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A primeira experiência parlamentar brasileira foi a Assembleia Geral, Constituinte e Legislativa do Império do Brasil, instalada em 3 de maio de 1823, no Rio de Janeiro. Essa data deu origem ao Dia do Parlamento. Embora tenha sido dissolvida, é reconhecida por historiadores como o início do Poder Legislativo no País, pois reuniu deputados eleitos para elaborar uma Constituição e dotar a nação de um novo ordenamento jurídico.

APRESENTAÇÃO

A Assembleia Geral Constituinte e Legislativa de 1823 do Império do Brasil, instalada no dia 3 de maio, reuniu representantes eleitos em todo o país para elaborar a Constituição e criar um ordenamento jurídico próprio do nascente Estado brasileiro. Ao longo de seis meses de intensa atividade parlamentar até seu fechamento por D. Pedro I, a Assembleia produziu decretos, leis, projetos de lei, um projeto de Constituição e outros documentos que refletem o debate público sobre a construção do país.

Diferentes grupos sociais acompanhavam os debates e decisões da Assembleia, manifestando suas demandas e interesses por meio de cartas, petições e representações enviadas à Constituinte. Administradores das províncias, cidadãos de diversas cidades do país e mesmo uma escrava produziram uma correspondência que revela múltiplas demandas e expectativas de vários estratos sociais.

Aquele foi um momento histórico excepcional do país: o debate parlamentar sobre a construção do Estado brasileiro recém-independente. O rico acervo documental da Assembleia Constituinte de 1823, sob a guarda do Arquivo Histórico da Câmara dos Deputados, recebeu, em 2013, o registro “Memória do Mundo”, conferido pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), pelo seu valor como patrimônio documental da humanidade.

DA CONVOCAÇÃO À INSTALAÇÃO

Decisão do Governo nº 57 de 19 de junho de 1822

Meses antes da Independência do país, em 3 de junho de 1822, os procuradores das províncias solicitaram ao príncipe regente a instalação de uma assembleia de representantes provinciais para elaborar uma Constituição do Brasil. No mesmo dia, D. Pedro editou decreto atendendo à reivindicação.

Em 19 de junho de 1822, foram expedidas as instruções para a eleição de 100 deputados das diversas províncias.

A Revolução do Porto, ocorrida em agosto de 1820 em Portugal, teria grande influência sobre os acontecimentos no Brasil. O movimento levou à instalação, no início de 1821, das Cortes Constituintes de Lisboa, com a participação de representantes brasileiros escolhidos por meio de eleições gerais, as primeiras ocorridas no Brasil. Seu objetivo era criar uma monarquia constitucional e dar fim ao absolutismo régio em Portugal.

Quadro “Sessão das Cortes de Lisboa”, de Oscar Pereira da Silva

As decisões adotadas pelas Cortes de Lisboa com o objetivo de retomar o controle colonial português sobre o Brasil e acabar com sua autonomia administrativa geraram forte resistência por parte desses representantes e da sociedade brasileira. Os deputados brasileiros estavam em minoria nas Cortes: eram 75 em um total de 205 membros, tendo efetivamente comparecido 50 parlamentares.

Nesse momento, a contestação do regime colonial e do absolutismo monárquico, inspirados pelo pensamento iluminista, fazia parte do debate público em todo o continente americano. No início da década de 1820, vários países já haviam conquistado sua independência nas Américas, constituindo regimes constitucionais com a garantia de direitos individuais.

Independência nas Ámericas

Quadro “Volta de D. João a Portugal”

Em abril de 1821, as Cortes portuguesas exigiram o retorno de D. João VI a Portugal, ficando D. Pedro como príncipe regente no Brasil. A insatisfação com as decisões das Cortes de acabar com a estrutura administrativa criada a partir de 1808 com a vinda da família real para o país se acentuou.

Coroação de D. Pedro I como Imperador

A Proclamação da Independência do país, em 7 de setembro de 1822, fez com que a Constituinte já convocada ganhasse novo sentido: a construção do novo Estado nacional.

As eleições nas províncias ocorreram em diferentes datas. Os conflitos pela independência continuavam em alguns locais, enquanto outras províncias ainda decidiam entre a adesão ao novo Estado e a manutenção dos elos com Portugal. Portanto, nem todas realizaram eleições para escolher seus representantes na Assembleia.

Algumas províncias passaram por conflitos intensos até sua adesão definitiva à independência do Brasil: Pará, Bahia, Maranhão, Cisplatina (atual Uruguai) e Piauí. Na época da Independência, o Brasil possuía cerca de 4 milhões de habitantes, distribuídos em 19 províncias.

Foram eleitos 88 deputados, mas 5 deles não assumiram o mandato. As eleições ocorreram com base no voto censitário: o direito ao voto foi conferido a uma parcela pequena da população que possuía uma renda anual mínima estabelecida, propriedade de terras e uma certa quantidade de mandioca plantada.

Quase todos os constituintes eram brasileiros natos, integrantes das elites provinciais. Entre os representantes eleitos havia padres, matemáticos, médicos, funcionários públicos, militares, bacharéis de direito, juízes, desembargadores.

Sob o ponto de vista político, havia pelo menos três grupos distintos: os que defendiam o poder absoluto do monarca, os que buscavam submeter o Imperador ao Legislativo e uma ala que tentava conciliar esses dois outros grupos.

Após as eleições, foram realizadas sessões preparatórias para verificação dos diplomas dos deputados eleitos e para elaboração de um regimento interno provisório.

3 de maio de 1823: sessão inaugural da Assembleia

A sessão contou com a presença de 52 parlamentares que já estavam na capital e somavam metade mais um do número previsto. Outros chegariam posteriormente, na medida em que novas províncias aderiam ao governo independente, resolvendo os conflitos com as tropas portuguesas e os grupos que ainda tinham interesse em manter o vínculo colonial com Lisboa. O Imperador abriu os trabalhos da Assembleia, fazendo seu pronunciamento.

Os representantes das províncias se reuniram para discutir, pela primeira vez, projetos comuns a todo o Brasil. 
Cabia à Assembleia elaborar a Constituição e exercer a função legislativa ordinária.

Reunião da Assembleia Constituinte. Ilustração/Notices of Brazil in 1828 and 1829

ATIVIDADE LEGISLATIVA

Presidência e Mesa da Assembleia

A Constituinte teve seis presidentes eleitos pelo voto dos parlamentares. Eles se revezaram no cargo, exercendo o mandato por um mês cada. Na escolha dos membros da Mesa, vice-presidente e secretários, foi adotado o mesmo procedimento.

Dom Jozé Caetano da Silva Coutinho

José Bonifácio de Andrada e Silva

Manoel Ferreira da Câmara Bithencourt Aguiar e Sá

José Egídio Álvares de Almeida – Barão de Santo Amaro

Martim Francisco Ribeiro de Andrada

José Severino Maciel da Costa

Projeto de Constituição, apresentado pela Comissão de Constituição em 1º de setembro de 1823

Regimento Interno

Uma comissão especial preparou um regimento provisório enquanto se elaborava o texto definitivo, que foi apresentado mas não chegou a ser votado integralmente.

Comissões

A Constituinte possuía Comissões Técnicas Permanentes e Comissões Especiais.

Regimento Interno:

Art. 146 – As Comissões Permanentes são: 1) da Constituição; 2) da Legislação e Justiça Civil e Criminal; 3) de Comércio, Agricultura, Indústria e Artes; 4) da Marinha e Guerra; 5) da Fazenda Nacional; 6) da Instrução Pública; 7) de Poderes; 8) do Eclesiástico; 9) da Estatística e Diplomática; 10) da Redação do Diário da Assembleia; 11) de Petições — de Saúde Pública — de Colonização, Catequese e Civilização dos Índios; 12) de Redação das Leis; 13) Comissão de Minas e Bosques; 14) da Polícia e Inspeção da Casa em que são membros natos o presidente e os dois primeiros-secretários.
Art. 146-A – Além destas Comissões Interiores haverá tantas Comissões Auxiliares de fora quantas a Assembleia julgar necessárias à requisição das respectivas Comissões Interiores.
Art. 147 – Para os casos ocorrentes que assim o exigirem, a Assembleia nomeará todas as Comissões Especiais que lhe parecerem.

O Projeto de Constituição

A Comissão de Constituição, criada em 5 de maio, possuía 7 membros e tinha como objetivo elaborar o projeto de Constituição que foi entregue em 1º de setembro de 1823, contendo 272 artigos.

A discussão do projeto de Constituição teve início em 15 de setembro, e 24 artigos foram aprovados após intenso debate. Os deputados demonstravam conhecimento sobre o que ocorria em outros países. Os princípios liberais permeavam os debates, embora o conservadorismo escravista dominasse amplamente as discussões.

“A decisão de que nenhuma prisão, ainda que legal, fora do flagrante delito, se faça sem ordem por escrito do juiz, é uma garantia da liberdade pessoal, porque evita arbítrios e despotismo dos juízes e firma mais a cada cidadão na posse dos direitos pessoais.”

Deputado Carvalho e Melo,
discussão do artigo 11 do projeto de Constituição.

O texto estabelecia a tripartição de poderes em Executivo, Legislativo e Judiciário, com predomínio do Legislativo sobre o Executivo; definia quem seria considerado brasileiro; e proclamava direitos individuais.

Atividades parlamentares

A Assembleia realizou 148 sessões e foram apresentados:

38

projetos de lei

o projeto
de regimento interno

7

requerimentos

157

indicações

237

pareceres

A ASSEMBLEIA E A SOCIEDADE

Pessoas de todo o país escreveram para a Assembleia fazendo pedidos, sugestões e reclamações por meio de petições, requerimentos, representações e outros. Os documentos contêm grande diversidade de temas e pluralidade de remetentes, que podiam ser uma mulher escravizada, um comerciante ou outros cidadãos.

A participação da sociedade estava prevista no art. 69 do Regimento Interno da Assembleia:

Art. 69 – A todo cidadão é lícito representar por meio do presidente da Assembleia, secretários, ou outro qualquer deputado, o que julgar proveitoso à nação.
Art. 70 – Para que as representações sejam aceitas, é necessário que venham assinadas e reconhecido o nome por um tabelião.

Requerimento de Maria Joaquina, escravizada

Consultas das províncias: Os governos das províncias de todo o país encaminharam consultas à Assembleia, que eram analisadas e recebiam parecer. A Constituinte procurou divulgar seu trabalho em todo o país por meio do envio do Diário da Assembleia para todas as Câmaras do Império, previsão constante de seu Regimento Interno:

Art. 212 – Será remetido o Diário da Assembleia a todas as Câmaras do Império; e será pago por aquelas que possam pagar; e as que por informações dos corregedores dadas as juntas da Fazenda não tiverem rendas, lhes será distribuído gratuitamente. Recomendar-se-á às Câmaras que convidem pessoas que assinem para este Diário. As Câmaras facilitarão a leitura do Diário a todos os cidadãos pelos meios que lhes parecerem mais próprios.

“Requerimento, sem data, de Maria Joaquina (escrava), preta de nação, solicitando sua liberdade segundo ação impetrada contra Felizarda Querubina da Silva, sua proprietária, visto já haver esta recebido outra escrava em troca, conforme combinado, e depois vendido a suplicante ao Sr. Domingos Alves Loureiro. Encaminhado à Comissão de Petições em 30/10/1823.”

EMBATES COM O IMPERADOR

Ao longo dos trabalhos da Assembleia, as relações desta com o Imperador foram se deteriorando. A apresentação do projeto de Constituição, em 1º de setembro, aumentou o atrito com D. Pedro I por limitar o poder do monarca e submeter as Forças Armadas ao Legislativo, entre outros. Crise política e crise militar passaram a fazer parte de um mesmo quadro.

A dissolução da Assembleia deu-se à uma hora da tarde de 12 de novembro de 1823

“Ao saírem os deputados, foram presos em nome de D. Pedro I: Antônio Carlos, Martim Francisco, Belchior, Fernandes Pinheiro, José Joaquim da Rocha e Francisco Gê Acayaba de Montesuma. Foram conduzidos ao cais do Largo do Paço, embarcados em um escaler guarnecido de tropa e levados ao arsenal da Marinha, acompanhados de quatro escaleres igualmente guarnecidos de tropa. ‘Tudo isto estava de antemão preparado. Antônio Carlos, ao sair preso e acompanhado de soldados, tirou o chapéu a uma peça de artilharia que estava apontada para a porta que ele acabara de franquear e disse: respeito muito o seu poder’”. José Bonifácio foi preso em casa. Também foram presos, e depois libertados: Vergueiro, Muniz Tavares, Henriques de Resende, Carneiro da Cunha, Alencar, Cruz Gouveia, Xavier de Carvalho e Luis Ignácio de Andrade Lima. Os primeiros presos foram postos na charrua ‘Luconia’ e exilados.”

Inventário analítico do arquivo da Assembleia Geral
Constituinte e Legislativa do Império do Brasil, 1823 / Edições Câmara

200 ANOS DA CONSTITUINTE DE 1823

O significado da Constituinte de 1823 ultrapassa seu curto tempo de duração. A Assembleia estava inserida no quadro mais amplo do processo de independência nacional e expressou o debate público travado na época, ao mesmo tempo que o incentivou, mantendo diálogo com a imprensa e com diversos setores da sociedade.

Vários dos deputados participantes haviam sido protagonistas em momentos anteriores, inclusive em movimentos locais de independência. Posteriormente, diversos constituintes continuariam a fazer parte da arena política nacional, ocupando cargos eletivos e na administração do Império e nas províncias.

Dos deputados que participaram da Constituinte, 27 seriam reeleitos em 1826 para a primeira legislatura do Império. Além disso, 33 seriam senadores, 28 ministros de Estado, 18 presidentes de província, 7 membros do primeiro conselho de Estado e 4 regentes do império.

Após a dissolução da Assembleia, D. Pedro encarregou o Conselho de Estado de redigir um novo projeto de Constituição. O texto foi apresentado ao Imperador no dia 11 de dezembro de 1823. A nova Constituição do Império foi jurada em 25 de março de 1824. O texto outorgado pelo Imperador tomou por base o projeto discutido na Assembleia, e 7 dos seus 10 signatários haviam sido constituintes.

A primeira experiência parlamentar brasileira foi a Assembleia Geral, Constituinte e Legislativa do Império do Brasil, instalada em 3 de maio de 1823, no Rio de Janeiro. Essa data deu origem ao Dia do Parlamento. Embora tenha sido dissolvida, é reconhecida por historiadores como o início do Poder Legislativo no País, pois reuniu deputados eleitos para elaborar uma Constituição e dotar a nação de um novo ordenamento jurídico.

APRESENTAÇÃO

A Assembleia Geral Constituinte e Legislativa de 1823 do Império do Brasil, instalada no dia 3 de maio, reuniu representantes eleitos em todo o país para elaborar a Constituição e criar um ordenamento jurídico próprio do nascente Estado brasileiro. Ao longo de seis meses de intensa atividade parlamentar até seu fechamento por D. Pedro I, a Assembleia produziu decretos, leis, projetos de lei, um projeto de Constituição e outros documentos que refletem o debate público sobre a construção do país.

Diferentes grupos sociais acompanhavam os debates e decisões da Assembleia, manifestando suas demandas e interesses por meio de cartas, petições e representações enviadas à Constituinte. Administradores das províncias, cidadãos de diversas cidades do país e mesmo uma escrava produziram uma correspondência que revela múltiplas demandas e expectativas de vários estratos sociais.

Aquele foi um momento histórico excepcional do país: o debate parlamentar sobre a construção do Estado brasileiro recém-independente. O rico acervo documental da Assembleia Constituinte de 1823, sob a guarda do Arquivo Histórico da Câmara dos Deputados, recebeu, em 2013, o registro “Memória do Mundo”, conferido pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), pelo seu valor como patrimônio documental da humanidade.

DA CONVOCAÇÃO À INSTALAÇÃO

Decisão do Governo nº 57 de 19 de junho de 1822

Meses antes da Independência do país, em 3 de junho de 1822, os procuradores das províncias solicitaram ao príncipe regente a instalação de uma assembleia de representantes provinciais para elaborar uma Constituição do Brasil. No mesmo dia, D. Pedro editou decreto atendendo à reivindicação.

A Revolução do Porto, ocorrida em agosto de 1820 em Portugal, teria grande influência sobre os acontecimentos no Brasil. O movimento levou à instalação, no início de 1821, das Cortes Constituintes de Lisboa, com a participação de representantes brasileiros escolhidos por meio de eleições gerais, as primeiras ocorridas no Brasil. Seu objetivo era criar uma monarquia constitucional e dar fim ao absolutismo régio em Portugal.

Quadro “Sessão das Cortes de Lisboa”, de Oscar Pereira da Silva

As decisões adotadas pelas Cortes de Lisboa com o objetivo de retomar o controle colonial português sobre o Brasil e acabar com sua autonomia administrativa geraram forte resistência por parte desses representantes e da sociedade brasileira. Os deputados brasileiros estavam em minoria nas Cortes: eram 75 em um total de 205 membros, tendo efetivamente comparecido 50 parlamentares.

Nesse momento, a contestação do regime colonial e do absolutismo monárquico, inspirados pelo pensamento iluminista, fazia parte do debate público em todo o continente americano. No início da década de 1820, vários países já haviam conquistado sua independência nas Américas, constituindo regimes constitucionais com a garantia de direitos individuais. 


Independência nas Ámericas

Quadro “Volta de D. João a Portugal”

Em abril de 1821, as Cortes portuguesas exigiram o retorno de D. João IV a Portugal, ficando D. Pedro como príncipe regente no Brasil. A insatisfação com as decisões das Cortes de acabar com a estrutura administrativa criada a partir de 1808 com a vinda da família real para o país se acentuou.

Coroação de D. Pedro I como Imperador

A Proclamação da Independência do país, em 7 de setembro de 1822, fez com que a Constituinte já convocada ganhasse novo sentido: a construção do novo Estado nacional.

As eleições nas províncias ocorreram em diferentes datas. Os conflitos pela independência continuavam em alguns locais, enquanto outras províncias ainda decidiam entre a adesão ao novo Estado e a manutenção dos elos com Portugal. Portanto, nem todas realizaram eleições para escolher seus representantes na Assembleia.

Algumas províncias passaram por conflitos intensos até sua adesão definitiva à independência do Brasil: Pará, Bahia, Maranhão, Cisplatina (atual Uruguai) e Piauí. Na época da Independência, o Brasil possuía cerca de 4 milhões de habitantes, distribuídos em 19 províncias.

Foram eleitos 88 deputados, mas 5 deles não assumiram o mandato. As eleições ocorreram com base no voto censitário: o direito ao voto foi conferido a uma parcela pequena da população que possuía uma renda anual mínima estabelecida, propriedade de terras e uma certa quantidade de mandioca plantada.

Províncias participantes e número de deputados eleitos:

Quase todos os constituintes eram brasileiros natos, integrantes das elites provinciais. Entre os representantes eleitos havia padres, matemáticos, médicos, funcionários públicos, militares, bacharéis de direito, juízes, desembargadores.

Sob o ponto de vista político, havia pelo menos três grupos distintos: os que defendiam o poder absoluto do monarca, os que buscavam submeter o Imperador ao Legislativo e uma ala que tentava conciliar esses dois outros grupos.

Após as eleições, foram realizadas sessões preparatórias para verificação dos diplomas dos deputados eleitos e para elaboração de um regimento interno provisório.

3 de maio de 1823: sessão inaugural da Assembleia

Reunião da Assembleia Constituinte. Ilustração/Notices of Brazil in 1828 and 1829

A sessão contou com a presença de 52 parlamentares que já estavam na capital e somavam metade mais um do número previsto. Outros chegariam posteriormente, na medida em que novas províncias aderiam ao governo independente, resolvendo os conflitos com as tropas portuguesas e os grupos que ainda tinham interesse em manter o vínculo colonial com Lisboa. O Imperador abriu os trabalhos da Assembleia, fazendo seu pronunciamento.

Os representantes das províncias se reuniram para discutir, pela primeira vez, projetos comuns a todo o Brasil. Cabia à Assembleia elaborar a Constituição e exercer a função legislativa ordinária.

“É hoje o dia maior, que o Brazil tem tido; dia em que elle pela primeira vez começa a mostrar ao mundo, que é imperio, e imperio livre. Quão grande é meu prazer, vendo juntos representantes de quasi todas as provincias fazerem conhecer umas ás outras seus interesses, e sobre elles bazearem uma justa e liberal constituição”.

Pronunciamento do Imperador D. Pedro I na abertura da 1ª sessão da Constituinte

ATIVIDADE LEGISLATIVA

Presidência e Mesa da Assembleia

A Constituinte teve seis presidentes eleitos pelo voto dos parlamentares. Eles se revezaram no cargo, exercendo o mandato por um mês cada. Na escolha dos membros da Mesa, vice-presidente e secretários, foi adotado o mesmo procedimento.

Dom Jozé Caetano da Silva Coutinho

José Bonifácio de Andrada e Silva

Manoel Ferreira da Câmara Bithencourt Aguiar e Sá

José Egídio Álvares de Almeida – Barão de Santo Amaro

Martim Francisco Ribeiro de Andrada

José Severino Maciel
da Costa

Regimento Interno

Uma comissão especial preparou um regimento provisório enquanto se elaborava o texto definitivo, que foi apresentado mas não chegou a ser votado integralmente.

Comissões

A Constituinte possuía Comissões Técnicas Permanentes e Comissões Especiais.

Regimento Interno:

Art. 146 – As Comissões Permanentes são: 1) da Constituição; 2) da Legislação e Justiça Civil e Criminal; 3) de Comércio, Agricultura, Indústria e Artes; 4) da Marinha e Guerra; 5) da Fazenda Nacional; 6) da Instrução Pública; 7) de Poderes; 8) do Eclesiástico; 9) da Estatística e Diplomática; 10) da Redação do Diário da Assembleia; 11) de Petições — de Saúde Pública — de Colonização, Catequese e Civilização dos Índios; 12) de Redação das Leis; 13) Comissão de Minas e Bosques; 14) da Polícia e Inspeção da Casa em que são membros natos o presidente e os dois primeiros-secretários.
Art. 146-A – Além destas Comissões Interiores haverá tantas Comissões Auxiliares de fora quantas a Assembleia julgar necessárias à requisição das respectivas Comissões Interiores.
Art. 147 – Para os casos ocorrentes que assim o exigirem, a Assembleia nomeará todas as Comissões Especiais que lhe parecerem.

Decisão do Governo nº 57 de 19 de junho de 1822

O Projeto de Constituição

A Comissão de Constituição, criada em 5 de maio, possuía 7 membros e tinha como objetivo elaborar o projeto de Constituição que foi entregue em 1º de setembro de 1823, contendo 272 artigos.

A discussão do projeto de Constituição teve início em 15 de setembro, e 24 artigos foram aprovados após intenso debate. Os deputados demonstravam conhecimento sobre o que ocorria em outros países. Os princípios liberais permeavam os debates, embora o conservadorismo escravista dominasse amplamente as discussões.

“A decisão de que nenhuma prisão, ainda que legal, fora do flagrante delito, se faça sem ordem por escrito do juiz, é uma garantia da liberdade pessoal, porque evita arbítrios e despotismo dos juízes e firma mais a cada cidadão na posse dos direitos pessoais.”

Deputado Carvalho e Melo, discussão do artigo 11 do projeto de Constituição.

O texto estabelecia a tripartição de poderes em Executivo, Legislativo e Judiciário, com predomínio do Legislativo sobre o Executivo; definia quem seria considerado brasileiro; e proclamava direitos individuais.

Atividades parlamentares

A Assembleia realizou 148 sessões e foram apresentados:

38

projetos de lei

o projeto
de regimento interno

157

indicações

7

requerimentos

237

pareceres

“Nós fizemos uma completa insurreição declarando-nos independentes; por esta heroica resolução caducou tudo quanto era de Portugal; e tanto que para fazer subsistentes as leis civis e criminais que dantes nos regiam, foi preciso que esta Assembleia as ratificasse inteiramente.”

Deputado Carneiro de Campos, discussão do projeto sobre confirmação da legislação.

A ASSEMBLEIA E
A SOCIEDADE

Pessoas de todo o país escreveram para a Assembleia fazendo pedidos, sugestões e reclamações por meio de petições, requerimentos, representações e outros. Os documentos contêm grande diversidade de temas e pluralidade de remetentes, que podiam ser uma mulher escravizada, um comerciante ou outros cidadãos.

A participação da sociedade estava prevista no art. 69 do Regimento Interno da Assembleia:

Art. 69 – A todo cidadão é lícito representar por meio do presidente da Assembleia, secretários, ou outro qualquer deputado, o que julgar proveitoso à nação.
Art. 70 – Para que as representações sejam aceitas, é necessário que venham assinadas e reconhecido o nome por um tabelião.

Consultas das províncias: Os governos das províncias de todo o país encaminharam consultas à Assembleia, que eram analisadas e recebiam parecer. A Constituinte procurou divulgar seu trabalho em todo o país por meio do envio do Diário da Assembleia para todas as Câmaras do Império, previsão constante de seu Regimento Interno:

Art. 212 – Será remetido o Diário da Assembleia a todas as Câmaras do Império; e será pago por aquelas que possam pagar; e as que por informações dos corregedores dadas as juntas da Fazenda não tiverem rendas, lhes será distribuído gratuitamente. Recomendar-se-á às Câmaras que convidem pessoas que assinem para este Diário. As Câmaras facilitarão a leitura do Diário a todos os cidadãos pelos meios que lhes parecerem mais próprios.

Requerimento de Maria Joaquina, escravizada

“Requerimento, sem data, de Maria Joaquina (escrava), preta de nação, solicitando sua liberdade segundo ação impetrada contra Felizarda Querubina da Silva, sua proprietária, visto já haver esta recebido outra escrava em troca, conforme combinado, e depois vendido a suplicante ao Sr. Domingos Alves Loureiro. Encaminhado à Comissão de Petições em 30/10/1823.”

EMBATES COM O IMPERADOR

Ao longo dos trabalhos da Assembleia, as relações desta com o Imperador foram se deteriorando. A apresentação do projeto de Constituição, em 1º de setembro, aumentou o atrito com D. Pedro I por limitar o poder do monarca e submeter as Forças Armadas ao Legislativo, entre outros. Crise política e crise militar passaram a fazer parte de um mesmo quadro.

Tropas do brigadeiro José Manuel de Morais, que foi à Assembleia com o decreto imperial de dissolução da Constituinte.

A dissolução da Assembleia deu-se à uma hora da tarde de 12 de novembro de 1823

“Ao saírem os deputados, foram presos em nome de D. Pedro I: Antônio Carlos, Martim Francisco, Belchior, Fernandes Pinheiro, José Joaquim da Rocha e Francisco Gê Acayaba de Montesuma. Foram conduzidos ao cais do Largo do Paço, embarcados em um escaler guarnecido de tropa e levados ao arsenal da Marinha, acompanhados de quatro escaleres igualmente guarnecidos de tropa. ‘Tudo isto estava de antemão preparado. Antônio Carlos, ao sair preso e acompanhado de soldados, tirou o chapéu a uma peça de artilharia que estava apontada para a porta que ele acabara de franquear e disse: respeito muito o seu poder’”. José Bonifácio foi preso em casa. Também foram presos, e depois libertados: Vergueiro, Muniz Tavares, Henriques de Resende, Carneiro da Cunha, Alencar, Cruz Gouveia, Xavier de Carvalho e Luis Ignácio de Andrade Lima. Os primeiros presos foram postos na charrua ‘Luconia’ e exilados.”

Inventário analítico do arquivo da Assembleia Geral Constituinte e Legislativa do Império do Brasil, 1823 / Edições Câmara

200 ANOS DA
CONSTITUINTE DE 1823

O significado da Constituinte de 1823 ultrapassa seu curto tempo de duração. A Assembleia estava inserida no quadro mais amplo do processo de independência nacional e expressou o debate público travado na época, ao mesmo tempo que o incentivou, mantendo diálogo com a imprensa e com diversos setores da sociedade.

Vários dos deputados participantes haviam sido protagonistas em momentos anteriores, inclusive em movimentos locais de independência. Posteriormente, diversos constituintes continuariam a fazer parte da arena política nacional, ocupando cargos eletivos e na administração do Império e nas províncias.

Dos deputados que participaram da Constituinte, 27 seriam reeleitos em 1826 para a primeira legislatura do Império. Além disso, 33 seriam senadores, 28 ministros de Estado, 18 presidentes de província, 7 membros do primeiro conselho de Estado e 4 regentes do império.

Após a dissolução da Assembleia, D. Pedro encarregou o Conselho de Estado de redigir um novo projeto de Constituição. O texto foi apresentado ao Imperador no dia 11 de dezembro de 1823. A nova Constituição do Império foi jurada em 25 de março de 1824. O texto outorgado pelo Imperador tomou por base o projeto discutido na Assembleia, e 7 dos seus 10 signatários haviam sido constituintes.

Exposição 200 Anos da Constituinte de 1823

Visitação de 25 de abril a 5 de maio de 2023, segunda a sexta, das 9h às 17h
Corredor Tereza de Benguela | Câmara dos Deputados

REALIZAÇÃO Centro Cultural Câmara dos Deputados | CURADORIA Debora Bithiah de Azevedo | PESQUISA DE IMAGENS Laila Monaiar e Vânia Lúcia Alheiro Rosa | PRODUÇÃO Clarissa de Castro, Juliana Baeza Cals (FAAP) | PROJETO GRÁFICO Ely Borges | INFOGRÁFICO Thiago Fagundes, Rafael Teodoro