CÂMARA DOS DEPUTADOS

COMISSÃO ESPECIAL DESTINADA A PROFERIR PARECER À PROPOSTA DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO Nº 182, DE 2007, DO SENADO FEDERAL, QUE “ALTERA OS ARTS. 17, 46 E 55 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, PARA ASSEGURAR AOS PARTIDOS POLÍTICOS A TITULARIDADE DOS MANDATOS PARLAMENTARES E ESTABELECER A PERDA DOS MANDATOS DOS MEMBROS DO PODER LEGISLATIVO E DO PODER EXECUTIVO QUE SE DESFILIAREM DOS PARTIDOS PELOS QUAIS FOREM ELEITOS” (PEC DA FIDELIDADE PARTIDÁRIA), E APENSADAS
55ª Legislatura - 1ª Sessão Legislativa Ordinária

ATA DA 6ª REUNIÃO ORDINÁRIA
AUDIÊNCIA PÚBLICA
REALIZADA EM 10 DE MARÇO DE 2015. 

Às dez horas e vinte e seis minutos do dia dez de março de dois mil e quinze, reuniu-se a Comissão Especial destinada a proferir parecer à Proposta de Emenda à Constituição nº 182, de 2007, do Senado Federal, que “altera os arts. 17, 46 e 55 da Constituição Federal, para assegurar aos partidos políticos a titularidade dos mandatos parlamentares e estabelecer a perda dos mandatos dos membros do Poder Legislativo e do Poder Executivo que se desfiliarem dos partidos pelos quais forem eleitos” (PEC da Fidelidade Partidária), e apensadas, no Anexo II, Plenário 7 da Câmara dos Deputados. Estiveram presentes os Deputados Rodrigo Maia - Presidente; Rubens Otoni e Tadeu Alencar - Vice-Presidentes; Marcelo Castro - Relator; Afonso Motta, Alceu Moreira, Antonio Bulhões, Arthur Oliveira Maia, Chico Alencar, Daniel Almeida, Esperidião Amin, Henrique Fontana, Joaquim Passarinho, Josi Nunes, Lincoln Portela, Luciano Ducci, Marcelo Aro, Milton Monti, Moema Gramacho, Pedro Fernandes, Renata Abreu, Renato Molling, Sandro Alex, Uldurico Junior, Valtenir Pereira e Veneziano Vital do Rêgo - Titulares; Adail Carneiro, Afonso Hamm, Baleia Rossi, Danilo Forte, Elmar Nascimento, Evandro Gussi, Fábio Sousa, Jean Wyllys, Juscelino Filho, Odorico Monteiro, Padre João, Paes Landim, Samuel Moreira, Vinicius Carvalho e Zé Carlos - Suplentes. Compareceram também os Deputados Dulce Miranda, José Fogaça, Jovair Arantes e Ricardo Barros, não-membros. Deixaram de comparecer os Deputados Benito Gama, Carlos Zarattini, Edmar Arruda, Indio da Costa, Marcus Pestana, Max Filho, Silvio Torres e Victor Mendes. ABERTURA: O Presidente declarou abertos os trabalhos e submeteu à apreciação as Atas da terceira, quarta e quinta reuniões, cujas leituras foram dispensadas a pedido do Deputado Afonso Hamm. Não houve discussão e, em votação, as Atas foram aprovadas.  ORDEM DO DIA: Audiência Pública para debate sobre a proposta de Reforma Política com o seguinte convidado: EUGÊNIO JOSÉ GUILHERME DE ARAGÃO, Vice-Procurador-Geral Eleitoral do Ministério Público Eleitoral. Ao anunciar a Ordem do Dia, o Presidente informou que aquela reunião era fruto do Requerimento  nº 7/15, de autoria do Deputado Padre João, e que seria uma Audiência Pública interativa, com a possibilidade de os internautas enviarem seus comentários e perguntas, ficando a critério dos parlamentares repassá-las ao convidado, se assim desejassem. Ato contínuo, o Presidente informou sobre os procedimentos que norteariam a reunião e passou a palavra ao convidado, por vinte minutos. O Vice-Procurador-Geral Eleitoral discorreu sobre vários aspectos relacionados à reforma política, destacando a questão do financiamento de campanha, a necessidade do fortalecimento dos partidos e da criação de novas regras para sua formação. Finda a exposição do convidado, manifestaram-se os Deputados Henrique Fontana, Rubens Otoni, Daniel Almeida, Odorico Monteiro, Esperidião Amin, Marcelo Castro, Afonso Motta, Arthur Oliveira Maia, Elmar Nascimento, Milton Monti, Jean Wyllys, José Fogaça, Evandro Gussi, Zé Carlos e Renata Abreu. Em sua manifestação, o Deputado Jean Wyllys citou comentários enviados pelos internautas e leu algumas perguntas destes. Não havendo mais oradores inscritos, o Deputado Rubens Otoni, que assumira a presidência dos trabalhos, concedeu a palavra ao Procurador-Geral Eleitoral para responder às indagações dos Deputados e considerações finais. Em seguida, o Deputado Rubens Otoni agradeceu ao convidado pela presença e valiosa contribuição e informou que passava às mãos do Relator, Deputado Marcelo Castro, as manifestações dos internautas. ENCERRAMENTO: Nada mais havendo a tratar, o Deputado Rubens Otoni  convidou a todos para participarem da Audiência Pública naquela mesma tarde de terça-feira, às quatroze horas e trinta minutos, com a presença do Presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Ministro José Antonio Dias Toffoli, e encerrou a reunião às doze horas e quarenta e sete minutos.  E, para constar, eu ______________________, Regina Pereira Games, lavrei a presente Ata, que, após lida e aprovada, será assinada pelo Presidente, Deputado Rodrigo Maia ___________________________, e publicada no Diário da Câmara dos Deputados. O inteiro teor foi gravado, passando os arquivos de áudio, vídeo e notas taquigráficas a integrarem o acervo documental da reunião. x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-

 

DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO

 

NÚCLEO DE REDAÇÃO FINAL EM COMISSÕES

 

TEXTO SEM REVISÃO

 

 

COMISSÃO ESPECIAL - PEC 182/07 - REFORMA POLÍTICA

EVENTO:

REUNIÃO Nº: 0043/15

DATA: 10/03/2015

LOCAL:

INÍCIO: 10h25min

TÉRMINO: 12h49min

PÁGINAS: 52

 

DEPOENTE/CONVIDADO - QUALIFICAÇÃO

 

 

 

SUMÁRIO

 

 

 

OBSERVAÇÕES

 

TEXTO SEM REVISÃO. APENAS PARA CONSULTA.

 

 


 

 

            O SR. PRESIDENTE (Deputado Rodrigo Maia) - Declaro aberta a 6ª reunião da Comissão Especial destinada a proferir parecer à Proposta de Emenda Constitucional nº 182, de 2007, do Senado Federal e apensados.

            Encontra-se à disposição dos Srs. Deputados cópias das atas das 3ª, 4ª e 5ª reuniões.

            Pergunto se há necessidade da leitura das referidas atas.

            O SR. DEPUTADO AFONSO HAMM - Peço a dispensa da leitura da ata presente.

            O SR. PRESIDENTE (Deputado Rodrigo Maia) - Dispensada a leitura da ata.

            Em discussão.

            Não havendo quem queira discuti-las, em votação.

            Aprovadas.

            Daremos início à reunião de audiência pública, atendendo a Requerimento nº 7, de 2015, de autoria do Deputado Padre João.

            Convido-o a tomar assento à mesa.

            Já está à mesa o Sr. Eugênio José Guilherme de Aragão, vice-Procurador-Geral Eleitoral do Ministério Público.

            Peço a atenção de todos para as seguintes orientações:

            Esta é uma audiência pública interativa. A sociedade civil poderá participar com sugestões e questionamentos pelo endereço e-Democracia.Camara.gov.br. Os Deputados poderão acompanhar as sugestões e perguntas por celulares e tablets.

            Na fase dos debates, os Deputados poderão direcionar as sugestões e questionamentos aos convidados.

            Ao final da reunião, todas as sugestões recebidas serão entregues ao Relator, Deputado Marcelo Castro.

            Quanto ao tempo de exposição e debate, solicito a compreensão de todos no tocante ao tempo de exposição dos debates, conforme as seguintes orientações: o tempo concedido ao palestrante será de 20 minutos. Os Deputados interessados em interpelar o palestrante deverão se inscrever previamente junto à Secretaria. As perguntas deverão ser feitas ao final da (ininteligível) e deverão restringir-se ao assunto da exposição formuladas no prazo de 3 minutos, dispondo o palestrante de igual tempo.

            Aos Deputados são facultadas a réplica e a tréplica pelo mesmo prazo.

            Feitos os esclarecimentos, daremos início à audiência.

            Convido o Sr. Eugênio Aragão para fazer sua exposição.

            O SR. EUGÊNIO JOSÉ GUILHERME DE ARAGÃO - Sr. Presidente, agradeço a deferência desta Comissão em convidar o Ministério Público Eleitoral para aqui colocar sua posição a respeito da reforma política.

            Em nome de V.Exa. cumprimento todos os Parlamentares presentes e as demais autoridades.

            Minhas senhoras, meus senhores, é com grande satisfação que venho aqui expor algumas ideias a respeito da reforma política que temos discutido internamente na equipe do Ministério Público Eleitoral.

            A opção por uma reforma política que se faça pela via da emenda constitucional é um desafio muito grande, porque um tema central como esse para a sociedade brasileira pressupõe que o produto final seja resultado de um largo consenso dentro da sociedade.

            Uma reforma eleitoral feita na base da emenda constitucional deve pressupor também por isso um largo consenso para que se possa atingir o quórum de 3/5 de sua aprovação.

            Essa discussão, realmente, é processualmente complicada. Vemos com certa preocupação, no Ministério Público, a enorme polarização política que nós temos experimentado ao longo do processo eleitoral, que possa contaminar esse debate ou que possa, vamos dizer, até tornar esses consensos mais amplos, às vezes, mais difícil do que em épocas mais tranquilas de convívio na classe política.

            De qualquer forma, esse é um problema político. Não é um problema que eu, como jurista, tenho de enfrentar. A opção foi fazer uma reforma política por via de emenda constitucional. Portanto, temos de nos ater a pontos realmente essenciais que possam produzir esse consenso. Não adianta querer transformar essa reforma constitucional numa panaceia de rever tudo, porque o procedimento escolhido não vai permitir essa amplitude. Fosse um procedimento com um quórum mais baixo talvez se pudesse atacar maior número de problema, mas com esse quórum de emenda constitucional há que ser uma reforma muito pontual.

            Nós temos, no Ministério Público, para nós que a principal fragilidade da democracia brasileira está na ausência de partidos políticos programáticos sólidos, com identidade clara e com uma estrutura de democracia interna transparente. Essa daí talvez seja a maior fragilidade que nós temos hoje. E me parece que todos os demais problemas decorrem, no fundo, no fundo, disso, da nossa paisagem partidária caótica, pouco definida, em que nós temos alguns partidos grandes e outros partidos pequenos, todos compartilhando a mesma arena, mas com estruturas internas que não os permitem terem uma solidez muito clara de propósitos. Muito mais me parece que os partidos são caminhos para garantir a eleição de alguns atores. Isso realmente torna o resto muito complicado.

            Portanto, parece-me que qualquer reforma política deve se centrar, em primeiro lugar, em uma reforma partidária. Sem isso, não adianta a gente falar em reforma de sistema de financiamento, em reforma eleitoral, se a gente não começar pelos partidos políticos. Democracias sólidas pressupõem hoje partidos sólidos.

            Não é à toa que o art. 5º da Carta Democrática Interamericana, de 2001, diz com todas as letras: “O fortalecimento dos partidos e de outras organizações políticas é prioritário para a democracia. Dispensar-se-á atenção especial à problemática derivada dos altos custos das campanhas eleitorais e ao estabelecimento de um regime equilibrado e transparente de financiamento de suas atividades”, art. 5º da Carta Democrática Interamericana. Parece-me que diz tudo do que a gente está precisando aqui neste momento, é uma síntese clara.

            Somente partidos fortes conseguem conferir transparência ao financiamento. No momento em que candidatos são levados a colher por si os recursos para o seu financiamento, acaba o candidato ter o contato com o dinheiro, com as fontes de financiamento, e isso pode contaminar o processo. O ideal seria que o candidato não tivesse que se preocupar com isso, que a estrutura partidária contasse com os meios para garantir um financiamento equânime de todos aqueles que queiram concorrer, e isso pressupõe transparência e democracia interna. Ou seja, que realmente os escolhidos pelo partido para concorrer sejam todos eles igualmente suportados e financiados por esse partido, que não haja, dentro dos partidos, candidatos melhores e candidatos piores. Pode até haver, na medida em que um partido pode, até com transparência, dizer: “Este ou aquele candidato tem maiores chances de colher votos do que aquele outro. Então, eu vou colocar mais prioridade nesse candidato que é uma fonte de maiores votos”. Isso é perfeitamente legítimo, desde que os critérios sejam transparentes, mas não se pode perder esse princípio do financiamento democrático num caciquismo, em que alguns dizem quem é que vai receber mais dinheiro e o outro menos dinheiro e, com isso, criar uma situação de desigualdade interna dentro do partido.

            Então, é fundamental que o partido seja fortalecido para isso, para ele ser uma estrutura democrática de dar chances a todos, mulheres e homens que queiram se candidatar, e não permitir que essas pessoas venham elas a correr por fora, coletando dinheiro. Isso fragiliza o partido e cria o contato entre o financiador e o candidato, que acaba muitas vezes contaminando o mandato.

            Conheço inúmeras situações de Deputados amigos, pessoas conhecidas minhas que quebraram financeiramente por causa de uma campanha eleitoral. Isso não é justo. Não é justo que os recursos pessoais do candidato sejam levados a uma situação extrema de transferi-lo para a pobreza. E há casos realmente de políticos que foram para a pobreza, porque usaram os seus recursos próprios e não têm recursos para pagar suas dívidas de campanha.        Parece-me que o problema central que está por trás disso é a estrutura partidária fragilizada.

            A nossa Constituição fez uma opção muito clara pela centralidade dos partidos políticos no nosso sistema político.  Por quê? Porque a nossa Constituição determina que ninguém poderá se candidatar a não ser que seja por via de um partido político. Nós não admitimos no Brasil candidaturas avulsas. Então me parece que isso é realmente a mens legislatoris. O constituinte quis isto: que, na centralidade do sistema, esteja o partido. É disso que nós temos que conversar, parece-me, antes de falar em financiamento e em qualquer outra coisa, é na centralidade do partido neste sistema político nosso. Parece-me que é a nossa principal fragilidade.

            A Constituição, por outro lado, foi omissa. Ela não ofereceu a nós nenhum conceito operativo de partido. O que é um partido político? Cada um de nós pode ter uma ideia completamente do que seja um partido, porque a Constituição não oferece uma definição normativa. E podem ter com isso também, vamos dizer, perspectivas distintas, expectativas distintas do que se espera de um partido.

            Se a gente for para o direito comparado, por exemplo, a Constituição alemã, no art. 21, a lei fundamental alemã é muito clara. O que ela diz a respeito dos partidos políticos? Os partidos atuam na formação da vontade política do povo. Isso é fundamental. Então, o papel principal dos partidos é a formação da vontade política popular. Isso significa o quê? Que o partido mesmo não é o autor da vontade política. O partido é um veículo para essa formação. Significa que, se eu sou um produtor rural, estou preocupado com o financiamento da minha produção e eu gostaria que houvesse neste País mecanismos mais democráticos e economicamente mais sustentáveis de financiamento, eu tenho o direito de escolher um partido que se afine com essas minhas ideias programaticamente e usar esse partido como veículo, para eu chegar ao resultado final de uma elaboração de uma agenda necessária para facilitar o financiamento rural.

            Esse me parece que é o papel correto dos partidos. É isto o que se espera deles, não que o partido em si gere as políticas, faça as políticas. Não, ele leva as políticas para as instâncias que são aquelas que vão a respeito delas decidir, formar a vontade política popular. É esse o papel do partido político. E me parece que a gente se perdeu muito nisso. O papel do partido político é visto por muitos como um veículo para fazer carreira política. E aí a gente se perde no individualismo.

            O aspecto programático acaba a ser de só menos importância. Nós sabemos hoje que há uma tendência muito grande de troca de partidos no sistema brasileiro. Um mandatário, se o sistema for completamente aberto, acha que não tem nada de mais sair de um partido para outro. E realmente parece que não tem na medida em que o aspecto programático do partido é absolutamente secundário. O que importa é onde, em que partido, em que agremiação ele tem mais chance de se reeleger. E me parece que não é essa finalidade de um partido.

            É isso o que eu acho que nós temos que repensar. E aí realmente todos os ingredientes que fortaleçam o partido, que garantam a centralidade do papel do partido no financiamento eleitoral e na obra final que é a empreitada democrática são salutares neste momento. É nisso que me parece que nós tínhamos que nos concentrar.

            Infelizmente, a nossa lei dos partidos trata da criação de partidos de uma forma um tanto descuidada. Dos 492 mil apoiamentos que são hoje cobrados de uma agremiação para se registrar como um partido, nós sabemos que a grande maioria das situações é uma balela, por quê? Porque o apoiamento é colhido onde? Ele é colhido em praça pública, em ponto de ônibus, nos supermercados, onde as pessoas estão preocupadas com tudo, menos com a formação de um partido. O sujeito, muitas vezes, assina aquele papelucho lá com os seus dados, para se ver livre daquele chato com a prancheta na mão. A gente sabe que é assim, ao invés de a gente demandar realmente uma intenção sincera do eleitor de apoiar aquele partido. Então, me parece que aí o TCU tem sido omisso.

            Parece-me que procedimentalmente era muito mais razoável se exigir que o eleitor se dirigisse à sua zona eleitoral e lá registrasse o seu apoio à formação daquele partido. Seria muito mais fácil e mais autêntico. Por quê? Naquela hora o eleitor vai gastar 10, 20 minutos do dia dele para se concentrar naquela questão, formação de partido. Aquilo é uma vontade sincera dele. Senão, ele não ia gastar esse tempo. Ele não ia lá. Lá chegando, ele coloca os seus dados em um sistema. E pode centralmente já ser verificada a autenticidade daquele apoio. É muito mais fácil a gente depois, no final, ter os apoios reais e autenticados, porque ele vai diretamente ao cartório.

            Muitos diriam: “Ah, mas isso vai demorar muito mais tempo. É muito mais difícil conseguir isso.”. Claro que é. Mas quem disse que criar partido deve ser uma coisa fácil. Não deve ser fácil não. O partido é uma instituição que é essencial à formação da vontade política. Ele precisa ser uma instituição perene. Uma instituição perene não se cria num estalar de dedos. Não se facilita a criação dele com coleta de assinaturas a rodo, em um final de semana, no Parque da Cidade, entre as pessoas que estão andando de skate. Parece-me que é uma questão muito mais séria do que isso.

            Então, fazer campanhas para chamar as pessoas para irem a seus cartórios e darem seu apoio à formação daquele partido, e também a Justiça Eleitoral ter um papel mais claro em convocar as pessoas... Seja um eleitor pleno, também contribua para a formação dos seus partidos políticos, trabalhe para isso.

            É uma coisa impressionante. Eu conheci bem a paisagem política alemã. Na Alemanha, os grandes partidos, como o SPD, o CDU, têm um número de pessoas, que eles chamam de (ininteligível), com o livrinho do partido, com a carteirinha do partido, um número expressivo. São milhões de pessoas que são inscritas no partido. Isso faz parte. Muitas vezes, você vê famílias inteiras, desde o pai, o avô, o filho, todo mundo sempre apoiou aquele partido, faz parte da tradição daquela família. O partido é isso, ele deve representar realmente a expressão da sociedade.

            Então, não dá para a gente criar um partido a toque de caixa só porque precisamos de um partido novo para facilitar a migração de mandatários para uma nova agremiação sem perder os seus mandatos, o que hoje está acontecendo. Parece-me que isso vai na contramão da consolidação democrática do País. Então, partido é uma coisa séria. E nós temos que tratar nossa paisagem partidária com muito carinho. Parece-me que todos os outros problemas que nós vamos apontar agora rapidamente são decorrentes disso.

            Eu passo para o problema do financiamento eleitoral. O financiamento eleitoral hoje é pouco transparente. Por quê? Porque o financiamento eleitoral é pulverizado. A gente não sabe quem é que está buscando dinheiro de quem. Não é isso?

            A prestação de contas dos partidos e a das campanhas eleitorais já estão muito melhores, é verdade, do que eram alguns anos antes. Mas nós sabemos quantas portas existem de escapatória para sair do sistema. Nenhum sistema de prestação de contas é tão fechado que possa apreender as inúmeras possibilidades de escapar das suas exigências. E existe uma natural tendência do político de querer escapar disso, porque o sistema é muito exigente.

            Não quero, vamos dizer, me entreter nisso, porque me parece que essa é uma questão lateral, talvez fosse para uma Constituinte, e não para uma reforma política pontual, mas me parece que nisso daí temos uma grande culpa da própria estrutura da Justiça Eleitoral.

            Eu tenho para mim — posso até estar falando algo que possa soar para alguns como heresia — que a Justiça Eleitoral do jeito que temos no Brasil hoje é um constructo autoritário. Não é a toa que foi criado pouco antes do Estado Novo, fortalecido nele e depois fortalecido durante o regime militar. É um construto autoritário, porque ele realmente controla o político a partir de uma estrutura burocrática, não representativa. As grandes democracias não têm justiça eleitoral. Elas têm comissões eleitorais e são formadas paritariamente por todos os atores que participam do processo. Por que um Juiz, que nunca fez parte desse processo político, vai decidir melhor uma questão eleitoral do que um político que esteja ali, vigiado por seus pares, numa comissão paritária? Todas as democracias modernas têm comissões paritárias para regular eleições. Não tem Justiça Eleitoral.

            A Justiça Eleitoral é um construto autoritário. Está na hora de a gente pensar seriamente nisso. Aliás, é uma estrutura, diga-se de passagem, completamente fora de seu tempo. Como é que, em Roraima, nós temos sete Juízes no TRE e, em São Paulo, também? No mínimo, São Paulo deveria ter alguns TREs para dar conta do recado. Ele acaba tendo a mesma estrutura de Roraima e do Amapá.

            Então, não faz sentido. Essa é uma estrutura, me parece, que está superada. Num outro momento — parece-me que essa reforma não tem tamanho para isso —, ela terá de ser repensada. A Justiça Eleitoral, porque é autoritária, trabalha no viés da proibição, no viés da criminalização da política. É com isso que nós temos de parar. Existem crimes eleitorais? Existem, a fraude eleitoral, por exemplo. Por que a Justiça Criminal não deve ser capaz de lidar com isso? Por que tem que ter uma justiça especializada, que expõe muito mais o ator político do que uma justiça comum? Quando se tem uma justiça especializada, o foco é outro. Você olha para o político como um potencial criminoso.

            Então, parece-me que essas são questões que nós temos de repensar, mas bom isso, aqui, a latere.

            Voltemos ao que nos interessa que é a questão do financiamento. O financiamento brasileiro tem alguns gargalos. O principal deles é o tamanho do nosso território. Nós sabemos que o político, para se eleger, tem de fazer muita viagem. Vai para cima e para baixo. Aluga avião particular. Não é isso? O custo de locomoção é enorme. O custo de agregar pessoas que vêm de diversos rincões é muito grande. Precisa de algum motivo para isso, fazer um churrasco, alguma coisa que chame essas pessoas, porque o território é enorme. Então, isso é custo. Território grande custo.

            Quando nós temos um custo muito grande, a primeira pergunta é: quem vai pagar o custo desse território enorme? A iniciativa privada? É o que tem sido até hoje, e a experiência do custeio privado das eleições não tem sido boa. Não tem sido boa, porque esse custeio privado admite que interesses, muitas vezes pouco claros, muitas vezes não muito kosher — não é isso? — enfestem a eleição. Muitas vezes, uma empresa vai financiar um candidato, porque ela espera algo do candidato, se ele se eleger. Claro, ninguém está aí para fazer bondades.

            Então, espera-se algo em troca. E se isso é para um cargo majoritário de Governo, é claro que espera contratos vantajosos que venham compensar largamente o investimento feito no político. Bom, é assim que funciona o sistema capitalista. Ninguém vai conseguir convencer os seus sócios ou os seus acionistas a dar dinheiro para um político se isso não trouxer vantagem para o acionista ou para o sócio. Faz parte.

            Então, você acaba contaminando a campanha com o lucro da economia capitalista. Me parece que você está misturando as coisas. Não que eu entenda que a empresa não possa participar porque ela não tem legitimidade em si.

            Se uma empresa fosse financiar um candidato, outro candidato, porque tem afinidade com um partido e sua agenda, espera, sinceramente, que alguns projetos de interesse da empresa sejam levados através daquele partido sem que, com isso, se esteja condicionando ou fazendo algum tipo de corrupção indireta do agente político. Mas não. Legitimamente, canalizando seu interesse através da eleição para aquele objetivo final, que é obter algum projeto. Se todos nós fossemos carmelitas de pés descalços e esta fosse uma prática corrente das empresas, não teria nada demais. O fato de a empresa não votar é um argumento xucro para mim. Se a empresa não votar, não pode financiar. Não. O fato de a empresa não votar não deixa de mantê-la no espectro político. A empresa tem interesses políticos sim. E legítimos interesses políticos de sobrevivência econômica e do seu setor. Isso não tem nada de errado, mas depende de como ela traduz essa prática — se ela traduz essa prática no toma lá dá cá, dizendo “eu vou comprar um político”, ou se ela simplesmente diz que vai fortalecer um partido... Por exemplo, a indústria alemã tradicionalmente centrava no partido liberal alemão. Seus financiamentos iam para o partido liberal. Os sindicatos, por sua vez, todos deles, financiavam o SBD, o Partido Social Democrata. Ninguém está dizendo que isso é errado. O eleitor deve se questionar sim: “Ué! Esse candidato aqui só teve financiamento daquela empresa? O que ele tem com aquela empresa?” Isso pega mal para o candidato. Então, isso em si não está errado. Agora, nós sabemos que na nossa prática isso não tem sido a regra. Na nossa prática, o financiamento de campanhas por empresas tem levado ao toma lá dá cá. Parece-me que, por isso, não é desrazoável a gente pensar no afastamento do financiamento privado de campanha. Ou pelo menos por parte de as empresas deixarem para o indivíduo até certa quantidade do percentual da campanha eleitoral, ou seja, dos custos. E essencialmente que se admita. A população tem que aceitar isso. Campanha e democracia custam dinheiro. O poder público vai ter que financiá-la. A verdade é que as eleições passadas custaram mais de 1 bilhão de reais para a União, se levarmos em consideração os 800 milhões de reais que foram para o efeito da propaganda dita gratuita. O poder público paga aquela propaganda gratuita por meio de isenções fiscais e compensações fiscais. Então, a propaganda só é gratuita para o candidato. Não é gratuita para o contribuinte. Então, nós já temos hoje uma campanha eleitoral que custou aos cofres públicos mais de 1 bilhão de reais. Então, tudo é uma questão de a gente começar a começar a criar proporções mais claras nesses gastos. Mas me parece que o financiamento público é uma boa proposta hoje. Não sei se é a única, mas pelo menos é como eu vejo. É claro que existe o risco de, mesmo com o financiamento público, partidos e pessoas se utilizarem do financiamento privado por via de determinados caminhos pouco claros. Por exemplo, uma empresa pode perfeitamente pagar para um candidato, um ano antes da eleição, um tremendo contrato de consultoria, fazendo com que esse recurso que ele vai investir na sua campanha integre o seu patrimônio. E a legislação eleitoral atual permite que o candidato use ilimitadamente seu patrimônio próprio no financiamento da sua campanha. Então, parece-me que não é somente proibir o financiamento privado. Temos que fechar outras portas também, senão fatalmente o financiamento irá pela via do financiamento privado do candidato. O ideal por isso mesmo, e volto a dizer, é o fortalecimento da estrutura partidária, fazendo com que o partido concentre todas as finanças das campanhas. Esse tipo de caminho elisivo desaparece. Agora, nós temos que garantir. É democracia interna no partido. A democracia interna no partido significa que o partido é obrigado a distribuir os recursos de forma equânime ou através de critérios transparentes e discutidos. Como eu falei para os senhores, sim, é legítimo que financie melhor um candidato do que o outro desde que aquele candidato tenha mais chances de arrecadar votos para o partido que outros. É razoável. Mas isso tem que ficar claro, isso tem que ficar claro.

            E, por isso mesmo, eu sei que hoje aqui, só para terminar, Sr. Presidente, é uma polêmica, que está aqui, me parece que, infelizmente, o distritão, por mais apoio que possa ter, ele não é a melhor solução para fortalecer partidos. O distritão dispensa o partido em nome da figura de proa de um candidato. Na verdade, ele enfraquece o partido. O que fortalece o partido, hoje, é o voto em lista. Ou seja, o partido estabelece, na sua convenção, a lista dos seus candidatos por uma ordem de prioridade a partir das chances que cada um tem, da sua popularidade, feito através de institutos de pesquisa, o que seja; e, a partir dessa lista, então, o partido vai colocar x candidatos, até certo ponto dessa lista, dentro do grêmio parlamentar. Não é isso? Parece-me que isso fortalece o partido, porque o eleitor passa a ser obrigado a votar num partido, o partido passa a ter uma cara, uma identidade e é isso o que nós temos que fortalecer hoje.

            O distritão, infelizmente, não tem essa consequência. O distritão hoje, ele faz desaparecer a importância do partido, o partido passa a ser um detalhe, o importante é o candidato. E o distritão também, ele não diminui o custo da campanha, em absolutamente nada; ao contrário, na verdade, ele pulveriza mais ainda o financiamento partidário. Então, é tudo o que a gente não gostaria de ter aqui para fortalecer realmente, vamos dizer, a estrutura de partidos e ter transparência no financiamento das campanhas. Agora, para diminuir custo, o voto

distrital é uma grande ajuda. Eu estive agora, há pouco, no Reino Unido e tive reunião com algumas autoridades, inclusive com a Comissão Eleitoral do Reino Unido. No Reino Unido, cada candidato tem direito a arrecadar recursos. Mas os recursos que eles podem arrecadar é até o montante de 45 mil libras, ponto. Quarenta e cinco mil libras, isso hoje dá mais ou menos 220 mil reais. É o que cada candidato pode arrecadar hoje; os partidos, por sua vez, em cada distrito, podem arrecadar até 200 mil libras. É o limite de financiamento nos distritos. A vantagem do distrito eleitoral é que, aquilo que eles chamam de constituency o eleitorado, ele é muito mais limitado. O custo da campanha é menor. As pessoas já se conhecem. Inclusive, se um candidato fizer alguma coisa errada, aquilo vai que nem fogo de palha, corre a notícia. Então, o distrito tem esta vantagem: ele diminui enormemente o custo da campanha, porque o candidato vai se concentrar naquele distrito. O voto distrital, com o voto em lista junto, me parece, hoje, para enfrentar os problemas que nós temos, no Brasil, ser a solução ideal, com financiamento público de preferência, porque nós sabemos dos riscos e das contaminações das candidaturas através do dinheiro privado.

            Ao mesmo tempo, é interessante isso o que eu achei no Reino Unido. No Reino Unido, é interessante que as empresas podem contribuir ilimitadamente. Teoricamente, um candidato pode obter os seus 45 mil de uma única empresa, financiá-lo, só que o eleitorado vai querer dizer “Mas, espera aí, como é que é isso, esse candidato Coca-Cola, ele é 100% financiado pela Coca-Cola? Então, esse cara não é um candidato, esse cara é um agente da Coca-Cola!”, e ele não é eleito, porque, num distrito desse tamanho, todo mundo fica sabendo. É claro que ele, pelo menos, vai ter que colher um dinheiro plural, não adianta ele querer pegar dinheiro de uma fonte só, mas teoricamente é possível.  Nós temos essa coisa dos 10% da renda do exercício anterior, se for pessoa física e 5% do faturamento. Na verdade, a gente sabe que essas...Hoje, a jurisprudência do TSE ficou tão flexível que permite a correção pela empresa do seu imposto de renda. Depois, se for verificado que ele estourou o Imposto de Renda, faz uma retificadora, aquilo o Tribunal (ininteligível): Agora está tudo bem.

            Então, passou simplesmente a ser uma questão atuarial, a questão dos 5%. E isso não facilita as coisas.

            Parece-me que hoje nós temos este problema: a forma extremamente liberal, leniente com que a justiça eleitoral tem tratado a questão partidária, a formação dos partidos, misturado com a pouca consistência das regras que são essencialmente repressivas. A justiça eleitoral tem a prática de regras repressivas. E não me parece que isso é bom.

            Por exemplo: uma das coisas que eu sempre coloco em xeque, por que essa questão de proibição de campanha antes do tempo?

            Afinal de contas, tudo bem! No regime militar em que fazer política tinha hora certa: Oh! Você vai estar liberado para falar de tantas a tantas horas. Isso fazia sentido. Mas no regime democrático, não tem problema nenhum de hoje alguém querer falar sobre a sua perspectiva de reeleição em 2018. Qual é o problema para a democracia, sinceramente? O que significa isso, a chamada campanha antecipada? Desde que, claro, isso corra pelos partidos políticos e os recursos sejam transparentes. Todo mundo saiba o que está acontecendo, e os recursos sejam os recursos públicos. Mas não tem nada de errado alguém querer fazer campanha antes da hora. Se estiver fazendo dentro de um contexto de igualdade de chances.

            Então, parece-me que, só para resumir, então, Sr. Presidente, o nosso problema essencial está na paisagem partidária. Essa tem que ser pensada. E essa questão partidária é que leva fatalmente a todos os desvios nas práticas de financiamento.

            E não custa nada tematizar e pensar para um futuro a própria viabilidade democrática de uma justiça eleitoral.

            Muito obrigado.

            O SR. PRESIDENTE (Deputado Rodrigo Maia) - Eu vou informar aos Deputados e Deputadas que eu vou dar 4 minutos para cada um de pronunciar. Depois de 4 minutos vou cortar a palavra, porque senão a gente não...

            Vamos começar pelo Deputado Henrique Fontana.

            O SR. DEPUTADO HENRIQUE FONTANA - Sr. Presidente, quero cumprimenta-lo, cumprimentar o nosso Relator Marcelo Castro, Deputado Rubens Otoni e o nosso convidado de hoje para este debate e reflexão da nossa Comissão, Vice-Procurador-Geral Eleitoral Ministério Público Eleitoral, Eugênio José Guilherme de Aragão e os colegas Parlamentares.

            Nós aqui hoje, eu vinha entrando no corredor e vi que ao mesmo tempo se realiza uma sessão plenária da CPI, mais uma CPI nesta Casa, e a sessão de debate da nossa Comissão de Reforma Política.

            Eu, como a minha formação é Medicina, eu sou médico-geral comunitário, eu sempre valorizei muito todos os atos de educação e prevenção em saúde, sob pena de que se eles não forem aplicados o sistema de saúde pode triplicar o seu orçamento e ele nunca vai conseguir resolver, de fato, o problema de saúde pública, geral, da população.

            E nós temos essa responsabilidade. Nós temos a oportunidade de proporcionar uma mudança estrutural para a política brasileira, que diminua profundamente a necessidade de realização de novas CPIs, pelo menos no que tange ao debate dos temas que envolvem corrupção, que obviamente não tem como única causa o financiamento eleitoral, mas tem como causa estrutural o financiamento eleitoral.

            E eu nesta Comissão vou conversar muito com os colegas, porque eu quero conquistar uma maioria aqui. É o papel de cada um de nós, tentar com os argumentos conquistar uma maioria para cada um dos itens que nós queremos ver votados, com argumentos, com convencimentos.

            E em 4 minutos a gente sempre escolhe uma coisa só para falar. E a coisa que eu quero falar hoje de novo, dentro dessas prioridades que foram colocadas, é pedir a reflexão dos colegas sobre o tema financiamento eleitoral.

            Algumas perguntas: qual a vantagem para uma democracia, para uma sociedade, de empresa financiar eleições. Qual a vantagem comparativa com outros métodos de financiar eleições que teria um sistema como o nosso, que amplifica o papel das empresas no financiamento eleitoral?

            Segunda pergunta que eu me faço, todos nós nos fazemos: qual a vantagem de ter um sistema em que o céu seja o limite, em termos de gastos eleitorais? Porque, se nós criarmos um teto para cada nível de eleição — ou seja, candidato a Governador no Estado “x” pode gastar no máximo “y”; candidato a Deputado Federal, qualquer que seja o sistema eleitoral, no Estado “z”, pode gastar, no máximo, “x”, obviamente levando-se em conta o tamanho dos Estados, números de eleitores, etc. —, esse teto é que permitirá que todos nós nos sintamos seguros de fazer uma campanha mais barata, porque hoje nós vivemos a chamada corrida do ouro: o nosso adversário, de repente arrecadou três vezes mais do que nós, e nós temos que correr atrás de mais dinheiro, porque o dinheiro decide boa parte da eleição. E o teto permitirá que todos nós nos acompanhemos, que, se todo mundo está sob o mesmo teto de gastos, não é possível que alguém possa aparecer na rua com cinco mil placas, em todas as cidades, e o outro candidato não tenha dinheiro, porque o material custa o mesmo para todo mundo. Então, isso facilita a fiscalização do processo eleitoral no que diz respeito ao abuso do poder econômico.

            E eu concluo, respeitando aqui a regra correta que o nosso Presidente está tentando trazer para todos nós, dizendo que além de outros problemas — digo isso ao nosso Procurador, que trouxe informações muito preciosas, o ponto de vista de quem conhece muito o sistema eleitoral —, não é o problema que a empresa não tem o direito de votar; o problema é que o direito de fazer fluir o nosso conjunto de ideias tem que ser tratado em igualdade de condições por todos. Então, não é possível que eu queira fazer fluir uma ideia, defender uma ideia, e eu tenha a possibilidade de falar, de participar de reuniões, como cidadão, de ir à associação de bairro do meu bairro, e o meu voto... E um outro tomador de decisões,...

            O SR. PRESIDENTE (Deputado Rodrigo Maia) - Deputado...

            O SR. DEPUTADO HENRIQUE FONTANA - ... que é o diretor de relações institucionais — é a última frase, Sr. Presidente — de uma grande financiadora de eleições, tem a sua a sua opinião, o direito de falar, e mais 100 milhões para destinar para quem ele queira, em listas fechadas, que não têm nenhum republicanismo, e, obviamente, nenhum critério equitativo.

 Esse, no meu ponto de vista, é o argumento fundamental para retirar as empresas do financiamento eleitoral. E é isso o que nós vamos continuar debatendo. E eu quero conversar muito com cada um dos colegas, com o nosso Relator, para que nós consigamos sair desta Comissão com esse avanço, além de outros, para o nosso sistema eleitoral.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rodrigo Maia) - Vai ganhar o meu voto, Governador Espiridião, quem conseguir falar nos quatro minutos as suas teses.

O SR. DEPUTADO ESPERIDIÃO AMIN - Então, eu vou ganhar o voto. (Risos.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rodrigo Maia) - Deputado Rubens Otoni.

O SR. DEPUTADO RUBENS OTONI - Nossa saudação ao nosso Presidente; ao nosso Relator, Deputado Marcelo Castro; e, de maneira especial, ao nosso convidado, Dr. Eugênio, que hoje nos traz aqui uma colaboração importante neste debate. Cumprimento as Sras. Deputadas e os Srs. Deputados.

O Dr. Eugênio traz aqui uma reflexão hoje, nesta manhã, importante, quando ele joga luz sobre o debate do fortalecimento dos partidos. E diz(?) que o fortalecimento dos partidos está no centro dessa discussão do aperfeiçoamento do nosso sistema eleitoral, e, mais do que isso, o fortalecimento dos partidos é essencial para que, no nosso sistema, possamos superar uma série de debilidades que nós temos enfrentado no nosso dia a dia.

O Deputado Henrique Fontana levantou um ponto que eu também prezo muito: é a questão do financiamento das campanhas e quais as alternativas que nós teremos de busca de superação para diminuir a influência do poder econômico na escolha de nossos representantes. Isso, para mim, parece-me central, mesmo.

Mas eu queria aqui apenas deixar para o Dr. Eugênio — tento aproveitar a presença dele aqui — que, nessa essência do debate do fortalecimento dos partidos, qual é a reflexão que ele faz e o entendimento que ele tem a respeito das coligações proporcionais. Qual o impacto que isso tem, ou não tem, na questão do fortalecimento dos partidos e a influência nesse sistema que nós estamos buscando.

            Então, aproveito a presença dele aqui para que ele possa, nesse ponto, também, dar a sua contribuição, jogar luz sobre este debate.

            O SR. DEPUTADO ESPERIDIÃO AMIN - Ganhou o voto.

            O SR. PRESIDENTE (Deputado Rodrigo Maia) - Ganhou o voto.

            Com a palavra o Deputado Daniel Almeida.

            O SR. DEPUTADO DANIEL ALMEIDA - Sr. Presidente; nobre Relator; Sr. Eugênio, nosso convidado, eu também queria externar a alegria de ouvir, porque compartilho desse sentimento do diagnóstico a respeito do papel dos partidos políticos, e do desafio de fortalecer as instituições políticas, os partidos políticos no nosso País.

E eu fico muito à vontade porque sou membro de um partido que completa agora, no dia 25 de março, 93 anos de existência. É uma corrente de pensamento, de organização e de ideologia identificada na sociedade brasileira. Eu tenho uma única filiação partidária na minha vida, desde 1981. Eu nunca pertenci a nenhuma outra organização partidária, e não pretendo, jamais, afastar-me daquilo que acredito como caminho para a atividade política do ponto de vista ideológico, programático e orgânico. Mas isso é quase exceção, e eu não quero fazer nenhum juízo sobre nenhuma outra organização partidária, mas não faz parte da regra do funcionamento político-partidário no nosso País.

Portanto, é fato: nós devemos fazer um esforço permanente de fortalecer os partidos — ideologicamente, programaticamente, organicamente. E isso precisa evoluir na expressão política, na disputa dos espaços eleitorais. O problema é como fazer isso, qual é a realidade, como avançar olhando a realidade objetiva. Eu defendo o financiamento exclusivamente público de campanha. Defendo lista preordenada. Acho que lista preordenada com voto distrital, no modelo clássico, não tem como existir. O distritão, na minha opinião, é isso que o nosso convidado expressou, é a destruição das organizações partidárias. Qualquer um que queira ser candidato e que imagina que pode alcançar o número suficiente para ser eleito não precisa de nenhum... Em qualquer partido ele vai encontrar espaço para fazer a disputa.

No entanto, não imagino que seja possível, e nem o caminho adequado, estabelecer mecanismos restritivos da liberdade de organização partidária para fortalecer partidos apenas do ponto de vista numérico. São várias as correntes de opinião, vários os perfis de composição da nossa sociedade, e cabe ao eleitor... Claro, estabelecendo condições transparentes, democráticas, no funcionamento das direções partidárias e na organização dos partidos, na própria formação dos partidos, mas não estabelecendo certas condições, a ideia de cláusulas, cláusula de barreira, etc. Acho que temos que fazer um debate mais aprofundado. Isso acaba ferindo um princípio, que alguns afirmam ser cláusula pétrea de nossa Constituição, que é a livre associação, a livre filiação e a livre associação entre pessoas e entidades, instituições.

            Mas queria dizer, concluindo, nobre Presidente, que me parece que não é possível avançar naquilo que eu imagino. Nenhuma reforma vai avançar de acordo com a cabeça de cada um de nós. O que é possível? Acho que é possível avançarmos no sistema eleitoral, mas principalmente no modelo de financiamento. Parece-me que esse aí, nas condições do Brasil hoje, é o principal elemento perturbador, destruidor desse processo político que está em curso. Esse, na minha opinião, é o elemento central. Retirar o financiamento empresarial, nas condições de hoje, do debate que, no País, se faz hoje, me parece algo absolutamente essencial. Se não pode ser o financiamento exclusivamente público, que tenha limite para o financiamento individual, do cidadão.

            Por isso, eu me associo, para concluir, à proposição defendida pela coalizão, liderada pela OAB, CNBB: de financiamento público combinado com financiamento pessoal, privado, pessoa física no limite que eles defendem, de 700 reais. Poderia ser em torno de um valor nessa dimensão.

            Agradeço ao nobre convidado.

            O SR. PRESIDENTE (Deputado Rodrigo Maia) - Com a palavra o Deputado Odorico Monteiro.

            O SR. DEPUTADO ODORICO MONTEIRO - Quero saudar o Presidente, o  nosso Relator Rubens Bueno e o nosso Vice-Procurador, Dr. Eugênio Aragão, e parabenizar os que trazem aqui uma luz importante.

            Mas, Sr. Presidente, queria também aproveitar este momento para dar um informe da audiência que nós tivemos lá em Fortaleza, no Ceará, uma audiência descentralizada, uma das primeiras por orientação desta Comissão, e também dar o depoimento da importância que foi a presença do nosso Relator Marcelo Castro lá. Tivemos lá a presença de vários Parlamentares, prefeitos, lideranças da sociedade civil. Enfim, acho que foi um momento muito importante para a descentralização desse debate, que nós precisamos fazer com a sociedade brasileira.

            Eu queria dizer que uma das coisas que me chamou a atenção lá, depois do nosso Relator Marcelo Castro, foi a satisfação das pessoas com a tese defendida pelo nosso Relator, que é a mesma tese defendida aqui pelo Dr. Eugênio Aragão, ou seja, a necessidade do fortalecimento dos partidos políticos. Isso me parece uma coisa extremamente importante.

            Nós temos uma equação extremamente danosa na política: a conjugação de você ter campanha totalmente individualizada, o enfraquecimento dos partidos no processo eleitoral e o fato de você ter o financiamento empresarial quase que hegemônico no processo eleitoral. Eu fico muito feliz por estarmos começando a construção de um consenso aqui na Casa neste sentido: de que a nossa equação tem de apontar nessa perspectiva.

            Eu queria colocar aqui para o nosso Vice-Procurador algumas questões importantes: primeiro, eu acho que essa questão do distritão, trazida pelo Vice-Procurador, é extremamente importante. É muito sedutor, às vezes, essa ideia de que vai resolver o problema, mas não vai. Pode ser, digamos, uma pegadinha desse processo.

            Nós estamos falando também de um país continental, como o nosso, extremamente desigual, com desigualdades do ponto de vista da sociedade, com 200 milhões de habitantes, com um pacto federativo único no mundo. Nós somos o único País que tem esse modelo interfederativo. Temos que eleger 5.570 prefeitos, 27 governadores, num País continental e desigual, com eleições que não estão casadas. Isso causa um dano enorme na construção das políticas públicas!

            Então, nós temos que pensar na perspectiva de eleições gerais. Só sabe o que é isso quem é Secretário Municipal do pequeno Município ou prefeito, porque quando ele está começando a organizar as coisas, vêm eleições para os Executivos Federal e Estaduais. Quando o Executivo aqui está se organizando, vêm eleições municipais, num País em que nós temos de fazer um alinhamento interfederativo de políticas públicas importantes como saúde e educação.

            Só para concluir, eu já estou convencido de que esta questão da reforma política é uma dívida que a Constituição de 1988 deixou para este País, porque nós não fizemos a reforma política na Constituição de 1988 por um conjunto de razões que não vamos aqui debater. E não fizemos a revisora que fizesse isso. E mantivemos uma inércia que deu no que está hoje aí.

            Por isso eu acho que o nosso Vice-Procurador deixou uma pista, a questão da Constituinte, alguns temas. Eu queria ouvir do senhor como o senhor vê essa questão. Se é realmente uma reforma como nós queremos, ela pode ser feita aqui? Podemos pensar em parte ou podemos ver se, em algum momento não conseguirmos o que precisamos aqui, a Constituinte poderia ser também um debate para essa questão.

            Eu acho que o nosso Vice-Presidente, o Rubens, colocou a questão das coligações profissionais. Eu quero reforçar. Queria ouvir sobre isso e também sobre a questão do desempenho. Como é que o Vice-Procurador vê essa questão. E, numa perspectiva de fortalecimento dos partidos, como é que passamos, então, a ter um desenho partidário que dê conta dessas questões. Obrigado, Sr. Presidente.

            O SR. PRESIDENTE (Deputado Rodrigo Maia) - Governador Esperidião Amin.

            O SR. DEPUTADO ESPERIDIÃO AMIN - Sr. Presidente, queria saudar os companheiros da Comissão, nossos visitantes e especialmente nossos convidados.

            Eu quero fazer um registro preliminar. Eu esperava que o nosso convidado fosse comentar o texto-base sobre o qual nós estamos reunidos. O texto-base não fala em distritão. O texto-base fala em circunscrição, que se aproxima muito da ideia de Distrito. Aliás, é o primeiro caminho para a ideia de Distrito. Ninguém vai desenhar Distrito no Brasil sem antes desenhar circunscrição.

            Pensem bem nisso. Como é que você vai desenhar um Distrito para eleger um, como há na Inglaterra, burgos podres? Aliás, a Inglaterra tem uma missão contraditória para nós. Ela não tem Justiça Eleitoral, e funciona. Como nos Estados Unidos. Nem sei em quantos países existe a Justiça Eleitoral e não sei o que ela contribui para melhorar as eleições. Não sei. Mas lá tem burgo podre.

            Burgo podre é a deformação por redução de densidade demográfica de núcleos que elegem. E isso é fraude que já foi praticada na Argentina, que já foi praticada na França sobre o De Gaulle etc. Então, ninguém vai desenhar Distrito honesto. O que está em debate aqui é a circunscrição, que é um sistema honesto, que valoriza o partido.

            Segundo, o que está aqui na 352 é um modelo que moraliza o que existe hoje em matéria de financiamento. E não merece ser demonizado, como ilustres líderes desta Casa têm feito reiteradamente, como se a 352 fosse o núcleo da futura corrupção, ignorando que se é verdade que o financiamento de empresas complica o mandato, o que está corrompendo no Brasil é o caixa dois, é o dinheiro oculto. Está lá. Procure ali na CPI da PETROBRAS e você vai ver o que é que está corrompendo o Brasil.

            E, finalmente, eu queria fazer a seguinte ponderação. Nós temos essa profusão de partidos. E eu lembro, gostei da sua frase: partido deve ser coisa séria. Ninguém prejudicou mais a estrutura partidária no Brasil do que as decisões da Justiça Eleitoral. Se há um réu nessa história é o Tribunal Superior Eleitoral, que passou a considerar justa causa para migrar de um partido para um partido novo, numa fábrica corrupta e corruptora que ainda está movimentando as suas engrenagens. Tanto é que o Congresso reagiu agora, impedindo as fusões. Ninguém ajudou mais essa corrupção do que a Justiça Eleitoral do Brasil.

            Nós demos a nossa contribuição. O Congresso também tem culpa, mas ninguém provocou uma alavanca tão poderosa quanto o Tribunal Superior Eleitoral ao incluir como justa causa essa indústria. Então, queria os seus comentários a respeito disso. E me perdoe se eu fui um pouco enfático, mas eu queria não passar despercebido e cumprir o horário. Obrigado.

            E dou parabéns ao Jean Wyllys, que está de aniversário, aproveitando a sua presença hoje aqui. (Palmas.)

            O SR. PRESIDENTE (Deputado Rodrigo Maia) - Dr. Eugênio.

            O SR. EUGÊNIO JOSÉ GUILHERME DE ARAGÃO - Eu vou ser breve, porque são várias questões aqui que foram postas.

            Naquilo que diz respeito à fala do Deputado Henrique Fontana sobre o limite de gastos eleitorais me parece que aqui, Dr. Esperidião, o culpado, mais uma vez, também, vamos fazer mea culpa, é o TSE, porque a legislação permite que o teto...

            O SR. DEPUTADO ESPERIDIÃO AMIN - Não, mas nós tínhamos que fazer as leis e não fazemos.

            O SR. EUGÊNIO JOSÉ GUILHERME DE ARAGÃO - Sim, mas a lei diz que enquanto a lei não sair o TSE pode estabelecer o teto.

            O SR. DEPUTADO ESPERIDIÃO AMIN - E no projeto aqui, doutor, enquanto não sair a lei, não pode haver a doação. Ou seja, a PEC 352 radicaliza a proibição.

            O SR. EUGÊNIO JOSÉ GUILHERME DE ARAGÃO - Então, bem ou mal, me parece que esse teto já deveria existir até por intervenção jurisdicional. Poderia haver, e não houve. E todo mundo estava ciente desse problema.

            O fato é que também me foi dito lá na Inglaterra que o teto deles é curto. E, aliás, os Deputados reclamam muito, porque lá também existe inflação.

            O SR. DEPUTADO ESPERIDIÃO AMIN - Para poder fiscalizar.

            O SR. EUGÊNIO JOSÉ GUILHERME DE ARAGÃO - Vamos dizer, lá também existe inflação. E há anos que esse teto não é corrigido. Então, o que acontece? Aqui, na verdade, as despesas de campanha estão reduzindo.

            Disseram que, se ficarmos deixando isso aberto, a tendência é haver, realmente, uma corrida do ouro. A cada eleição, a eleição fica mais cara. O teto é absolutamente necessário para pôr um basta nisso. Mas me parece que aí houve uma omissão também no caso da jurisdição. Já que temos Justiça Eleitoral que estava capacitada a fazê-lo, por que não o fez?

            E concordo com o Deputado Henrique Fontana também que um dos problemas essenciais do financiamento público e privado de campanha por empresa é isso, é a desigualdade que isso causa.

            Por isso é interessante. Eu acho muito curioso que a nossa legislação eleitoral permite o financiamento por empresa, mas proíbe o financiamento por sindicatos. Isso é muito curioso, porque na Inglaterra eles não querem proibir o financiamento por empresa porque o Tory, o partido conservador, se financia por empresas. E o partido trabalhista se financia pelos sindicatos. Então, ninguém quer mexer no sistema porque está equilibrado, um pega os sindicatos e o outro, as empresas.

            Mas no Brasil você botou o torniquete em cima dos sindicatos, e por que, rigorosamente? Enquanto a empresa está livre para financiar a política. Aí também cria uma enorme desigualdade.

            Deputado Rubens Otoni, quanto às coligações proporcionais, me parece que, para mim, entendo que a liberdade partidária também implica liberdade de formar, vamos dizer, coligações, significa junções de um partido com o outro. E me parece que é perfeitamente possível que dois partidos menores, para se viabilizarem eleitoralmente, possam fazer federações de partido que, aliás, é algo que, em muitos países, é comum. Na Alemanha mesmo também existe o chamado wahlbündnis, quer dizer, a coligação eleitoral, que permite que dois partidos se fundam como se um só fosse, na eleição.

            Claro que, se esse partido vier a entrar na coalizão governamental, que tem uma distinção entre coligação e coalizão... A coligação é, vamos dizer, um construto para eleições. A coalizão é um construto para governar. Então, se a coligação entrar na coalizão, ela se comporta como se fosse um só partido. Aí, não tem o direito de um dizer que quer de um jeito e o outro fazer de outro.

            Para você fazer uma coalizão governamental na Alemanha, você precisa de um acordo de coalizão. Esse acordo de coalizão estabelece todas as cláusulas em que há consenso entre os partidos que formam o Governo. Já a coligação não precisa disso, porque na coligação, já que nas eleições andaram juntos, é de se pressupor que eles são um partido só. Então, não preciso de um acordo.

            Eles podem ter um acordo interno deles para formar a coligação, mas não precisam de um acordo de coalizão. Agora, partidos, por exemplo, que estavam em campos opostos durante a eleição, e resolvem governar juntos, esse, a bem da transparência, a bem do conhecimento do que está acontecendo para o eleitor, esses precisam fazer um acordo de coalização, e esse acordo tem que ser registrado no Parlamento. Ou seja, é uma coisa para valer. E, se o acordo é rompido, o Governo cai. Claro, porque aí o partido não é mais obrigado a continuar. E me parece que no Brasil nós temos esse problema da governabilidade. É que nós temos vários partidos formando a base do Governo sem acordo. O acordo é de boca. Mas não temos transparência, dizendo claramente em base de quê que esses partidos estão juntos.

            E como é que eu, vamos dizer, eleitor de um dado partido, posso entender que esse meu partido, para governar, entrou em coalizão com o partido que, nas eleições, estava na direção oposta? Isso só é possível se tiver um acordo que mostre para mim: olha, a base desse trabalho conjunto é isso e é limitado a isso, no restante, todos os outros são livres a andar solo, ou seja, nós só estamos de acordo nesses pontos.

            Eu acho que isso é muito mais honesto com o eleitor: ele saber com base em quê partidos que, aparentemente, estão em bancadas opostas, estão trabalhando junto para um governo. Mas eu não tenho nenhum problema com coligações proporcionais nesse aspecto, desde que, claro, haja transparência. Isso é o mais importante.

            Deputado Daniel Almeida, a questão da cláusula de barreira e também o limite para financiamento individual pelo cidadão. Eu não acho que cláusula de barreira, em si, seja um pecado. Eu tenho um problema muito maior. Pessoalmente, teoricamente, eu vejo um problema muito maior: é a convivência, no sistema, de partidos que não têm a mínima chance de chegar ao poder. A essência de um partido político, que é a essência de se fazer política, é chegar ao poder. Ninguém faz política para não chegar ao poder.

            Então, você tem que ter mínima chance de conquistar o poder para realmente se tornar um partido funcional. Aquele que jamais terá vai virar moeda de troca. O destino é partido com “abadá” e partido na “pipoca”. Não é isso? Ou seja, o partido da “pipoca” quer entrar no clube, mas não consegue. E ele vai fazer o quê? Vai fazer barulho em volta, mas na verdade ele não vai ser da essência do sistema.

            Devo lembrar que em 1932, na Alemanha, o Sr. Adolf Hitler conseguiu chegar com um partido no poder por causa da extrema fragmentação da paisagem partidária alemã. Ele não tinha nada. Num sistema sólido ele não teria chegado ao poder. Da mesma forma também em 1933, nas novas eleições, ele mal conseguiu chegar, pouco mais do que isso, trinta e poucos por cento. Mas ele nunca teve, realmente, a maioria da população alemã eleitoralmente atrás de si. Mas isso foi possível por quê? Por causa da fragmentação da paisagem partidária.

            E é por isso que, na Alemanha, para evitar esse tipo de desastre, existe a experiência da cláusula de barreira, para evitar essa fragmentação do espectro partidário. E me parece que essa fragmentação é contrária a todo esforço de governabilidade. E um país precisa ter governabilidade para funcionar.

            Agora, isso é antidemocrático? Veja bem, por isso eu entendo que partidos pequenos podem existir, isso não é problema nenhum. É o partido que não tem a chance eleitoral. Os Estados Unidos têm inúmeros partidos que não fazem nem parte do sistema, mas existem, não têm problema criar o partido. O problema é saber se esse partido pode, por causa da sua representatividade, estar dentro do grêmio parlamentar ou não estar dentro do grêmio parlamentar.

            E aí, para ele poder entrar no grêmio parlamentar, é perfeitamente legítimo que ele entre numa federação de partido com outros partidos, desde que isso faça sentido para o eleitor, e se junte para ter, depois, a cláusula e poder entrar no sistema. Mas aí você terá, vamos dizer, um sistema de coagulação partidária, através de vários partidos que formam uma base, que é mais facilmente negociável. É importante que o poder possa ser negociado com menos gente. Negociar com uma infinitude de partidos, cada um atirando para outro lado, é muito complicado para se chegar a consensos. E o País precisa de consenso para avançar.

            Então, eu não tenho problema nenhum com cláusula de barreira. Mas, na contrapartida, na cláusula de barreira, sim, a liberdade de coligação tem que existir. Essa é a condição.

            Deputado Odorico Monteiro, quanto à questão da Constituinte. Olha, há certas coisas que um processo normal de reforma constitucional por PEC não consegue realizar, precisamente por causa do seu quórum muito restrito. Não é possível. É o que eu falei desde o início. Aqui, como houve essa opção, claramente não se pode esperar muita coisa dessa reforma. Ela vai ser pontual, porque só pontualmente vai haver, por exemplo, consenso suficiente para passar por cima dessa barreira dos três quintos. Eu não estou falando em Constituinte, mas me parece que um processo de reforma constitucional, como estava previsto, Sr. Presidente, na Constituição — e infelizmente fracassou —, uma reforma pelo menos com um quórum reduzido para se fazer a reforma política, ainda que seja por este Congresso, não necessariamente por outro grêmio, já facilitaria as coisas.

Se queremos realmente mexer na essência, temos um problema sério com a limitação natural do mecanismo da PEC. Era só isso o que eu queria dizer. Agora, eu acho que a Constituinte é mais democrática, na medida em que a população vota num grêmio só para repensar a Constituição, que não se deixa, vamos dizer, contaminar pelos conflitos normais da atividade parlamentar ordinária.

            Eu acho que seria, vamos dizer, mais... Mas aí temos que ver o custo disso. Há uma série de outras questões a serem levadas em consideração.

            Deputado Esperidião Amin, realmente, eu reconheço a minha falha. Não me ative ao texto, mas também porque o tempo é curto. Preferi fazer uma exposição mais ampla. Entendo, sim, que o projeto tem grandes méritos, o projeto circunstancial. Eu tive o prazer de lê-lo para chegar aqui. Realmente, concordo com o senhor quanto ao aspecto da migração partidária. Nós tivemos esse problema desde o início. Nós fizemos, aliás, uma distinção no Ministério Público Eleitoral. Nós distinguimos a migração partidária dos votos proporcionais com os majoritários. Por quê? Porque no majoritário, em princípio, a pessoa realmente, vamos dizer, o eleitor vota naquela pessoa. Então, nós não temos visto problema de fidelidade partidária na migração dos majoritários. Isso tem sido uma posição que nós do Ministério Público temos assumido, até porque os mandados de segurança no Supremo Tribunal Federal que deram origem a esse debate no TSE e a resolução sobre fidelidade partidária no TSE só falavam em voto proporcional. O TSE, na resolução, estendeu o tema e colocou os majoritários no meio da conversa, mas eles não estavam na conversa, porque a questão que o Supremo Tribunal Federal discutiu foi precisamente o índice, o coeficiente partidário, que permitiu àquela pessoa obter aquele mandato — e talvez ela não obtivesse aquele mesmo mandato se tivesse em outra agremiação partidária.

Então, de certa forma, permitir que essa pessoa saia do seu partido para outro partido é uma fraude ao eleitor, porque, na verdade, ele está levando consigo um coeficiente que pertence ao partido de origem e não a ele. Essa era a grande discussão que nós tínhamos — e isso não atinge o majoritário. Aliás, no majoritário, muitas vezes, há uma situação até pior. Quando você diz que o Senador ou principalmente o Governador deveria ser destituído porque mudou de partido, o que acontece? Quem vai para o lugar dele muitas vezes não é alguém do partido que está reivindicando o mandato, e sim do partido até adversário. (Riso.) Na verdade, a complicação fica muito maior no voto majoritário.

Então, por isso, distinguimos essas duas coisas, mas, realmente, a possibilidade do chamado “pit stop”, a possibilidade de se migrar para um partido novo, e com isso não incorrendo em fidelidade partidária, é um completo nonsense. Desculpem-me, porque isso é um pit stop. Por quê? Porque o sujeito sai para um partido novo, e a partir daí ele tem uma carta branca para ir para qualquer outro partido, porque o partido novo não tem como reivindicar o mandato dele, que dele não é. Então, é simplesmente como se o sujeito fizesse um pouso naquele partido, e depois ele está liberado para fazer qualquer outra coisa. É uma fraude ao sistema. Então, nós do Ministério Público fomos contra, sempre, a esse sistema de pit stop, como a gente chama.

            (Não identificado) - (Intervenção fora do microfone. Inaudível.)

            O SR. EUGÊNIO JOSÉ DE GUILHERME ARAGÃO - Na verdade é como se o carro saísse da pista para trocar o óleo, não é isso?

            Então, nós fomos contra isso e acho que aí houve realmente leniência do TSE em relação a essa questão da fidelidade partidária.

            O SR. PRESIDENTE (Deputado Rodrigo Maia) - Com a palavra o Deputado Marcelo Castro.

            O SR. DEPUTADO MARCELO CASTRO - Quero cumprimentar todos, o nosso Presidente Rodrigo Maia, o Dr. Eugênio José de Guilherme Aragão, que deu uma palestra aqui brilhante, bem centrada, profunda, que eu acho que V.Exa. conseguiu tocar no cerne, no que é essencial para a gente promover uma reforma política.

            Em verdade, quando aqueles de junho de 2013 foram para as ruas e mostraram cartazes “vocês não nos representam” é porque, na realidade, a representação popular aqui no Congresso Nacional está distorcida por essa pulverização de partidos que nós temos, por esse mecanismo de votos individualizados.

            O nosso sistema eleitoral hoje, a gente vota em João e elege Pedro. A vontade nacional, que é a finalidade do sistema eleitoral, não está sendo captada e expressada no Congresso Nacional.

            Nós estamos nos perdendo no meio do caminho e a expressão da vontade do Congresso Nacional está dissociada, distante e divorciada da vontade nacional.

            Acho que V.Exa. tratou isso com uma profundidade! Não posso elogiar muito a ele, porque vou terminar me elogiando. (Riso.) Como disse aqui o nosso colega Deputado Odorico Monteiro, do Ceará, as teses que ele defendeu aqui são as teses que eu venho defendendo aqui há longo tempo. Inclusive está nessa cartilha que eu quero passar a V.Exa.

            V.Exa. fala em outro aspecto muito importante, do fortalecimento dos partidos. V.Exa. caminhou, caminhou, eu esperei que dissesse uma palavra que V.Exa. não disse.

            O grande agente pulverizador e enfraquecedor dos nossos partidos é o nosso sistema eleitoral de lista aberta que permite as campanhas individualizadas. As campanhas no Brasil não são partidárias.

            As campanhas no Brasil não são partidárias, como de resto ocorre no mundo inteiro. No restante do mundo ou é o sistema majoritário distrital ou o sistema proporcional de lista fechada ou de lista preordenada.

            Num sistema ou em outro, as campanhas são partidárias e aí, os partidos, para poderem conseguir voto da população, é evidente que os partidos têm que ser coesos, têm que ter disciplina interna e, sobretudo, têm que ter conteúdo programático para o eleitor ter identidade e saber por que ele vai votar no partido “a” e não no partido “b”. E isso nós só vamos conseguir, Dr. Eugênio, no dia em que nós acabarmos com as campanhas individualizadas como existe aqui no Brasil.

            Eu já citei esse exemplo aqui uma vez. Eu acho que se nós citarmos cem vezes ainda será pouco. Na eleição passada, em São Paulo, o PMDB, o PSDB e o PT fizeram aí por volta de umas 180, 170 campanhas, porque eles tiveram nessa faixa de candidato a Deputado Federal e a Deputado Estadual.

            Se o sistema for de lista preordenada, o PT, o PMDB e todos os outros partidos, em vez de terem feito 200 campanhas, teriam feito uma campanha. É evidente que o preço de uma campanha deve ser infinita vez menor do que o preço de 200 campanhas. Isso é uma coisa óbvia.

            Agora, eu gostaria de fazer um esclarecimento a V.Exa., que tocou em um assunto aqui. Nós estamos numa comissão especial para dar o parecer sobre a PEC, mas, vendo essa insuficiência, nós fizemos, juntamente com o nosso Presidente Rodrigo Maia, gestões junto ao Presidente da Câmara dos Deputados e já conseguimos formar uma comissão paralela, composta dos mesmos membros com o mesmo Presidente e com o mesmo Relator para a gente ter o poder também de fazer o projeto de lei.

            Então, a nossa Comissão aqui, no final, ela vai produzir uma PEC, que vai ser um parecer sobre as PECs, que são 107, e vai produzir também um projeto de lei, uma matéria infraconstitucional. E é bom que seja feito pela mesma Comissão para não haver discordância, não haver incongruência.

            V.Exa. defende o sistema distrital misto, parece, também, é o que nós defendemos, mais adequado, e V.Exa. fala aqui no financiamento de campanha.

            Eu achei tão interessante que eu copiei hoje o que saiu no jornal O Globo. Aqui tanto faz dizer que foi V.Exa. que falou, como dizer que foi o Paulo Roberto Costa, porque eles repetem igualzinho as palavras. Eu gravei hoje aqui e escrevi.

            “As doações de campanha são empréstimos a juros altos”. Isso é o Paulo Roberto Costa que está dizendo. Que as campanhas eleitorais, o que é declarado oficialmente é apenas um terço, nos cálculos dele, do que na verdade os partidos gastam.

            Então, o que ele diz numa reportagem hoje do jornal O Globo? — refiro-me ao Paulo Roberto Costa, da PETROBRAS — Que quando uma empresa financia um candidato, ela está fazendo um empréstimo a juros altos para receber de volta aquilo que investiu.

            Eu acho que quem pensa bem da realidade brasileira e quer fazer um sistema eleitoral em favor do nosso País, tem que ter isso daqui como reflexão, porque, na verdade, o que a prática demonstra é isso daí.

            É só olhar o financiamento das empresas e acompanhar as pesquisas eleitorais. Quando o partido “a” está na frente, recebe mais doações das empresas. Quando o candidato “a” começa a fraquejar e o candidato “b” começa a subir, o candidato “b”, que estava recebendo poucos recursos das empresas, começa a receber muito mais.

            O SR. DEPUTADO ESPERIDIÃO AMIN - Começa a ser procurado.

            O SR. DEPUTADO MARCELO CASTRO - Começa a ser procurado.

            O SR. EUGÊNIO JOSÉ DE GUILHERME ARAGÃO - (Inaudível. Fora do microfone.)

O SR. DEPUTADO MARCELO CASTRO - É evidente que não há uma identidade aí do financiamento de uma empresa para o partido, porque o partido defende as causas que venham ao encontro do interesse daquelas empresas. Defende.

            Na prática, o que ocorre no Brasil? As empresas que têm negócio com o Governo financiam todos os candidatos. Financiam mais os que têm mais; financiam menos os que têm mais chance. Financiam mais os que estão no poder; financiam menos os que estão fora do poder.

            Isso é regra geral para demonstrar que não há vinculação alguma programática ideológica com o partido, mas, sim, com o interesse que elas estão defendendo.

            Então, Sr. Procurador, quero parabenizar V.Exa. pela sua contribuição valorosa. Eu acho que fica aqui uma aula muito boa para a gente se debruçar sobre esse conteúdo que V.Exa. trouxe aqui hoje para nós.

            Muito obrigado.

            O SR. PRESIDENTE (Deputado Rodrigo Maia) - Com a palavra o Deputado Evandro Gussi.

            O SR. DEPUTADO MARCELO CASTRO - Só um instantinho, Sr. Presidente. Eu me esqueci de perguntar: como seriam essas comissões paritárias? E me permitir só uma discordância de V.Exa.

            V.Exa. não foi enfático na proibição de coligações proporcionais. Eu acho que outro grande fator do enfraquecimento partidário é a gente permitir as coligações proporcionais. Confunde a cabeça do eleitor.

            As coligações são feitas completamente díspares de um Estado para outro Estado e aí a gente não sabe quem está defendendo o que. Tem que haver nitidez. Isso é importante.

            O partido tem que ter nitidez de proposta para o eleitor saber em quem ele está votando, porque está votando e para quem está votando, para aquele partido vir aqui para o Congresso Nacional e expressar a vontade popular. Isso é que é democracia representativa.

            O SR. PRESIDENTE (Deputado Rodrigo Maia) - Com a palavra o Deputado Afonso Motta.

            O SR. DEPUTADO AFONSO MOTTA - Eu quero cumprimentar o nosso Presidente, o nosso Relator, os colegas Parlamentares e, de pronto, Dr. Eugênio Aragão, dizer que eu me aproximei muito das suas criteriosas colocações.

            Posso afirmar que me identifico muito com os principais conceitos apresentados pelo ilustre colega.

            Quero registrar que eu tenho tido uma preocupação, em minhas colocações, com um enunciado que para mim é o enunciado que, a cada dia, com colocações públicas, com o debate público, tem estado mais presente. É a conclusão definitiva que é o esgotamento do atual sistema político.

            Há preocupação de que, mesmo que nós venhamos a definir o melhor consenso do sistema eleitoral, o melhor consenso ou a melhor aproximação sobre financiamento de campanha eleitoral, nós deveremos concluir essa reforma, se Deus quiser, uma reforma que vai acontecer, com o mesmo sistema, o mesmo Presidencialismo de coalisão e fragmentado.

            Então, eu tenho manifestado uma preocupação muito grande com a governabilidade. Essa questão tem que integrar a pauta da reforma política.

            Mas eu queria me dirigir à questão partidária que eu acho que é uma ênfase muito importante, dizendo que, eu acho que nós temos, na realidade atual, um debate sobre conteúdo fundamental.

            Eu acho o conteúdo programático, partidário, não vou dizer do passado, mas até bem pouco tempo, que era um conteúdo de massas, com pouca diversidade, não existe mais. Este é um ponto importante do debate.

            Nós vivemos hoje mais do que a questão programática de parte do mundo de diversidade. Esse mundo de diversidade não pode ser afastado por um conjunto de regramentos para estimular a representação partidária.

            Hoje, quando muito, podemos dizer que nos aproximamos pelo campo que nós temos identidade política e não podemos esquecer a questão da disputa pela política pública. Essa disputa identifica uma visão partidária numa parte importante do território nacional.

            Essa disputa pela política pública, talvez, seja hoje a participação mais presente no espaço público mesmo de um Parlamentar. E ainda, evidentemente, a questão temática, por assim dizer, para ser abrangente, nós convivemos aqui com representações partidárias de fundo temático.

            Então, essas questões são fundamentais para que possamos nos situar na valorização do partido político. Eu acho que a governabilidade é mais importante do que a representação. As duas são importantes, mas eu gostaria de situar.

            Por outro lado, assim, V.Exa., nesse exercício, na ocupação desse espaço público, também tem uma grande indagação, que é uma indagação para todos nós: como nós convivemos hoje com um fundo partidário que é financiamento público de campanha, sim senhor, e que não funciona e não tem critério?

            Nós estamos falando aqui em igualdade e em redução de custos de campanha. Esse hoje já é um dos grandes privilégios no processo eleitoral e a utilização do fundo partidário.

            Como nós temos um horário eleitoral gratuito, que é também financiamento público de campanha, e nós temos descritérios que dão uma grande desigualdade no processo eleitoral? Então, eu acho que essa é uma reflexão muito importante.

            Por fim, eu queria dizer também que incluí nas minhas observações, nas minhas contribuições também uma preocupação muito grande com limites. A questão de estabelecer limites tanto para os recursos utilizados pelo candidato, tanto pelos recursos utilizados publicamente quanto eventualmente pelo setor privado é um ponto muito importante.

            Obrigado.

            O SR. PRESIDENTE (Deputado Rodrigo Maia) - Com a palavra o Deputado Arthur Oliveira Maia.

            O SR. DEPUTADO ARTHUR OLIVEIRA MAIA - Meu caro Dr. Eugênio Aragão, é um prazer recebê-lo aqui. Parabéns pela sua fala, pelas colocações, pela contribuição que está trazendo, na manhã de hoje, a esta nossa Comissão.

            Eu quero iniciar a minha fala dizendo que alguns companheiros, alguns Deputados que me antecederam colocaram que existe uma culpa do Judiciário ou de algum poder por até hoje estarmos nessa situação.

            Eu diria que não se trata de culpa de ninguém. Na verdade, nós constatamos a incapacidade, real incapacidade que o Poder Legislativo teve até este momento de construir uma legislação eleitoral que seja satisfatória.

            Nós vivemos em um sistema eleitoral que foi constituído a partir de 1988 e, de lá para cá, apesar de termos todos constatados que esse sistema é um sistema falido, não tivemos condição, consenso político, capacidade de atingir os três quintos dos votos desta Casa, para poder produzir algum outro documento que fosse diferente, que fosse melhor do que esse.

            Eu diria que, de tudo que V.Exa. falou, dois pontos me chamam muito a atenção. O primeiro diz respeito ao financiamento de campanha. Não há duvida, Dr. Eugênio, de que há um consenso, de todos nós, de que precisamos reduzir — reduzir drasticamente — o custo da campanha eleitoral.

            Eu quero discordar do senhor quando o senhor diz que os distritos maiores produzem custos maiores. A minha experiência me diz o contrário. A impressão que eu tenho é que, nas eleições municipais, por exemplo, o custo naquele Município é muito, mas muito mais alto do que nas eleições de Deputado.

            O somatório do custo das campanhas municipais em qualquer Estado certamente vai ser maior do que o custo de uma campanha de Governador ou da soma das campanhas de Deputados. Esse é o meu sentimento, de sorte que eu não penso que distritos maiores ou menores vão baratear o custo.

            Penso que precisamos avançar em outras quadras, como, por exemplo, limitar o financiamento de campanha. Temos que estabelecer um teto. Não é possível que o céu seja o limite, que um Deputado que consiga arrecadar 100 ou 200 milhões de reais possa aplicar tudo numa campanha eleitoral, porque isso certamente traz uma distorção para a campanha, do mesmo jeito que não é condizente com a democracia que uma pessoa rica possa gastar na sua campanha de maneira ilimitada. Não importa se o dinheiro é dele ou se vem de terceiros; o que importa é que o uso do dinheiro na campanha eleitoral causa desequilíbrio. Portanto, a origem tem pouco significado.

            E aí, meu caro Dr. Eugênio, eu quero dizer que ouvi aqui alguns colegas que me antecederam dizerem que essa questão da fiscalização daquilo que seja visual da campanha seria uma forma de barrar o caixa dois. Eu discordo peremptoriamente.

            Eu não creio que o caixa dois esteja na propaganda visual, não creio que o caixa dois esteja naquilo que é possível enxergar, material de campanha. O caixa dois acontece no subterfúgio da compra de voto lá na base, no dinheiro que é dado para o cabo eleitoral ou para o Vereador, na distribuição comezinha, por debaixo do pano, feita da maneira mais sórdida, na calada da noite.

            É esse caixa dois que tem que ser combatido, meu caro Deputado Fontana — não é o caixa dois da visualização, em que alguém tem duzentas placas eleitorais e outro tem mil.

            O SR. DEPUTADO HENRIQUE FONTANA - Posso lhe pedir um aparte de 30 segundos?

            O SR. DEPUTADO ARTHUR OLIVEIRA MAIA - Claro!

            O SR. PRESIDENTE (Deputado Rodrigo Maia) - Não pode, não! V.Exa. vai terminar e os outros vão falar.

            O SR. DEPUTADO ARTHUR OLIVEIRA MAIA - Perfeitamente.

            Então, eu quero dizer que temos, sim, que criar mecanismos de combater o caixa dois de maneira mais eficiente e, realmente, acho que essa fórmula nenhum de nós tem ainda. Mas penso que a limitação de um teto de gastos já seria um grande avanço, como acho que, dentro das próprias empresas privadas, se nós estabelecermos um limite, é possível, sim, conviver com as doações privadas.

            Mais uma vez eu falo da incapacidade que nós temos de fazer aqui o nosso avanço em relação à constituição da lei. Se, no Brasil, a Câmara dos Deputados, o Congresso Nacional, já tivesse conseguido votar a lei do lobby, para estabelecer com clareza o que é a legítima...

            O SR. PRESIDENTE (Deputado Rodrigo Maia) - Para encerrar, Deputado.

            O SR. DEPUTADO ARTHUR OLIVEIRA MAIA - ...ação de alguém para interferir de maneira ou de outra nas ações e no andamento de um processo administrativo, não seria nenhum problema estabelecermos e vermos com clareza o que é possível e impossível de uma empresa fazer.

            O SR. DEPUTADO ARTHUR OLIVEIRA MAIA - Muito obrigado, Sr. Presidente.

            O SR. PRESIDENTE (Deputado Rodrigo Maia) - Não posso cortar a palavra de um Maia. Fica difícil para mil.

            O SR. DEPUTADO ARTHUR OLIVEIRA MAIA - Pois é, isso seria trair a bancada da nossa família.

            O SR. PRESIDENTE (Deputado Rodrigo Maia) - Claro.

            O SR. DEPUTADO ARTHUR OLIVEIRA MAIA - Eu ficaria inconformado realmente.

            O SR. PRESIDENTE (Deputado Rodrigo Maia) - Com a palavra o Deputado Elmar Nascimento.

            O SR. DEPUTADO ELMAR NASCIMENTO - Meu caro Presidente Rodrigo Maia, nosso convidado de hoje, Vice-Procurador-Geral Eleitoral, a verdade é que nós vivemos no nosso País um sistema absolutamente esquizofrênico, um sistema em que o eleitor vota no candidato, mas a nossa legislação e a própria decisão do nosso Supremo Tribunal Federal diz que o mandato é dos partidos, não é do eleitor.

            Se fizermos um plebiscito — todo mundo fala em plebiscito —, veremos que o povo abomina os partidos políticos. Ele vai falar que é para acabar com os partidos políticos e votar só nos candidatos.

            V.Exa. defendeu uma coisa interessante, que é a questão do apoiamento para a criação do partido político. Aqui nós já aprovamos que eleitor filiado a outro partido político não pode assinar lista de apoiamento. Aprovamos isso há 15 dias.

            Eu concordo com o que V.Exa. defende, no sentido de ir ao cartório político. Agora, isso complica muito mais. A gente precisa facilitar que partidos orgânicos, como a rede da ex-Ministra Marina Silva, sejam criados. E talvez seja o caso de reduzir a quantidade de assinaturas, porque os verdadeiros partidos de aluguel não vão conseguir levar o eleitor ao cartório eleitoral para assinar um apoiamento a determinado partido.

            Quanto à questão do financiamento eleitoral, seja privado ou público, o grande problema é o caixa dois. Tínhamos que criminalizar o caixa dois, porque as empresas vão continuar a ter interesses aqui, em função de projetos e demandas do Congresso Nacional e do próprio relacionamento com o poder público. Portanto, o marco estabelece o financiamento público, mas as empresas que estão tendo coragem de dar dinheiro através de caixa dois vão continuar a dar esse dinheiro, e é isso que tem que acabar.

            Quanto ao distritão, permita-me discordar de V.Exa.: se não é o ideal, talvez seja o caminho. Eu só vejo dois caminhos — a circunscrição, defendida pelo Deputado Esperidião Amin, ou o distritão —, porque o que ocorre hoje é que é o pior de tudo.

            Por exemplo, na Bahia, do nosso partido, o Democratas, nós somos quatro Deputados Federais, e ninguém quer se filiar ao nosso partido para concorrer conosco. Se fossem eleitos majoritariamente os mais votados, nós poderíamos ter um partido muito mais forte, em vez de termos que filiar candidatos que não têm qualquer potencial de se eleger, quando na verdade o povo vota no candidato, e não no partido. Portanto, a gente tem que procurar chegar a um meio termo do que é possível.

            E a coligação proporcional possibilita, por meio, sei lá, da Federação, o funcionamento e a existência de partidos importantes, como o PCdoB. É possível. O que não é possível é que não exista uma verticalização. No Brasil, em que o partido é nacional, a gente tem as coligações o mais díspares possível. No Rio de Janeiro, coliga-se o partido num sentido e, na Bahia, coliga-se o mesmo partido num sentido totalmente diferente.

            Eu queria que V.Exa. falasse sobre o tema que não foi tratado aqui, a reeleição para cargo executivo — uma experiência cujo tempo de acabar eu acho que já passou —, bem como sobre a coincidência de eleições, que é um tema que tem avançado aqui.

            Por último, para concluir, a questão principal, que faz com que não avance nenhuma reforma política, é a constitucionalização de temas de processo eleitoral que não deveriam estar na Constituição. A gente deveria ter coragem aqui de desconstitucionalizar tudo que não seja questão de clausula pétrea, retirando da Constituição.

            E quem é minoria precisa ter coragem de se submeter à vontade da maioria. Não adianta a gente falar em plebiscito para o eleitor votar temas que sequer a maioria dos Deputados tem condição de se aprofundar e de conhecer, quanto mais o eleitor. Vamos ter coragem, sim, de tirar xda Constituição, jogar tudo para legislação infraconstitucional! É preciso coragem de fazer.

            Eu vejo V.Exas. falando: “Ah, essa reforma vai ser limitada”. Isso depende da gente. Eu me sinto preparado. Acho que todos os Parlamentares que foram eleitos agora, recentemente, que tomaram posse neste mês, estão preparados para fazer a reforma necessária — talvez não seja a ideal, mas é a necessária —, para, aí sim, por meio da legislação infraconstitucional, submetê-la talvez a um referendo. Mas é preciso ter a coragem de fazer e mexer com o que precisa ser mexido.

            O SR. PRESIDENTE (Deputado Rodrigo Maia) - Obrigado, Deputado.

            Tem a palavra o Deputado Milton Monti.

            O SR. DEPUTADO MILTON MONTI - Sr. Presidente, Rodrigo Maia, caro Relator, Marcelo, Deputado Otoni, caro convidado, Dr. Eugênio Aragão, eu quero me somar um pouco às palavras do Arthur, do colega aqui da Bahia.

            Primeiro, nós não temos nenhuma garantia de que o financiamento de pessoas físicas ou público garanta o fim do caixa dois. Vamos usar agora aquilo que foi dito pelo delator, embora com palavra de delator tenha-se sempre que tomar cuidado: dois terços do dinheiro foram para o caixa dois.

            Então, se nós tivéssemos uma lei já vigente do financiamento público, isso aconteceria do mesmo jeito. Nós não temos nenhuma garantia, não temos aqui instrumentos capazes de fazer com que o caixa dois acabe. E nós precisamos acabar com o caixa dois.

            Nós não temos nenhuma garantia, não temos aqui instrumentos capazes de fazer com que o caixa dois acabe. E nós precisamos acabar com o caixa dois.

            Nós temos que lembrar que uma pessoa jurídica é obrigatoriamente, antes de tudo, uma pessoa física. Não existe pessoa jurídica sem pessoa física! Nós podemos criar distorções, podemos arrumar atalhos para que as pessoas jurídicas possam doar através de pessoas físicas. Então, nós estamos tangenciando a questão.

            Qual é a solução? Luz — a luz é o melhor detergente —, transparência, limite de gastos, para trazer as campanhas de forma igualitária. Hoje não são igualitárias, não só no tempo de televisão, não só no fundo partidário. Nós não podemos tangenciar; temos que enfrentar a questão de frente.

            E, na minha opinião, a questão do financiamento público ou privado é uma questão menor. Nós temos que tratar de transparência, de legislação pesada para o caixa dois. E temos que ter condições de ter uma campanha mais igualitária para todos.

            Quanto à questão do distritão, eu até não tenho ainda uma opinião formada, mas acho que é muito raso dizer que isso enfraquece os partidos políticos, porque o fortalecimento do partido político se dá em duas mãos: os partidos atrás de bons candidatos e os candidatos atrás de bons partidos.

            Não é porque nós vamos ter uma eleição majoritária que os partidos não se interessarão por bons candidatos, ou até mesmo que os candidatos passarão a não se interessar por bons partidos, porque nós vamos obrigar estes a terem propostas concretas. Por que eu vou me filiar ao partido? Eu quero saber a sua ideologia, a sua proposta. Eu não vou me filiar apenas por uma circunstância eleitoral que vai facilitar naquele momento a minha eleição. Então, nós precisamos analisar com cuidado.

            Pode ser que, ao invés do enfraquecimento, haja o fortalecimento do partido, com este atraindo pessoas de bem e colocando para discussão no seu programa também propostas de bem, que possam ser adotadas por várias pessoas. Então, eu vejo que essa é uma discussão que realmente deve ser aprofundada.

            E nós devemos deixar de lado um pouco os clichês de que isso prejudica aquilo ou de que aquilo prejudica o outro. Nós estamos aqui para debater e para usar o nosso conhecimento, a nossa inteligência até mesmo para mudar de opiniões.

            Eu mudo de opinião também, quando sou convencido do contrário. É importante mudar de opinião e ver o que é melhor para o sistema político brasileiro, o que é o melhor para o País, a forma em que a população vai se sentir melhor representada.

            Sr. Presidente, Relator, estou aqui para colaborar e também vejo com muita simpática essa tese de nós tirarmos um pouco de coisas da Constituição, porque parece que se engessa tudo para não mudar nada. Então, vamos desengessar, para poder avançar.

            O SR. PRESIDENTE (Deputado Rodrigo Maia) - Com a palavra, o Deputado Jean Wyllys.

            O SR. DEPUTADO JEAN WYLLYS - Obrigado, Sr. Presidente.

            Dr. Eugênio, deu para notar que as pessoas vêm para esta Comissão com suas teses prontas para serem apresentadas aqui, e não necessariamente para ouvir. Embora o discurso seja o discurso do debate, na verdade, todo mundo tem sua tese pronta e sua reforma política na cabeça e as traz aqui, inclusive com uma certa dose de deselegância em relação ao senhor.

            Posso chamá-lo de você? Achei muito interessante o comentário que você fez sobre os partidos — uma crítica, na verdade. A proposição da constituição dos partidos é muito boa, mas num mundo ideal, e nesse mundo ideal não só o sistema de educação funcionaria, dando às pessoas educação política para poderem identificar o partido em que elas se encontram ideológica e programaticamente, mas também as concessões das TVs e das rádios passariam por um controle social e não estariam nas mãos de políticos. Então, é fundamental que a gente pense nisso quando a gente faz essa crítica à constituição de partido, embora eu considere sua crítica bastante pertinente.

            Eu pertenço a um pequeno partido, um partido ideológico e programático, e faço uma provocação a você, perguntando em qual posição do espectro político estão os partidos de aluguel, que mereceram sua crítica e que servem na verdade para aluguel e para carreirismo de determinados políticos.

            Eu queria que localizasse, embora não esteja muito na moda falar de esquerda e direita, ou de conservadores e progressistas. Vamos localizar, vamos situar, já que estamos numa audiência pública e temos aqui uma quantidade de pessoas nos acompanhando, em cumprimento à promessa do Presidente Rodrigo Maia relativa a uma proposta feita por mim, no sentido de que as pessoas participassem desses debates. Então, abrimos uma sala no e-Democracia, e há muita gente acompanhando.

            As pessoas levantaram algumas questões, que eu quero trazer aqui para você também discutir. Não foram perguntas propriamente ditas — algumas fazem colocações, muitas de senso comum —, mas há algumas questões interessantes para trazer aqui.

            Alguém pergunta: “No voto distrital e no voto distritão, como fica o papel dos Vereadores e Deputados Estaduais? Como distinguir essas figuras da figura do Deputado Federal em suas atribuições?”

            Outros falam de como não há transparência no Judiciário e de como isso pode também afetar o resultado das eleições e o sistema político, já que se cobra muita transparência do Poder Legislativo, mas o Poder Judiciário é muito pouco transparente.

            As pessoas pedem para você se posicionar em relação à exigência de curso superior para que alguém se candidate, o que eu acho uma loucura, porque essas pessoas querem excluir do jogo democrático aquelas que não passaram pelo sistema formal de educação.

            Há pergunta sobre financiamento de igrejas. Fala-se muito em financiamento empresarial, mas pouco das igrejas que têm financiado políticos e constituído bancada aqui.

            Por fim, há a questão da paridade de gênero, que não foi colocada, bem como a da garantia de porcentagem para grupos, como as nações originárias, os povos indígenas, que não têm representação neste sistema eleitoral e dificilmente passarão a ter.

            É isso.

            O SR. PRESIDENTE (Deputado Rodrigo Maia) - As inscrições estão encerradas.

            Passo a palavra ao Deputado José Fogaça.

            O SR. DEPUTADO JOSÉ FOGAÇA - Obrigado, Sr. Presidente.

            Dr. Eugênio, gostei muito da sua palestra, que foi numa direção muito precisa, com muita agudeza no trato deste dilema que nós vivemos no Brasil hoje, que é o de escolher um caminho para um reforma político-eleitoral.

            Eu me lembro de que, logo após a Reforma Golbery, em 1980, quando acabou a dualidade partidária de MDB e ARENA, um Deputado antigo — naquele tempo ele já era antigo; hoje, falecido, de saudosa memória —, o Dr. Temperani Pereira, me disse uma frase: “A partir de agora, quem é cauda de baleia vai querer ser cabeça de sardinha”. Ou seja, nós estávamos saindo daquela rigidez da dualidade, do bipartidarismo, e estávamos caminhando para uma fragmentação de proporções gigantescas, como nenhuma outra nação do mundo moderno conhece. E, realmente, a profecia dele se realizou.

            Os partidos têm uma hierarquia muito fechada, restrita, repressora, tradicional, conservadora. A estrutura hierárquica é ainda a mesma que era em 1920. Então, os partidos políticos impedem o fluxo natural do surgimento e da ascensão de lideranças. Com isso, todo mundo sai de um partido para fundar outro, e a realidade se plasmou.

            Logo após a Constituinte, o então Senador Marco Maciel me disse uma frase no Senado: “Olha, pela legislação que nós estamos elaborando, é mais fácil fundar um partido do que fundar uma microempresa”. Tanto o Temperani Pereira, um homem de esquerda, quanto o Marco Maciel, um homem mais conservador, tinham inteira razão: nós construímos a mais fragmentada democracia do planeta.

            Em nenhum lugar do mundo o partido que governa tem apenas 13% do Parlamento. No Brasil, o maior partido tem apenas 13%. Num país como a Argentina, onde há 34 partidos com assento no Parlamento, o maior partido, que é o Partido Justicialista, tem 46% do Parlamento. Cem partidos participam das eleições americanas, mas só dois realmente conseguem ter uma representação significativa, expressiva no Congresso Nacional.

            Então, a questão da fragmentação partidária, parece-me o núcleo e a essência de toda a discussão. Como evitar essa fragmentação? Por que o presidencialismo multipartidário não há em nenhum País do mundo? Eu repito. Em nenhum país do mundo há presidencialismo multipartidário.

            A Bélgica tem multipartidarismo. Há um grande número de partidos também, uma grande liberdade de organização partidária, mas formam a coalisão e se acertam para governar no Parlamentarismo.

            A Itália também tem um grande número de partidos, mas é um regime Parlamentarista. O único regime presidencialista com 28 partidos, diluindo e dispersando totalmente as estruturas de poder, de mando, de comando, de decisão, o único lugar do mundo é o Brasil.  Esse é um dos pontos da abordagem de V.Exa. que eu gostaria de ver, caro Vice-Procurador.

            Por outro lado, acho que a questão da limitação dos recursos de campanha é essencial. A proibição e a vedação às empresas faz parte de uma necessidade, digamos assim, “expurgante” ou moralizadora neste momento.

            É a retomada de outra cultura. Pode ser que muitas empresas até invistam na qualidade das pessoas, na qualidade da representação e não tenham esta visão tão mesquinha e pequena de só visar o seu interesse. Pode uma empresa estar pensando na qualidade do Parlamento, se lhe serve viver num País, onde haja um Parlamento decente. Mas, neste momento, a questão cultural está pedindo que nós façamos esse expurgo das empresas, pelo menos da questão legal nas doações.

            Portanto, acho que é importante, de certa forma, reconhecer a validade de suas palavras nessa questão.

            O SR. PRESIDENTE (Deputado Rodrigo Maia) - Para encerrar, Deputado.

O SR. DEPUTADO JOSÉ FOGAÇA  - O importante não é limitar os recursos. Vamos limitar, sim. Mas se for igual para todos não há nenhum problema. A Regra do jogo é a democracia, para todos, sem dúvida alguma.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rodrigo Maia) - Concedo a palavra ao Deputado Evandro Gussi.

O SR. DEPUTADO EVANDRO GUSSI - Obrigado, Sr. Presidente. Tive que me ausentar para ir à reunião administrativa da CCJ. Mas, no que pude acompanhar, aqui, S.Exa., Dr. Eugênio Aragão, eu primeiro o parabenizo por tamanha lucidez e amplo conhecimento sobre o tema.

Sem fazer análise psicológica ou estética dos Srs. Deputados que trazem suas ideias, que sempre presumo que são com retidão de intenções, chamou muito a atenção a fala de S.Exa., no sentido da criminalização da política. Isso vindo, sobretudo, de um membro do Ministério Público é algo que realmente nos alegra. Não porque queremos que aquilo que é crime seja tratado como crime, com suas consequências — e V.Exa. deixou muito claro. Mas uma criminalização geral da política tem afastado, em geral, as pessoas de bem. Porque as pessoas que são boas, que são honestas e que poderiam oferecer um grande serviço ao País, quando se taxa, desde o início, que são indignas, aqueles que enxergam as coisas boas, em geral, tendem a se afastar.

Queria, aqui, agradecer a V.Exa. nos dar uma visão melhor sobre essas comissões que acontecem a Electtorali, na Espanha, a experiência alemã, que V.Exa. tão bem demonstrou conhecer. Como isso, de fato, acontece, suas boas consequências para a vida política e, claro, uma preocupação que nós e a população sempre teremos de que isso é efetivo no controle das boas práticas políticas e assim por diante.

            V.Exa. também colocou, com muita agudeza, a questão dos grandes custos da campanha como uma causa sensível dos problemas de financiamento eleitoral. Ou seja, se me permite uma analogia simplista, talvez, diante de uma hemorragia, antes de pensarmos em como melhorar o fluxo de sangue da transfusão — Dr. Marcelo Castro, médico, espero que concorde comigo —, que passemos a estancar a hemorragia.

            Os custos são altos. V.Exa. identificou muito bem o tamanho do nosso território. Não há nenhum País com a circunscrição, com o distrito eleitoral como o Brasil hoje. Em São Paulo, por exemplo, há 32 milhões de eleitores. Sabemos bem o que isso significa. E as dificuldades logísticas, por exemplo, do Amazonas não menores. Como se pensa em colocar essa questão? Quanto ao último ponto, V.Exa. também falou sobre a centralidade dos partidos políticos. Por conhecer bem a experiência alemã e europeia como um todo, V.Exa. sabe da importância que isso tem.

            Vejo hoje, humildemente, a posição e a consequência a que nos detemos. Como disse aqui o Deputado José Fogaça, tentamos sempre estancar a questão, ou da diversidade partidária, que não permite construção de maiorias sólidas, assim por diante. Claro, sempre respeitando as sagradas Minorias, mas a democracia se faz pelo princípio da Maioria. Sempre pensamos que existem fórmulas clássicas que fortalecem os partidos, desde suas causas.

            Penso, por exemplo, na fórmula clássica. Não a estou aqui defendendo, neste momento, embora seja simpático, mas o distrito uninominal é uma fórmula clássica de fortalecimento partidário. Já termino, Excelência.

            O sistema alemão, embora temperado pelo princípio proporcional, constrói isso. Assim por diante. Como V.Exa. vê essa atuação nas causas pouco discutidas no Brasil?

            Obrigado, Sr. Presidente.

            O SR. PRESIDENTE (Deputado Rodrigo Maia) - Concedo a palavra ao Deputado Zé Carlos.

            O SR. DEPUTADO ZÉ CARLOS - Obrigado, Sr. Presidente.

            Cumprimento V.Exa., Deputado Rubens Otoni, primeiro Vice-Presidente; o Deputado Marcelo Castro e os companheiros que estão, aqui, presentes e fazem esta Comissão. Cumprimento o nosso palestrante, Dr. Eugênio Aragão, que proferiu uma bela palestra e nos iluminou com relação àquilo que temos que avaliar.

            As minhas conversas, as minhas percepções, durante esse tempo em que faço parte desta Comissão, Sr. Presidente, é de que só há um ponto comum entre os políticos, entre o Governo e entre a sociedade, que é exatamente a necessidade dessa reforma. Os demais pontos que abrangem essa reforma têm senões de uma parte ou de outra, maior ou menor.

            De qualquer forma, eu peço a V.Sa. Dr. Eugênio, que faça uma consideração sobre os prós e os contras a respeito do voto. Se é facultativo ou não, levando em consideração o Estado brasileiro, onde há locais em que a conscientização política é mais forte e em locais onde essa conscientização é mais debilitada.

            Era essa a minha abordagem, Sr. Presidente. Quanto ao tempo, Sr. Presidente, eu acho que vou ganhar o seu voto (Risos.) nessa avaliação.

            O SR. PRESIDENTE (Deputado Rodrigo Maia) - Concedo a palavra à Deputada Renata Abreu

            A SRA. DEPUTADA RENATA ABREU - Obrigada, Sra. Presidente.

            Eu queria fazer um questionamento. Sei que eu sou sempre Minoria aqui. É uma grande luta para mim poder falar alguma coisa e as pessoas entenderem o meu posicionamento.

            Eu queria falar sobre governabilidade. O que é ter governabilidade? A meu ver, seria justamente nós discutirmos com as Minorias as coisas que são de interesse da nossa população. Não necessariamente fazer-se aprovar tudo que um partido “a” ou um partido “b” quer.

            Eu acredito que há fragmentação. Eu pergunto: por que o Congresso fragmentou? Por que novos partidos entraram nesta Casa? É isso. Como o meu, que, pela primeira vez, está aqui, nesta Casa. Eu digo, entre todos od partidos que entraram, no Congresso Nacional, 100% são Deputados de primeiro mandato. A renovação política pela qual o Brasil está gritando na rua aconteceu e está acontecendo. E nós aqui, nesta Comissão, quisemos ignorar essa realidade e defender cláusulas de barreiras para esmagar nosso nascedouro. Isso é triste!

            Eu acho que nós, enquanto Parlamentares, independente dos nossos partidos, temos que incentivar que novas pessoas, unidas à experiência de quem aqui está, venham com entusiasmo, com vontade e com novas ideias. E não é uma cláusula de barreira que vai ajudar o Brasil no que ele quer.

            Muita gente tem defendido, inclusive a imprensa, que a fragmentação é ruim para o País, mas ela é resultado das urnas. Elas vêm aí mostrar — e mostrou para a gente — o que a população está querendo. E quem deu, sim, oportunidades reais para essas novas caras da política foram os partidos pequenos e médios. Então, eu tenho que vir aqui defender, sim, esses pequenos partidos.

            Acho que a gente tem que brigar não só pelo fim da reeleição no Executivo, mas uma única reeleição também no Legislativo, para oxigenar essas Casas. Isso é importante. Eu entrei aqui agora e vejo que realmente há pessoas muito competentes, mas, é claro, o sistema burocrático, a dificuldade de fazer as coisas acontecerem desmotiva. Essas novas pessoas vêm para cá com entusiasmo, com vontade. A gente pode realmente promover mudanças para a nossa sociedade.

            Eu não acho que a fragmentação é ruim para o País. Pelo contrário, a gente tem que defender coisas. Todo mundo ri de mim, quando eu falo, mas por que, numa eleição de Prefeito, quando se lança um candidato — inclusive nos grandes partidos há mais de um nome com vontade de pleitear o cargo, e não há legenda para ele ali — o tempo é só de 30 segundos, sendo que outro partido, por causa de uma eleição que já passou, é 5 minutos? Até que ponto a gente não está direcionando essas eleições para manter os grandes no poder? Por que isso?

            São questionamentos que eu tenho que fazer aqui no Congresso, porque acho que nós estamos indo na contramão do que o povo está clamando. Eu acho que defender, como o senhor muito bem disse, o fim das coligações, o que é interessante, vai continuar mantendo a escolha dos candidatos por conveniência partidária. Qual partido tem coeficiente partidário? O que acontece? Mesmo aqui dentro, nos grandes partidos, há pessoas reunidas num único partido que pensam de forma completamente diferente. Ou não é assim que está acontecendo? Por isso eu mudei a minha posição e passei a defender o próprio distritão. Eu acho que, pelo menos nessa situação, as pessoas escolheriam os partidos por afinidade com seus dirigentes, com a ideologia do partido. E realmente hoje a situação do Brasil é que pessoas votam em pessoas, e não em partidos. Isso não é o essencial e não é bom para o nosso País, mas é a realidade. E nós precisamos nos adequar à realidade.

            Então, eu vou finalizar dizendo aos senhores a minha pergunta: a fragmentação é ruim? Por quê? Por que não pode haver debate dentro desta Casa também com as minorias? Por que nós temos que ser excluídos do processo e do funcionamento Parlamentar? Eu não concordo com isso. Queria deixar a minha posição.

            A segunda questão é quanto à governabilidade. Eu acho que ter governabilidade é justamente ter diálogo com as minorias, com as diferentes classes. Espero que as decisões aqui tomadas sejam também levadas a essas pessoas que lutam muito para aqui chegar.

            Meu muito obrigada.

            O SR. PRESIDENTE (Deputado Rubens Otoni) - Com a palavra o Procurador Eugênio.

            O SR. EUGÊNIO JOSÉ GUILHERME DE ARAGÃO - Sr. Presidente, são inúmeras as perguntas. A lista desta vez está bem maior do que na sessão passada. Vou tentar ser breve para não castigar os senhores aqui, pois o tempo já está avançado.

            Uma das questões recorrentes nas discussões aqui é com relação às Comissões Parlamentares Paritárias, que tratam das eleições. Não existe um modelo único, cada país tem um modelo diferente. Existem modelos mais burocráticos, como o modelo alemão, cuja autoridade eleitoral é central, com vinculação também com o Parlamento, com o Governo e com o Ministério da Justiça. Existem outros sistemas que são, por exemplo, de Comissões independentes, semelhantes ao sistema britânico. Na verdade, você entrega para a sociedade civil a regulação das eleições. Você contrata pessoas que não têm nenhuma vinculação partidária, através de um processo seletivo do Parlamento, que é quem contrata essa Comissão. Tem que ser uma Comissão realmente independente. É uma prática possível e também muito elogiada. São Comissões independentes. Elas não têm vinculação governamental, prestam contas da sua atividade ao Parlamento no final. Existem outras, são as Comissões propriamente paritárias. Todos os partidos que concorrem estão ali dentro representados. Eles estabelecem comum acordo à regra do jogo. Essas Comissões sempre têm algum pé dentro do Parlamento. Em todos esses sistemas, não existem Comissões que sejam puramente executivas.

            O modelo Judiciário é um modelo minoritário no Brasil e no Peru. Em alguns países, há o modelo de Justiça Eleitoral. Mas não me parece que, dentro do direito comparado, seja necessariamente a melhor solução. É claro que o modelo Judiciário, pelo fato de ele ser extremamente burocratizado, traz alguns resultados de eficiência, sem dúvida nenhuma. Há possibilidade, por exemplo, de implantação da eleição eletrônica, que traz tamanha eficiência e rapidez. Isso, sem dúvida nenhuma, é uma virtude da nossa estrutura da Justiça Eleitoral, mas, ao mesmo tempo, é uma estrutura extremamente custosa. É só os senhores imaginarem quantas centenas de funcionários o Tribunal Superior Eleitoral e os tribunais regionais eleitorais têm para manter esse sistema. O País paga muito por essa estrutura, embora o resultado seja eficiente, e talvez pudesse ser eficiente com menos. A gente vê, por exemplo, que a Comissão Eleitoral britânica não chega a ter uma centena de funcionários e cuida das eleições do país inteiro.

            Essas questões merecem reflexão, eficiência, custo e sobretudo representatividade. Ou seja, quem regula a eleição tem que ser os atores da eleição. Parece-me que é muito mais justo se todo mundo estabelecesse as regras, de comum acordo. Que essas regras também sejam observadas na medida em que um controla o outro. Parece-me que há mais eficiência nisso do que no porrete da criminalização em cima do político. Tudo o que ele faz é proibido. Por exemplo, colocar um cartaz que seja maior do que 4 metros quadrados — não pode ter 4 metros, 16 metros. Se o jogo é combinado entre todos, não há problema. As pessoas têm que saber o que querem. Agora, realmente o importante nisso tudo é que haja um teto de gastos. Com certeza, esse teto de gasto tem que ser prévio.

            Agora, quanto à questão da chamada adversidade na política, fatalmente é um fator de fragmentação. Nas democracias representativas, sempre há um grande dilema. Por um lado, é garantir a governabilidade através do poder da maioria, mas, por outro lado, também é não sufocar as minorias.

            Parece-me que o importante neste debate é também ver como é que os partidos se organizam internamente para também darem lugar às minorias. É o que o Deputado José Fogaça falou do extremo conservadorismo dos grandes partidos, que estão calcados em cima de lideranças congeladas, que estão há muito tempo ali, e não abrem espaço para novas lideranças. Parece-me que essa é uma discussão da vida partidária. Os partidos devem estimular esse debate e a formação de novos quadros políticos, com uma escola de políticos. A juventude socialista, por exemplo, em Portugal, é nada mais do que um celeiro de políticos do futuro. E recursos do fundo partidário estão aí exatamente para isso, para a formação política de novos quadros. Os partidos têm que ter também a consciência da necessidade de renovação permanente do quadro, para dar chance aos mais novos, a fim de que não haja esse tipo de frustração. Aí, sim, há tendência a se criarem agremiações que realmente, em última análise, não têm chance de chegar ao poder. Elas podem dar uma contribuição como minoria, mas não vão ser jamais pivotantes dentro do sistema de poder. Parece-me que é isso que a política trata, do poder. E quando você tem um partido que não tem chance de chegar no poder, se esse partido não ter uma solidez programática e ideológica forte, a tendência desse partido é virar moeda de troca. Isso é um risco porque aí começam também os toma-lá-dá-cá, e não são sempre, vamos dizer, ortodoxas as atividades na penumbra partidária.

            Eu acho que a fragmentação é um problema. Acho que é um problema, sim, para a governabilidade. A governabilidade pressupõe partidos fortes. É aquela distinção, é o contraste entre rua e repartição, quem é Governo e quem está na rua. Quem está na rua quer tudo, e é legítimo, tem desejos nos seus direitos, infinitos. Quem está no poder tem que administrá-los. E necessariamente quem está no poder corta direitos porque os recursos são limitados. Uma coisa é estar na rua, querer tudo, outra coisa é estar dentro do Governo e só poder fazer alguma coisa. Realmente a fragmentação criativa da rua fatalmente, quando chega a hora de administrar a governabilidade, tem que passar por um funil. Não tem jeito. Não se governa permanentemente em debate de ágora, não é possível isso. A ágora tem o seu lugar, mas a ágora não forma administrações racionais burocráticas no sentido weberiano, não forma. Eu acho que isso aqui é um pouco de realismo dentro da política, realpolitik. Eu acredito, sim, mas tem que ter lugar para as minorias e os partidos têm que se abrir para isso, senão eles se fossilizam e o eleitor também se desinteressa pelo partido.

            Aliás, esse é um fenômeno nas democracias tradicionais todas, o desinteresse do eleitor pela política porque, em última análise, os partidos tradicionais fazem a mesma coisa, só muda o rótulo, mas na verdade é tudo extrato de tomate. As pessoas começam a perceber isso e começam a se desinteressar ou a criar agremiações de pouca durabilidade.

            Isso está acontecendo na Alemanha, por exemplo. Hoje nós temos partidos novos, como a AfD, e partidos antieuropeus, muitas vezes. A gente sabe que são partidos de crise. No momento em que a crise passa, esses partidos se dissolvem, não têm durabilidade, e os partidos tradicionais ficam, por conta de suas estruturas rígidas.

            Só para ir adiantando também, a questão de culpa do Judiciário — e me parece que aí está também a questão da transparência do Judiciário — é outro debate. Realmente, se a gente fala de Justiça eleitoral, o Judiciário brasileiro não é um Judiciário democrático. Nosso Judiciário é um Judiciário burocrático. É bem estruturado, de carreira, mas falta-lhe muito legitimidade democrática porque as pessoas que entram nessas carreiras, na verdade, entram com objetivos que não têm necessariamente a ver com uma visão política de mundo, têm a ver com sua conquista de espaço, de prestígio e de poder. Burocraticamente são sistemas que funcionam bem. A Justiça brasileira está indo para um caminho melhor em termos de resultado, mas tem um forte déficit de democracia.

            Por exemplo, uma coisa que a gente vê na Justiça alemã é que toda decisão judicial começa com a frase: “Em nome do povo alemão...” Isso pode parecer bobagem, mas pelo menos o juiz tem que saber que ele está sentado ali não por acaso. Se ele está sentado ali e se ele é uma parte do poder é porque todo poder emana do povo e em seu nome é exercido. Aqui no Brasil não, burocraticamente nossas decisões começam em “Vistos, etc”. (Risos.) Fica bom também. A gente vê o contraste. "Vistos, etc.” Toda decisão judicial. A gente mostra um pouquinho da nossa mentalidade, do “Vistos, etc”, que é uma mentalidade árida.

            Aliás, temos um grande problema. A nossa Justiça tem os poderes de uma Justiça legítima eletiva e é uma Justiça burocrática. Por exemplo, um juiz poder declarar uma lei inconstitucional, de certa forma, desautoriza o Legislativo. Se o Legislativo aprovou aquela lei, depois de ela ter passado por uma Comissão de Constituição e Justiça que disse que ela era constitucional, chegar um único juiz dizer: “Eu não aplico essa lei porque para mim ela é inconstitucional”...

Nos sistemas de Justiça burocrática, como, por exemplo, o sistema alemão, o juiz não tem esse poder. A Constituição diz com todas as letras que o juiz é vinculado à lei. Ponto. Quem pode discutir sobre a constitucionalidade da lei é a corte constitucional, que não pertence ao Poder Judiciário. É um órgão constitucional, não é parte do Poder Judiciário. Não há Ministério Público na corte constitucional. A corte constitucional é outra coisa, é um grêmio escolhido pelo Parlamento.

            Existe uma regra no conselho constitucional, uma regra não escrita na corte constitucional alemã: sempre que vaga um cargo de juiz, ele é revezadamente ocupado pela Situação e pela Oposição. Um é pela Situação, um é pela Oposição, um é pela Situação, um é pela Oposição. Sempre existe esse consenso, sempre houve. Há um equilíbrio na composição da Corte Constitucional, e é o Parlamento quem indica. É claro, ele vai desautorizar o Parlamento.

            (Intervenção fora do microfone. Ininteligível.)

            O SR. EUGÊNIO JOSÉ GUILHERME DE ARAGÃO - Vai fazer isso através da corte constitucional.

            É o que eu digo. Isso é dentro de um modelo...

            (Intervenção fora do microfone. Ininteligível.)

            O SR. EUGÊNIO JOSÉ GUILHERME DE ARAGÃO - Deputado, eu estou falando que esse é um modelo burocrático. No modelo americano, por exemplo, em que o juiz pode declarar uma lei inconstitucional, tem que levar em consideração que o juiz é eleito. Se o juiz é eleito pelo voto, ele tem autoridade para dizer que uma lei é inconstitucional, mas um juiz que tem o cargo por concurso público não tem essa legitimidade. Ele não tem legitimidade política, ele tem uma legitimidade burocrática pela eficiência de sua decisão.

            Essa é uma questão que, parece-me, está saindo um pouco do tema, mas já que falamos sobre transparência de Judiciário... Não é isso?

            (Intervenção fora do microfone. Ininteligível.)

            O SR. EUGÊNIO JOSÉ GUILHERME DE ARAGÃO - Não são escolhidos.

            (Intervenção fora do microfone. Ininteligível.)

            O SR. EUGÊNIO JOSÉ GUILHERME DE ARAGÃO - Vamos continuar porque o tempo está avançado.

            Partidos de aluguel, a que V.Exa. se referiu. Em que espectro estão? Eu não digo que estão em espectro nenhum. Parece-me que os partidos de aluguel, na grande maioria, são esvaziados no seu conteúdo político porque eles são partidos de ocasião mesmo. Então não têm espectro.

            Eu só digo uma coisa: normalmente os partidos ideológicos de esquerda não são de aluguel. Só digo isso, não são de aluguel porque há um filtro muito rígido para seu ingresso e para ser parte dos seus quadros, mas, tirando o aspecto programático e ideológico, se ele é pequeno ele se presta a qualquer coisa, basta a pessoa ter condições de ser reeleita. Aí ele entra no partido.

            Eu não digo que não se deve dar chance para as pessoas, mas talvez o modo de essa chance ser dada talvez devesse ser mudado. Acho que os partidos deveriam ser mais permeáveis a dar chance para as pessoas que querem começar, em vez de permitir que elas criem infinitamente pequenos partidos.

            Questão do voto facultativo. Parece-me que é um outro aspecto importante aqui. Eu acho o seguinte: no Brasil, o voto não é obrigatório. Não é obrigatório porque o custo de a gente não votar é o quê? É de 3 reais a multa. Não tem voto obrigatório, é só pagar 3 reais e pronto, está tudo bem.

            (Não identificado) - Vai para a praia e justifica lá na praia.

            O SR. EUGÊNIO JOSÉ GUILHERME DE ARAGÃO - Não me parece que o voto é obrigatório, tanto é que nas eleições passadas nós tivemos um grande número de abstenções. É claro que, muitas vezes, foram geradas pela impossibilidade do transporte. O eleitor que mora nos rincões do interior não tem condições nem dinheiro para chegar à urna eletrônica. É um outro problema, um problema social.

            Num País como o nosso, de desigualdades muito grandes e de baixa densidade de consciência política, que é uma questão de educação, evidentemente, eu não acho ruim o voto obrigatório. Aliás, muitas pessoas com quem eu conversei em outros países acham a ideia muito boa porque eles têm um sério problema de legitimidade política. Hoje os países que têm voto facultativo têm eleições esvaziadas. Às vezes são 20% do eleitorado que tomam decisões.

            (Não identificado) - Realmente, a experiência que eu tenho... Só uma contribuição muito pequena...

            (Intervenção fora do microfone. Ininteligível.)

            (Não identificado) - Então vai lá. Conclua.

            O SR. EUGÊNIO JOSÉ GUILHERME DE ARAGÃO - Parece-me que, na nossa situação, dentro das nossas condições, o voto obrigatório não é um mal. Eu acho que o voto obrigatório é sim um processo necessário de inclusão. Nós estamos incluindo através do voto obrigatório, ainda mais porque é um custo simbólico, é só a chatice de ter que ir ao cartório depois pagar. Na verdade, não chega a penalizar ninguém profundamente.

            Tenho outras questões aqui, mas me parece que pelo adiantar da hora... Essas são as questões principais que foram perguntadas. Espero que eu tenha atendido a todos adequadamente. Peço desculpas se algum outro tema eu não tenha conseguido abordar com profundidade.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.

            (Palmas.)

            O SR. PRESIDENTE (Deputado Rubens Otoni) - Nós é que agradecemos.

            Com certeza o tempo não é suficiente para abordar temas tão profundos e sua multiplicidade, mas queremos aqui agradecer ao Dr. Eugênio José Guilherme de Aragão, Vice-Procurador-Geral Eleitoral, do Ministério Público Federal, por sua presença, participação e colaboração.

            Aproveito a oportunidade para passar ao nosso Relator, Marcelo Castro, as contribuições e sugestões dos internautas recebidas durante esta audiência, para que possam servir de referência no trabalho realizado.

            Nada mais havendo a tratar, agradeço a presença de todos e os convido para participarem da audiência pública na tarde de hoje, terça-feira, às 14h30, audiência essa que terá a presença do Presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Sr. José Antônio Dias Toffoli.

            Está encerrada a reunião.