CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ

Sessão: 153.1.55.O Hora: 15:57 Fase: GE
Orador: LUIZ COUTO, PT-PB Data: 15/06/2015

O SR. LUIZ COUTO (PT-PB. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, em primeiro lugar, eu queria agradecer ao Deputado Glauber Braga, do PSB do Rio de Janeiro, a concessão do tempo reservado para seu pronunciamento. S.Exa. é um Deputado combativo, referência nesta Casa e no Estado onde milita pela coerência entre seu discurso e sua prática.

Eu também queria me associar ao pronunciamento do Deputado Wadson Ribeiro e manifestar minhas condolências ao povo brasileiro, em particular ao povo mineiro, que perdeu uma figura importante. Canção da América sempre foi uma referência, Coração de Estudante foi símbolo na luta pelas Diretas Já. Ele sempre estava presente. Nossa solidariedade por esta grande perda! Mas agora Fernando Brant vai se associar a outros autores e cantores e tocadores de sanfona no céu e com certeza compor muitos hinos de louvor a Deus e à Trindade Santa!

Sr. Presidente, eu tenho posição clara contrária à redução da maioridade penal e hoje vou falar tomando como referência um conjunto de ações da Psicologia. Vários psicólogos colocam dez razões para a não redução da maioridade penal.

A redução da maioridade penal está sendo oxigenada por um fundamentalismo exaurido de inverdades, cortinas de fumaças e exageros radicais como se fosse um grupo terrorista que destina seu extermínio a uma falsa resolução de problemas derivados da chamada violência, especialmente do aumento da criminalidade.

A emenda que deu origem a essa situação é a Emenda nº 171, número do artigo do Código Penal que tipifica o crime de estelionato. Ou seja, é uma enganação achar que, reduzindo a maioridade penal, vamos resolver o problema da criminalidade, da violência. O problema da violência é o mau exemplo dado pelos adultos, é o crime organizado, que está aliciando, recrutando crianças e adolescentes, é a ação das quadrilhas, das organizações criminosas, é a violência praticada contra esses adolescentes, que na sua infância foram estuprados, sofreram violência, maus-tratos, tratamentos cruéis e desumanos.

Querem reduzir a maioridade penal porque o ato infracional cometido por esses adolescentes atinge o patrimônio. Quarenta e seis por cento daqueles que estão internados em centros de recuperação praticaram roubos. Essa é a razão do ódio, da ira daqueles que possuem propriedade, porque estão se sentindo ameaçados.

O que seria dos adolescentes e jovens se todos alcançassem disciplinas educadoras, se todos tivessem educação - mas não têm -, se todos tivessem políticas públicas, se todos fossem evangelizados pela educação social, se todos tivessem suas necessidades básicas supridas em seus lares, se todos tivessem direito a políticas sociais, se todos fossem tratados sem distinção de raça, cor e etnias? O que seria dos adolescentes e jovens brasileiros se tudo isso fosse o mundo real? Mas não é, é um mundo imaginário. É a velha história: quem leva a culpa pelo que está errado na casa é sempre o menor. Vamos colocar a culpa, a máscara naqueles que defendem a redução da maioridade penal, que não foram capazes de estabelecer políticas para enfrentar a violência contra jovens, crianças e adolescentes.

É exatamente isso, senhores e senhoras, as medidas de redução de direitos, principalmente no que se refere à redução da maioridade penal e do aumento do período de internação, atingem principalmente os adolescentes e jovens marginalizados, negros, aqueles que moram na periferia, que já tiveram todos os seus direitos de sobrevivência negados previamente. As violências cometidas não têm sua origem em nenhum desvio humano dos adolescentes, e sim de uma realidade brutal e de negação de direitos que levam esses adolescentes a cometer tais atos. Por isso, devemos maltratá-los, jogando-os em presídios desumanos ou devemos de fato resolver os problemas sociais, educacionais e psicológicos deles?

Segundo psicólogos brasileiros, há um aumento exorbitante de jovens e adolescentes procurando consultórios psicológicos no Brasil. Há também pais e mães que os levam para resolver problemas que eles não conseguiram tratar. Os principais motivos são diversos: problemas com a família, desilusões amorosas, dificuldade de se expressar ou de fazer amigos. Os jovens estão pondo em xeque o famoso "é só uma fase" para firmar seus problemas perante a sociedade e tratá-los tão seriamente quanto acreditam ser necessário.

Resgatando o pensamento do sociólogo, falecido em 1997, Herbert de Souza, o Betinho, do IBASE - Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas: "Se não vejo, na criança, uma criança é porque alguém a violentou antes; e o que vejo é o que sobrou de tudo o que lhe foi tirado". Isso demonstra que os adolescentes e os jovens são violentados quando não possuem os direitos necessários ao seu crescimento, e ainda querem violentá-los e transformá-los em operadores do crime e jogá-los nos presídios junto com os adultos. Vão sair de lá, se não morrerem, com doutorado em crime porque cometeram infrações. Colocar adolescentes nas masmorras que são as prisões brasileiras é dizer: "Agora vamos eliminá-los". Não bastar reduzir a maioridade.

Sr. Presidente, uma entidade de psicologia do Rio Grande do Sul separou dez razões psicológicas contra a redução da maioridade penal. Mas antes de falar sobre elas, concedo aparte ao Deputado Zé Geraldo.

O Sr. Zé Geraldo - Deputado Luiz Couto, parabéns por trazer este debate para o seu grande pronunciamento. No final de semana próximo passado eu fui a Havana, Cuba, e conversei com várias autoridades cubanas - os Ministros do Esporte, que lá não se chama Ministro, mas Presidente, da Saúde, da Educação, do Partido Comunista -, e com pessoas nas ruas. Lá, Deputado Luiz Couto, pode-se sair pela cidade - e Havana não é uma capital com pouca gente - às 3, 4, 5 horas da manhã sem medo de ser assaltado. Em qualquer cidade brasileira, de São Paulo a menor cidade do Pará ou do Rio Grande do Sul, todos têm medo de sair às ruas. E nós sabemos que uma das grandes desgraças do nosso País são as drogas, drogas violentas. Mas lá a juventude estuda, e estuda ideologia. Aqui qual é a ideologia para nossos jovens? Consumo! Ligam a televisão ou o rádio dia e noite: consumo, consumo, consumo, consumo. E os jovens muitas vezes não têm recursos para comprar aquilo que se incentiva comprar. V.Exa. tem razão: a juventude vive um momento difícil. Lá, Deputado Luiz Couto, tomando um pouquinho mais do seu pronunciamento, o jovem serve ao Exército durante 3 anos. Aqui, 1 ano. Ou seja, já fica 2 anos a mais em uma organização de disciplina. Eu penso que nós precisamos cada vez mais investir na educação, para que nossa juventude possa realmente aprender outros valores - e que nossa educação possa também ensinar outros valores, não só Matemática, Português, História, Inglês - e pare de pensar que para ser feliz precisa de um bom celular, de uma boa moto ou de um bom carro. É isso que os meios de comunicação, a nossa televisão, passam para a cabeça da nossa juventude todos os dias. Diminuir a maioridade penal não vai diminuir os crimes no País.

O SR. LUIZ COUTO - Muito obrigado, Deputado Zé Geraldo. Gostaria que o aparte de V.Exa. constasse do meu pronunciamento.

Primeira razão apresentada pelos psicólogos do Rio Grande do Sul: a adolescência é uma das fases do desenvolvimento dos indivíduos e, por ser um período de grandes transformações, deve ser pensada pela perspectiva educativa. O desafio da sociedade é educar seus jovens, adolescentes e crianças, permitindo um desenvolvimento adequado tanto do ponto de vista emocional e social quanto físico. Por isso, investir em educação, em esporte, em políticas públicas é fundamental para fazer com que o jovem possa aprender uma arte e estar associado à luta pela cultura.

Segunda: é urgente garantir o tempo social de infância e juventude com escola de qualidade, visando dar condições aos jovens para o exercício e a vivência da cidadania, que permitirão a construção dos papéis sociais para a constituição da própria sociedade.

Terceira razão: a adolescência é momento de passagem da infância para a vida adulta. A inserção do jovem no mundo adulto prevê em nossa sociedade ações que assegurem seu ingresso, de modo a oferecer-lhe as condições sociais e legais, bem como as capacidades educacionais e emocionais necessárias. É preciso garantir essas condições para todos os adolescentes.

Quarta: a adolescência é momento importante na construção de um projeto de vida adulta. Toda atuação da sociedade voltada para essa fase deve ser guiada pela perspectiva da orientação. Um projeto de vida não se constrói com segregação, e sim pela orientação escolar e profissional ao longo da vida, no sistema de educação e trabalho.

Quinta razão: o Estatuto da Criança e do Adolescente propõe responsabilização do adolescente que comete ato infracional com aplicação de medidas socioeducativas. O ECA não propõe impunidade, como muitos querem dizer. É adequando, do ponto de vista da Psicologia, uma sociedade buscar corrigir a conduta dos seus cidadãos a partir de uma perspectiva educacional, principalmente em se tratando de adolescentes.

Sexta: o critério de fixação da maioridade penal é social, cultural e político, sendo expressão da forma como uma sociedade lida com os conflitos e questões que caracterizam a juventude; implica a eleição de uma lógica que pode ser repressiva ou educativa. Os psicólogos sabem que a repressão não é uma forma adequada de conduta para a construção de sujeitos sadios. Reduzir a idade penal reduz a igualdade social, e não a violência. Ameaça não previne e punição não corrige.

Sétima razão: as decisões da sociedade em todos os âmbitos não devem jamais desviar a atenção daqueles que nela vivem, das causas reais de seus problemas. Uma das causas da violência está na imensa desigualdade social e, consequentemente, nas péssimas condições de vida a que estão submetidos alguns cidadãos. É por isso que as infrações maiores são de roubos; a segunda, de tráfico de drogas, o recrutamento feito pelo crime organizado, pelo narcotráfico. A taxa de homicídios é de 0,01%, segundo os dados do Conselho Nacional de Justiça. O debate sobre a redução da maioridade penal é um recorte dos problemas sociais brasileiros que reduz e simplifica a questão.

Oitava: a violência não é solucionada pela culpabilização e pela punição, antes, pela ação nas instâncias psíquicas, sociais, políticas e econômicas que a produzem. Agir punindo e sem se preocupar em revelar os mecanismos produtores e mantenedores da violência tem como um de seus defeitos principais aumentar a violência.

Nona razão: reduzir a maioridade penal é tratar o efeito, não a causa; é encarcerar mais cedo a população pobre jovem, apostando que ela não tem outro destino ou possibilidade.

Só para V.Exa. ter um dado, Deputado: nos últimos 10 anos, a faixa etária em que mais cresceu o número de mortes, de homicídios por armas de fogo, foi de 10 a 14 anos. O Mapa da Violência coloca que são os adolescentes e os jovens as maiores vítimas da violência por arma de fogo. São jovens pobres, negros, que moram nas periferias, afrodescendentes.

Nesse sentido, sem possibilidade, sem acolhimento, sem condição de viver plenamente na relação familiar - com a desintegração também da família -, como exigir que um adolescente, vítima da violência, de estupros, de exploração sexual, de maus-tratos, de tortura, de espancamentos, de todo tipo de violência, sem ter educação, espiritualidade, família que o integre, como exigir dele outra coisa senão cometer infrações? Mas é importante destacar que, mesmo quando comete infrações, tem o internamento, que muitas vezes é maior do que o de alguns presos que conseguem redução da pena e logo são soltos. Se tiver uma boa banca de advogados, logo se solta.

Décima e última razão: reduzir a maioridade penal isenta o Estado do compromisso com a construção de políticas educativas e de atenção para com a juventude. Nossa posição é de reforço a políticas públicas que tenham a adolescência sadia como meta.

Essas são as dez razões colocadas por pessoas que estudaram o ser humano, psicólogos, sob o ponto de vista da Psicologia, do porquê de não se dever reduzir a maioridade penal.

Concedo aparte ao Deputado Gonzaga Patriota.

O Sr. Gonzaga Patriota - Eu serei breve, Deputado Luiz Couto, e V.Exa. há pouco fez aparte ao meu pronunciamento de apoio à interligação do Rio Tocantins com o Rio São Francisco. Eu tenho uma proposta de emenda à Constituição sobre a maioridade geral. Eu penso também como V.Exa.: por que só a maioridade penal? Por que não a maioridade geral? Os tempos mudaram. Esse negócio de meninos com 18 anos tem 60 anos. Os meninos eram abestalhados, hoje estão danados. Minha proposta de emenda à Constituição é para o rapaz com 16 anos ser homem: fazer concurso, vestibular, sem esse problema que está aí, candidatar-se a Vereador. Nessa semana a gente aprovou abaixar a maioridade para candidatos a Prefeito, Governador e Presidente da República. Os tempos mudaram. As crianças são outras. Não dá mais para ter maioridade só a partir de 18 anos no geral: menino com 16 anos fazer concurso público; menino com 16 anos tirar habilitação, casar, virar homem. Ora, se ele fizer alguma coisa errada, vai pagar, como pagam os outros. Não dá para continuar como está: essa meninada matando a mando de outro. Nós temos que fazer as duas coisas aqui: a maioridade geral e, ao mesmo tempo, dar condições para que os adolescentes de 14 ou 15 anos não venham a fazer o que estão fazendo agora os que têm menos de 18 anos. Portanto, quero me associar ao pronunciamento de V.Exa., dizendo que minha PEC é mais ampla, propõe a maioridade geral e não apenas a maioridade penal, como V.Exa. mostra nesses dez pontos.

O SR. LUIZ COUTO - Nós temos, Deputado Gonzaga Patriota, que investir na educação: educação para todos, educação de qualidade, educação para a cidadania. Aí sim você terá escola de tempo integral, dará oportunidade ao adolescente de aprender uma profissão, uma arte, um esporte. O esporte qualifica. A gente sabe de muitos que poderiam estar num espaço onde a violência seria a máxima, mas foram integrados numa escola da música, das artes, do esporte, enfim, trabalhando aquilo que é fundamental na vida do ser humano, o seu espírito, o sopro que Deus coloca sobre cada um de nós para que possamos viver com dignidade. Está assegurada na Constituição que todas as ações do Estado são para assegurar a dignidade da pessoa humana. Infelizmente, essa dignidade não está sendo respeitada, está sendo roubada. Precisamos fazer o nosso papel.

O que acontece? A grande maioria desses adolescentes é recrutada e aliciada pelo crime organizado. Então, a gente pune o adolescente, mas o cara está solto, traficando armas, cometendo uma série de ações criminosas. Enquanto isso, nosso adolescente está sendo vítima de acusações. Na realidade, ele é internado porque o juiz determina, e pode determinar, como fez agora em São Paulo, que o adolescente fique mais tempo na cadeia. Por quê? Porque tem um desvio de personalidade. E o juiz não vai liberar enquanto não for mostrado que ele pode ser recuperado através de um trabalho interdisciplinar, que é fundamental. O SINASE - Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo coloca isso, mas infelizmente essa situação não acontece.

Concluindo, afirmo ser um erro reduzir a maioridade penal no Brasil. Não temos estrutura psicológica para suportar tal exagero cometido pelos conceitos distorcidos da violência. A delinquência juvenil é, portanto, um indicador de que o Estado, a sociedade e a família não têm cumprido adequadamente seu dever de assegurar com absoluta prioridade os direitos da criança e do adolescente.

Do ponto de vista da Psicologia, enquanto ciência, a tese do ser humano em desenvolvimento observa a correlação entre as práticas parentais e a manifestação do comportamento antissocial. Constata-se, entre os adolescentes em conflito com a lei, a ausência de práticas parentais positivas, aquelas em que o afeto e o acompanhamento dos pais estão presentes, sobretudo nas famílias em risco social. Esse fato afasta a informação simplista da existência de sujeitos biologicamente predispostos a cometer delitos.

Sr. Presidente, solicito que seja dada a devida publicidade a este pronunciamento nos meios de comunicação desta Casa, inclusive no programa A Voz do Brasil.