CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ

Com%20reda%C3%A7%C3%A3o%20final
Sessão: 237.1.53.O Hora: 15:00 Fase: PE
Orador: IRINY LOPES, PT-ES Data: 12/09/2007

A SRA. IRINY LOPES (PT-ES. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, em março deste ano, tivemos oportunidade de ter acesso a relatório preliminar sobre os conflitos no campo em 2006, elaborado pela Comissão Pastoral da Terra - CPT, que destaca, com muita ênfase, o que vem sendo chamado de "judicialização dos conflitos agrários", que nada mais é do que a criminalização dos movimentos sociais, sobretudo os que lutam pela reforma agrária em nosso País.

A despeito do que afirma o art. 184 da nossa Constituição, que prevê a desapropriação "por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social", tem sido, infelizmente, muito comum no Judiciário brasileiro a adoção de medidas conservadoras no que diz respeito ao direito à propriedade, embasadas na arcaica Lei de Terras, de 1850. Essa legislação, superada do ponto de vista legal, visto que a Constituição é nossa lei maior, visava, naquele período pós-abolição do tráfico de escravos, evitar que colonos e negros tivessem acesso a terra. Para tanto, previa que ele só ocorreria unicamente por instrumento de compra.

O relatório da CPT nos chama a atenção também para os índices alarmantes de 351,2% de aumento nos casos de trabalhadores presos (num total, neste ano, de 749 pessoas) em relação a 2005. Contabilizado ainda o período do primeiro mandato do Governo Lula, a Pastoral constatou que 99,7 mil famílias de trabalhadores rurais foram despejadas por ordem judicial, mais 11,3 mil famílias foram expulsas sem nenhuma decisão judicial que amparasse essa decisão, totalizando 110 mil famílias retiradas à força da terra. Esse total equivale a um terço das famílias assentadas durante o Governo Lula.

O temor que a ascensão de Lula à Presidência trouxe de que se deflagraria uma ampla reforma agrária possivelmente tenha sido o fator que acionou esse comportamento por parte do Judiciário. Afinal, Lula não reprimiu, como o Governo anterior, as mobilizações legítimas daqueles que desejam a aceleração do processo de reforma agrária.

Destaco uma reportagem sobre o tema feita pela Agência Carta Maior, em março deste ano, em que relaciona uma pesquisa do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM) nos Estados do Rio Grande do Sul, São Paulo, Pará e Pernambuco. De acordo com o estudo, "a tática mais comum do Poder Judiciário frente aos movimentos de luta pela terra tem sido igualar ações de cunho político - principalmente as ocupações com objetivo de pressionar o governo a agilizar a reforma agrária - a atos criminais comuns", com indiciamento freqüente de trabalhadores rurais e sem terra por formação de quadrilha ou bando, o que vem a se constituir numa criminalização da ação coletiva.

Para esses magistrados "a questão social é irrelevante para o aplicador da lei, não estando os movimentos sociais autorizados a condutas que eles consideram ilegais". Outra postura do Judiciário frente a essas questões tem sido a de protelar indefinidamente processos que envolvem a reforma agrária. Para fazer frente a tal omissão, que freqüentemente usa como álibi o fato de a Justiça estar abarrotada de ações de toda a natureza, que mobilizamos e vai estar nesta quinta e sexta-feira no Espírito Santo o Desembargador Gercino José da Silva Filho, Ouvidor Agrário Nacional de Combate à Violência no Campo, para conversar com movimentos sociais rurais do Estado.

O Ouvidor estará ainda com o Ministério Público Estadual e o Presidente do Tribunal de Justiça, aos quais sugerirá a criação de promotoria e vara agrárias. Também, em encontro com o Secretário de Segurança Pública do Estado e o Comandante da PM, Gercino Filho, vai pedir a criação de 1 Delegacia agrária e do Centro de Gerenciamento de Conflitos Agrários da PM.

Entendemos que o ideal seria a criação, pela Justiça Federal, de varas agrárias, mas achamos que a iniciativa, ainda que não seja positiva em alguns Estados, como no Pará e na Paraíba, por exemplo, em que o Judiciário se guia pelos interesses do latifúndio, existem outras - as de Minas Gerais e Santa Catarina - em que os magistrados tentam solucionar os conflitos do campo mediante diálogo.

Nesta sexta-feira também promoveremos, na Assembléia Legislativa do Espírito Santo, com apoio dos Deputados Cláudio Vereza e Givaldo Vieira, o Seminário da Terra, abordando, sobretudo, a questão das terras devolutas e improdutivas.

O MST do Estado, tendo como base as publicações do IBGE, afirma que o Espírito Santo tem mais de 500 mil hectares de terras devolutas. Do total, apenas 2,6 mil hectares foram entregues pelo Governo ao INCRA para fins de reforma agrária. O companheiro Ademilson Pereira Souza, do MST, calcula que os 500 mil hectares seriam suficientes para assentar mais de 5 mil famílias de trabalhadores rurais, o que poderia gerar, em média, 20 mil postos de trabalho no Estado.

Em um cenário em que terras devolutas são facilitadas para grandes empresas multinacionais e negadas ao interesse social, em que o Judiciário se apóia em legislações ultrapassadas e destituídas pela Constituição de 1988 para negar aos trabalhadores rurais o acesso a terra, em que se criminaliza coletivamente os sem-terra apenas pelo fato de reivindicarem a observância da lei no que se refere à reforma agrária, essa discussão se faz essencial, assim como essencial é a terra para quem dela precisa.