CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ

Sessão: 59673 Hora: 09:48 Fase:
Orador: Data: 10/06/2020

O SR. PRESIDENTE DA CÂMARA DOS DEPUTADOS (Rodrigo Maia. Bloco/DEM - RJ) - Declaro aberto o seminário destinado a debater o tema A Importância da Renda Emergencial e os Desafios da Seguridade Social, proposta coordenada pela Comissão Externa de Ações Contra o Coronavírus, presidida pelo Deputado Dr. Luizinho, junto com a Deputada Carmen Zanotto.

Agradeço muito aos convidados por estarem aqui. São eles o Marcelo Reis Garcia; o Martim Cavalcanti; a Monica de Bolle; a Paola Carvalho, que será a nossa moderadora; o Rogério Barbosa; e a Tereza Campello. Muito obrigado a todos.

Agradeço também aos Deputados e às Deputadas.

Acredito que este é um debate fundamental, não apenas no que diz respeito à renda emergencial, mas também no que diz respeito aos desafios que ficarão, decorrentes da pandemia, em relação aos mais vulneráveis do nosso País.

Passo a palavra à Paola Carvalho, para que possa dar início ao nosso seminário.

Muito obrigado e bom dia a todos.

A SRA. COORDENADORA (Paola Carvalho) - Bom dia.

Obrigada, Sr. Presidente da Câmara dos Deputados, que propôs a realização deste seminário, junto com a Comissão Externa de Ações Contra o Coronavírus, agora de manhã, destinado ao debate do tema A Importância da Renda Emergencial e os Desafios da Seguridade Social.

Ele está sendo transmitido pela TV Câmara e também pelo Youtube, em canais disponíveis. Acredito que no Facebook da TV Câmara ele também está sendo transmitido. Então, através desses canais e também do e-mail da Câmara Federal, nós poderemos receber os questionamentos para a nossa mesa de debates, que, ao final, poderá responder-lhes.

Nossa dinâmica será a seguinte: assim que eu apresentar os participantes desta Mesa, cada um de nós poderemos falar por 15 minutos, para expor a nossa posição sobre a renda emergencial de 600 reais ou de 1.200 reais, que foi aprovada pela Câmara Federal e pelo Senado para o enfrentamento da crise do coronavírus, e sobre o atendimento às pessoas no Brasil em situação de trabalho informal, a autônomos e desempregados registrados no Cadastro Único.

É importante lembrar que a nossa discussão vai até às 11h30min.

Eu vou apresentar quem compõe a nossa Mesa de debate: Martim Cavalcanti, Secretário Executivo Adjunto do Ministério da Cidadania, que representa oficialmente aqui o Ministério da Cidadania - seja bem-vindo, Martim; Monica de Bolle, pesquisadora, economista - especialista, ela é a nossa economista de mais longe, que sempre contribui para o debate da renda básica no Brasil e que tem-se posicionado muito fortemente sobre esse debate; Marcelo Reis Garcia, assistente social, professor de práticas sociais, foi Secretário Nacional de Assistência Social, Secretário Municipal de Assistência Social do Rio de Janeiro e agora é membro titular da Comissão Intergestora Tripartite do Sistema Único de Assistência Social e Coordenador Nacional do Cadastro Único dos Programas Sociais - bem-vindo, Marcelo; Rogério Barbosa, doutor em sociologia pela USP, pós-doutor em ciência política também pela USP e pesquisador da Universidade de Columbia - bem-vindo, Rogério; e a ex-Ministra do Desenvolvimento Social e Combate à Fome Tereza Campello, que coordenou no Brasil o Plano Brasil Sem Miséria, que tem um currículo vasto na área da proteção social e é também economista;

e eu que, além de moderadora, também sou assistente social e faço parte da Rede Brasileira de Renda Básica, sou Diretora de Relações Institucionais, e hoje aqui nesta mesa represento as 162 entidades que mobilizam o movimento Renda Básica que Queremos.

Vamos logo dar início ao seminário. Estamos no adiantado da hora e já perdemos alguns minutos iniciais. Nós fizemos antes uma combinação de como organizaríamos a Mesa.

Então, de imediato, passo a palavra ao Marcelo Reis Garcia, pelo tempo de 15 minutos, para suas considerações.

O SR. MARCELO REIS GARCIA - Bom dia, Paola; bom dia, Rogério; bom dia, Ministra Tereza; bom dia, Secretário Martim; bom dia, Monica. Agradeço ao Presidente Rodrigo Maia o convite, a oportunidade para este debate.

Vou fazer só uma correção no currículo: eu não sou membro do Conselho Nacional, nem membro da Comissão Intergestores Tripartite. Eu fui. Eu não faço parte do Governo atual. Eu fui membro da Comissão Intergestores Tripartite e também do Conselho Nacional e fui Presidente do Colegiado Nacional de Gestores Municipais de Assistência Social. Atualmente estou trabalhando com práticas sociais, ajudando o Governo de Goiás na discussão de enfrentamento das questões sociais da epidemia aqui em Goiás.

Eu comecei às 9h53min e tenho 15 minutos. Então, vamos lá. Eu fiquei muito satisfeito por este debate surgir, porque, desde março, nós estamos trabalhando nisso, num grupo do Instituto Liberdade e Cidadania. Nós produzimos o primeiro protocolo social no Brasil sobre a questão da epidemia. Eu tinha certeza de que a epidemia iria atingir os mais pobres. Fizemos uma discussão longa sobre a importância da proteção social frente à epidemia, que começou na classe média, começou na elite, mas ela se pauperizou e quem está sendo mais atingido neste momento, de longe, são os pobres.

Recentemente, fiz um texto rápido e quero compartilhar com vocês um parágrafo que me chamou muita a atenção:

Um amigo executivo de uma holding de São Paulo estava alugando um prédio para as equipes. Desistiu do aluguel, pois, para ele, o trabalho em casa gerou muitos benefícios econômicos para a empresa. Ao não alugar o prédio, não terão acesso a emprego porteiros, vigilantes, serventes, copeiros. Ao não saírem de casa, a demanda de transporte coletivo vai diminuir. Ao ficarem em casa, motoristas de aplicativo perderão clientes; táxis enfrentarão filas gigantescas para conseguir uma corrida. As reuniões que demandavam viagens, compras de passagens aéreas são feitas pelo Zoom, cada um de sua casa, de sua cidade, Estado ou país. Os setores hoteleiro e aéreo vão perder muito sem as reuniões de negócios. Serão menos recepcionistas, manobristas, secretárias para emitir passagem e motoristas para buscar as pessoas em aeroportos. Serão menos voos e, assim, menos comissários e pilotos, bem como menos pessoas trabalhando em aeroportos. Sem o escritório, os almoços em restaurantes finos e lanchonetes serão esvaziados e, assim, menos cozinheiras, ajudantes de cozinha; garçons serão dispensados. Na realidade, não estamos vivendo a crise do desemprego, mas uma crise real de emprego.

O que eu aponto nesse texto e quero aprofundar levemente é que, ao nos depararmos com a epidemia, muitos acordaram e viram que estamos em 2021, a modernidade existe, os prédios estão sendo fechados, as pessoas estão trabalhando em casa, mas a cadeia produtiva dos mais pobres está sendo desempregada com muita força. Os pedidos de seguro-desemprego cresceram enormemente no Brasil. Isso, sem dúvida nenhuma, mostra que temos um problema concreto. Não temos condições de, ao terminar um emprego, não garantir seguridade social; ao terminar um emprego, não garantir proteção social.

Mas vivemos uma dicotomia no Brasil, e essa dicotomia é muito forte quando vamos discutir seguridade social, porque o nosso primeiro desafio hoje no Brasil é não permitir a morte da seguridade social. Esse, para mim, é o primeiro desafio. O tempo inteiro, o que está acontecendo são mostras do Ministério da Economia de que a seguridade social pode ser desprezada, de que a seguridade social pode ser desmontada.

Não foi fácil, no Brasil, construir o que temos de seguridade social. A nossa proteção social não é perfeita, mas ela era muito mais imperfeita 20 anos atrás. Se andarmos 30 anos para trás, ela era mais imperfeita ainda. Houve uma corrida de revezamento muito forte. Eu participei dessa corrida; a Ministra Tereza Campello participou dessa corrida; o Ministro Patrus Ananias participou dessa corrida; a Ministra Márcia Lopes participou dessa corrida; a Ministra Benedita participou dessa corrida; a Ministra Wanda Engel participou dessa corrida. Um grupo, inclusive muito plural de pensamentos, participou dessa corrida de revezamento para chegarmos a um patamar de proteção social no Brasil.

Esse patamar de proteção social no Brasil começa a ser desmontado a partir de 2016 e segue sendo desmontado. Só que, a partir de 2019, o desmonte ficou evidente. Desde 2019, a seguridade social brasileira corre severos riscos. E quando eu digo que corre, é porque corre mesmo.

Nós estamos com problemas graves no Sistema Único de Assistência Social, por exemplo. O SUAS foi uma conquista democrática que aconteceu em 2003, numa deliberação da Conferência Nacional de Assistência Social. Ele foi construído, a partir de 2004, por muita gente. E digo que participei desse processo todo, com pessoas que ideologicamente tinham algumas ou muitas divergências, mas o que estava em jogo era garantir a construção de uma rede de proteção social no País. Essa questão era muito importante. Não podíamos abrir mão desse conceito de proteção social.

Hoje, eu escuto palavras, eu escuto frases que me mostram claramente que a proteção social brasileira pode e deve ser desmontada, pode e deve ser sucateada. O melhor exemplo disso foi a decisão do Ministério da Economia e do Ministério da Cidadania de descartar os trabalhadores do Sistema Único de Assistência Social - assistentes sociais, psicólogos, pedagogos, sociólogos -, que trabalham numa rede no Brasil de mais de 6 mil CRAS, os Centros de Referência de Assistência Social, na questão do Cadastro Único.

O aplicativo não resolveu a questão do Cadastro Único, e por isso há tantas irregularidades nesse cadastro. Dispensaram, sem eu saber por que, quem fazia isso há 20 anos com muita qualidade. O Cadastro Único brasileiro, até esse momento, era considerado exemplar no Brasil inteiro.

Ele começou em 2001, no Governo Fernando Henrique, passou pelo Governo Lula, passou pelo Governo Dilma, e foi se aperfeiçoando, como eu disse, numa corrida de revezamento.

A decisão de a Caixa Econômica Federal comandar o processo de cadastramento é, deliberadamente, uma afronta à seguridade social brasileira. Nós não estamos precisando de um processo de bancarização no Brasil. Nós estamos precisando de um processo de fortalecimento da proteção social no Brasil, e a proteção social no Brasil está sendo sucateada, desmontada.

Este espaço é fundamental para fazermos denúncia. Recursos para o funcionamento de Centros de Referência de Assistência Social e Centros de Referência Especializados de Assistência Social - CREAS estão sendo bloqueados. Há pelo menos 2 meses não se repassam recursos do Fundo Nacional de Assistência Social para o custeio dos CRAS e dos CREAS.

A Caixa Econômica e o Ministério da Economia estão pautando o debate social no País. Aliás, estão pautando o debate do não direito social no País. A cada fala do Ministro Paulo Guedes fica claro que ele defende o não direito, ele defende que rasguemos a Constituição de 1988 e faz um atalho para defesas que absolutamente esgotam o papel do direito social.

Eu volto a dizer: é grave o que acontece hoje. No meio de uma epidemia, no meio de tanto desemprego, no meio de tanta gente sem condições de sobrevivência, o Sistema Único de Assistência Social entrar em profundo sucateamento é absolutamente grave.

A Ministra conhece bem isso, e talvez a Paola conheça também. Nós temos Centros de Referência de Assistência Social em todos os Municípios brasileiros. Isso começou em 1999 e avançou profundamente a partir de 2003, para que em 2008 todos os Municípios brasileiros tivessem um CRAS, que é a porta de entrada para uma família colocar as suas desproteções e as suas privações sociais. O modelo que foi escolhido para fazer o Cadastro Único nesta pandemia esvazia o direito de a família procurar um técnico para colocar as suas desproteções e privações.

A correria no aplicativo bancário deu no que deu porque se esvaziou o trabalho social. É evidente que não podemos esvaziar o trabalho social na construção de igualdade de direito. Se acharmos que aplicativo resolve problema social, estamos num caminho erradíssimo neste País, porque as desproteções são de renda, mas elas são também de convivência familiar, elas são também de vínculo social, e elas são de inércia.

Nós precisamos discutir com a população e com os usuários os direitos que eles têm, e não apresentar um aplicativo dizendo que eles vão ganhar 600 reais por 3 meses, o que gerou essa correria bancária. Inclusive quem passava em frente às filas da Caixa Econômica via o risco que os pobres estavam correndo de se contaminar. Havia centenas e centenas de pessoas na fila, sem uma cadeira para se sentar, sem uma cruz marcada no chão para manter o afastamento, sem nada, para irem receber 600 reais.

Nós propusemos ao Ministério da Cidadania que fosse feito um convênio com a FEBRABAN para que todos os bancos pudessem pagar o benefício, e não só a Caixa Econômica, mas a Caixa Econômica insistiu que tinha capacidade.

E não teve. Expôs os pobres ao sofrimento, ao sol quente, à chuva e, sobretudo, à possibilidade de se contaminarem pela COVID.

Então, eu acho que o Governo atual, que, na campanha eleitoral de 2018, propunha o lema Menos Brasília, mais Brasil, definitivamente fez uma escolha: agora é só Brasília. As decisões estão sendo todas tomadas no gabinete do Ministério da Economia, sem participação social, sem controle do Conselho Nacional de Assistência Social, sem nenhuma participação e pactuação da Comissão Intergestora Tripartite. Isso é muito grave. Eu queria dizer ao representante do Governo que isso, além de grave, é ilegal, porque vocês, inclusive, estão usando recursos do Fundo Nacional de Assistência Social. E os recursos do Fundo Nacional de Assistência Social precisam ser pactuados com a Comissão Intergestores Tripartite e aprovados pelo Conselho Nacional de Assistência Social. Não vale tudo neste momento. Precisamos respeitar as instâncias que foram construídas e que estão dando certo.

Sobre o auxílio emergencial - controlando o meu tempo, eu tenho só mais 3 minutos -, é evidente que ele precisa continuar. O Bolsa Família foi um processo continuado e deve continuar também. Inclusive, eu quero dizer o seguinte: diminuir o valor para 300 reais, neste momento, é um sacrifício enorme para a população pobre e desempregada. Nós não precisamos apenas de um programa de segurança de renda, como é o Bolsa Família, nós precisamos também, neste momento, de um programa que garanta sobrevivência e esperança para as pessoas.

O Bolsa Família cumpre um papel fundamental. Mas, ao se elevar o valor para 600 reais, garantiu-se às pessoas um pouco mais. E tirar esse pouco mais neste momento, para mim é absurdo, é não conhecer a vida diária da pobreza brasileira. Aliás, quem está fazendo a gestão social no País não conhece a vida diária da pobreza no País, não conhece o Sistema Único de Assistência Social, não conhece o trabalho que foi feito nos últimos 20 anos. Chame-nos para um debate, vamos debater os últimos 20 anos, vamos debater as conquistas que as famílias tiveram, vamos debater as conquistas que a proteção social teve. Não vai dar certo desmontar a proteção social no Brasil, como o Ministério da Economia está propondo - não vai!

Então, sobre a seguridade social, eu reafirmo: hoje, eu temo por ela. Eu acho que nós estamos a passos largos para ela ser assassinada - e isso é muito grave -, para ser banalizada. A seguridade social é composta pela saúde, pela assistência e pela previdência. E a assistência social está sendo completamente esfacelada neste momento pelo Governo Federal.

Sobre o auxílio emergencial, ele foi uma conquista importantíssima do País votado no Congresso. Não cabe ao Ministro da Economia dizer que serão 300 reais. Se ele não quer prorrogar o auxílio, ele tem que devolver o debate para o Congresso Nacional. É o Congresso Nacional que vai dizer se serão 300 reais ou 600 reais, não é o Ministro da Economia.

Para encerrar, já que se esgotou o meu tempo, eu reafirmo que é muito grave que, neste momento, o País não tenha um Ministério de Desenvolvimento Social ou um Ministério de Bem-Estar Social ou um Ministério da Cidadania e que as decisões estejam sendo tomadas no gabinete do Ministro da Economia, porque eu só vejo o Ministro da Economia falando sobre questões sociais. Ele é o único que fala - e fala para desmontar a proteção social no Brasil.

Então, eu quis trazer essa colaboração. Eu não quero ultrapassar os 15 minutos, mas aponto que está muito grave, está muito difícil. Se não defendermos a proteção social para o País, os riscos serão enormes para toda a sociedade. E, neste momento, a proteção social no Brasil está sendo completamente desmontada e sucateada.

Eu vou permanecer on-line para poder participar dos debates.

Muito obrigado.

A SRA. COORDENADORA (Paola Carvalho) - Muito obrigada, Marcelo, inclusive por ter respeitado os 15 minutos, para que possamos ouvir todos e todas, que têm muito a contribuir conosco neste debate.

Lembro que quem tiver dúvidas e quem quiser mandar perguntas para este seminário é possível fazê-lo a partir do site da Câmara dos Deputados, na aba da TV Câmara, e também pelo e-mail que eu vou passar a vocês: sgm@camara.leg.br.

As perguntas poderão ser direcionadas a cada participante da Mesa ou poderão mandar para que a Mesa, como um todo, comente.

De imediato, passo a palavra ao Sr. Martim Cavalcanti, Secretário-Executivo Adjunto do Ministério da Cidadania, para que também faça uso dos seus 15 minutos, lembrando que eu o avisarei quanto faltarem 5 minutos para acabar o seu tempo.

O SR. MARTIM CAVALCANTI - Bom dia a todos!

Obrigado pela oportunidade de participar deste debate, que é importante.

Acho relevante lembrar a origem do auxílio emergencial. Realmente é um debate que começa no Congresso Nacional. A lei é de autoria do Legislativo - é a Lei nº 13.982, de 2020 -, e ao Governo coube implementá-la.

Essa lei está alinhada com os objetivos do Governo. Refiro-me ao nosso programa de Governo, intitulado O Caminho da Prosperidade. Este é um Governo fraterno, é um Governo que se preocupa em ajudar as pessoas quando é necessário, quando é preciso estender a mão, mas também é um Governo eficiente, preocupado com a questão fiscal e é um Governo constitucional, preocupado com as leis. Esses são os três pilares que estão lá em O Caminho da Prosperidade, que era o nosso programa de Governo.

O auxílio emergencial foi sancionado no dia 2 de abril de 2020. E junto com a sanção desse auxílio foi publicada uma medida provisória de crédito extraordinário no valor de 98,2 bilhões de reais para que pudéssemos implementá-lo.

Esse valor foi estimado com base no melhor que nós tínhamos à época em dados, considerando os dados que tínhamos em Cadastro Único, MEI e Contribuinte Individual.

Na própria nota que embasou o pedido desse crédito, nós relatamos que não tínhamos uma ideia do grau de informalidade da economia. E dada a velocidade com que tivemos de implementá-lo, também não tínhamos como fazer os cálculos das famílias monoparentais que demandavam um valor mais alto de auxílio.

O Governo foi muito cobrado em função da lei que foi sancionada no dia 2. No dia 6, ele já era cobrado por não ter feito nenhum pagamento do auxílio emergencial.

Começamos a fazê-lo no dia 8, quando fizemos o primeiro crédito para a Caixa Econômica Federal. Foi um desafio muito grande, primeiro porque a lei falava em instituições financeiras públicas federais. E quando a lei foi sancionada, foram consultados imediatamente os quatro principais bancos federais: Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Banco do Nordeste e Banco da Amazônia. Mas de todos eles, apenas a Caixa Econômica aceitou o desafio de implementar o auxílio. Por quê? Porque havia a necessidade de implementação rápida, uma vez que entendíamos que o impacto econômico iria ser muito forte para as pessoas vulneráveis.

Quem eram essas pessoas? Os informais, os microempreendedores individuais, as pessoas do Bolsa Família, enfim, exatamente como veio na modificação, a baiana do acarajé, o vendedor de pipoca, o vendedor de cachorro-quente. Então havia a necessidade de uma implementação rápida, e apenas a Caixa Econômica aceitou o desafio dessa implementação.

Nós corremos também para costurar um acordo com a FEBRABAN. Para quê? Embora nós façamos o pagamento pela Caixa Econômica Federal, se a pessoa indicar uma conta corrente na hora em que ela se cadastrar, a Caixa automaticamente faz o crédito nessa conta corrente de qualquer instituição financeira. Isso já foi muito debatido, muito perguntado, inclusive pela Justiça. Então, se uma pessoa tem uma conta no Nubank, em qualquer instituição financeira cadastrada no Banco Central do Brasil, ela pode indicar, e vai ser feita a transferência para essa outra conta corrente.

Juntos, nós também tivemos que iniciar o processo de análise, porque o Ministério da Cidadania não tem essa capacidade de processamento. Então, foi feita uma PoC, uma Prova de Conceito, com a DATAPREV, que começou a trabalhar nisso no dia 5; no dia 8, nós já tínhamos um primeiro pagamento, um primeiro crédito foi feito para a Caixa Econômica; e, no dia 9, já era feito o pagamento para as primeiras pessoas exatamente do Cadastro Único.

Agora, eu precisava capturar os dados dessas pessoas, que são os informais, e garantir que elas recebessem esse auxílio rapidamente. Por isso, começamos por esse canal digital.

Estão me ouvindo? Agora sumiu a imagem aqui. Estão me ouvindo?

O SR. PRESIDENTE (Dr. Luiz Antonio Teixeira Jr. Bloco/PP - RJ) - O áudio está excelente, Martim. Está todo mundo acompanhando.

O SR. MARTIM CAVALCANTI - É importante conseguirmos entregar rapidamente esse auxílio para as pessoas. Essa foi uma preocupação.

Então, em menos de 60 dias, nós já analisamos mais de 120 milhões de CPFs. Nós já temos mais de 60 milhões de pessoas recebendo o auxílio emergencial.

Erros acontecem? Sim. Vai haver erros, vai haver equívocos, porque esse sistema para o processamento foi todo montado rapidamente pela DATAPREV. Esse sistema não existia. A DATAPREV montou todo um sistema novo, usando big data para fazer o cruzamento em mais de 25 bases de dados simultaneamente. A cada remessa que processa, ela aprende e coloca dentro do que a DATAPREV chama de motor. E aquelas condições alimentam as próximas remessas que são analisadas.

O próprio aplicativo da Caixa também foi desenvolvido em tempo recorde e está sendo sempre aprimorado. Desde o começo, sabíamos que havia questões que precisavam ser melhoradas no aplicativo. A Caixa sempre se dispôs a melhorar e a aprimorar o aplicativo. Agora, era importante que começássemos a capturar essas informações, porque, se não começássemos a capturar as informações das pessoas informais, dos contribuintes individuais que precisam e dos microempreendedores individuais que precisam, nós não iríamos conseguir pagar. Não adianta eu querer planejar um sistema perfeito, e não começar a atender as pessoas.

O foco sempre foi a questão do atendimento às pessoas. Os desafios são muitos. Continuamos a aprimorar. No primeiro momento, foi o canal digital. Agora estamos evoluindo para um canal presencial. Ou seja, fizemos um contrato com os Correios, para que as pessoas que não têm acesso à telefonia móvel, que não têm acesso à Internet, possam se cadastrar por um outro meio.

Por que começamos pela telefonia móvel? Por que começamos com um sistema on-line? Porque havia a necessidade de capturar o mais rápido possível as informações para atender o maior número possível de pessoas. Mas nós nunca nos esquecemos dos ultravulneráveis. Por isso, evoluímos na questão, por exemplo, do cadastramento via Correios. Já foi feito um contrato. Desde segunda-feira, nós já estamos operando com os Correios.

Inicialmente, a ideia era que a Caixa também faria esse cadastro. No entanto, por uma questão de risco operacional da Caixa, apontado pela área de risco, eles optaram por não seguir em frente. Depois de 3 semanas de discussão, eles começaram a desenvolver o sistema na área de TI deles.

Estamos também evoluindo para que os CRAS façam esse atendimento. Mas havia uma preocupação: evitar que houvesse filas e aglomerações lá, expondo os servidores ao risco. Então, antes de abrirmos esses centros, conseguimos montar um sistema em que fornecemos recursos para os CRAS que aceitam. Lembro que eles são tripartite, ou seja, o Governo Federal não é o dono, não manda no CRAS. Isso é compartilhado com Estados e Municípios. Então, já há algum tempo, nós abrimos a oportunidade para que eles possam aderir a um programa em que eu forneço recursos para a aquisição de EPIs, a fim de garantir a segurança das pessoas do CRAS. Eles podem aderir para solicitar recursos para abrigamento, exatamente preocupados com a população de rua, e para a aquisição de alimentos, também preocupados com a população vulnerável. Agora estamos aptos a abrir os CRAS para que eles possam exatamente capturar essas pessoas mais vulneráveis.

O Governo nunca negligenciou os CRAS. O orçamento para eles neste ano veio muito baixo, conforme a LOA aprovada. É um orçamento de pouco mais de 1 bilhão de reais. Mas o orçamento de que precisamos para ver os CRAS funcionando é, por exemplo, o que foi executado no ano passado, de 2,7 bilhões de reais. Para chegar a uns 2 bilhões de reais, parte do orçamento dependia de RP 9. Eu dependia de uma negociação do RP 9, dependia de uma negociação para a aprovação da exceção da regra de ouro e dependia mais da aprovação de uma reforma que era exatamente uma parte da reforma constitucional lá do pacto da economia.

Então, para quem conhece a linguagem orçamentária, com os recursos que tínhamos disponíveis da RP 2, que é o recurso discricionário que o Ministério pode usar, nós tínhamos pouco mais de 100 milhões de reais para repassar para os CRAS. Era muito pouco, muito pouco. Nós repassamos por mês mais de 200 milhões de reais para a manutenção e o funcionamento deles. Para tentar mitigar isso, enquanto não passavam essas leis, enquanto não eram aprovadas todas essas excepcionalidades que aumentariam o recurso, nós pedimos para a Economia um adiantamento de recursos dos últimos meses, para que conseguíssemos chegar, pelo menos, a um repasse de 150 milhões de reais, focando exatamente nos CRAS menores, nas cidades menores, mais vulneráveis. Portanto, o Governo se preocupa com a cidadania, se preocupa com a manutenção do sistema, se preocupa com a saúde dos funcionários dos CRAS.

O Governo tem trabalhado para sempre aprimorar os desafios do auxílio emergencial, que são grandes. A questão da prorrogação do auxílio é um debate que vai ser feito no Congresso Nacional e vai envolver os Parlamentares. É importante também mencionar - e provavelmente a Monica de Bolle vai abordar um pouco esta questão - que esse Governo é preocupado com a questão fiscal. Hoje o auxílio emergencial já tem um orçamento de mais de 152 bilhões de reais para pagar, durante 3 meses, as pessoas que precisam dele.

Uma conquista importante do Brasil foi a estabilidade monetária.

A estabilidade monetária foi fundamental para tirar milhões de brasileiros da miséria. Nós não podemos regredir também nesse ponto.

Então, há que se sopesar, há que se balancear ambas as questões. Temos que manter um atendimento. Temos que ser fraternos, atender aos vulneráveis, mas sempre preocupados com a questão fiscal e sempre lembrando que as mais afetadas por um desequilíbrio fiscal, por um retorno inflacionário, por um Governo que depende da inflação para se financiar, são exatamente essas pessoas mais vulneráveis, que não têm acesso à bancarização e não têm acesso a um meio de proteção.

Eu acho que o meu tempo acabou, porque já levantaram a mão aqui para mim.

Obrigado.

A SRA. COORDENADORA (Paola Carvalho) - Martim, na verdade, você tem ainda 4 minutos.

O SR. MARTIM CAVALCANTI - O.k.

Então, quais são os desafios que nós estamos enfrentando no auxílio emergencial? Foi citada a questão da fila. Como eu disse, é tudo muito novo. Há uma preocupação de sempre aprimorar. Já foram feitos aprimoramentos, mas erros, num programa desse tamanho, na velocidade em que ele está sendo desenvolvido, acontecem. O importante é corrigirmos esses erros rapidamente. E esse Governo tem feito isso.

Sobre a questão do CPF, o primeiro problema que apareceu foi de CPFs irregulares. Para todos nós que estamos aqui, o CPF regular é uma coisa comum. Todos os que estão participando deste debate têm um CPF regular. No entanto, as pessoas mais vulneráveis normalmente tinham problema de regularização do CPF. Era um problema de regularização que não dependia do Poder Executivo. Mais de 90% dos problemas de muito mais de 1 milhão de CPFs irregulares decorriam de problemas com a Justiça Eleitoral. Então o Governo correu, junto com a Receita Federal, para permitir a regularização do CPF de forma on-line, para evitar as filas, as corridas às delegacias, às agências da Receita Federal. Hoje também é possível tirar o CPF de forma on-line, para evitar as aglomerações. O aprendizado que nós tivemos com o pagamento da primeira parcela nós já utilizamos no pagamento da segunda parcela. Nós incentivamos as pessoas a utilizarem a bancarização, deixarem de simplesmente ir à Caixa Econômica para sacar o recurso.

Então, primeiro foi feito o cronograma de pagamento da segunda parcela, a disponibilização dos recursos; foi desenvolvido o aplicativo de débito Caixa Tem, para que as pessoas pudessem fazer compras, pagar as contas através de débito. E que só fossem às agências algum tempo depois, para exatamente evitar a aglomeração que foi vista no primeiro pagamento, no pagamento da P1.

A Caixa Econômica também tem se preocupado com essa questão. Participei de diversas audiências na Justiça Federal, no Ceará, Bahia, Rio de Janeiro, Minas Gerais, e a Caixa em todas elas mostrou preocupação em orientar e organizar as filas. Atitudes foram tomadas, por exemplo, no Ceará, com a aquisição de toldos, para que as pessoas não esperassem debaixo do sol; a contratação de pessoal para orientar as pessoas que estão na fila, porque nem todos os que estão na fila estão lá para sacar, muitos estão apenas para tirar dúvidas. Então, já foram colocadas pessoas volantes para atender e tirar dúvidas dessas pessoas, enquanto elas estão na fila, para evitar aglomeração.

Tudo está sendo feito para aprimorar o processo. À medida que nós identificamos problemas, falhas, nós corremos para corrigir e aprimorar o processo e garantir que o auxílio emergencial chegue às pessoas que realmente necessitam.

Temos Acordos de Cooperação Técnica firmados desde o começo para sermos auditados de forma automática, on-line, pela Controladoria Geral da União - CGU e pelo Tribunal de Contas da União.

Nós temos um acordo com o Ministério da Justiça e Segurança Pública também, para que os casos de polícia sejam encaminhados para averiguação por eles. Nós terminamos de fechar um acordo de cooperação técnica com a Receita Federal para termos um acesso maior à sua base de dados, para melhorarmos o cruzamento dessa base de dados. E estamos fechando também um acordo de cooperação técnica com o CNJ para termos acesso ao banco de dados de foragidos, procurados, porque o Ministério da Justiça não tem esses dados, para que ele nos passe a base de dados dos presidiários.

Há uma preocupação do Governo com as pessoas mais vulneráveis, há uma preocupação com a fraternidade por parte do Governo, mas mantendo a responsabilidade fiscal, mantendo o princípio de obedecer às leis, obedecer à Constituição.

Era isso. Estamos aprimorando.

Muito obrigado.

A SRA. COORDENADORA (Paola Carvalho) - Obrigada, Martim, que também representa aqui a Secretaria Executiva do Ministério da Cidadania.

Informo que chegaram bastantes perguntas para a Mesa. A organização aqui da Câmara está me mandando as perguntas pelo WhatsApp, que são de várias ordens.

Então vamos otimizar o tempo dos nossos palestrantes, para que eles possam depois responder às questões do público.

De imediato, vou passar a palavra para Sra. Monica de Bolle, pelo tempo de 15 minutos, conforme combinamos.

A SRA. MONICA DE BOLLE - Bom dia a todos os que estão aqui. Bom dia, Paola, Marcelo, Martim, Rogério, Tereza. Bom dia, Deputado Rodrigo Maia, Presidente da Câmara dos Deputados.

É um prazer estar aqui participando deste seminário sobre um tema de absoluta relevância, de absoluta importância para o País.

Nós ouvimos duas falas. A segunda fala, a do Martim Cavalcanti, explicou as falhas do Governo na execução do auxílio emergencial, e tenhamos em conta de que foram falhas. Isso tem de ser reconhecido, porque foram.

Acho muito bom que o Governo esteja empenhado em consertar essas falhas, sobretudo porque agora vamos conversar sobre a prorrogação do auxílio emergencial.

É reconfortante saber que essas falhas não serão repetidas - pelo menos foi isso que eu entendi na fala do Martim.

Quero fazer algumas considerações sobre o que vamos enfrentar pela frente. Nós falamos muito de passado, mas o que importa é o que vem pela frente.

Por que a prorrogação do auxílio emergencial não pode ser por apenas 2 meses? Porque isso não dará conta do tamanho dessa epidemia.

E por que a fala do Martim a respeito de risco inflacionário está absolutamente deslocada do cenário tal qual ele se apresenta? Deixe-me fazer algumas considerações sobre isso. Essa crise - e eu tenho dito isso desde o princípio, e quando eu falo desde o princípio, eu estou falando desde março, e essas falas estão registradas - não é econômica, é uma crise de saúde pública. E sendo uma crise de saúde pública, as medidas econômicas que vêm sendo adotadas, principalmente o auxílio emergencial, vêm para dar sustentação a uma crise de saúde pública que tem efeitos muito desiguais sobre a população.

Esses efeitos desiguais já poderiam há muito ter sido mapeados pelo Governo, porque afinal de contas não é segredo para ninguém que acompanha os dados divulgados do IBGE, os dados da PNAD, os dados do Censo Pop Rua, enfim, o enorme arsenal de dados microeconômicos que nós temos no País, que a população de informais, o grau de informalidade que nós temos no País é, e sempre foi, alto. Mais alto ficou desde a recessão de 2015 e de 2016 e, em particular, dado o crescimento extremamente lento da economia que vimos em 2016, em 2017, em 2018, em 2019 e que provavelmente veríamos novamente em 2020, se não fosse a epidemia.

O que nós vamos ver em 2020, com a epidemia, é uma profunda recessão, muito além das contas que o Governo hoje nos apresenta para a retração do PIB.

Em parte, nós já conseguimos ver isso nos dados que estão sendo apresentados até agora: nos dados do PIB do primeiro trimestre; nos dados do CAGED a respeito do que está acontecendo no mercado formal de trabalho; e nos próprios dados da PNAD Contínua do IBGE.

Aliás, em todos esses indicadores, já está evidente a desigualdade tal qual ela se manifesta em termos do impacto da epidemia e da crise econômica dela decorrente sobre a população vulnerável, que inclui pobres e pessoas que hoje não têm acesso, ou não tinham acesso, pelo menos antes do auxílio emergencial, a políticas de proteção social, porque são essas pessoas - e quem acompanha esses dados sabe disso - que entram e saem a todo tempo da informalidade.

Diante desse quadro e diante do quadro que essa crise apresenta, essa crise provoca, pela própria natureza dela, por ser uma crise de saúde pública, um quadro de depressão econômica. Não à toa acabamos de ver revisões para o PIB brasileiro, as projeções para 2020, pelo próprio Banco Mundial e pela OCDE, hoje pela manhã, que já falam numa retração muito severa do PIB, um quadro de depressão mesmo, principalmente porque o País está com uma epidemia descontrolada. Então, isso é um fator de extrema relevância, porque o que determina o andar da economia hoje é o vírus. Isso eu tenho dito já há vários meses, e deveria ter ficado evidente, com muito mais celeridade do que ficou, para o Governo brasileiro.

Dito isso, o que vamos ter pela frente? Não há vacina, não há tratamento. Portanto, essa crise, do jeito que ela está se manifestando e do jeito que ela vai continuar a se manifestar, vai continuar a vitimar precisamente as pessoas que o Governo acabou de identificar - e que ficou surpreso com o número de pessoas informais que existem na economia. Essas serão as pessoas que continuarão a ser afetadas.

Nós temos decretado um estado de calamidade pública até o dia 31 de dezembro de 2020, o que significa que o Governo pelo menos acha que o grau de calamidade, a situação de calamidade, vai até o dia 31 de dezembro de 2020.

Então, uma pergunta que eu me faço sempre quando eu me deparo com essas questões a respeito do auxílio emergencial, é a seguinte: por que cargas d'água, se nós sabemos que a calamidade vai até o dia 31 de dezembro de 2020, estamos falando em renovar o benefício em apenas 2 meses, se a calamidade conosco estará até o final de dezembro?

Essa é uma pergunta para a qual eu gostaria muito de uma resposta, porque eu simplesmente não entendo a desconexão lógica que existe entre a prorrogação do benefício

hoje ou o que se propõe na prorrogação do benefício e o que se antevê em termos de necessidades outras para atender o estado de calamidade pública. Então, deixo essa pergunta para que o nosso representante do Governo responda.

Além disso, deixem-me colocar mais alguns pontos. Com a crise que se apresenta, por ter essa natureza de depressão econômica e por se apresentar como uma depressão econômica, nós certamente teremos, em 2020, independentemente da ordem de magnitude que se imagine, a queda do PIB. A queda do PIB neste ano, os efeitos sobre o mercado de trabalho e o desequilíbrio que vai se manifestar - e já está se manifestando - serão inéditos. Nesse contexto, falar em responsabilidade fiscal sem falar em responsabilidade social é uma maneira extremamente estreita de olhar para um problema que é muito mais amplo do que essa noção estrita de responsabilidade fiscal. Não existe, neste momento de crise humanitária, responsabilidade fiscal sem responsabilidade social. Responsabilidade social passa por conectar os pontos e traçar a seguinte lógica: se a calamidade vai até dezembro, o auxílio emergencial tem que ir pelo menos até dezembro também, porque não faz sentido desconectar uma coisa da outra, dado que elas estão intimamente conectadas. Então, eu queria trazer esse ponto.

Outro ponto que o Martim quis trazer diz respeito à inflação. Ora, nós estamos enfrentando um cenário deflacionário! Nós nunca enfrentamos esse tipo de cenário no Brasil. Isso é novo para nós. Temos esse apego e esse temor a respeito da inflação, no sentido de que qualquer medida que façamos vai resvalar na inflação. Isso é curioso, porque temos quase 3 décadas de estabilidade monetária. Por que achamos que, de repente, vamos recair nos anos 80, em termos de desequilíbrio monetário, por simplesmente estar respondendo a uma crise inédita e extraordinária, de magnitude que nunca vimos? Eu não entendo essa linha de raciocínio.

Também seria muito útil que alguém me explicasse por que achamos que são inflacionárias medidas como o auxílio emergencial, que visam dar sustentação às pessoas, que visam, sobretudo, dar condições de subsistência a pessoas que não as teriam em outras circunstâncias. Por que isso é inflacionário? É inflacionário porque vai aumentar a dívida? Esse argumenta não cola. A dívida pública vai aumentar em todos os países - já está aumentando em vários países emergentes e desenvolvidos. Os déficits públicos estão aumentando igualmente.

Hoje, por ser a crise deflacionária, há bancos centrais no mundo fazendo coisas impensáveis há poucos anos. Por exemplo, o Banco da Inglaterra, neste exato momento, está monetizando o déficit do governo, porque reconhece ser essa uma situação absolutamente extraordinária e diferente de outras crises enfrentadas num passado recente, como inclusive a crise de 2008, que atingiu o Reino Unido em cheio. O Brasil está inserido exatamente no mesmo contexto, porque, diferentemente da crise de 2008, em que o Brasil não era centro, o Brasil era periferia, hoje todos os países são centro, porque a causa da crise não vem de fora, vem de um vírus.

E o vírus se espalha no País, propaga-se no País e paralisa a economia, independentemente de medidas sanitárias serem implantadas. Aliás, sem medidas sanitárias, o quadro é pior, como nós vamos ver no Brasil. O Brasil vai ser o país que vai dar a todos o exemplo do que não fazer, em termos de controle epidemiológico e em termos de sustentação econômica, porque tudo o que tem sido feito até agora tem sido absolutamente insuficiente.

É nesse contexto que se coloca a discussão do auxílio emergencial. Por quê? Uma medida que foi pensada entre a sociedade e o Congresso e que foi abraçada pelo Governo nos últimos minutos do segundo tempo acabou sendo, pelo menos no desenho, senão na execução, uma medida de extrema relevância para a sustentação da economia.

Se o Brasil anda mal na percepção externa - eu estou fora e posso dizer que o Brasil anda muito mal na percepção externa -, ao menos uma coisa o Brasil fez e abriu os olhos do resto do mundo: o auxílio emergencial. Execução à parte, esse foi um programa que, de fato, fez diferença e, a despeito de todas as coisas que o Brasil tem feito, colocou o País num patamar em que pelo menos alguns países passaram a olhar de novo para o Brasil e prestar atenção no que o Brasil estava fazendo.

Neste momento, em que tanto precisamos que o auxílio emergencial permaneça conosco e que continue essa política, pelo menos durante o estado de calamidade pública, estamos falando em renovar esse benefício por apenas 2 meses. Não faz o menor sentido! O responsável fiscalmente e o responsável socialmente é haver a renovação do benefício, pelo menos, pelo período de calamidade pública.

Eu não sei quanto tempo ainda tenho, Paola, mas, para encerrar, vou fazer algumas considerações finais em relação a isso. Essa é uma discussão separada, não é a mesma discussão, mas temos que olhar a discussão da renda mínima. Temos que olhar para os desenhos de renda mínima que estão sendo propostos, porque o auxílio emergencial é uma política de resposta à pandemia, é uma política de resposta à crise, não é uma política permanente, nem deve ser da forma como ele está desenhado hoje.

Uma política de renda mínima, com outro tipo de desenho, que preencha as lacunas que hoje existem na nossa rede de proteção social precisa ser desenhada e pensada. Ela é fundamental, inclusive, na saída da crise, porque, na saída dessa crise, não vamos ter mais uma situação de normalidade tal qual imaginamos.

Quanto às pessoas que hoje saíram do mercado de trabalho - muita gente saiu, inclusive, da força de trabalho quando olhamos para os dados da PNAD -, o que nós constatamos é que essas pessoas vão ter muita dificuldade de reinserção, porque a recuperação, a retomada no Brasil, haja vista a falta de controle, vai ser extremamente lenta, vai ser muito demorada, e essas pessoas vão continuar desassistidas caso não instauremos um programa de renda mínima.

O programa de renda mínima não visa substituir outros programas. O Programa Bolsa Família tem que continuar. O Programa Bolsa Família, aliás, é fundamental, porque ele é focalizado em pobreza, algo que ainda temos muito no País e teremos mais ainda, haja vista o que vai acontecer na nossa economia. Então, o que temos que fazer é complementá-lo com um programa de renda mínima que chegue a essas pessoas vulneráveis, porque elas estão constantemente entrando e saindo do mercado de trabalho formal.

Hoje, muitas delas estão fora do mercado de trabalho formal por conta do que está acontecendo com a pandemia. Essas são as pessoas que terão dificuldades de reinserção e que precisam, sim, ser contempladas com o um programa de renda mínima.

É com isto que muitos de nós temos trabalhado: com simulações, com dados, com estimativas e com um conhecimento profundo do que são as desigualdades e a situação de informalidade do nosso País.

Então, eu queria deixar essas reflexões, porque esse trabalho - não sei como ele está sendo feito dentro do Governo - está sendo muito bem feito fora do Governo. Seria ótimo se vocês nos ouvissem.

Obrigada.

A SRA. COORDENADORA (Paola Carvalho) - Obrigada, Monica.

Eu não estou no meio das falas, não estou fazendo grande introdução nem dialogando com a fala individual, para que, no final, possamos responder as questões que estão aparecendo. Queremos ganhar tempo, porque a combinação da Câmara é receber perguntas até 11h10min. Como já há aqui um conjunto importante de perguntas, estou otimizando o tempo.

De imediato, passo a palavra para o próximo palestrante, o Rogério Barbosa.

Rogério, está com você a palavra, também pelo tempo de 15 minutos. Eu aviso quando faltarem 5 minutos.

O SR. ROGÉRIO BARBOSA - Obrigado, Paola. Obrigado à Câmara pelo convite. Obrigado, Presidente Rodrigo Maia. Obrigado também aos parceiros Martim, Monica e Tereza.

Eu vou fazer um compartilhamento da minha tela, para apresentar alguns eslaides. Peço que me avisem se deu certo.

Vocês estão enxergando os eslaides, Paola?

(Segue-se exibição de imagens.)

A SRA. COORDENADORA (Paola Carvalho) - Agora, sim, Rogério.

O SR. ROGÉRIO BARBOSA - Ótimo! Muito obrigado.

Eu gostaria de fazer a apresentação rapidamente.

Eu faço parte de uma iniciativa maior, chamada Rede de Pesquisa Solidária, que é um consórcio com mais de 20 instituições. Formamos um grupo de mais de 60 pesquisadores. Trata-se, na verdade, de uma pesquisa coletiva. Eu trabalho no Centro de Estudos da Metrópole, da Universidade de São Paulo, com financiamento da FAPESP, mas, para essa pesquisa, contamos com o auxílio de diversas instituições e também de muitos voluntários. A minha equipe, especificamente, conta com 11 pesquisadores, alguns consultores e uma coordenação compartilhada com Ian Prates.

Eu queria apenas ressaltar o quadro anterior. Já encontramos a pandemia, na verdade, de uma forma muito desagradável. O mercado de trabalho não andava muito bem. Nós vivíamos, desde 2015, uma crise que não passou, principalmente para os mais pobres, que ainda experimentam perda de renda até hoje. Os saldos dos mais pobres ainda são negativos. É como se a crise continuasse na base da distribuição de renda. O desemprego cresceu e, a partir de 2015, não reduziu. Essa redução, na verdade, é muito pequena. Continuamos em duas casas.

O eslaide mostra os dados mais recentes da PNAD, no primeiro trimestre de 2020. A pobreza, a partir desse momento, subiu e se tornou bastante estável, num patamar alto. Utilizamos várias linhas de pobreza. A que está no meio do gráfico, a segunda, é muito próxima à linha do Banco Mundial com relação à miséria mundial. Na verdade, as nossas linhas de pobreza são muito conservadoras. Consideramos as linhas do Bolsa Família com um nível muito baixo. Ela é só um pouquinho superior à linha de 1,90 dólar em qualidade (falha na transmissão) que o Banco Mundial estabelece. Mas todas as linhas de pobreza acusam, na verdade, uma subida e uma estabilidade. A pequena queda que houve, nos últimos anos, na verdade, nem sequer é estatisticamente significativa.

Com essa tempestade perfeita, chega o coronavírus, que vulnerabiliza grupos muito específicos e grupos novos.

Neste eslaide, mostramos um quadro que resume os três grupos mais vulneráveis. Os informais são tradicionalmente vulneráveis. Eles sempre são vulneráveis em todas as ocasiões. No entanto, devido ao fato de que certos setores foram chamados de não essenciais pelo Governo, para combater o espraiamento da doença e fechar um pouco a economia, que é uma medida sanitária mais do que necessária, certos segmentos que são do setor formal, em pequenas e em médias empresas, e que são até de grandes empresas, todos com carteira assinada, acabam se tornando novos vulneráveis. Então, somando os antigos historicamente vulneráveis e os novos vulneráveis, mais ou menos 83% do mercado de trabalho se torna vulnerável. Há perda de renda e perda de emprego, especificamente.

A prova de que esse grupo foi, de fato, afetado são os resultados que a Monica já comentou sobre o CAGED. Em abril, houve o saldo de mais de 800 mil empregos desfeitos, mais de 800 mil vínculos desfeitos, a despeito do fato de que havia a MP 936, que tentava blindar os trabalhadores contra a perda de emprego. Foram feitos 8 milhões de acordos pela MP 936, sendo que mais da metade deles é de suspensão completa do contrato de trabalho. Isso significa que os trabalhadores recebem só o valor equivalente ao seguro-desemprego, que tem um teto muito baixo. Isso significa perdas para o segmento de novos vulneráveis que não são recompensadas. É importante lembrar que eles não são elegíveis para receber o benefício emergencial.

Tentamos montar um quadro atual do que está acontecendo hoje e fazer uma simulação. Os dados da PNAD Contínua Anual de 2019 são os mais recentes, do ano passado, e contêm informações completas sobre os domicílios, sobre as demais rendas que existem além da renda do trabalho. Então, nós simulamos, usando dados da PNAD, os desligamentos do CAGED no setor formal. De acordo com os resultados do IBGE em relação à divulgação trimestral de fevereiro a abril da PNAD, a cada um trabalhador formal desligado, dois trabalhadores informais foram desligados. Portanto, simulamos um desemprego para o setor informal com diferencial para o setor de atividade e tudo o mais. Simulamos também a incidência da MP 936, com diferencial por setor e por tipo de acordo, e simulamos a incidência da renda básica emergencial, para vermos o que estaríamos observando em abril, em maio e no presente.

Os resultados estão apresentados nesta tabela - peço desculpas, pois é extremamente chato conseguir lê-la, mas, na verdade, ela é muito informativa.

A renda domiciliar per capita no Brasil em 2019 era de 1.442 reais. Quando incide um desemprego que estimamos que estaria acontecendo em abril, agora até um pouco mais do que isso, incidem também os acordos da MP 936, de redução de salários. Antes de incidir o benefício emergencial, observamos essa renda aqui em vermelho, ou seja, há uma queda de quase 100 reais.

É importante mencionar que 1 real, na renda domiciliar per capita, significa, na verdade, uma redução, na massa de rendimentos, de 210 milhões de reais, porque é 1 real por pessoa e nós temos uma população de mais ou menos 210 milhões de pessoas. Então, a cada 1 real que cai na renda per capita, caem 210 milhões de reais na renda de rendimentos. Uma perda de 100 reais significa 21 bilhões de reais a menos na massa de rendimentos.

Quando o benefício de 600 reais incide (falha na transmissão.).

O SR. PRESIDENTE (Dr. Luiz Antonio Teixeira Jr. Bloco/PP - RJ) - Congelou a imagem do Rogério.

Eu sou o Deputado Dr. Luizinho e estou presidindo a sessão, pois o Deputado Rodrigo Maia foi a uma cerimônia no Tribunal de Contas da União e já está retornando.

Acho que deveremos seguir e depois retornaremos para a exposição do Rogério.

A SRA. COORDENADORA (Paola Carvalho) - Está certo. Vou registrar que ele já tinha usado a palavra por 6 minutos. Depois, quando ele voltar, retomaremos daí.

A próxima fala era minha mesmo. Então, eu colocarei aqui o cronômetro e seguirei as nossas combinações sobre o tempo. Assim que o Rogério voltar, retomaremos a apresentação dele.

Eu estava atuando como moderadora e agora troco a roupa e falo como alguém que vem para o debate. Represento a Rede Brasileira de Renda Básica e o Movimento Renda Básica que Queremos, que reúnem mais de 62 entidades.

Quero cumprimentar, em nome dessas entidades, a Tereza, o Martim, o Marcelo, a Monica e também o Deputado Luizinho, que está nos acompanhando e é proponente deste evento. Para nós, é essencial que a Câmara dos Deputados escute especialistas, escute o Ministério da Cidadania e escute os movimentos que têm debatido isso no Brasil há muito tempo.

É fundamental recuperar um pouco, no início da minha fala, a forma como se deu esse processo de construção do auxílio emergencial no Brasil. Nós já tínhamos um valor por parte do Governo, desde o início, apontado pelo Ministério da Economia, que seria de 200 reais. Depois, com o máximo de flexibilização, foi até 300 reais, também limitado a um número muito menor de pessoas do que o entendimento que nós tínhamos sobre o público a que deveria ser destinada essa renda emergencial nesse momento no País. A partir de uma grande mobilização que nós organizamos, da campanha Renda Básica que Queremos e também da posição essencialmente importante da Câmara e do Senado, conseguimos construir uma proposta alternativa.

Eu acho sempre importante retomar a história, porque, neste momento, quando o Ministro da Economia retoma os valores anteriores e os critérios anteriores, parece-me que quer voltar à história das coisas que nós conquistamos no debate público e no debate com a sociedade brasileira. Então, eu sempre acho que é importante retomar esse caminho de construção que nós fizemos.

Lembro que é bem importante passarmos ao debate sobre a ampliação da renda básica emergencial - há o debate sobre os 2 meses ou 3 meses -, em virtude da quantidade de mortos que temos hoje no País.

Parece-me essencial que contextualizemos a importância desse debate neste momento. Nós conseguimos avançar aqui, no sentido de uma renda emergencial, exatamente porque vivemos um período de calamidade. Esse período de calamidade é associado a uma série de medidas que deveriam ser emergenciais, mas nem todas aconteceram no tempo que o coronavírus exige do mundo, não só do Brasil.

Nós entendemos que a renda é absolutamente central nesse processo de discussão. Assim como a questão sanitária, a questão da renda é entendida por nós como essencial, muito no caminho de dar visibilidade a algo que sempre surpreendeu o Governo - para mim, parece estranho surpreender -, que é o número de pessoas em situação de vulnerabilidade ou invisibilidade no Brasil. Mas invisíveis para quem? Isso é o que temos de nos perguntar sempre. Para quem essa população é invisível e até quando o será? Também me parece essencial que façamos essa reflexão.

Esses movimentos, como o Renda Básica que Queremos, vêm promovendo debates - e a Rede Brasileira de Renda Básica, inclusive, vem fazendo o debate de uma renda permanente no Brasil -, para que se possa, sim, retomar a economia, com um diálogo constante sobre a renda como direito de cidadania.

É importante dizer que, sobre a concessão da renda básica emergencial, nós nos debruçamos para acompanhar a implementação desse projeto. Isso nos levou, neste final de semana, a lançar um documento público com os 20 principais gargalos em relação ao auxílio emergencial. E aí eu já dialogo aqui com as questões do Governo, porque, obviamente, nós entendemos que é muito complexo criar um projeto emergencial que tenha o volume e o impacto que nós imaginávamos que deveria ter uma renda básica emergencial no Brasil, mas nem todas as questões são de implementação nova. Parece-me que, para alguns gargalos, não se encontra uma resposta efetiva. Por exemplo, hoje faz 63 dias que o aplicativo do auxílio emergencial foi lançado.

Esse relatório dialoga com três grandes campos.

O primeiro campo seria o modelo de implementação, como foi tratado agora - o Marcelo falou bastante sobre isso -, que dialoga com a questão do uso do aplicativo, de uma não retomada, de um não diálogo com a rede socioassistencial. Agora foram incluídos os Correios, que me parece não terem uma expertise de atendimento aos mais vulneráveis. Isso está, sim, no Sistema Único de Assistência Social. Há também os problemas.

O que eu quero levantar aqui? Eu sei que o meu tempo é curto para tratar de todos os gargalos, mas eu preciso dizer isto: nós temos, por um lado, uma política já implementada. Hoje o Governo anuncia 59 milhões de pessoas atendidas com o auxílio emergencial, pelo menos com a primeira parcela. Mas também acumulamos 43 milhões de pessoas que tiveram o auxílio emergencial negado e 11 milhões de pessoas cujos cadastros seguem em análise há 63 dias. Portanto, parece-me um pouco confusa a questão do emergencial neste momento, o quanto é emergencial e o quanto pode esperar, enfim, o quanto uma pessoa pode esperar - e são 63 dias - para receber um auxílio que é emergencial.

Desses auxílios negados - nessa construção que fazemos do ponto de vista do acompanhamento dessa política -, identificamos também grandes problemas no diálogo com o Governo. Refiro-me a questões que seriam de mais fácil resolução, digamos assim, e encontramos caminhos para a solução, mas que até agora não foram resolvidos. Por exemplo, pessoas que concorreram nas últimas três eleições, a elas hoje é negado o auxílio emergencial. Parece-me que há em torno de 38 mil a 40 mil pessoas no Brasil que estão com auxílio emergencial negado por conta de terem concorrido nas últimas eleições, mas não ocuparam cargo eletivo. O TRE já mandou a lista para o Ministério da Cidadania e está aguardando apenas uma autorização.

Outra questão são os beneficiários do Bolsa Família, sobre o qual já há expertise há muitos anos e que não depende de uma nova implementação. A lei diz o seguinte: "Beneficiários do Bolsa Família serão automaticamente transferidos para o auxílio emergencial". Nós tivemos casos muito graves, na minha avaliação.

Na primeira parcela, o Governo informa que 700 mil famílias do Bolsa Família não migraram para o auxílio emergencial. Para mim, o mais grave é que houve uma enorme alteração da primeira para a segunda parcela, o que não dialoga com um direito fundamental, que é planejamento. Muitas vezes, achamos que o pobre não precisa ter previsibilidade. Bom, você foi aprovado para o programa, mas, na segunda parcela, o Governo resolve colocar você em análise de novo. Há informações de que muitas famílias do Bolsa Família foram cortadas do próprio Programa Bolsa Família, nessa segunda parcela, o que iria contra uma portaria do Governo, que, por 120 dias, impede qualquer desligamento, inclusive em virtude da pandemia que estamos vivendo.

Então, estamos levantando aqui essas questões, que, para mim, são chave no tocante à implementação do auxílio emergencial. Nós do movimento defendemos que esse auxílio precisa ser concedido, pelo menos, até o final do ano, de forma emergencial, para que possamos acumular o debate para uma renda ampliada e permanente no Brasil, associados, sim, a uma reforma tributária, a uma avaliação mais justa no Brasil de quem está pagando isso, para que possamos pensar no futuro.

Agora, não faz sentido - e a Monica dizia isso - que o decreto de calamidade vá até dezembro, que nós estejamos no centro mundial em relação à ampliação de casos do coronavírus e que coloquemos em debate a concessão da renda básica por 2 meses com diminuição de valores. Não faz absolutamente nenhum sentido essa questão! Enquanto isso, o Governo prioriza investimentos nos maiores, inclusive no sistema bancário. Então, temos que priorizar o que está no centro do debate, quando se pensa em proteção social e na sobrevivência, inclusive, do povo brasileiro.

Eu levanto essas questões porque o último tema que tratamos aqui - e isso não foi levantado até agora - diz respeito a alterações no Projeto de Lei nº 873, vetado quase na íntegra pelo Governo. Só foi aprovada a ampliação do benefício para as mães adolescentes, o que, para mim, primeiro, reforça que alguns públicos no Brasil seguem como invisíveis, como é o caso dos trabalhadores rurais, dos agricultores, dos pescadores, que seguem fora desse auxílio emergencial. Nós temos que resolver essa questão dos que teimam em transformar algumas pessoas no Brasil em invisíveis.

Do processo de judicialização também não podemos nos esquecer. A Defensoria Pública e o Ministério Público recebem, cotidianamente, denúncias em relação à implementação desse auxílio emergencial. E há uma judicialização para que as pessoas garantam esse direito fundamental.

Nesses dias, inclusive - o Marcelo trouxe um caso e eu, como ainda tenho tempo, vou falar sobre ele -, a D. Tânia me encontrou, desesperada, como militante dessa renda básica, para me provar que está viva, porque o Governo disse, através do aplicativo, que ela estava morta. Ela entrou em pânico, obviamente, porque um sistema público - quando ela está passando fome e enfrentando muita dificuldade - diz que ela está morta. E ela não consegue provar para o Governo que está viva. Ela não tem e-mail e não consegue procurar a Defensoria, que está com a porta fechada neste momento, porque também precisa proteger os defensores. Ela não sabe como acessar esse direito de sobrevivência num período tão crucial da história brasileira, da história mundial.

Então, trago esses elementos aqui porque acho fundamental que a nossa posição seja reforçada. Nós lutaremos para que a renda emergencial seja concedida até o final do ano, para que as pessoas parem de viver sob a ameaça de que ela está acabando. Não me parece plausível que, de 2 em 2 meses, tenhamos que retomar o debate de ampliação do benefício por mais 1 mês, por mais 2 meses. Se o decreto de calamidade vai até o final do ano, por que as pessoas também não são consideradas como emergenciais nesse período? Então, o nosso debate, sim, é sobre ser concedido o auxílio até o final do ano.

Fundamentalmente, espero que nós possamos, com seriedade, adentrar esses problemas de implementação e olhar para esses mais de 50 milhões de brasileiros que tiveram o benefício negado ou que ainda estão em análise e precisam de uma renda emergencial para viver. Então, é disso que estamos falando. Nós estamos falando sobre a sobrevivência do povo brasileiro e sobre a prioridade no orçamento público, ainda mais num momento como o que estamos vivendo.

Para nós do movimento é essencial que o tema seja discutido aqui na Câmara, porque temos compreensão, sim, de que essa não é uma decisão do Ministro da Economia. Essa foi uma construção do movimento com a Câmara e o Senado. E não é com canetaço que se resolve até quando as pessoas receberão e qual será o valor. Essa é uma discussão pública, que precisa, sim, ter visibilidade nos seus números, que precisa ser transparente, para que possamos coletivamente avançar nesse processo.

Nós reconhecemos a importância da renda básica emergencial. Nós compreendemos o quanto ela é fundamental no Brasil neste momento. Nós queremos ampliá-la e desburocratizá-la, para que todos os brasileiros e as brasileiras que têm o direito a receber esse auxílio possam, sim, recebê-lo.

Eu vou dar o exemplo, já que o meu tempo acabou. Eu vou autobloquear a minha fala para que possamos prosseguir com o nosso debate.(Risos.)

Eu quero agradecer a todos que compõem a Mesa e ao Deputado, que também segue nos acompanhando no debate.

Eu queria só confirmar se o Rogério está de volta.

O SR. PRESIDENTE (Dr. Luiz Antonio Teixeira Jr. Bloco/PP - RJ) - Paola, o Rogério já está de volta na tela conosco.

O SR. ROGÉRIO BARBOSA - Sim, a minha Internet deu um problema, mas agora está tudo certo.

A SRA. COORDENADORA (Paola Carvalho) - Está bom.

Rogério, você tinha gasto 6 minutos e meio do seu tempo. Como eu era a próxima falar, já falei. Agora, vou passar a palavra a você para concluir o seu pensamento, o.k.?

O SR. ROGÉRIO BARBOSA - Depois, vou deixar disponíveis os eslaides para quem quiser requisitá-los. Eu acho isso importante. Não sei se vou conseguir fazer a apresentação como eu queria, mas vou continuar com a mesma mensagem.

Nós fizemos simulações sobre diversos cenários em relação ao desemprego: tal como ele seria em abril; tal como ele seria em maio, caso a tendência de abril continuasse; tal como ele seria em junho, caso a tendência de abril continuasse por mais 1 mês ainda. Em todos os casos, somente um benefício de 600 reais conseguiria compensar as perdas na renda domiciliar per capita. Isso é muito importante enfatizar. Os benefícios de 200 reais e de 300 reais, que já foram ventilados na opinião pública, só conseguiriam conter as perdas na renda domiciliar per capita sob estimativas muito conservadoras de desemprego, que provavelmente já ultrapassamos.

Quando falamos em desemprego de 17%, isso provavelmente não vai ser medido no próximo resultado do IBGE, da PNAD-COVID, que deve sair esta semana, porque muita gente se recolhe à inatividade e deixa de procurar emprego. Então, na verdade, a nossa estimativa de 17% significa 17% de pessoas procurando emprego. Essa é a definição de desemprego.

Isso provavelmente não vai acontecer, porque a pandemia não é muito animadora para se procurar emprego e continuar a atividade no mercado de trabalho. É importante ressaltar isso. Haverá a impressão de queda da pobreza, mas é necessário mencionar que os resultados que provavelmente vão ser observados em breve são, na verdade, transitórios. Um benefício que dura alguns poucos meses não é suficiente para retirar as pessoas dessas condições de moradia precária, de segurança escassa, de insegurança alimentar de todos os tipos. Uma renda transitória desse tipo pode reduzir a pobreza tal como medida monetária nos indicadores, mas não significa a erradicação da pobreza de modo algum, inclusive porque ela é multidimensional e não passa só pela renda.

Então, o benefício de 600 reais é muito importante, inclusive em todos os nossos cenários de simulação em que o desemprego passa um pouquinho do que já passou em abril.

Como financiar uma renda emergencial? Nós propomos, baseados no estudo da Ursula Peres e do Fábio Pereira, uma contribuição social emergencial sobre altas rendas. Isso não é uma reforma tributária, significa simplesmente uma contribuição que pode incidir sobre rendas superiores a 15 salários mínimos. É uma medida parecida com a que o Chile fez quanto ao imposto sobre altas fortunas. Aqui seria sobre a renda e complementar ao Imposto de Renda, mas não seria um tributo permanente. A diferença é que estamos propondo uma contribuição, e a ideia de contribuição precisa provavelmente de maioria qualificada. Então, precisa de uma PEC para passar. Mas, como a aprovação do benefício emergencial foi bastante consensual, acho que é bastante viável politicamente também.

Então, poderíamos estabelecer uma alíquota de 10% para rendas de 15 salários mínimos a 40 salários mínimos; de 15% para 40 salários mínimos a 80 salários mínimos; e de 20% para 80 salários mínimos ou mais. Isso permitiria arrecadar, pelo menos, emergencialmente, 142 bilhões de reais e financiar o que precisamos. Nós colocamos a conta sobre aqueles que estão perdendo menos. Quem está perdendo mais são principalmente aqueles 83%. Isso aqui incidiria sobre o 1% mais rico, fundamentalmente. Então, é viável.

Uma coisa significa bancar a renda emergencial e outra coisa significa tornar um sistema de proteção social forte e duradouro para além da pandemia. É importante ressaltar, como já foi dito anteriormente, que a economia não vai se recuperar rapidamente. Os informais serão os mais afetados. Um quadro crônico de pobreza atingirá pelo menos um quarto da população, com a pobreza e a volatilidade de renda.

As pessoas transitam entre pobreza e não pobreza, formalidade e informalidade o tempo todo. Se tirarmos uma foto, às vezes, elas estão de um lado, às vezes, elas estão de outro. Mas, na verdade, são pessoas que o tempo todo estão voltando para a pobreza. Isso já atingia quase dois terços da população brasileira.

E, como dissemos, o Bolsa Família era um benefício voltado principalmente para os extremamente pobres. Essa população ficava descoberta.

Uma ideia possível, que eu também apoio, é a de uma renda básica que incida, de forma complementar, no sistema de proteção social existente. A proteção social não pode ser "voucherizada". Ela vai para muito além da transferência de renda. Saúde e educação são subfinanciadas. Então, é preciso haver uma viabilidade fiscal.

Existem vários desenhos de baixo custo de uma renda básica e vários modelos de focalização de renda básica. Um deles foi proposto por Sergei Soares, do IPEA, e por diversos coautores no ano passado. O foco eram as crianças, o que acabava afetando bastante os dois terços da população. É principalmente entre os mais pobres que há mais taxa de fecundidade. As pessoas têm mais filhos, ainda que essa taxa esteja declinando.

Então, eu acho que é possível criar um benefício focalizado em crianças e fazer com que isso se torne, na realidade, uma forma indireta de se evidenciar a pobreza e essas pessoas, que são muito voláteis. E é possível fazer benefícios relativamente baratos.

É importante ressaltar que isso significa um incentivo à atividade econômica quando o mercado de trabalho ainda vai estar falido. Isso também significa a possibilidade de arrecadação no âmbito dos Municípios. Isso significa o abastecimento dos cofres públicos municipais e estaduais, além da possibilidade de autofinanciamento, porque essa arrecadação vai para o alimento do sistema e faz com que esse tipo de benefício seja sustentável.

Focalizar nas crianças também faz com que nós não precisemos ter um critério de renda muito definido e que incentive a informalidade. Uma das preocupações dos economistas é que, na verdade, um benefício muito alto faz com que as pessoas deixem de trabalhar no mercado formal. A ideia de que essa medida estimularia o aumento da fecundidade ou o número de pessoas que não queiram trabalhar, demonstradamente, não é verdade e depende da dose que se vai conceder de benefício. Uma dose um pouco mais alta poderia incentivar não o desemprego, não a inatividade, mas, talvez, a informalidade.

Focalizar nas crianças significa que não estou pedindo o contracheque das pessoas. Como os pobres têm mais filhos, isso significa que eu estou focalizando os pobres.

Nossas simulações mostram que o alcance seria relativamente alto, um pouquinho menor do que o Bolsa Família, mas muito maior do que diversos outros benefícios. Isso também é complementar ao BPC, que incide sobre idosos e não é substituído facilmente. E há outras atividades que não são, sinceramente, a transferência de renda que a assistência social faz.

Nós estimamos que benefícios focados em crianças de 0 a 6 anos ou de 0 a 17 anos podem custar de 115 bilhões a 150 bilhões de reais. Isso não é muito caro, pode equivaler a 1,5% do PIB mais ou menos. Nós podemos tornar isso viável através de uma reforma tributária, que agora discuta não só eficiência como também progressividade, sem que isso signifique, necessariamente, um aumento da carga tributária.

É importante dizer que a carga tributária brasileira é um pouco menor do que a da OCDE. Nós não estamos propondo nos tornarmos um país de renda média tão tributador quanto um país europeu, mas existem alternativas viáveis de reforma tributária. Elas são um pouco diferentes do que as reformas tributárias que estavam sobre a mesa no ano passado. Eu acho que dá para avançar nisso.

Enfim, era isso o que tinha a dizer. Peço desculpas por não ter conseguido apresentar os meus eslaides, mas acho que foi uma alternativa mais fácil para evitar que aqui travasse de novo.

Muito obrigado.

A SRA. COORDENADORA (Paola Carvalho) - Obrigada, Rogério. Que bom que conseguimos ouvi-lo até o fim! A Internet não boicotou o nosso debate.

Conforme a organização da Câmara, as perguntas já se encerraram. São 11h12min. Então, vou passar a palavra para a nossa última...

A SRA. TEREZA CAMPELLO - Vai me pular, Paola?

A SRA. COORDENADORA (Paola Carvalho) - Não, vou lhe passar a palavra. Só estou avisando que as perguntas já se encerraram, para que o pessoal da equipe lá me mande os questionamentos, que depois vou passar à nossa mesa de debates.

Vou conceder a palavra à nossa última palestrante da Mesa, Tereza Campello, ex-Ministra do Desenvolvimento Social e Combate à Fome.

Seja bem-vinda, Tereza! Os próximos 15 minutos são seus.

A SRA. TEREZA CAMPELLO - Bom dia a todos! É uma honra enorme participar de Mesa tão qualificada.

Queria agradecer a iniciativa da Presidência da Câmara dos Deputados e da Comissão Externa de combate ao coronavírus e parabenizá-las.

Deputado Luizinho, obrigada pelo convite.

Cumprimento Paola Carvalho, Marcelo Garcia - trabalhou conosco diversas vezes em relação à agenda da assistência social -, Monica de Bolle, Rogério Barbosa e o representante do Governo, Martim Cavalcanti.

Estou me beneficiando ao falar depois de terem sido dadas contribuições tão valiosas. A minha ideia era falar um pouco também sobre a questão da assistência social. Vou me beneficiar bastante das falas tanto da Paola quanto, em especial, do Marcelo Garcia, que já explicaram a importância, a relevância da agenda da assistência social, do SUAS. Eu pensei em dar duas contribuições fundamentais, olhando essa agenda emergencial. Esta foi a proposta que a Câmara nos fez: discutir a emergência.

Eu acho que, para discutirmos a situação de emergência, primeiro é importante atualizarmos um pouco o nosso diagnóstico. Não podemos continuar trabalhando e discutindo a renda básica, a prorrogação da renda básica, como se ainda estivéssemos em março. O que está acontecendo agora e o que já aconteceu ao longo desses 3 meses de calamidade sanitária, humanitária e econômica que o Brasil enfrenta?

Eu queria propor algumas medidas que considero absolutamente relevantes para que possamos não voltar atrás, porque acho que o Brasil errou em tudo que ele podia, o Governo Federal errou em todas as frentes, seja na área da saúde, seja na área sanitária mais geral, seja na área econômica. Vou tentar ver o que podemos fazer daqui para frente para que esta crise de saúde, sanitária e econômica não se aprofunde ainda mais.

Realmente fiquei surpresa com a fala do Martim, porque ela parecia mais a fala de alguém do Ministério da Economia do que a de um integrante do Ministério da Cidadania. Nós estamos numa situação dramática. Parcela gigantesca da população, em especial a pobre e vulnerável, está com medo. Muitos estão passando fome, muitos estão desempregados, todos eles têm medo de se contaminar, têm medo do que está por vir. Eles têm medo do futuro. E muitos já estão enterrando os seus mortos. Nós estamos numa situação em que o Brasil já tem 40 mil famílias que enterraram os seus mortos. Então, é desse lugar que temos de olhar a crise e a situação emergencial.

Para que a renda básica foi criada? A Paola falou um pouco a respeito de onde veio essa renda. O Governo podia ter agido. Nós já sabíamos que essa crise ia nos alcançar. O Governo tinha que ter tomado medidas já em fevereiro e em março. Não precisava ter esperado que, em abril, o Congresso Nacional, ouvindo a população, os movimentos sociais, os partidos da Oposição, tomasse uma atitude e dissesse: "Governo, pague a renda emergencial". Podia ter tomado medidas em fevereiro, podia ter começado a criar aplicativo, podia ter começado a construir meios para lidar com essa população informal, que é conhecida.

Aliás, parte dessa população informal foi criada pelo próprio Governo, ao desmontar a CLT, ao desmontar a legislação trabalhista, ao desmontar toda a base de proteção ao trabalhador que tínhamos.

Essa população já deveria estar sendo organizada, listada, documentada, exatamente para poder ter acesso a esse benefício. Todos os países do mundo se preocuparam em tomar medidas. O Governo não se preocupou. O Congresso teve que entrar.

Qual é o objetivo fundamental da renda básica? É exatamente, no caso, dar cobertura durante a crise sanitária. Como a Monica colocou muito bem, nós vivemos uma crise de saúde, não uma crise tradicional como a de 2008. É uma crise de saúde. Só há uma forma de lidar com esta crise: promover o isolamento social, de maneira coordenada, o que não aconteceu. O Governo Federal não coordenou o processo de isolamento e de proteção da vida das pessoas, seja por conta das medidas que os Governos Estaduais e Municipais tomaram, seja porque a própria população, por medo, acabou ficando em casa. A renda emergencial é um recurso para garantir que a população possa ficar em casa. Portanto, é uma medida de garantia da vida e da saúde. Ficar em casa para não se contaminar e para não contaminar a sociedade, essa era a principal medida com relação aos informais, com relação àqueles que não podem fazer home office, com relação àqueles que não têm renda garantida. Trata-se da maneira como podem se proteger, já que não podem ir para a rua trabalhar. Essa medida era fundamental para que a crise sanitária não tivesse proporções gigantescas, como está tendo.

Ontem o Dr. Sergio Rezende, que compõe o Comitê Científico do Consórcio Nordeste, anunciou um dado impressionante. Se o isolamento tivesse sido feito, coordenado pelo Governo Federal, teríamos evitado 80% das mortes. Ou seja, de quase 40 mil, teríamos evitado cerca de 30 mil mortes. É disso que nós estamos falando e é isso que a renda básica emergencial pode ajudar a compor. É por isso que ela não pode ser interrompida.

Esta crise sanitária, por conta da interrupção da atividade econômica, gera uma crise econômica gigantesca. Não foi só no Brasil que isso aconteceu. Isso aconteceu na Alemanha, aconteceu no México, aconteceu na Argentina, aconteceu em todos os países. Estão vivendo a crise, do ponto de vista da crise sanitária, da mesma forma, como uma crise de saúde gigantesca.

Nós não tomamos as medidas de saúde necessárias. A maior parte dos países está criando condições para que a população possa fazer o distanciamento social, inclusive os pobres, que são os que mais têm dificuldade de fazê-lo, porque não têm água, porque os cômodos da casa são pequenos. Temos que olhar para isso também. Não é só dar renda.

O Governo, ao deixar de tomar as medidas, gerou uma crise, que também é econômica, muito maior. Na minha avaliação, o Governo tinha que ter tomado medidas em três frentes, e não tomou. A primeira é essa com relação aos informais, que o Congresso Nacional acabou assumindo, com os 600 reais. O Governo, que tinha que executar isso, ele o fez mal e tardiamente. Acho que a Paola falou de maneira excepcional, listando o conjunto de problemas.

O Governo também tinha que ter tomado uma outra medida fundamental, essa com relação àqueles que têm carteira assinada, para proteger o emprego. O Governo o fez tardiamente. A primeira medida que apresentou era para suspensão dos salários. O escândalo foi tão grande que teve de recuar. Apresentou a Medida Provisória nº 936, de 2020, que foi muito mal executada e que termina agora.

A questão que eu queria levantar para o Deputado Luizinho e para os Deputados que nos assistem é esta: além da agenda da renda básica emergencial, temos uma agenda estratégica fundamental, que tem de ser observada imediatamente, porque a medida provisória que acolheu os trabalhadores termina agora. Então, eles vão ser jogados numa situação de vulnerabilidade gigantesca. Isso se somará à massa de problemas sociais e econômicos que já temos. A segunda medida, então, era proteger os empregos.

Nós dos partidos da Oposição, em especial no caso do PT, tínhamos vários projetos com esse fim. Um deles, conhecido como Ninguém demite Ninguém, propunha, a exemplo do que os países da Europa fizeram, que o Estado assumisse as folhas de pagamento até determinado valor - até três salários mínimos, era a nossa ideia -, protegendo o emprego.

A terceira medida que o Governo tinha que ter tomado, e não tomou, ou o fez tardiamente, também depois de os Deputados se movimentarem, era a de proteção das empresas, em especial as médias, pequenas e microempresas. As pequenas e microempresas até agora não tiveram acesso aos recursos e estão fechando as portas.

Nós temos um diagnóstico muito preocupante. Qual é a situação hoje quanto à População Economicamente Ativa? Em abril, havia no País 12,8 milhões de desempregados. A esses temos que somar os 5,2 milhões de trabalhadores que não fazem parte da população que não é economicamente ativa e estão em casa somente porque não têm emprego e porque têm que se proteger. Se fizermos a conta certa, veremos que era de 18 milhões o número de desempregados em abril. Isso é um escândalo!

A esses eu queria somar dois públicos que estão invisíveis nessas contas que estamos fazendo. O primeiro deles se refere aos que vão ficar completamente descobertos com o fim dos efeitos da MP 936. Então, vão se somar a esses 18 milhões outros 10 milhões de trabalhadores, em relação aos quais temos que tomar medidas imediatamente. Vamos prorrogar a MP 936? Que medidas vamos tomar para que esses trabalhadores não caiam numa situação de desamparo, já que a legislação trabalhista não consegue protegê-los, dada a situação atual?

Outro público a que ninguém vem prestando atenção até agora é o dos trabalhadores das pequenas e microempresas que fecharam.

Muitas empresas já fecharam as portas e não têm dinheiro nem para pagar os encargos trabalhistas. Essas pessoas estão na rua, no pior mundo, Paola. Eu acho que elas têm que entrar na lista de preocupação de vocês, porque são pessoas que, formalmente, ainda têm um contrato assinado, mas, na prática, já foram demitidas. Essas pessoas não vão conseguir acessar a renda básica emergencial. Constam no CAGED como empregadas, mas, na realidade, estão desempregadas. Portanto, elas estão completamente desassistidas. A situação delas é gravíssima.

A minha avaliação é que vamos ter um patamar de desemprego ainda mais alto. Já estamos vivendo perto do patamar de 20%, e isso vai se aprofundar no próximo período. Então, um contingente de quase 30 milhões de pessoas vai precisar dessa renda básica emergencial.

É importante dizer que a crise sanitária é resultado do coronavírus, mas as mortes não, as mortes são resultado da falta de ação do Governo Federal. A crise econômica foi impactada pelo coronavírus, mas a profundidade da crise que nós vivemos tem a ver com a inação completa do Governo. A crise de desemprego que vivemos hoje não é resultado do coronavírus, a crise do desemprego que o Brasil vive hoje é responsabilidade exclusiva deste Governo, que não protegeu o emprego no País.

Consideremos, por exemplo, a Alemanha, um país capitalista que sempre defendeu a agenda fiscal. E não venham vocês do Ministério da Cidadania fazer a defesa da agenda fiscal frente a 40 mil mortos, frente a quase 30 milhões de pessoas desamparadas. Pelo amor de Deus! Deixem que os que defendem essa agenda façam esse discurso. É um absurdo isso! A Alemanha - é difícil encontrar país mais fiscalista que a Alemanha - tem 4% de desemprego. Por quê? Porque foi o primeiro país a tomar medidas para proteger o povo e para proteger o emprego. O Brasil podia ter feito a mesma coisa.

A consequência de vocês terem sido omissos com relação à saúde, omissos com relação à proteção social, omissos com relação à proteção do emprego é que vamos ter uma crise econômica mais longa, uma crise social muito mais longa e uma tragédia quando essa crise sanitária passar. Esperamos realmente que ela passe. Se depender do Governo, nem sei o que vai acontecer.

Frente a isso, acho que temos três questões que precisam ser enfrentadas e acho que o Congresso Nacional, da mesma forma que se adiantou no primeiro momento, tem que tomar a frente. Eu falo diretamente aos nossos Deputados, aos Parlamentares, quanto a tomar mais uma vez a frente. Primeiro, precisam prorrogar o benefício emergencial, no mínimo, até dezembro - no mínimo, até dezembro -, não só porque há um decreto de calamidade pública mas também porque a crise continuará no próximo período. O decreto está correto. Pelo amor de Deus! Só falta agora o povo suspender o decreto. Então, nem vamos dizer que é por causa do decreto; na verdade, é porque a crise continua.

Segundo, o Congresso tem que nos ajudar a corrigir tais erros. Existe população que está fora do acesso à renda básica emergencial, como os trabalhadores rurais, como os pescadores. O Sistema Único de Assistência Social tem que ser incluído nessa agenda. É preciso conversar com os Secretários Estaduais, é preciso conversar com os Secretários Municipais. É preciso incluir a agenda da assistência social, porque é ela que conhece a população pobre e também pode ajudar a resolver esses problemas.

Não vai ser conversando com o Ministério da Economia e com gente preocupada com a agenda fiscal que vamos resolver o problema de quem está fora do auxílio emergencial, inclusive beneficiário do Bolsa Família. E está dentro quem não podia estar. Existe gente rica que está recebendo esse auxílio. Não há explicação para isso que vocês fizeram. Vocês erraram em tudo! É um absurdo o que vocês fizeram!

Cito a terceira medida. Faltou uma questão fundamental. O Congresso Nacional tem que nos ajudar a construir uma agenda para esses trabalhadores sobre os quais comentei, que tinham carteira assinada, estão passando por uma situação de desassistência e não serão cobertos pela renda básica emergencial. Nós temos que construir imediatamente ações para atender esse contingente gigante de trabalhadores com carteira assinada que vai ser jogado numa situação de desalento no próximo período.

Por fim, eu queria fazer um comentário. Ontem, o Ministro da Economia, em vez de vir a público apontar medidas necessárias e urgentes que devem ser tomadas para salvar micro e pequenas empresas que estão falindo no Brasil, salvar pessoas que estão ficando desempregadas, livrar da morte pessoas que estão ficando doentes, enfim, em vez de vir a público falar sobre a emergência, ele veio a público dizer que vai, no futuro, ao término desta crise - acho que ele pensa que isso acontecerá logo na sequência -, acabar com o Bolsa Família e unificar programas. Ele, com isso, desorganizará toda a rede de proteção social.

Não podemos aceitar que este Governo pegue o maior e mais qualificado programa de transferência de renda do mundo, reconhecido no mundo todo, e o Cadastro Único, que vocês negligenciaram, ignoraram, jogue tudo isso num pacote só e desorganize e destrua a rede de proteção social no Brasil.

Nós só podemos aceitar uma discussão que preserve direitos, sobretudo dos pobres, idosos, pessoas com deficiência, beneficiárias do BPC, promova o avanço da rede de proteção social e reduza desigualdades. E não é nada disso que este Governo vem apontando.

Muito obrigada.

A SRA. COORDENADORA (Paola Carvalho) - Obrigada, Tereza.

Fechamos aqui o nosso debate. São 11h30min.

O Exmo. Sr. Presidente da Câmara dos Deputados, o Deputado Rodrigo Maia, voltou a acompanhar o nosso debate. Acho essencial que ele e o Deputado Luizinho tenham conseguido acompanhar esse processo de discussão.

Eu lhes agradeço e pergunto se querem fazer uso da palavra.

O SR. PRESIDENTE DA CÂMARA DOS DEPUTADOS (Rodrigo Maia. Bloco/DEM - RJ) - Eu quero rapidamente, primeiro, agradecer e me desculpar, porque participava aqui de um evento virtual com o Tribunal de Contas da União. Eu peguei parte dos debates, principalmente o início e agora o final.

Concordo com que a não utilização do Cadastro Único para atendimento aos vulneráveis no caso da renda emergencial foi, de fato, um equívoco por parte do Governo. Houve uma concentração no Governo Federal, o que diverge da linha governamental de menos Brasília e mais Brasil. A forma de pagamento do Governo foi muito mais Brasília e muito menos Brasil, com a concentração desse cadastro, o que acabou gerando esses conflitos.

Mas eu acho que agora o Governo ainda tem tempo para reorganizar essa questão, entre outros temas.

Eu vou fazer só uma pergunta para a Monica. Há um debate acontecendo sobre a questão de qual é a capacidade de endividamento do Estado brasileiro para suprir tantas demandas.

Nós não podemos esquecer que, quando aprovamos esse projeto na Câmara, a projeção que os técnicos do Governo e de fora do Governo nos davam é de que estaríamos alcançando um número de aproximadamente 30 milhões de brasileiros. Eu não sei se chegamos a 50 ou 60 milhões. Isso significou um aumento grande do custo do programa ou do investimento do programa - prefiro chamar de investimento do programa.

Nós vamos ficar, no pós-pandemia, com problemas de renda e emprego entre os brasileiros. As projeções são de que teremos um pico de desemprego no terceiro trimestre, chegando a 18% de desempregados no Brasil. Então, nós sabemos o tamanho do nosso drama, mas sabemos também o tamanho das nossas limitações, por questões históricas, por credibilidade ou não credibilidade internacional.

O que eu queria perguntar à Monica é em cima dos números que todos nós temos. Arrendondando, temos mais 1 mês a 600 reais, são 50 bilhões; em 2 meses, são 100 bilhões; em 3 meses, são 300 bilhões. Lembro que o lucro das empresas em 2019 com patrimônio acima de 1 bilhão de reais foi algo da ordem de 350 bilhões de reais, só para termos uma noção da riqueza gerada pelo setor privado no Brasil ano após ano. Se nós formos avançar no programa por 6 meses... Eu não estou dizendo que não temos que avançar. Estou dizendo que temos que avançar, mas temos que avançar baseados em formulações também do ponto de vista da capacidade do Estado brasileiro de financiar isso.

Então, o que eu pergunto à Monica é como ela vê, primeiro, a prorrogação do programa do ponto de vista da capacidade do Estado brasileiro e como ela vê, segundo, a formulação de um programa permanente - talvez seja necessário esse debate nos próximos meses - e como o Brasil financia isso sem gerar uma perda de controle da nossa dívida pública. A dívida pública todos os brasileiros pagam. Há os que sabem disso e os que não sabem, mas todos nós pagamos a dívida pública brasileira.

A SRA. COORDENADORA (Paola Carvalho) - Obrigada, Deputado.

Eu queria fazer uma sugestão à nossa Mesa. Eu recebi algumas perguntas que chegaram. Pelo adiantado da hora - e tenho um acordo com a TV -, queria sugerir fazer uma leitura dessas questões que chegaram para nós. E depois fazemos uma segunda rodada mais rápida com os questionamentos. Pode ser? De acordo?(Pausa.)

Algumas questões chegaram pelo Deputado Arnaldo Jardim. Ele manda várias questões, na verdade. Vou ler a primeira questão dele:

Os efeitos da pandemia têm sido até aqui devastadores, com centenas de milhares de falências, sobretudo entre as micro, pequenas e médias empresas, desemprego de milhares de trabalhadores, uma chocante queda de renda e vidas perdidas aos milhares, tudo isso aliado ao fato de nada sabermos sobre quanto tempo essa situação vai durar. Não é motivo suficiente para pensarmos em perspectiva de médio e longo prazos?

Prorrogar o auxílio emergencial poderia ser um passo importante para reduzir os impactos negativos dessa pandemia na economia e na sociedade?

Sabemos que os custos de implementação e prorrogação de um programa de renda básica, como previsto na Lei nº 13.982, desafiam a capacidade fiscal do Estado. Mas, diante do cenário atual, faz sentido perguntarmos qual o custo da não implementação de tal programa? Estamos diante de um dilema entre propostas de renda básica emergencial e renda básica regular?

Eu vou pular para outras perguntas, porque senão vamos responder só as de uma pessoa.

A próxima pergunta veio da Maria Isabel. Pelo que eu entendi, é uma pessoa de fora, que não é Deputada.

Muitos cidadãos perderam seus empregos ou suas rendas. Quais critérios serão adotados para os envolvidos continuarem a receber o auxílio emergencial sem o risco de ocorrerem fraudes - por exemplo, quem necessita acabar ficando de fora e quem não se inscreveu ter direito, ou seja, os dados constarem no sistema?

Nós já falamos isso aqui, Maria Isabel. Mas retomamos isso depois para o Governo responder.

Bom dia. Assisti a um programa na TV Câmara no qual se falava do auxílio emergencial. Gostaria de falar sobre o meu caso. Fui demitido pela transportadora na qual trabalhava, no final do ano passado, e recebi seguro-desemprego até março. Quando o Governo Federal instituiu o auxílio emergencial, em abril, fiz o meu cadastro e depois de quase 1 mês recebi a negativa, pois, segundo quem faz a avaliação, eu estava recebendo o seguro-desemprego e minha renda era superior. Mas como pode acontecer isso se eu estou desempregado, não tenho renda e as parcelas do seguro-desemprego acabaram? Fiz a contestação, e até hoje ela se encontra em análise.

Aí ele passa os dados, que eu não vou ler, obviamente, por sigilo em relação à pessoa.

A próxima pergunta é para o Martim. Martim, desculpe, mas eu vou ter que ficar lendo aqui as perguntas.

Pergunta para o Sr. Martim: o senhor afirmou que o sistema criado pela DATAPREV dialoga com 25 bancos de dados. O senhor pode explicar o que aconteceu para que quase 200 mil servidores militares tivessem tido benefícios pelo auxílio emergencial

Prezados, gostaria de perguntar ao Sr. Reis Garcia: muito tem se falado sobre a operacionalização do benefício emergencial, apesar do excepcional trabalho do Governo para operacionalizar esse auxílio e do excelente trabalho da Caixa Econômica Federal. Entendo que poderiam existir mecanismos que atendessem à população em tempos de crise. Nesse sentido, apresentei o Projeto de Lei nº 1.777, de 2019, que torna o CPF um número único. Nesse sentido, o cidadão que já nasce com um número de CPF seria identificado por esse número ao longo da vida. O CPF seria o número do RG, da CNH, etc. Ademais, há a diminuição do papel moeda com o incentivo do pagamento digital. Pergunto para o Sr. Marcelo: essas iniciativas auxiliariam no pagamento do benefício para esta crise e para as futuras? Deputado General Peternelli, do PSL de São Paulo.

Paulo Fonseca: gostaria de pautar neste seminário a importância de um projeto de lei visando criar uma renda básica hoje no mundo. Nem metade de todas as nações tem esse benefício.

Se fosse implantado no Brasil, ele seria fundamental, universal, e a base seria taxar grupos ricos que tenham renda acima de 15 mil reais. Também ressalto a importância de se fazerem reuniões entre Executivo, Congresso e Judiciário visando a diminuição dos salários para arcar com o benefício. Um ótimo dia a todos! Paulo Fonseca.

Eu vou até consultar a Casa aqui, porque muitas perguntas são do ponto de vista operacional. Eu queria fazer uma sugestão para a Mesa. Já que deram essa tarefa para mim, então eu vou organizar. Eu queria sugerir que centrássemos as respostas em questões operacionais que as pessoas estão fazendo e em respostas às questões econômicas para isso, porque as perguntas se repetem. Então, eu queria sugerir que fizéssemos uma rodada de 10 minutos, concentrando as questões que foram apresentadas. A Mesa concorda?

O SR. PRESIDENTE DA CÂMARA DOS DEPUTADOS (Rodrigo Maia. Bloco/DEM - RJ) - Tudo bem.

A SRA. MONICA DE BOLLE - Sim, mas eu posso começar respondendo ao Deputado Rodrigo Maia?

A SRA. COORDENADORA (Paola Carvalho) - Sim, Monica. Pode começar por ti. Não precisamos seguir a mesma sequência das falas iniciais. Pode começar, Monica.

O SR. MARCELO REIS GARCIA - Só um instante: são 10 minutos para cada um ou para todos? São 2 minutos para cada um de reta final?

O SR. PRESIDENTE DA CÂMARA DOS DEPUTADOS (Rodrigo Maia. Bloco/DEM - RJ) - Acho que pode ampliar um pouquinho.

A SRA. COORDENADORA (Paola Carvalho) - Posso? Serão 10 minutos, então, para termos uma margenzinha de mais alguma réplica. Pode ser?

O SR. PRESIDENTE DA CÂMARA DOS DEPUTADOS (Rodrigo Maia. Bloco/DEM - RJ) - Claro.

A SRA. COORDENADORA (Paola Carvalho) - A Monica está com a palavra.

A SRA. MONICA DE BOLLE - Eu acho que a pergunta feita pelo Deputado Rodrigo Maia é extremamente pertinente, obviamente. Esta é a preocupação: exatamente o que vai acontecer com a dívida pública brasileira. Já sabemos que o Brasil não vai ser exceção. O Brasil vai estar junto num bolo de países que vão ver as suas razões dívida/PIB subirem enormemente. Algumas dessas experiências serão comparáveis à brasileira; outras, não. Aqui nos Estados Unidos, por exemplo, a dívida/PIB já subiu 10 pontos percentuais do PIB com um pacote fiscal que foi feito no mês de março. Mas evidentemente a situação da economia americana não se compara à situação da economia brasileira. Então, não temos como usar isso como baliza para nós próprios.

Em relação ao auxílio emergencial, a minha principal preocupação é a extensão do benefício, mais até do que o valor propriamente. Eu acho que, dada a situação que estamos atravessando hoje, dada a gravidade da epidemia e o quadro de saúde pública que se apresenta pela frente, dado que isso vai ter um impacto continuado sobre uma parcela significativa da população brasileira, como vários dos meus colegas aqui neste seminário apontaram, e apontaram corretamente, com números, com dados, com o respaldo necessário, o que eu vejo é o seguinte: temos que prorrogar o benefício no mínimo até dezembro. Como fazemos isso?

Existem dois parâmetros aqui: o parâmetro da prorrogação e o parâmetro do valor. Prorrogando o benefício até dezembro no valor atual, de 600 reais - se fizermos todo o financiamento disso por meio de emissão de dívida pública -, serão 4 pontos percentuais adicionais de dívida pública que vamos criar até o final de dezembro, sendo que já estamos numa trajetória de franca ascensão da dívida pública por duas razões: de um lado, porque já estamos emitindo dívida pública para custear algumas das operações que temos feito de combate à crise; de outro lado, porque vamos ter uma queda muito severa do PIB. Aliás, eu acho que essa daí é até predominante. A queda muito severa do PIB, como estamos falando aqui de uma razão - dívida/PIB -, leva necessariamente ao aumento da razão dívida/PIB, por construção.

Então, temos que ter esse olhar, temos que ter essa preocupação e temos que ter uma outra preocupação, que é a seguinte: embora tenhamos que ter esse foco na proteção social, tem que haver um equilíbrio entre o que vamos dar de sustentação direta às pessoas por meio de auxílio emergencial e o que vamos dar às pessoas de sustentação por meio do SUS. Hoje, do jeito que o Governo desenhou as coisas... Não o Congresso. Acho que o Congresso tem sido protagonista e tem sido de extremo auxílio no combate à pandemia, tem sido o protagonista no combate à pandemia - vamos ser claros. O caso desse equilíbrio entre o que se faz na proteção social e o que se faz na saúde... O benefício de 600 reais, estendido por 6 meses, com esses 4 pontos percentuais adicionais de dívida, causa isso - temos que reconhecer -, causa necessariamente um desequilíbrio entre o que é gasto com proteção social e o que é gasto na área de saúde. E talvez esse desequilíbrio não seja bom.

Portanto, eu penso que um dos parâmetros nos quais talvez tenhamos que mexer, sim, para prorrogar por 6 meses o auxílio - porque os 6 meses eu acho que são inquestionáveis em termos de necessidade -, é como calibramos o valor desse benefício. Como alguns dos meus colegas aqui apontaram, 300 reais talvez sejam pouco, mas podemos pensar, por exemplo, num valor intermediário entre 300 e 600 reais que não adicione tantos pontos percentuais à dívida assim, que não desequilibre a equação proteção social/saúde, que é uma equação fundamental a ser mantida, lembrando que saúde evidentemente faz parte de proteção social - é uma outra perna da maneira como protegemos as pessoas no País. Portanto, eu acho que a discussão tem que estar aí. A discussão tem que estar não na prorrogação. A prorrogação tem que ser de 6 meses, indubitavelmente, porque a crise conosco estará pelo menos até o final do ano. Eu acho que a questão maior é: em que valor fazemos isso, em que valor fazemos essa prorrogação? E, ao dar um benefício de um valor entre 300 e 600 reais por 6 meses, há uma sustentação natural dada à economia e uma sustentação natural dada à arrecadação. Eu penso desse modo. E eu penso que, se conseguirmos fazer algo que não adicione tantos pontos percentuais à dívida pública, mas ainda assim atenda às pessoas que precisam ser atendidas, equacionaremos bem os problemas que temos pela frente.

Então, deixo essas considerações em relação ao auxílio emergencial.

Em relação ao programa de renda mínima permanente, essa é uma outra questão, essa é uma discussão à parte do auxílio emergencial, porque é óbvio que não temos condições de pegar o auxílio emergencial tal qual ele existe hoje nesse valor de 600, cobrindo essas pessoas da forma como ele cobre, e simplesmente tornar esse programa permanente. Não dá. Não cabe nas contas públicas. Dá um valor muito alto, dá um valor de mais de 7 pontos percentuais do PIB - certamente vai ser muito superior a isso tendo em vista que o PIB vai cair. Portanto, esse tipo de programa, dessa magnitude, não temos como custear.

Para além disso, se fôssemos por esse caminho, teríamos alguns problemas de desenho. Teríamos um problema, de novo, de equacionamento entre o que gastamos com proteção social, saúde e educação. Acabaríamos gastando muito mais com proteção social do que com saúde e educação com o percentual do PIB, o que não é bom. Além disso, teríamos também questões relativas a como um programa dessa magnitude poderia gerar incentivos perversos à informalidade.

Então, há questões aqui relativas a como as pessoas se comportariam com um benefício dessa magnitude na saída da crise, quando estiverem decidindo se entram no mercado formal ou se ficam na informalidade. Essa não é uma questão trivial. Portanto, um programa de renda básica desse jeito, na realidade, cria mais problemas do que resolve.

A maneira como eu vejo a discussão da renda mínima é muito parecida com o que o Rogério colocou. Acho que temos um espaço enorme para pensar num programa de renda mínima que atenda crianças em determinadas faixas etárias, como, por exemplo, o que o Rogério mencionou: crianças na primeira infância, de zero a 6 anos, com um programa calculado como algo entre um quarto do salário mínimo e meio salário mínimo para todas essas crianças. Nós sabemos que existem muitas crianças em lares pobres e vulneráveis no Brasil. Com esse programa de renda mínima, desenhado dessa forma, para as crianças, alcança-se uma parcela ou, pelo menos, um montante muito grande dessa população que - como o Rogério falava - entra e sai do mercado de trabalho formal a todo tempo e que não é assistida pelos programas de combate à pobreza como o Bolsa Família. Dessa forma, seria possível chegar a essas pessoas.

Esse tipo de programa custaria algo entre 1 e 1,5 ponto percentual do PIB. Portanto, o que isso gera em termos de custo para a dívida pública é muito pequeno. Inclusive o meu artigo da semana passada e o de hoje para o Estado de S.Paulo, ambos, tratam desse tema olhando a questão dessa forma. Um programa de renda mínima bem desenhado é perfeitamente pagável e compatível com responsabilidade fiscal e social.

Só para encerrar e pegando o gancho do que o Rogério disse, esse tipo de programa é complementar aos programas que já existem. Então, não se trata de deixar de lado ou parar com o Bolsa Família e unificar programas. Não. Vamos deixar o Bolsa Família como ele é. Ele é um programa focalizado em pobreza, ele tem que continuar a existir. Nós podemos complementá-lo com um programa de renda mínima infantil, que não vai custar tanto assim, mantém o equilíbrio entre proteção social, saúde e educação e preenche as lacunas que hoje não são preenchidas pelo nosso sistema de proteção social.

Última palavra sobre isso: esse programa de renda mínima hoje teria a capacidade de gerar mais arrecadação para Estados e Municípios, porque justamente as pessoas que seriam por ele atendidas são as que consomem mais como proporção da renda. Portanto, parte disso volta, porque há mais arrecadação de ICMS e mais arrecadação de ISS. Isso sustenta a receita dos Estados e Municípios, que tanto precisam de sustentação neste momento.

Então, essa é a minha resposta ao Deputado Rodrigo Maia.

Muito obrigada.

O SR. PRESIDENTE DA CÂMARA DOS DEPUTADOS (Rodrigo Maia. Bloco/DEM - RJ) - Muito obrigado, Monica.

A SRA. COORDENADORA (Paola Carvalho) - Obrigada, Monica.

Marcelo, posso passar-lhe a palavra?

O SR. MARCELO REIS GARCIA - Pode, claro! Tenho 2 minutos para falar?

A SRA. COORDENADORA (Paola Carvalho) - O senhor tem 10 minutos. Eu aviso quando faltarem 3 minutos.

O SR. MARCELO REIS GARCIA - Está bem, são 10 minutos.

Eu acho que não vou nem precisar de 10 minutos, mas quero pontuar algumas coisas do debate.

Sobre a pergunta do Deputado General Peternelli, do PSL de São Paulo, acho que o CPF universal e a moeda digital são boas ideias. Enfim, toda boa ideia é muito bem-vinda.

Mas há uma questão que eu queria trazer e que a Ministra Tereza conhece bem. Essa crise toda da pandemia da COVID provou para mim e para muitos de nós, que trabalhamos com pobreza e proteção social, que essa estratégia de estrutura de proteção social no Brasil é muito desconhecida de grande parte das pessoas que estudam a pobreza. Por exemplo, o próprio Cadastro Único, criado em 2001, que completa 20 anos no ano que vem, foi descoberto de repente por várias pessoas, por vários economistas, por vários debatedores da pobreza. Era um documento muito restrito ao público que trabalha no Sistema Único de Assistência Social e que de repente provou ser um instrumento importantíssimo de tradução da pobreza e da desigualdade no Brasil. Mas ele não havia sido discutido abertamente até agora, como foi discutido este ano. Era uma discussão muito restrita.

Quando eu falei bastante do SUAS, não quis falar do passado, não. Eu quis falar do presente e do futuro! Ele está sendo sucateado! Quanto menos estrutura nós tivermos para atendimento às famílias pobres, mais vamos ter distanciamento para a construção de travessias de mobilidade social. Acreditar que só transferência de renda vai resolver a mobilidade social é um problema muito grande que temos que enfrentar nos debates. A mobilidade social precisa ser conquistada no trabalho entre o trabalhador do SUAS e a pessoa que está... É preciso tirar essa população da inércia social. Ela caiu na inércia. Ela precisa que haja discussões, ela precisa participar e debater para sair da inércia. Então, jamais se quer falar do passado ou contar uma história. Eu estou preocupado é com o presente e com o futuro.

Nós estamos sucateando um sistema de proteção social que levou 20 anos para ser construído. E, de repente, recebemos uma notícia... Por exemplo, o representante do Governo disse que a LOA deste ano veio prejudicada, só com 100 milhões para o CRAS. Quem fez a LOA deste ano foi o Governo (falha na transmissão), não foi o Governo passado. Quem fez a Lei Orçamentária Anual foram vocês, que desprestigiaram o trabalho dos Centros de Referência de Assistência Social colocando 100 milhões. Eu queria que os senhores do Governo soubessem que os trabalhadores estão sem receber salários há 2 meses! Talvez, vocês desconheçam também que o CRAS não é tripartite, o CRAS é único, ele faz parte de um sistema, do Sistema Único de Assistência Social. Então, vocês erram ao dizer que ele é tripartite. Ele faz parte de um sistema único! E esse sistema, que tem colaboração efetiva do Governo Federal, está sendo desmontado pelo Governo Federal. E o senhor provou isso quando disse que colocou 100 milhões na LOA. Quem fez a LOA foram vocês!

E o que é que está acontecendo? Eu quero chamar a atenção mais do Rogério e da Monica para o que está acontecendo nas cidades: os CRAS estão fechados e sem equipe, estão completamente sem equipe. Há CRAS funcionando com um trabalhador! Então, é claro que a população não vai receber atendimento! Daí, eu fico pensando numa questão da fala do Martim - e concordo com a Ministra Tereza, parece que estou ouvindo o representante do Ministério da Economia: palavras como "gente", "família", "vida", "humanidade", "território", "mobilidade social" não aparecem mais. Eu ouço a palavra "inflação", a expressão "responsabilidade fiscal" e várias outras que não deveriam vir do Ministério da Cidadania.

De lá deveria vir a preocupação com a vida, o lamento pela morte! Como bem disse a Ministra Tereza Campello, 40 mil brasileiros morreram - isso dos que foram notificados, porque muitos não foram notificados -, e 40 mil famílias estão sofrendo.

Quando vemos os cemitérios com covas abertas, sabemos que quem está sendo enterrado nesses cemitérios abertos agora não são pessoas de famílias ricas, e sim de famílias pobres, porque os ricos têm jazigo nos cemitérios das cidades. Quem está naquelas covas rasas são os pobres, que não tiveram acesso à proteção social durante esse tempo todo. E aí não adianta colocar a culpa na LOA! Na realidade, o que estamos discutindo aqui é projeto de Governo, projeto de País, projeto de vida. E o projeto deste Governo não favorece a vida. Está claro que favoreceu a morte nesses últimos 3 meses! E eu não estou falando do passado, estou falando do presente!

Se palavras como "gente", "família", "mãe", "criança" e "infância" deixaram de ser importantes, eu realmente lamento. E gostaria de ouvir do representante do Governo essa preocupação, a preocupação com o sistema de proteção que atende a famílias que não têm onde ser protegidas. Os CRAS, os assistentes sociais, os trabalhadores do SUS conhecem essas famílias, poderiam estar atendendo a essas famílias. Foi supercomum, nesse processo do aplicativo, pessoas não terem acesso à Internet. Elas não tinham smartphone; elas foram atropeladas pela modernidade, que nunca chegou à vida delas! E elas não podiam recorrer aos CRAS, porque os CRAS não tinham essa autonomia. Ficou centralizado num banco, a Caixa; não ficou centralizado nos Municípios. Cadê o discurso Mais Brasil, menos Brasília? Ficou tudo em Brasília, dependendo de uma ouvidoria telefônica, como se estivesse falando automaticamente com alguém. As pessoas estavam desesperadas tentando entrar no aplicativo, mas não tinham smartphone, não tinham Internet, não tinham nada! E não podiam acessar os CRAS, porque eles também estão sem receber recursos há 2 meses.

A preocupação que o Governo demonstra com a segurança da saúde dos trabalhadores - o.k., mais 3 minutos - não é a mesma que tem com o salário dos trabalhadores da proteção social. Eles estão com 2 meses de atraso! Há as Portarias nºs 369 e 378, e ninguém consegue entender como gastar o dinheiro.

Monica, 2,2 bilhões de reais foram repassados para os Municípios e estão parados nas contas, porque os Municípios não sabem prestar contas e não querem correr o risco de, depois, terem que responder às Controladorias Gerais dos Estados e aos Tribunais de Contas. Não sai um documento razoável do Ministério da Cidadania sobre como usar o dinheiro. Outra questão: vocês criaram várias entidades com as quais as Prefeituras precisam fazer convênio. Isso não acontecia desde os anos 1980. Vocês usaram o Fundo Nacional de Assistência Social para repassar dinheiro para a entidade oferecer trabalho para as Prefeituras, que não recebem esse dinheiro para poderem realizar o trabalho.

Então, eu queria finalizar esses 10 minutos dizendo que não vou ficar quieto em relação ao assassinato que o Governo Bolsonaro quer fazer com o Sistema Único de Assistência Social.

Não esperem de mim esse silêncio. De mim, vocês não terão esse silêncio. Eu vou lutar, sim, pelo Sistema Único de Assistência Social, pelos Centros de Referência de Assistência Social e pelo direito de os trabalhadores desse sistema receberem seus salários em dia, para poderem proteger e atender à população mais pobre do País. Eles não estão recebendo, os CRAS não estão funcionando, e os 2,2 bilhões que foram repassados pelo fundo, sem pactuação da Comissão Intergestores Tripartite, sem deliberação do Conselho Nacional de Assistência Social, estão parados há quase 1 mês, porque os Municípios não sabem como executar o recurso. Estão de forma carimbada, sem liberdade, sem olhar o próprio território, sem a possibilidade de construir diálogo com a sociedade local. Dois bilhões de reais estão parados na conta há 1 mês!

Vou encerrar a pedido da Paola. Ela está certa, está correta.

Mas quero dizer apenas que o Sistema Único de Assistência Social, queira ou não o Governo Federal, vai sobreviver. Há muita gente lutando por ele.

A SRA. COORDENADORA (Paola Carvalho) - Obrigada, Marcelo. Foi muito boa a sua fala.

Quando se está na coordenação da Mesa, há essas coisas, como fazer o papel de chata também.

Vou fazer uma combinação com a Mesa: vou passar a palavra ao Rogério. Martim, posso deixá-lo mais para o final, já que estamos levantando algumas questões para o próprio Governo responder?

O SR. MARTIM CAVALCANTI - Sem problema.

A SRA. COORDENADORA (Paola Carvalho) - Rogério, eu o aviso também quando faltarem 3 minutos. Pode falar.

O SR. ROGÉRIO BARBOSA - Na realidade, vou me ocupar muito menos do que 10 minutos. Só quero reforçar um ponto sobre o uso do SUAS, que, na verdade, foi deixado de lado e certamente poderia ter evitado uma série de outros problemas. Especialmente pelo fato de os CRAS estarem presentes em mais de 99% dos Municípios, eles fazem a regularização de CPF, fazem o Cadastro Único e são responsáveis, há muito tempo, pelas buscas ativas, que, nos últimos tempos, foram reduzidas. Isso certamente poderia ter evitado fraudes, filas e tornado mais célere o processo de concessão da renda emergencial.

Um segundo ponto refere-se ao financiamento tanto de uma renda básica emergencial quanto de uma renda permanente.

E queria pontuar novamente a ideia da possibilidade de uma contribuição emergencial sobre altas rendas, a partir de 15 salários mínimos. Isso é viável. A Argentina acabou de propor algo parecido. O Chile, que em geral tem um viés mais liberal, também propôs algo semelhante. Não se trata de um imposto permanente, mas de uma contribuição provisória, que evita exatamente a emissão de dívida pública para financiar esse caminho. É uma possibilidade.

Mas, no longo prazo, saindo então do emergencial, a discussão do fortalecimento da proteção social no Brasil e de uma eventual renda básica, em algum modelo viável e fiscalmente responsável, passa necessariamente por uma reforma tributária, que, ainda que mantenha a carga tributária tal como está, que já é relativamente elevada, tenha que ser necessariamente progressiva. E existem vários modelos para isso e várias possibilidades de implementação.

A tributação de lucros e dividendos, às vezes propagandeada por aí, não é uma panaceia.

Mas certamente traria em torno de 80 bilhões para os cofres públicos, de acordo com as nossas estimativas. Existem também outras possibilidades. Então, não é, na verdade, um problema que deve ser tabu, ainda mais porque entre os países de renda média ou alta, inclusive os da OCDE, apenas o Brasil e a Estônia deixam de tributar essa fonte de renda.

Mas eu acho que o mais importante é pensar num sistema que proteja não só agora os extremamente pobres, como era o caso do Bolsa Família e do BPC, que devem ser mantidos e são muitos importantes, mas também uma população que vai se tornar mais volátil durante a crise que vai se estender após a pandemia.

Então, como eu mencionei anteriormente, se nós temos dois terços da população que entram e saem da pobreza e a única forma de mensurarmos e capitarmos isso seria segui-los ao longo do tempo por uma quantidade razoavelmente longa de tempo -- nós não temos esses painéis longos no Brasil --, o que nós podemos fazer para impedir que eles sejam ora vistos como formais, ora vistos como informais, ora vistos como pobres, ora vistos como não pobres é estender um benefício que chegue até essas pessoas. Eu acho que isso vai ser relativamente incontornável ou, então, nós vamos ter, de fato, problemas socioeconômicos duradouros e quase irreversíveis no curto prazo. A conta vai vir, na verdade, de diversas outras formas, desde problemas de saúde, de educação, (falha na transmissão) e também eventualmente até de segurança pública e de outras formas.

Eram essas as minhas mensagens.

Muito obrigado, Paola. Muito obrigado, Deputado Rodrigo Maia. Foi um grande prazer, na verdade, participar dessa Mesa e uma honra compô-la com tanta gente legal e importante. Muito obrigado.

A SRA. COORDENADORA (Paola Carvalho) - Muito obrigada, Rogério.

Eu posso passar a palavra para você, Tereza? Depois, eu passo para o Martim, faço as minhas considerações aqui, já que eu coordeno a Mesa, e fecho o seminário, tá bom?(Pausa.)

A palavra está com você, Tereza.

A SRA. TEREZA CAMPELLO - Quero, mais uma vez, agradecer a participação. É superimportante o debate. Parabéns, Presidente Rodrigo Maia! Parabéns a todos que fizeram essa proposta! Também é uma alegria ter participado com vocês.

Eu queria responder a uma pergunta que eu gosto muito de fazer e foi feita pelo Deputado Jardim, que é qual o custo de não fazer. Eu gosto de olhar o debate sobre custo por essa ótica. Quanto custaria não ter criado a renda básica emergencial? Quanto custará não prorrogar a renda básica emergencial nestes próximos 6 meses?

Eu acho que o impacto acontecerá em três áreas. O primeiro impacto será na saúde, porque, na verdade, essas pessoas, não ficando em casa, serão obrigadas a ir para a rua tentar garantir sua vida. Então, a renda básica hoje é uma medida estratégica do ponto de vista de saúde pública, do ponto de vista de solução para a crise sanitária, é tão estratégica quanto os recursos que estão indo para o SUS. Então, eu acho difícil nós podermos jogar um recurso contra o outro: colocamos dinheiro no SUS, compramos equipamentos... Eu acho que garantir uma renda e garantir que as pessoas possam ficar em casa é fundamental do ponto de vista da crise sanitária. Portanto, custará vidas.

O segundo impacto custa a segurança alimentar, porque esse recurso não é um recurso que nós estejamos tratando como renda lato sensu.

É uma renda que as pessoas estão investindo em comida. É só analisar e ver que elas não estão comprando roupa. Ninguém está guardando dinheiro. Esse é um dinheiro que vai todo, basicamente, para a segurança alimentar.

Essa é uma agenda também estratégica, considerando inclusive que essa comida é produzida no Brasil. Portanto, há impactos maiores, generalizados, do que em outros países que não são grandes produtores de alimentos como o nosso.

E aí eu já caio na questão econômica, terceiro impacto. Essa população não teria outra solução. Nós temos que inclusive considerar, por exemplo, um cálculo que o Prof. Marcelo Neri fez para nós quando comemoramos 10 anos do Bolsa Família. De cada 1 real que gastamos no Bolsa Família, volta para a economia 1 real e 78 centavos, ou seja, o multiplicador do PIB do Bolsa Família é 1,78. Eu acredito que o multiplicador da renda básica emergencial é também 1,78 - é por aí, se não for maior - neste momento de crise.

Portanto, nós temos que conseguir fazer essa economia. E os empresários também têm que conseguir olhar isso do ponto de vista estratégico. Esses recursos estão ajudando o Brasil a não afundar mais, estão garantindo um colchão mínimo de funcionamento para a nossa economia, estão garantindo o mínimo de demanda no País, estão garantindo que nós não paremos completamente.

Então, eu acho que essa é uma questão fundamental. A renda básica é importante para a economia também. Vamos botar isso na conta.

Já que todo mundo falou, queria falar, rapidamente, sobre o renda básica. Eu não queria tratar desse assunto, porque o objetivo era a renda básica emergencial e a questão da calamidade pública. Até acho que esse é um debate para o qual, talvez, a Câmera pudesse nos convidar para fazer uma segunda rodada no futuro, para aprofundarmos esse debate. Eu acho que ele é fundamental. Estou vendo aqui a sinalização da Monica. Acho que ele é importante mesmo.

No entanto, eu queria levantar duas questões. Também acho superimportante olhar a renda básica. Fiquei contente de ouvir de todos vocês que ninguém acha que a renda básica deve substituir a rede de proteção social.

Portanto, nós estamos falando em expandir a rede de proteção para além daquilo que já existe. Eu acho fundamental que, toda vez que formos falar sobre o tema, nós reafirmemos isso. Não é isso o que o Governo fala. Então, nós temos que ter muito cuidado. Temos que reafirmar que isso é excelente.

Eu sempre me pergunto se, num país desigual como o nosso - a ideia é muito generosa, é encantadora e já vem sendo defendida pelo nosso querido Suplicy há muito tempo -, tão desigual quanto o Brasil, cabe distribuir renda em valores iguais para todo mundo, inclusive para os ricos, mesmo que olhemos só as crianças. Acho que esse é um debate que nós temos que fazer. É um debate legítimo, é um debate do bem, é um debate preocupado em melhorar a rede de proteção social.

Agora, nós vivemos um risco hoje no Brasil. Temos maioria? Eu tenho que perguntar isso, porque senão nós acabamos embalando numa discussão e vamos pagar as consequências dela. Nós temos maioria no Congresso Nacional hoje para abrir um debate sobre a renda básica que não gere o risco efetivo de desmonte da proteção social construída na Constituição Federal de 1988? Eu não acredito nisso. Nós temos maioria hoje para garantir que o debate sobre a renda básica seja um debate que preserve os direitos, que expanda direitos? Eu não tenho essa confiança.

Então, existe um risco embutido nessa discussão. E o Governo vai saber aproveitá-lo. O Governo quer desmontar a rede de proteção social construída na Constituição Federal de 1988.

Já vem fazendo isso.

Trata-se de um debate em que toda a questão social está submetida à Emenda Constitucional nº 95, portanto com um teto de gastos. É um debate, portanto, que discute quem vai perder. E quem vai perder, na minha avaliação, serão os de sempre: os pobres, os aposentados, a classe média de baixa renda, a população do BPC.

Eu entraria nesse debate com muita alegria, porque acho bom fazê-lo, contudo acho que ele tem riscos nesta conjuntura. E nós temos que estar atentos a isso. Todos que estão falando sobre isso aqui na Mesa eu conheço, e eu sei que as pessoas estão preocupadas em melhorar e em expandir.

Entrando um pouquinho no debate sobre fundos, eu acho que os fundos públicos devem ser usados hoje, prioritariamente, para olhar a agenda da desigualdade, que é uma agenda que tem impactos terríveis sobre a questão econômica. Hoje a desigualdade é um obstáculo. O nível de desigualdade no Brasil é tão alto, que é um obstáculo ao próprio desenvolvimento econômico do País. Nós temos vasta literatura produzida sobre isso.

E existe como melhorarmos tanto do ponto de vista de fundos públicos quanto do ponto de vista da arrecadação. O Brasil hoje tem como fazer uma arrecadação mais progressiva. E o Brasil tem duas fontes de renda, afora uma reforma tributária progressiva, que avance principalmente sobre os ultrarricos. Nós estamos falando - vou usar os meus 3 minutos aqui - dos 0,3% dos multimilionários que existem neste País. Podem dar uma contribuição para melhorarmos um pouquinho a desigualdade?

Agora, nós temos outros fundos. Aproveitando a pergunta do Deputado Rodrigo Maia, nosso Presidente, digo que nós temos 296 bilhões de reais em desonerações fiscais. Eu acho que nós poderíamos rever pelo menos 30% dessas desonerações. Isso geraria quase 90 bilhões de reais, que poderiam ser utilizados para que pudéssemos melhorar o perfil de distribuição de renda no Brasil.

E nós temos uma sonegação estimada, por baixo, em 570 bilhões de reais. Se nós conseguíssemos enfrentar pelo menos 30% do que existe de sonegação no Brasil... E isso sempre é perdoado! Nunca é perdoado o problema dos pobres. Não está sendo perdoado o problema de enfrentamento que as micro, pequenas e médias empresas estão sofrendo no Brasil. Nós só perdoamos dívidas dos multimilionários: 570 bilhões de reais. Se nós pegássemos só 30% disso, dariam 170 bilhões de reais. Portanto, nós temos uma folga, enfrentando as desigualdades, que é desigualdade dos grandes.

Para finalizar, eu acho que nós temos alguns aprendizados, frente a esta tragédia humanitária. Primeiro, quem é que vai salvar, em última instância, a economia em todos os países do mundo? O Estado. É o Estado que está entrando, salvando a economia, salvando vidas. Onde isso aconteceu - não aconteceu aqui no Brasil -, nós vamos ter um problema com os dois, com as mortes e com a economia. Os dois vão morrer, em última instância. Assim, há a importância do Estado.

Segundo, há a importância do Sistema Único de Saúde, que sempre foi tão maltratado. Finalmente, nós temos o Sistema Único de Saúde valorizado. Há quem diga: "O sistema vai sair enfraquecido". Não, eu acho que vai sair fortalecido, porque veio à tona a importância de haver um sistema único que proteja a população, inclusive do ponto de vista da vigilância sanitária.

O Sistema Único de Assistência Social também vai sair fortalecido. Por quê? Ficou evidente que o abandono do SUAS é o gerador desse conjunto de bate-cabeça e de trapalhada do Governo com relação à transferência de renda.

E eu acho também que chegamos à conclusão, finalmente, de que programas de transferência de renda são importantes, são estratégicos, com diferentes aspectos, valorizando uma coisa de que sempre falo: houve quem achasse que a população pobre no Brasil era pobre porque não trabalhava; ficou claro que os brasileiros pobres são trabalhadores. Nós estamos falando da população pobre, que é trabalhadora. Esses recursos estão protegendo os trabalhadores. Não existe este contraponto: pobre versus trabalhador. Não, os pobres trabalham, e trabalham muito. Têm que ser protegidos, porque eles são fundamentais para que o País avance, para que a saúde avance, para que a vida avance e para que saiamos juntos desta situação de calamidade.

Muito obrigada.

A SRA. COORDENADORA (Paola Carvalho) - Obrigada, Tereza.

Martim, eu vou passar a palavra para você, por 10 minutos. Não é porque as perguntas para você foram muitas que você vai ter mais tempo!(Risos.)

Você vai precisar ter capacidade de síntese. Depois, eu finalizo o nosso debate. Por favor, Martim, você tem a palavra.

O SR. MARTIM CAVALCANTI - É importante este debate, é importante ouvir. Eu não tenho a pretensão de ser conhecedor de tudo, de ter todas as respostas. Por isso, sempre é importante o debate, assim como a pluralidade de ideias.

Permitam-me só discordar da visão do Marcelo Garcia com relação ao Orçamento. A PLOA é do Governo, o Orçamento é do Congresso, a Casa legítima para debater onde vão ser alocados os recursos. E há mais: o Congresso faz o debate final de onde serão alocados os recursos orçamentários; adicionalmente, este ano o Orçamento é impositivo. Este ano eu já tive problema para mexer em recurso de um programa para outro dentro do Ministério da Cidadania, porque, quando eu fui tentar fazer isso, não foi permitido. A Secretaria de Orçamento Federal falou que, por ser impositivo o Orçamento, eu não posso mexer. E este foi também o problema exatamente da RP9. Foi o que aconteceu com o CRAS.

Quero deixar claro que o Governo em hora nenhuma quis destruir o Sistema Único de Assistência Social; pelo contrário, nós lutamos. Quando vimos que os recursos em RP2, que os recursos discricionários que tínhamos para alocar no SUAS eram insuficientes, nós pedimos - há um ofício nosso para o Ministério da Economia - que fossem adiantados os recursos do final do ano. Enquanto os recursos decorrentes de descontingenciamento, de regra de ouro e de outras questões fiscais não vinham, nós pedimos que os recursos fossem antecipados para que o CRAS e o CREAS não sofressem. Houve, sim, sempre essa preocupação. Há uma preocupação de manter o sistema funcionando.

Com relação à fala da Monica de Bolle, que diz que o programa mais falha do que acerta, eu discordo. Eu acho que foi um programa desafiador. É o maior programa que já foi feito num curto espaço de tempo. O programa da DATAPREV para fazer o big data deles é novo. Foi uma coisa que começou do zero. Os cruzamentos, a rotina, tudo é completamente diferente do que se faz para o INSS.

Agora, há falhas? Há, e nós o reconhecemos. Nós corremos e identificamos as falhas. Nós ouvimos o CNJ, a Defensoria Pública da União, o Ministério Público Federal, e corremos para tentar saná-las. Eu acho que pensar que um programa desse tamanho, com esse vulto e montado em tão curto espaço de tempo não teria falhas é, no mínimo, uma ingenuidade.

Com relação à questão dos invisíveis, da PNAD e de que o Governo foi surpreendido pelos informais, realmente não projetamos no começo os informais, mas houve preocupação da nossa parte. E nós conhecemos, sim, a PNAD Contínua e trabalhamos com os microdados da PNAD Contínua.

Eu fui, durante 9 anos, do Conselho Curador do IBGE e participei da formação da PNAD Contínua, desde o primeiro seminário. Participei de todos os seminários. Conheço o Cimar, que está à frente da PNAD, desde quando ele ainda estava à frente da PME - Pesquisa Mensal de Emprego, e converso muito com ele.

Contudo, existe uma questão sobre a qual somos questionados pelos órgãos de controle, como o Tribunal de Contas da União, porque o número de informais que nós achamos está muito superior ao da PNAD. Hoje, eu tenho que responder a um órgão de controle por que estou gastando com os informais mais do que o projetado com base na PNAD. Ora, como gestor, eu tenho que explicar essa questão a um órgão de controle.

Sobre os 43 milhões de reais gastos, que você mencionou, Paola, digo que isto se dá com base na lei, com os critérios legais, assim como ocorre com as 705 mil pessoas do Programa Bolsa Família. Sou cobrado, inclusive... Hoje, estou respondendo a questionários da CGU e do TCU, porque no achado deles há pessoas recebendo pelo Bolsa Família que não deveriam receber, de acordo com os critérios legais. Cito, por exemplo, menores de 18 anos. Tenho menores de 18 anos no Bolsa Família, mas, pela lei, eu não posso pagar. Eu estou respondendo à CGU e ao TCU, hoje, por isso - e não só por isso, mas também por outras questões legais. São critérios impostos pela lei que não me permitem pagar. Essas 705 mil famílias do Bolsa Família não receberam auxílio emergencial devido a uma questão legal. Há, portanto, uma trava legal.

Com relação à não prorrogação até o final do ano, há, neste caso, a questão do decreto. Por que o decreto vai até o final do ano? Isso foi algo construído pelo Governo junto ao Congresso Nacional, com a grande participação do Presidente Rodrigo Maia, com o grande apoio de S.Exa. Houve um entendimento acerca da situação. Nós também entendemos que esta é uma situação única e desafiadora. Nós queremos ajudar a todos os brasileiros e entendemos a preocupação dos vulneráveis. Este é o nosso foco: as pessoas que perderam a renda. Queremos tentar chegar a todas elas. Este é um grande desafio que nós enfrentamos.

Mas por que o decreto vai até o final do ano? Vamos supor que eles optassem por colocar um decreto desses até outubro. Qual seria a consequência? A consequência seria que, pelas regras fiscais, eu estaria amarrado, porque de tudo que estou fazendo, porque o decreto me permite esta excepcionalidade, eu teria que voltar atrás em novembro.

Além do decreto, é importante a ADPF julgada no Supremo Tribunal Federal no final de março, porque me permitiu não obedecer a artigos da LRF, da LDO e da Constituição. Sem isso, eu não conseguiria fazer esse gasto. Isso foi algo que teve de ser construído com o Congresso e com o Supremo Tribunal Federal. Por isso, eu não conseguia entrar com um auxílio desses antes. Se eu entrasse e começasse a fazer um crédito extraordinário daquele montante antes, eu estaria cometendo um crime de responsabilidade fiscal. Como gestor público, como funcionário público, eu não poderia assinar. Hoje eu já respondo a órgãos de controle, como TCU e CGU. Sem a ADPF que a AGU entrou no Supremo para permitir que eu fizesse esses gastos, eu não conseguiria realizar o programa.

Por isso, o programa começa na medida em que nós conseguimos construir o decreto legislativo, junto com o Presidente Rodrigo Maia, e quando conseguimos construir esse entendimento junto com o Supremo, inclusive um entendimento com relação à regra de ouro, uma regra constitucional. Caso contrário, eu estaria cometendo crime de responsabilidade fiscal. Simplesmente, os pedidos que fiz antes - e os que faço - ao Ministério da Economia não passavam, quanto a orçamento a ser atendido. Não saíam da Economia.

Portanto, eu tenho que ajudar a viver num mundo em que eu construa a solução. Eu tenho que buscar a solução para atender a essas pessoas. Eu tenho que ajudar a construir e ajudar essas pessoas. Essa é a minha preocupação.

Com relação aos militares - foi uma pergunta feita -, no começo nós não tínhamos a base dos militares, o Ministério da Defesa não tinha nos repassado a base. A primeira base que eles nos repassaram, que dá esse número de duzentos e tantos mil, é uma base problemática, porque eles mandaram inicialmente uma base histórica. Então, eu tinha gente que havia sido recruta do Exército 5 anos atrás, que já havia se desligado, que teria direito ao auxílio emergencial. Então, eu acabei depois gerando um bloqueio para essas pessoas.

Agora, quando eles me disponibilizam uma base de folha de pagamento - tenho a de março e a de abril, e estou solicitando a de maio, que ainda não tenho, apesar de tudo; eu já pedi, e não tenho a base da folha de pagamento de maio do Ministério da Defesa -, eu consigo exatamente filtrar para que militares na ativa e da reserva e os pensionistas não recebam.

Com relação aos óbitos, é também uma questão legal, mas nós aprimoramos. Hoje eu tenho que responder - e estou respondendo - ao TCU e ao CGU, como gestor, porque eu aprovei o pagamento de auxílio emergencial para pessoas que estão registradas como óbitos. Onde? No SISOBI e no SIRC, que são os dois sistemas usados para registrar óbitos.

O que nós estamos fazendo para tentar ver a questão do óbito? Nós estamos conseguindo construir uma chave, porque muitas vezes são pessoas humildes e, às vezes, quando alguém da família morre, a pessoa acaba fazendo o registro no cartório com o CPF dela. Então, legalmente essa pessoa está morta. Agora nós estamos indo além. Nessa chave, nós olhamos, no registro do cartório, se a data de nascimento daquele CPF bate com a data do outro. Se não bate, eu estou pagando. São desafios que aparecem na execução e que nós vamos sempre tentando atender.

Outro desafio que já apareceu na CGU foi o entendimento com relação à renda. O entendimento da CGU era de que teria que ser meio salário mínimo per capita e até três salários mínimos, ou seja, se houvesse uma família que ganhasse mais de três salários mínimos, mas a renda per capita fosse inferior a meio salário mínimo, ela não seria elegível. No nosso caso, o nosso entendimento foi este: nós preferimos que essa família que ganha, pelo rendimento declarado, mais de três salários mínimos, mas cuja renda per capita seja inferior, que ela tenha direito ao auxílio emergencial. A única situação, na renda, em que ela é excluída é quando a renda é superior a três salários mínimos, e a renda per capita é superior a meio salário mínimo.

Portanto, nós estamos entendendo que o Ministério tem sempre tentado aprimorar, está sempre aberto ao debate, sempre tentando fortalecer a Rede SUS, sempre tentando garantir que os recursos cheguem.

Com relação à pergunta sobre a Rede SUS, o Secretário Especial do Desenvolvimento Social, Sérgio Queiroz, com certeza pode abordar muito melhor este tema. Eu estou realmente muito mais focado lá em atender o auxílio emergencial.

Eu acho que essas foram algumas das questões colocadas, a que tentei responder. Há somente uma última questão, a comparação com a Alemanha. Só há um problema com a comparação com aquele país: a Alemanha sai de um patamar fiscal diferente do nosso. Se nós estivéssemos fazendo um superávit de 4,25, como já fizemos, eu teria muito mais capacidade de ação do Estado do que tenho hoje. Eu estou saindo de um déficit primário, de um déficit primário que acontece há 5 anos devido a decisões equivocadas que foram tomadas no passado. Então, essa é uma diferença fundamental, é o meu limite de capacidade de reagir, que é exatamente a pergunta do Presidente Rodrigo Maia.

Se eu tivesse uma capacidade maior de agir, com certeza... A Economia até hoje não nos disse "não", depois que passaram tanto o decreto quanto a ADPF. Hoje, pelo que a Economia nos informou, só em função de auxílios, não só o auxílio emergencial mas todos os outros, ela já liberou mais de 350 bilhões de reais para a economia. No auxílio emergencial, são 152 bilhões de reais para esses 3 meses.

Há prorrogação? Parece-me que sim, vai ser feita uma prorrogação. O debate, como eu disse, é importante que o debate seja feito no Congresso. É uma visão pessoal minha - é uma visão pessoal, não do Ministério - é que não deveria ser através de MP, mas sim através de um projeto do Congresso, que o Congresso debateria. O Congresso é a Casa do debate. Esse é o local para se debater a questão do auxílio emergencial, por Deputados e Senadores.

É isso que eu tenho a falar.

Muito obrigado.

A SRA. COORDENADORA (Paola Carvalho) - Obrigada, Martim.

A Monica pediu um minutinho.

Eu vou ficar bem atenta ao seu minutinho, Monica!

A SRA. MONICA DE BOLLE - São três pontos, será muito rápido.

O primeiro ponto diz respeito ao desconhecimento que o Martim disse a respeito dos elegíveis. Ora, nós que trabalhamos com isso, que calculamos os números e que sabemos, já sabíamos quem eram os elegíveis a partir do momento em que a Lei do Auxílio Emergencial começou a ser discutida, em que o projeto de lei começou a ser discutido no Congresso. Então, essa explicação, sinto muito, não cola.

A segunda coisa que não cola é esta: execução. Vocês tiveram tempo para se preparar. E num País onde temos programas sociais já com capilaridade, como o Bolsa Família, vocês tinham uma ampla rede - uma ampla rede - sobre a qual se calcar para poderem justamente fazer a execução correta desse benefício. Portanto, as suas explicações não atendem às perguntas que foram feitas.

E, por último, o decreto de calamidade saiu no dia 20 de março. Então, essa conversa de que não podíamos pagar o auxílio porque estaríamos infringindo a Lei de Responsabilidade Fiscal também não cola. O decreto foi do dia 20 de março, a Lei do Auxílio Emergencial entrou em vigor no dia 2 de abril.

Portanto, sinto muito, mas as suas explicações aqui, hoje, não deram conta das perguntas que foram feitas.

O SR. MARTIM CAVALCANTI - Perdoe-me, mas não é só a questão do decreto; a ADPF é que me permite. A ADPF é do dia 29 de março. Então, a partir daí é que eu consigo realmente fazer. Sem a ADPF, eu não consigo. É desrespeito às regras fiscais. É um julgamento do Ministro Alexandre de Moraes. Então, como gestor, para eu assinar... e não só eu, mas a própria Secretaria de Orçamento Federal. E são as mesmas pessoas que estão lá; entra Governo e sai Governo, são as mesmas pessoas. E elas não assinaram e não permitiram, antes que fosse julgada a ADPF pelo Ministro Alexandre de Moraes.

Com relação aos dados, vocês têm...

A SRA. MONICA DE BOLLE - Está certo, mas o que me consta...

A SRA. COORDENADORA (Paola Carvalho) - Vamos organizar, só para não precisarmos reabrir, porque nós temos um tempo que precisamos respeitar. (Falha na transmissão.) ...para que possamos fechar o debate.

Acho que este debate precisa seguir. Eu espero, inclusive, que a Câmara dos Deputados e o Senado promovam mais encontros como este, com outras pessoas, para que possamos apresentar em detalhes algumas propostas de renda básica emergencial e uma proposta de renda permanente, o que se pensa em relação a isso.

Não tenho dúvida - e quero aqui já fazer referência; é o Deputado Luizinho quem está na mesa agora, mas antes estava o Deputado Rodrigo Maia - de que precisam entender a necessidade e o papel da Câmara e do Senado neste momento tão crucial para a cidadania brasileira, que não podem sair deste debate.

Quero começar as minhas considerações perguntando algo a que acho que também não respondemos neste diálogo, a questão do Estado mínimo, que este Governo defende há muito tempo, que é exatamente para quem. Não me parece que o TCU e os órgãos de controle, como o Martim trouxe para nós, tenham o mesmo critério de exigência em relação às liberações muito rápidas que são feitas para os grandes bancos, por exemplo. Parece-me que, quando se trata da população e dos mais pobres, sempre apertam o garrote muito mais, como se diz aqui no Rio Grande do Sul.

Acho que há uma questão que precisamos enxergar nesse processo: um desmonte histórico, que vivemos pelo menos nos 3 últimos anos, em relação aos cortes orçamentários. A assistência social sofre isso, mas a emenda constitucional trouxe isso para o Brasil, em relação ao conjunto de políticas públicas. Se olharmos o quanto o SUS perdeu e o quanto poderíamos estar muito à frente do ponto de vista mesmo sanitário, em relação aos cortes que o SUS já vem sofrendo nos 3 últimos anos, podemos refletir sobre o quanto a questão dos cortes impacta a vida do povo brasileiro. E aí, sim, concordando com a Tereza, queremos uma renda que não destrua as políticas públicas, ao contrário, queremos que ela complemente as políticas públicas.

Precisamos enxergar o quanto esse corte promoveu perversas exclusões, que agora se refletem inclusive na implementação do auxílio emergencial, da renda básica emergencial. Na própria assistência social, o Conselho Nacional de Assistência Social, com uma série de números relacionados aos cortes orçamentários da assistência social nos 3 últimos anos, aponta que, por ano, pelo menos 10 milhões de atendimentos a menos nos CRASs foram realizados. Para quem não sabe, CRASs são centros regionais de assistência social, onde são feitos os cadastros únicos, hoje utilizados como base também para o auxílio emergencial.

Eu gostaria que o Governo falasse em bolsa-família, primeiro respondendo a algumas questões. O Bolsa Família para mim é um patrimônio brasileiro. Ele precisa ser enxergado assim. Teria que haver um certo cuidado para promover alguns debates num momento de emergência como este. Acho que há questões muito mais urgentes para resolver em relação ao Bolsa Família.

Historicamente também temos visto que esses cortes orçamentários chegaram e geraram neste Governo mais de 1 milhão e 200 desligamentos de beneficiários do Bolsa Família - então já houve um enxugamento do próprio programa -, mas eu gostaria de ter visto respondida, e infelizmente não vi, Martim, também, minha questão sobre os beneficiários do Bolsa Família que estão sofrendo agora, no período da emergência, que foram desligados agora: receberam a primeira parcela, na segunda tiveram uma mudança no valor e agora foram desligados do programa. Eu gostaria de uma resposta pública do Governo, porque essas pessoas têm procurado...

O SR. MARTIM CAVALCANTI - Isso não era para ter acontecido. Eu vou averiguar, ver o que aconteceu.

A SRA. COORDENADORA (Paola Carvalho) - Vou garantir a minha fala aqui, Martim.

Precisamos ter essa informação, porque as pessoas têm procurado os CRASs e a Caixa Econômica Federal, e não têm conseguido resposta em lugar nenhum. Imagino que seja essencial que possamos ter uma resposta pública a essa questão, assim como às dos militares, do dono da Havan, do filho do William Bonner e de todos os outros critérios.

Eu me preocupo... Quando criamos um conjunto de critérios para uma renda emergencial - e, aí, muito mais do que a lei, Martim, o processo como foi regulamentada posteriormente, por decreto -, a lei acaba criando alguns gargalos para o próprio Governo e fundamentalmente para a população.

No momento que vivemos, 112 milhões de brasileiros, metade da população brasileira, solicitaram o auxílio emergencial. Isso é um recado para quem discute proteção social, para quem discute distribuição de renda. Isso é um recado, gente! Bom, a pessoa tem carteira de trabalho assinada, como intermitente, num valor muito menor do que o salário mínimo, ela não pode ser beneficiada pelo auxílio emergencial? Ela pode passar fome, então? Para mim, os critérios que estão colocados garantem motivos para a exclusão mais dos mais vulneráveis - quando converso com pessoas que não têm capacidade de mandar um e-mail para a Defensoria Pública, isso para mim fica muito evidente - do que de pessoas que são mais organizadas e que podem acessar o benefício via aplicativo. Essa questão do aprofundamento dos critérios e focalização, focalização, focalização, acaba ajudando, infelizmente, a excluir boa parte da população que precisa muito.

Então, que a Câmara e o Senado também escutem o recado que a população brasileira está dando: 112 milhões de pessoas solicitaram o auxílio emergencial!

Acho muito grave que mais de 55 milhões de pessoas ainda estejam com os pedidos ou em compasso de espera ou como negados. E aí vou dizer uma coisa a vocês que o próprio Governo confirma: que 8 milhões desses pedidos foram negados porque as pessoas tinham emprego formal e o Governo reconhece que não tem capacidade hoje de dizer se a pessoa atualmente está empregada ou não. Isso não me parece uma justificativa plausível para o pedido de alguém permanecer 60 dias em análise num período de emergência, quando não é possível trabalhar de outra maneira, buscar renda de outra forma. Aí colocamos a pessoa na condição de ou sobrevive ou se protege do coronavírus ou morre de fome. Então, precisamos começar a pensar sobre isso efetivamente: do quanto o papel da implementação é fundamental para que consigamos superar o que estamos vivendo no mundo, mas nos debruçando no País.

Acho que temos um desafio, sim, e me parece que a resposta que tivemos agora ao que significou o desmonte do SUAS e do SUS nos mostra que a resposta que precisamos dar ao povo brasileiro não vem novamente em cortes daquilo que conquistamos, mas em olhar para aquilo em que não avançamos, como é o caso, por exemplo, da tributação. Parece-me que chegou o momento no Brasil de discutirmos aquilo que vimos sempre protelando, que é discussão de quem não paga tanto imposto assim, quem não é enxergado, portanto, assim. Parece-me que o tema da desigualdade, dessa curva entre os que têm muito e os que não têm nada, precisa ser efetivamente enfrentado no Brasil, e não é fazer isso diminuindo dos mais pobres.

Finalizando aqui, sendo muito justa e honesta com a minha Mesa, já que eu mesma me controlo, para garantir o mesmo tempo que todo mundo usou, quero agradecer aos meus companheiros e companheiras de Mesa, especialmente às mulheres, Monica e Tereza, mas também aos homens, Marcelo, Martim e Rogério. Fiz referência primeiro às mulheres, na importância deste debate da renda, porque sabemos o quanto isso impacta a vida das mulheres. O tema da renda básica é essencial na vida das mulheres. Então, quero fazer aqui um agradecimento especial a vocês.

Todos nós aqui, tenho certeza, queremos superar o período que estamos vivendo e temos a vida como prioridade sempre.

Agradeço ao Deputado Luizinho, Presidente da Comissão. Devolvo a palavra à Presidência da Mesa para a finalização dos trabalhos. Novamente, quero reforçar a importância que a Câmara e o Senado têm no sentido de garantir os direitos e a dignidade do povo brasileiro neste momento.

O SR. PRESIDENTE (Marcos Pereira. REPUBLICANOS - SP) - Muito obrigado, moderadora, Dra. Paola Carvalho. Quero agradecer a sua presença, a sua disponibilidade de moderar esta Mesa, neste importante debate, no seminário destinado a debater a importância da renda emergencial e os desafios da seguridade social.

Também agradeço ao Marcelo Garcia; ao Martim Cavalcanti; à Monica de Bolle; ao Rogério Barbosa; e a nossa sempre Ministra Tereza Campello.

Esta reunião foi importante. Eu não estava aqui desde o início, estava no gabinete da 1ª Vice-Presidência, mas a estava acompanhando. O Presidente Rodrigo Maia pediu que eu viesse substituí-lo a partir de meio-dia, porque ele tinha outro compromisso.

Em nome do Presidente Rodrigo Maia, da Mesa Diretora, da Deputada Carmen Zanotto e do Deputado Dr. Luizinho, que compuseram esta Mesa juntamente com o Presidente Rodrigo Maia desde o início dos debates, e que são membros da Comissão Externa que acompanha o tema do combate ao coronavírus, eu quero agradecer por este importante debate.

É importante o Parlamento estar atento. Aqui no Parlamento é que a voz da sociedade é ecoada. Nós temos aqui uma pluralidade, uma representatividade muito plural da sociedade brasileira.

Agora há pouco, eu participava de uma live da XP Investimentos. O que mais me perguntavam é como vai ficar o auxílio emergencial nos próximos meses, como vai atuar o Congresso.

O valor de 600 reais chegou a ser 600 reais por uma iniciativa e por um debate feito no Congresso, especialmente nesta Casa, na Câmara dos Deputados. Nós não podemos esquecer que o Governo propôs inicialmente um auxílio de 200 reais. E o Congresso propôs 500 reais, depois chegando a 600 reais.

O Congresso vai ser sempre sensível à voz da sociedade, à voz do povo brasileiro, especialmente dos mais necessitados.

Portanto, o debate apresentado aqui nesta manhã por esses especialistas ajudará, eu tenho certeza, em muito a decisão desta Casa para o auxílio emergencial. E não será só para o auxílio emergencial, mas uma renda mínima, uma renda básica para os cidadãos brasileiros, não somente para os próximos meses, mas para os próximos anos, quiçá para as próximas décadas.

É urgente que nós possamos minimizar o distanciamento que existe na sociedade brasileira, sobretudo com as condições sociais em que vivem os nossos concidadãos deste País.

Muito obrigado a todos.

Declaro encerrada a reunião.