudo pela Internet, em muitos locais, eu comecei a ler e ouvir, na mídia, esses nossos Ministros falando em acabar com a Lei da Anistia. E vi nossos representantes das Forças Armadas quietos, omissos, surdos. Não faziam nenhuma nota para contestar ou pelo menos explicar alguma coisa. Isso me deixou irritado, porque sou militar, estive lá, arrisquei minha vida para ter essa democracia, e não pedi indenização a ninguém, dinheiro a ninguém. Tive problemas depois que saí: neurótico de guerra. Porque quando se sai de uma guerra fica-se neurótico até se readaptar à sociedade. Quer dizer, não pedi nenhuma indenização, porque achei e acho que estava fazendo a coisa certa. Tanto é que, depois que os grupos de esquerda foram deixados já com menos vontade de combater, as Forças Armadas entregaram a Nação ao povo brasileiro para eleições diretas - já tinha democracia. Tanto tinha democracia que os partidos políticos ficaram oficialmente. Todos foram eleitos: PCB, PCdoB.

Então, lutei para isso, arrisquei minha vida para isso. Deixou-me irritado o fato de falarem de nós, militares que combatemos o Partido Comunista, o pessoal de esquerda. Falavam de ditadura militar, de regime militar, o que me deixou irritado, e nossos chefes não falavam nada. Como estou na mídia, estou aproveitando para fazer esse desabafo.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - Então, o senhor reconhece que essa fase da história tem de ser rediscutida?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Tem de ser dita a verdade.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - Mas a verdade é que o senhor participou de tortura e morte ilegal. O senhor reconhece isso hoje?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Eu não dei entrevista? Eu não acabei de confirmar?

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - E a motivação do livro? É por dinheiro?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - (Risos.) Dinheiro! Todo mundo pergunta: "Você cobrou sua entrevista? Você vai lá."

Tudo que os senhores estão falando... Entro na Internet, e um dos companheiros mandou por e-mail. Depois, se os Srs. Deputados quiserem, posso ler a opinião deles, antes de eu vir para cá, de tudo isso que está acontecendo. E mesmo assim eu vim.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - Sr. José Vargas, para concluir, eu queria obter uma informação. O senhor, na oportunidade, relatou para os meios de comunicação que tem documentos sigilosos. Esses documentos podem ser disponibilizados? Se são sigilosos, não podem vir a público. O senhor não está cometendo um outro ato de ilegalidade?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Mas o Exército abriu um inquérito sobre isso. Existe uma prescrição, há uma lei.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - Contra o senhor?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Claro. Abriu um inquérito e me chamou lá.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - Então, o senhor está respondendo a um processo?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Não, não. Foi uma sindicância. Ouviram-me e não falaram nada; arquivaram. O senhor sabe que tem lei que prescreve esses documentos. São mais de 35 anos.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - Então, eles são secretos, mas, pela lei, são prescritos e podem vir a público.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - A tortura é imprescritível.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - O terrorismo também é imprescritível.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - A tortura é imprescritível.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - O terrorismo também.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - Deputado Arnaldo, vamos permitir que o Deputado Claudio Cajado complemente sua intervenção. Depois, passaremos a palavra ao Deputado Fernando Ferro, para    fazer uma complementação de sua intervenção inicial.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - Apenas, Sr. Presidente, gostaria de encerrar, porque tenho de ir para a Ordem do Dia no plenário da Casa, em função de ser Vice-Líder do Democratas nesta data. Já deve ter iniciado a Ordem do Dia, e terei de lá estar. Eu gostaria de fazer uma última pergunta.

Quando o senhor entregou o Piauí e o Zezinho, claro, foi numa data, num mês. O senhor lembra o dia, o mês?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ    - O dia em que ele foi preso.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - Entregou para a Casa Azul?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Não, eu entreguei em Bacaba, e eles o mandaram para a Casa Azul.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - O senhor sabe quanto tempo eles...

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Foi no dia 24 de janeiro de 1974.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - Vinte e quatro de janeiro de 1974.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Isso.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - Foi entregue para o senhor na base de Bacaba.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Eu o capturei nas proximidades de São Domingos das Latas. Eu o capturei e, nesse dia, o entregamos em Bacaba. Eu tinha superior, que o mandou para a Casa Azul.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO -    Quem mandou para a Casa Azul?    O senhor sabe qual foi o militar?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Não tínhamos os nomes dos chefes; vivíamos na selva.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - Mas o senhor reconhece, então, que foram as Forças Armadas, no caso, o Exército Brasileiro, que matou, assassinou ou escondeu os corpos desses dois?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Não sei. V.Exa. é quem está falando.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - Mas se o senhor entregou...

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Eu já digo: ele está desaparecido; pode ser que esteja com nova identidade, pode até ser que ele esteja morto. Não sei. Eu já não estava mais lá. Eu saí em 27 de fevereiro de 1974. Ele estava vivo quando saí de lá.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - De qualquer forma, a responsabilidade é do Exército.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Não sei.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - Não? O senhor não entregou ao Exército?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Qual é a responsabilidade? Quem estava brigando lá? As Forças Armadas.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - Sim, então.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Está lá. Isso não é preciso nem dizer. Todos sabem que o Exército, a Marinha e a Aeronáutica estavam lá combatendo.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - Então, a responsabilidade é das Forças Armadas?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Nós estávamos lutando lá. Agora, quem lutou, quem é responsável ou não, os senhores que entrem com um processo e verifiquem.

O SR. DEPUTADO CLAUDIO CAJADO - Muito obrigado, Sr. Presidente.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Sr. Presidente, apenas uma indagação.

O senhor é reformado do Exército?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Não, estou na reserva. Posso ser convocado a qualquer momento.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - Deputado Fernando Ferro.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Sr. Presidente, infelizmente, o Brasil não trouxe a público ainda os documentos da Guerra do Paraguai. Nós não temos uma legislação que torne públicos documentos históricos. Não temos informações sobre a Guerra do Paraguai, muito menos agora do Araguaia.

Então, precisamos ter uma legislação, como qualquer país civilizado. Os Estados Unidos liberam com 20, 30, 50 anos; dependendo das implicações daqueles documentos, faz-se um processo de divulgação, tornando-os públicos para os historiadores, para a memória do país. Nós, infelizmente, não temos; temos projeto de lei que está parado. Sou autor de projeto de lei nessa área que não anda.

Apenas para que não fiquemos divagando sobre essa questão, até porque não conseguimos construir uma legislação sobre esse assunto.

Tenho uma preocupação com o que o senhor disse agora há pouco: o senhor se sente abandonado pelos chefes omissos frente à ofensiva dos que o acusam. Por quem o senhor se sente abandonado nesse processo? Pelos comandantes da época, pelas Forças Armadas? Qual é o sentido do que o senhor diz?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ -    Não é que eu me sinta abandonado. Eu sinto que, quando há ataques denegrindo as Forças Armadas, o Exército não se manifesta, a Marinha não se manifesta, a Aeronáutica não se manifesta. Ficam quietos, surdos e omissos, em vez de fazerem uma nota para contestar. E quem cala consente. Então, ficam quietos, e parece que todas as mentiras que falam sobre a instituição são verdadeiras. Pela pesquisa, dentro do Brasil, as Forças Armadas são das que têm maior credibilidade.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Essa afirmação dá a entender que as Forças Armadas são uma espécie de Deus, que não erram. E as Forças Armadas, como outras coisas terrenas, erram também, cometem erros.

O País, a Nação, o Estado deve ter a responsabilidade de reparar esses erros. Esta Comissão de Anistia inclusive é motivada por reconhecimento de erros, como outros países fizeram; por exemplo, Chile e Argentina. Os Estados Unidos já condenaram militares por erros também. Então, isso é natural, não são infalíveis. As Forças Armadas não são infalíveis; erram também.

Penso inclusive que a grandeza das instituições é saber quando erram, para reconhecer e reparar o erro. Penso que temos uma dívida nessa área para responder e para contribuir, de fato, para a democracia.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - Agradecemos ao Deputado Fernando Ferro.

Passamos a palavra ao Deputado Tarcísio Zimmermann.

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - Sr. Presidente, nobre Relator, Sr. José Vargas, o Bispo Desmond Tuto, quando justificava a Comissão Liberdade e Conciliação, constituída na África do Sul, depois da queda do regime Apartheid, em uma de suas frases, dizia que depois de ver a cara da besta, depois que a sociedade sul-africana pudesse enxergar a cara da besta, ela poderia partir para o esquecimento e para a superação da tragédia que fora o Apartheid.

Inicio minha explanação fazendo um elogio ao Sr. José, porque, depois de tantos anos, pela primeira vez, aparece um depoimento - que não sei se é verdadeiro ou não, mas pelo menos faz sentido - sobre aquele período histórico que continua ofuscado pela falta de informações.

Isto posto, faço minha primeira pergunta ao senhor: em que trabalha hoje? O que o Sr. José Vargas é hoje? Um ex-militar? Atua em que área?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Eu advoguei por um tempo. Agora, não advogo. Escrevi o livro. Recebo proventos na condição de 1º Tenente do Exército. Essa é minha única fonte de renda: 5 mil reais por mês.

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - Isso, mais para informação da própria sociedade.

Passo à segunda pergunta. O senhor apresentou alguns documentos publicados pela imprensa. A imprensa noticiou que o senhor teria entregue cópias deles a algumas autoridades militares. O senhor tem esses documentos aqui?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Eu trouxe cópias e as entreguei.

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN -    Já entregou. Não tem mais nenhum outro documento a não ser esses em sua posse? Não há mais nenhum outro documento que o senhor não tenha juntado?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Eu tenho mais alguns documentos.

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - O senhor poderia repassar esses documentos a esta Comissão?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ    - Vou pensar.

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - Penso que é importante que a Comissão, dentro das possibilidades legais, solicite cópias desses documentos também. Estamos diante de um fato histórico, e cidadãos brasileiros estão envolvidos. Por isso seria justo que esses documentos, se existem, viessem à luz.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Já o indagamos, e a resposta anteriormente foi a mesma que deu a V.Exa.: que vai pensar. Penso que precisamos torturá-lo para ver se entrega.

(Intervenções fora do microfone. Inaudível.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - Continua com a palavra o Sr. Deputado Tarcísio Zimmermann.

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - Na verdade, não. Queremos superar esse tempo histórico para sempre da História do Brasil.

Quero perguntar sobre sua entrevista à revista IstoÉ. Quando perguntado sobre a dureza do combate, das ações do Exército e sobre a guerrilha urbana, o senhor respondeu o seguinte: "Se as Forças do Estado tivessem sido radicais nas cidades, não teríamos ministros comunistas fazendo o que querem."

Há pouco, estive em audiência com a Ministra Dilma Rousseff, que o senhor sabe que foi presa política, foi torturada, lutou contra a ditadura militar. O senhor, neste caso, advogaria que o melhor teria sido que S.Exa. tivesse sido assassinada, como os demais, conforme relata?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Isso foi um desabafo.

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - O senhor retira o que falou?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Eu estou falando que isso foi um desabafo.

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - Mas o senhor retira isso que o senhor falou, ou o senhor, de alguma forma...

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Se S.Exa. estivesse lá, na Guerrilha do Araguaia, com certeza, não estaria viva.

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - O senhor está falando de uma hipótese, a de Ministra estar lá. S.Exa. não estava.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - V.Exa. não vai me questionar sobre o que vou fazer ou sobre o que devo fazer. Eu não vou responder.

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - Não. O senhor diz aqui, objetivamente, o seguinte: "não teríamos ministros comunistas fazendo o que querem". Estou lhe perguntando objetivamente sobre a Ministra Dilma Rousseff. Ela foi presa no mesmo período que ocorreu a Operação Araguaia.

Eu quero saber se o senhor, como militar e cidadão brasileiro, advoga que o melhor teria sido se ela tivesse sido assassinada, como o foram o Piauí e o Zezinho.

O SR JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Não sei se o Piauí e o Zezinho foram assassinados. Não sei de nada.

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - O senhor mesmo informou isso.

O SR JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Não informei.

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - Nós não precisamos aqui usar neologismos...

O SR JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Eu não informei. O senhor está enganado.

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - Ou como os outros que foram decapitados lá no Araguaia.

O SR JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Ah! Tá. O Piauí e o Zezinho não.

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - O senhor advoga que o melhor teria sido que ela tivesse sido assassinada?

O SR JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Olha, esse negócio advogar, olha, no caso, numa situação real, numa guerra, a gente faz o que faz no momento. Agora, eu estou tranqüilo, estou aqui fora. Há euforia. É diferente. Quando se está numa guerra é uma situação. Nós estamos agora em outra situação.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Tarcísio, só quero aproveitar a oportunidade para dizer o seguinte. Como você pode dizer que está tranqüilo diante de tantos relatos? Você tem certeza da tranqüilidade?

O SR JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Por que eu deveria estar com medo? Se eu estivesse com medo não estaria aqui conversando com os senhores.

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - Eu quero voltar a lhe fazer essa pergunta, porque eu creio que ela é muito importante e a sua resposta a essa pergunta, na verdade, revela parte da formação que foi impingida, eu diria, aos oficiais e ao Exército brasileiro.

Foi perguntado pela revista IstoÉ: E o combate à guerrilha urbana? O que o senhor respondeu? "Se as forças dos Estados tivessem sido radicais nas cidades, não teríamos Ministros comunistas fazendo o que querem. Os militares que atuaram nas cidades foram muito tolerantes."

Eu quero lhe perguntar de novo: na sua opinião, teria sido melhor, então, ou teria sido justificado, historicamente, inclusive, que a Ministra Dilma Rousseff tivesse sido assassinada, como o foram outras. É isso?

O SR JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Se estivesse no Araguaia seria outra situação. Só que eu não...

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - O senhor não fala do Araguaia. O senhor fala da guerrilha urbana

O SR JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Eu dou exemplo. Eu estou dando um exemplo.

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - O senhor fala da guerrilha...

O SR JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Não é um exemplo que eu estou dando?

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - E o senhor acha que é normal que tenham sido assassinados aqueles que lutavam na guerrilha do Araguaia?

O SR JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Eu estou contando o que nós fizemos lá. Se é normal ou não, os senhores que vão decidir.

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - O senhor, numa altura também, diz aqui: "Torturar é normal numa guerra. Para obter informações, você tem que apelar, fazer a tortura, senão o cara não conta." E mais adiante: "O senhor torturou e matou?" E aí o senhor fala: "Vi muito guerrilheiro sendo torturado em Bacaba, mas eu só apertei um camponês que não queria falar. Coloquei-o nu num pau-de-arara, com o corpo lambuzado em açúcar em cima de um formigueira. Quando as formigas começaram a subir pelo corpo dele, o camponês contou tudo."

O senhor acha isso normal?

O SR JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Na oportunidade era normal. Agora, não sei.

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - Esse camponês, o senhor prendeu, estava armado?

O SR JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Ele ainda está vivo.

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - Ele estava armado, esse camponês?

O SR JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Estava, estava.

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - O senhor não refere isso aqui.

O SR JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - É. Isso é só um detalhe.

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - Mas na hora que o senhor o prendeu, o amarrou em cima de um formigueiro, ele estava armado?

O SR JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Mas se ele já foi preso, como é que vou deixar um prisioneiro armado?

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - E o senhor não sente vergonha de usar a sua condição de superioridade para impor esse tipo de humilhação e de tortura    sobre uma pessoa? O senhor acha isso normal?

O SR JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Ah! Coloque-se no meu lugar...

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - O senhor acha isso normal?

O SR JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Não, não. Coloque-se no meu lugar. Se ele estivesse me prendido, o senhor acha que eu estaria vivo aqui? É normal isso também?

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - Talvez sim, talvez não.

O SR JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Ah! Então, é isso.

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - Talvez sim, talvez não.

O SR JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - A sua resposta é essa também.

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - A história seria a dele. Ele contando, eventualmente.

O SR JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Então, o senhor acha que eu estaria vivo aqui?

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - Eu quero lhe perguntar se o senhor acha isso normal, porque...

O SR JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Na época foi normal. Na época foi normal.

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - O senhor não diz aqui que na época foi normal.

O SR JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Jornalista escreve muita coisa. E às vezes aumenta um pouquinho para ter sensacionalismo. Mas eu confirmo isso aí.

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - Quer dizer que o senhor é um torturador? Isso o senhor confirma?

O SR JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Eu fiz o que fiz aí.

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - O senhor é um torturador. O senhor confirma isso?

O SR JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Eu fiz o que está escrito aí. Eu fiz. Pronto!

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - Eu penso que nós devemos encaminhar uma representação à Justiça, informando isso, informando os termos aqui admitidos pelo Sr. José Vargas Jiménez, para que o Poder Judiciário, as autoridades do Ministério Público possam tomar conhecimento formal do depoimento que o Sr. Jiménez deu aqui nesta Comissão.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Sr. Presidente...

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - Deputado Tarcísio Zimmerman, obrigado pela sua intervenção.

Passo a palavra ao Relator, Deputado Arnaldo Faria de Sá.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Quando respondeu ao Deputado Tarcísio Zimmermann, ele disse que se a Dilma estivesse no Araguaia não teria sobrevivido. E porque que o Genoíno sobreviveu?

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - Com a palavra o Sr. José Vargas.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Conforme depoimentos do Curió, do Lício Maciel, ele entregou. Por isso que ele está vivo. Ele entregou os companheiros.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Sr. Presidente, eu acho a sugestão do Deputado Tarcísio Zimmermann tem que ser levada adiante. A Comissão deve fazer uma representação para o Ministério Público Federal, entregando cópia da fita deste depoimento, que tem a confissão de tortura, que eu reafirmo é crime imprescritível, do Sr. José Vargas Jiménez aqui na Comissão, diante de todas as testemunhas. Quer dizer, ele poderá dizer eventualmente que a entrevista que ele deu à revista IstoÉ, tem isso ou aquilo que não corresponde à realidade, mas o que ele disse aqui está totalmente gravado, e não tem que dizer que vale ou que não vale. Acho que nós devemos extrair cópia desse depoimento, encaminhar ao Ministério Público Federal para tomar as providências cabidas e devidas em relação a esse elemento, que, reafirmo, está apenas tentando vender o livro, não se importando com o que fez, com as atrocidades que cometeu e com as torturas que praticou.

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - Eu queria Presidente, pedir que também, já que houve aqui a confissão de que existem outros documentos em poder dos Sr. José Vargas Jiménez, encaminhemos uma solicitação ao Ministério Público Federal no sentido de requisitar esses documentos, para inclusive ilustrar ou instruir processos de apuração de desaparecidos políticos.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - Há alguma observação, senhor Vargas?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ    - Não.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - Sr. Relator, alguma observação a mais?

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Com todo o respeito, Sr. Presidente, estou enojado. Lamento. Nada mais.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Sr. Presidente.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - Pois não, Deputado Fernando Ferro.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Em função da fala do depoente, talvez fosse interessante a Comissão solicitar um depoimento do Curió para confirmar algumas informações.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - V.Exa. pode encaminhar requerimento à Comissão que o apreciará no momento oportuno.

Gostaria ainda, Sr. Vargas, de indagar sobre uma informação que a matéria da revista Veja traz, dando conta da existência de uma relação com nome de camponeses que foram identificados como colaboradores da guerrilha. Isso consta de um documento distribuído para todos os membros das Forças Armadas que se encontravam naquele episódio. E dá um número, em torno de 400 pessoas. Se existe esse documento, e se esse é o número que esse documento continha.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ    - Não existe não. O que existe é o que li no início.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - A revista IstoÉ. Não existe nenhum documento com essa relação de nomes.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Eu não falei. Nessa entrevista não falei de quatrocentos. Falei de alguns, e aqueles que eu citei aqui, que estão no plano de busca e apreensão

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - Não existem documentos, portanto.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Não, em relação aos quatrocentos não. Só em relação àqueles outros que eu citei agora.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - Existiram documentos orientando o Exército ou as forças de segurança sobre procedimentos.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Normas Gerais da Ação.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - V.Sa. não apresentou esses documentos nessa relação que encaminhou.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Não.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - V.Sa. tem esses documentos?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Tenho.

O SR PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - Poderia apresentar?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Mas eu não trouxe. Segue o requerimento dele solicitando pelo Ministério Público. Na hora que requisitar, eu entregarei.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - V.Sa. teria condições de informar sobre a existência de outros documentos, relatos, dados, em referência a esse episódio da Guerrilha do Araguaia, que esteja preservado em algum ambiente, no Exército ou fora dele, com pessoas?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Não. Em 1985, houve ordem para acabar com todos os documentos, queimar todos sobre a guerrilha.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - Ordem de quem?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Do CIEx - Centro de Informações do Exército, em 1985. Na época, eu trabalhava no Serviço de Inteligência e soube que houve essa ordem. Foram todos queimados na época. Por isso que hoje em dia... A não ser que o CIEx tenha. Não sei. Mas dentro do que o senhor está perguntando se alguém tem, se alguma unidade tem, não tenho.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - V.Sa. não guardou cópia desses documentos?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Eu guardei desse que acabei de apresentar para o senhor, do estudo do PCdoB para implantação da guerrilha, entendeu? Está aí com o senhor.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - Além do Curió, que V.Sa. já mencionou, V.Sa. poderia identificar outras pessoas que poderiam colaborar com esta Comissão trazendo dados, informação?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Quem ia querer colaborar do jeito que os senhores estão me tratando? Eles já têm medo. E agora que eu contar como me trataram aqui, você acha que vão querer colaborar?

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - V.Sa. se sente tratado com algum grau de indignidade que fuja aos padrões da civilidade neste depoimento?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Só um cego, que não enxerga, que não quer ver. O senhor não viu? Não sentiu? Eu não sou leigo, não.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - V.Sa. acha que recebeu algum tipo de coação, de ameaça, de algo que possa ter lhe deixado...

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Na hora que degravarem, os senhores vão sentir como me foi perguntado. O senhor é o único que, ele e um outro, fala decentemente. Os outros falam com afronta, não falam decentemente. O senhor está falando decentemente.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - Eu queria considerar que a Mesa e a Presidência avaliam que todos o trataram aqui com absoluta decência. Todos os Parlamentares que fizeram intervenção o fizeram num tom adequado, com equilíbrio, dentro do objeto desta Comissão, que é buscar dados, elementos, investigar. E não considera que em qualquer momento V.Sa. tenha sido ameaçado, tratado de forma indigna, incompatível com aquilo que é próprio de um ambiente de interrogação, como este que estamos produzindo aqui.

Essa é a convicção desta Presidência.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Essas são as suas palavras. Mas na hora que degravar o que está sendo gravado, os senhores vão perceber. E qualquer pessoa vai perceber isso pelo tom de voz, pelas risadas, pelas ameaças.

Agora o senhor, que é Presidente, realmente tem que defender; os senhores são maioria, e eu estou sozinho aqui.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - V.Sa., então, tem pessoas que poderiam fornecer mais informação, mas não se sente à vontade para apresentar os nomes. Poderia fazer isso num ambiente não público? Poderia colaborar com a Comissão entregando isso numa sessão secreta, encaminhando posteriormente essas informações?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Eu vim para cá pensando que estava num País democrático, mas estou vendo que não acontece isso. Qual é o homem que teria a coragem que estou tendo aqui de chegar e contar? Só eu, senhores, só eu.

Então, quem não me conhece fala: "Você é maluco, você é louco". Eu não, eu estou fazendo consciente. O que eu estou falando, eu estou falando consciente.

Agora chego aqui para explicar, para contar para os senhores e começo a levar farpadas? Eu fui alertado por muitos companheiros que isso ia acontecer. E aconteceu. Mas eu vim assim mesmo, entendeu? Eu vim assim mesmo, porque eu quero que na história do Brasil seja contada a verdade, não a mentira.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - Antes de encerrar, passo a palavra para o Deputado Fernando Ferro, que quer fazer uma complementação.

O SR. DEPUTADO FERNANDO FERRO - Sr. Presidente, eu acho que as intervenções todas fizemos de maneira precisa e respeitosa. Agora, é estranho que uma pessoa acostumada a torturar, como o senhor, tenha tido essa preocupação, se sentido tão ofendido com algumas palavras que foram ditas aqui. Para um torturador se espera mais frieza e mais coragem. Não houve agressão nenhuma a sua pessoa. Tudo inclusive que foi dito, perguntado foi tratando-o respeitosamente de senhor, inclusive fiz questão durante todo esse tempo, e reconhecendo que está dando uma contribuição para o depoimento desta Comissão. Não houve de nossa parte nenhuma atitude agressiva, desrespeitosa. Nós estamos tentando obter informações. São fatos de há mais de 30 anos, com o qual a gente tem que aprender para construir uma democracia, que são naturais em um processo de um inquirimento. Talvez o senhor é que não esteja acostumado a um processo de debate desse jeito e se está sentindo acuado e ameaçado. Imagine suas vítimas se submetendo a sessões de torturas.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Mas eu vim voluntário, não fui intimado. Eu vim aqui porque eu quis. Mas eu esperava algo melhor. Duas ou três vezes, comentei com ele: "Ó, vamos conversar como gente civilizada, se não eu vou embora".

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - Deputado Tarcísio Zimmermann.

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - Sr. José, eu fiz uma inquirição dura para o senhor, mas coloquei, inicialmente, o reconhecimento pela sua coragem. Eu acho que isso é algo digno de registro. Mas, evidentemente, nós aqui nesta Comissão nos defrontamos cotidianamente com a dor produzida por aquele período e com as seqüelas produzidas daquele período. E temos também um verdadeiro desejo de que se produza aqui no nosso País a justiça e que possa se produzir a verdade.

Então, eu volto a um tema aqui, porque talvez o fato de eu não poder estar aqui desde o início, eu queria voltar àquele camponês já referido antes. O senhor refere, no final do seu depoimento, que ele ficou vivo. O senhor poderia dizer que ele está vivo?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - É a mesma coisa do Piauí e do Zezinho. Eu saí de lá antes da guerrilha terminar. Então, eu não sei o que aconteceu depois. A guerrilha terminou no final de 1974, no início de 1975. Eu saí daí em fevereiro, não fiquei até o final.

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - O senhor não tem, então, nenhuma referência?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Não. Não tenho.

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - O senhor saberia dizer mais alguma coisa sobre o nome dele?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Não.

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - É Zezinho do quê?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Não, Piauí e Zezinho. Eram dois.

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - Esse camponês.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Não lembro.

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - Nenhuma referência que pudesse localizá-lo?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Não, não.

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - Está bem. Obrigado.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - Agradecemos ao Deputado Tarcísio Zimmermann.

Sr. José Vargas, V.Sa. deseja fazer alguma colocação final a respeito desta audiência ou a respeito da sua participação nesta audiência pública?

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Sim. Finalizando, já falei, como eu disse, um desabafo. Senti-me pressionado. Eu informei a muitos que eu viria aqui, muitos, e todos não queriam que eu viesse. Mas eu tenho uma decisão. Quando eu tomo uma decisão, eu faço. Eu vim. Não tem ninguém me apoiando. É um problema que eu acho, que eu acabei de falar, acho esse problema que querem acabar com anistia - tá, às vezes, os senhores dizem que eu torturei. Dizem, não, eu confirmo. Nossos chefes das Forças Armadas não falam nada, não respondem a nada. Então, eu sou militar, sou daqueles que gostam de defender a pátria. E, na época, eu estava defendendo a Pátria contra o regime comunista. Tanto é que eu deixei um documento aí provando que o PCdoB queria impor o Regime Comunista no Brasil. É um documento. No mais, eu vou pedir o quê? Foi uma guerra. Pedi desculpas. Ficar com dó? Com certeza, porque guerra é guerra e afeta todo mundo, tanto a parte vencida, como os vencedores. Afeta os 2 lados, entendeu? Sei que há muita gente sofrendo por isso até hoje. E do nosso lado também tem gente sofrendo. E pedi a Deus, já pedi a Deus o meu perdão, entendeu? Agora, eu estava numa guerra e tinha que cumprir ordens.

Acho que é só isso que eu tenho que falar. Desculpem-me se eu fui muito arrogante, mas com certeza os senhores estão tendo um relato de quem esteve lá dentro, quem combateu, os relatos que eu tenho no meu livro, detalhes de como as pessoas morreram. Hoje em dia você tem a relação: Fulano morreu na Guerrilha. Mas eu relato como morreu, em que ataque morreu, qual dia que ele morreu, porque eu estava lá. Eu estava defendendo, como disse, era 3º Sargento, comandava 10 homens, defendendo o regime militar, um ideal democrático contra um ideal comunista. Eram idéias. Cada um, dentro do seu livre arbítrio, tem... Eu defendo o que eu quero, como os senhores agora estão defendendo esta Comissão. Os senhores acham que estão fazendo a coisa certa, eu também. E eu quero, antes de concluir, pedir desculpas a todos pela minha arrogância que todos estão falando e fazer a última pergunta para esta Comissão de Anistia e encerrar: se eu posso entrar também com um pedido de indenização porque eu trabalhei 6 anos lá.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Isso não é aqui.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - Agradecemos o Sr. José Vargas, convidado, a presença nesta audiência pública.

Queríamos afirmar que consideramos que não houve qualquer tipo de pressão, a não ser o debate natural que se produz num ambiente como esse de busca de esclarecimento, de interrogação e de diferenças de opinião que ficou expressa neste debate, a opinião do convidado e a opinião de alguns Deputados que compõem esta Comissão. Portanto, o nível do debate foi nível civilizado dentro daquilo que o Regimento prevê. Ainda bem que nós pudemos hoje ter esse tipo de confrontação de opiniões. E a democracia que o Brasil alcançou permite isso, permite que uma opinião completamente divergente possa ser exposta e possa ter dureza na contradição, mas a aceitação do direito daqueles que têm uma opinião diferente de expressar a sua opinião. É isso que aconteceu nesta audiência. Eu queria...

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - Sr. Presidente...

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - Pois não, Deputado Tarcísio.

O SR. DEPUTADO TARCÍSIO ZIMMERMANN - Eu queria fazer uma referência aqui porque o Sr. Jiménez fez uma observação que eu penso que é muito grave e que não pode passar batida, não pode passar como se não tivesse sido feita.

Ele fez a pergunta a esta Comissão se ele poderia entrar com um pedido de indenização. Eu, ao longo de várias das perguntas que eu fiz, Sr. José Vargas, quero destacar que, às vezes num situação de combate, até é compreensivo a ocorrência de algum excesso - não é justificável, é compreensivo -, mas, 30 anos depois, se nós não formos capazes de entender o que aconteceu e se mantivermos essa mesma posição a que o senhor está se referindo aqui, aí nós estamos verdadeiramente com problemas, porque inclusive os militares não têm autorização de usar a força que a sociedade lhes delega de forma ilegal para cometer ilegalidades.

O senhor estava a serviço, mas não estava a serviço da ilegalidade. Podia não ser uma legalidade democraticamente construída, mas o senhor não tinha a procuração para torturar e o senhor não foi torturado no Araguaia. O senhor torturou, não foi torturado no Araguaia.

A Lei da Anistia contempla aqueles que, de forma Ilegal, de forma arbitrária, foram vítimas da arbitrariedade de um regime que não tinha legitimidade popular. Então, eu quero lhe dizer em primeiro lugar: o senhor não lutava pela democracia, não lutava pela democracia. O senhor lutava para defender a ditadura militar. Essa é a primeira questão.

A segunda questão: o senhor não é merecedor de anistia. O senhor não é merecedor de anistia e nem de indenização, porque o senhor usou, inclusive, da sua autoridade que lhe foi conferida por um regime que não era legal, que não era legítimo; o senhor usou dela inclusive extrapolando aquilo que o próprio regime permitia, porque mesmo a ditadura militar nunca autorizou legalmente e formalmente a tortura. Então, por isso o senhor não tem direito. O senhor não tem direito. Nenhum torturador tem direito à anistia e nenhum torturador tem direito à indenização. Não podemos tripudiar uma segunda vez sobre aqueles que foram vítimas da arbitrariedade.

O SR. JOSÉ VARGAS JIMÉNEZ - Muito obrigado.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - O Deputado Tarcísio Zimmermann se encarregou de dar a resposta que eu em seguida faria, mas com muita propriedade. Uma coisa é qual foi o papel do Estado ou aqueles que, em nome do Estado e extrapolando o que a própria ordem constituída naquela circunstância estabelecia, cometeram atos de ilegalidade. É para essas vítimas que a anistia é feita, não para aqueles que, em nome do Estado e extrapolando aquilo que o Estado estabeleceu, cometeram esses atos. Esses a lei reserva os caminhos da identificação e da punição que, em muitos lugares, em muitos momentos históricos aconteceu pelo mundo afora.

Não se trata de fazer esse debate aqui. Nesta Comissão nós queremos criar as condições de identificar as situações, as pessoas que possam, a partir desse processo se beneficiar da legislação, da anistia. Foi para isso que o convidamos a esta Comissão.

As informações prestadas aqui, as informações inclusive que podem sugerir providências legais para dentro do ambiente jurídico e democrático que estamos vivenciando, conduzir a algum tipo de investigação e de punição de crimes, enfim, que possam ter sido revelado, esta Comissão vai providenciar. Vamos encaminhar ao Ministério Público, vamos, dentro do Regimento e dentro daquilo que a Casa permite, dar seqüência à busca desses elementos, dos elementos jurídicos, para que aquilo que foi revelado aqui possa ter as conseqüências legais pertinentes.

Para concluir, quero dizer que todos nós consideramos fundamental a existência de defesa, qualquer Nação, qualquer País, e o papel insubstituível das Forças Armadas. Não se pode pensar em Nação sem defesa, sem Forças Armadas para cumprir esse papel; aquilo que está previsto na lei, nada além daquilo que está autorizado pela lei. Esse papel o Congresso brasileiro, a sociedade brasileira quer relevar, quer reconhecer, quer dar a dimensão adequada e valorizar o papel das Forças Armadas. Não se trata de minimizar ou de questionar esse papel; trata-se de fazer com que ele se circunscreva ao ambiente legal, e, para esses, o rigor deve ser maior, não deve ter tolerância, porque os limites são absolutamente precisos, e há disciplina em relação a isso.

Quero dizer também que sou do PCdoB, tenho muito orgulho de fazer parte dessa história. Considero que a ação que desenvolvemos ao longo da história foi no sentido de resgatar a democracia.

A sociedade brasileira alcançou isso. Erros na trajetória foram cometidos. Todos nós cometemos erros, mas não temos nenhuma autocrítica a fazer sobre os objetivos que finalmente foram alcançados e o orgulho que temos de ter construído essa trajetória para alcançar esses objetivos. Não me considero mais nem menos patriota do que qualquer outro segmento da sociedade. O PCdoB, os seus membros, os seus filiados se consideram patriotas. Defender a Pátria não é impor suas convicções, não é suprimir a democracia, não é violentar as liberdades, não é agredir direitos humanos. Não se faz isso com tortura em lugar nenhum do mundo. E é isso que se quer corrigir para que nunca mais possamos nos deparar com esse tipo de situação.

V.Sa., se tem algum sentimento patriótico, deve refletir e com o nível de consciência que adquiriu, se é que não tinha desde então quando atuou na Guerrilha do Araguaia, deve refletir sobre a possibilidade de trazer informação, dados, documentos que possam permitir passar a limpo parte dessa história, para que os documentos que seguramente estão por aí não venham a público, não sejam divulgados como cinza, como aconteceu na Base Aérea de Salvador recentemente. Volta e meia tem-se notícia de que parte dos documentos existiam ou ainda existem e estão sendo gradativamente destruídos. O direito à verdade, à memória é um direito de todos os cidadãos e do Estado brasileiro.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Sr. Presidente, enquanto esses documentos são queimados, muitos que têm direito à anistia perdem por falta desses documentos.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - Exatamente.

Por isso que nós queríamos concluir reafirmando e requerendo de V.Sa. que encaminhe a esta Comissão todos os documentos que foram referidos aqui que constam por informação de V.Sa., na matéria da IstoÉ, que estariam em seu poder. Assim estaríamos todos nós tirando conseqüências mais concretas dessa audiência pública, caminhando na direção do esclarecimento e da possibilidade de promover a anistia para aqueles que naquilo que prevê a lei têm direito a essa anistia.

Agradeço a V.Sa. a presença e declaro encerrada...

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Sr. Presidente, Sr. Presidente. Eu queria dizer ao depoente que, da minha parte, se ele entregar esses documentos, eu abro mão da representação no Ministério Público Federal, mas desde que ele entregue esses documentos à Comissão.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Daniel Almeida) - Alguma informação a esse respeito, Sr. José Vargas?

Agradecemos, então, ao convidado a presença.

Antes de encerrar a sessão, eu convoco para a próxima quarta-feira, dia 10, reunião de audiência pública, convidando a Sra. Eugênia Augusta Gonzaga, Procuradora da República no Estado de São Paulo; o Sr. José Alves Paulino, Procurador Regional da República da 1ª Região; Marcelo Lavenère, Jurista; e Marcelo Normando, Advogado, a partir de requerimento do Deputado Pompeo de Mattos, aprovado no dia 11/8. Próxima sessão, então, dia 10, às 14h30.

Está encerrada a presente reunião.