CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ

Sessão: 343.3.55.O Hora: 12:48 Fase: OD
Orador: ERIKA KOKAY, PT-DF Data: 10/11/2017

A SRA. ERIKA KOKAY (PT-DF. Pela ordem. Sem revisão da oradora.) - Esse acordo da Organização Internacional do Trabalho diz respeito ao apoio ao trabalho decente.

O trabalho é a forma como realizamos a nossa humanidade. Ele é estruturante. Vários aspectos da nossa vida dependem do nosso trabalho. Aliás, lembro-me de Faulkner, que dizia que nada na nossa vida é tão constante quanto o trabalho, porque, dia após dia, ano após ano, década após década, nós trabalhamos.

Aliás, a reforma da Previdência, apoiada pelo Democratas, quer que se trabalhe até a morte e não quer que se combata o trabalho que não é decente, o trabalho indecente, que envolve crianças em situação de exploração sexual, que envolve trabalhos insalubres, que envolve o trabalho nos lixos, que envolve tantos aspectos que ferem a dignidade humana numa atividade que é fundamental para o nosso próprio reconhecimento humano.

Portanto, é importante que nós entendamos o que está se discutindo aqui. Nós queremos que o Brasil seja signatário de um acordo que assegura o trabalho decente e que combate toda forma de trabalho que fere a dignidade humana, o trabalho escravo, com as suas analogias e com as suas expressões pós-modernas ou contemporâneas.

Isso é muito importante, porque se diz muito aqui que esta Casa esta semana votou de acordo com o sentimento da população, mas vejam que ninguém aqui falou da situação do sistema prisional. Nós temos celas que deveriam comportar 10 pessoas e que tem 50. Essas pessoas estão tendo feridos os seus direitos!

Há um direito que se preserva, que é o direito à visita, o direito de se relacionar com as pessoas pelo menos uma vez por semana - ou, no caso de Brasília, a cada 15 dias. Aqui em Brasília, há pessoas em privação de liberdade que só recebem visitas de 21 em 21 dias. Os visitantes são os elos afetivos que possibilitam que essas pessoas em privação de liberdade ressignifiquem as suas vidas e voltem de forma harmoniosa para o convívio social.

Fala-se em restringir o "saidão", que é o período que as pessoas em privação de liberdade têm para se relacionar com a sua família. Dizem que elas saem e não voltam, mas repito: no último "saidão" em Brasília, de mil pessoas contempladas - o benefício é concedido a partir da avaliação do diretor do presídio, a partir da avaliação do Ministério Público, em função do comportamento e do estágio de progressão do preso -, nove não voltaram para o presídio. Mas esse índice se transformou em 20%, em 50%, numa espetacularização mentirosa dos dados! Os dados são claros, mas se recrudescem.

Lembro Foucault, que disse que o problema do sistema penitenciário não é que ele não recupera, mas é que ele é feito para não recuperar, ele é feito para apartar, para invisibilizar. Essas pessoas voltam para o convívio social depois de, no presídio, serem tratadas com tortura. Muitas vezes, elas passam por toda sorte de maus-tratos, são abrigadas em celas onde não podem deitar para dormir, porque não cabem deitadas, e têm que improvisar lençóis para dormir ou dormir com a cabeça na privada. É isto que se quer, aprofundar o conflito com a lei?

Querem igualar pessoas que cometeram infrações leves ou delitos leves a pessoas ligadas ao crime organizado - e aí vêm aqui falar de crime organizado! O crime organizado existe e tem que ser combatido, mas ele existe no vácuo do Estado. O Estado não dá condições, e ele cria as condições, para se fortalecer. É o que nós temos no Brasil: o crescimento do crime organizado.

Essas decisões foram tomadas aqui sem que se apresentassem propostas para enfrentar o crime organizado, para restabelecer a dignidade no sistema prisional. Que se façam políticas de prevenção, de educação, de saúde, de combate à drogadição, políticas que previnam a violência, inclusive rompendo a desumanização simbólica. Antes de as pessoas morrerem, elas são desumanizadas simbolicamente.

A luta em defesa de direitos, Sr. Presidente, é a luta que enfrenta a violência. As mulheres - 52% da população brasileira - são desumanizadas pela violência doméstica. Estima-se que 500 mil mulheres são estupradas todos os anos. Há um índice de violência sexual contra as crianças que nos assusta. Nós temos uma sociedade que desumaniza o outro. Ao se desumanizar o outro simbolicamente, o outro pode ser desumanizado literalmente. Hitler construiu os campos de concentração e matou os judeus, os comunistas, os homossexuais porque antes os desumanizou simbolicamente.

Portanto, lutar contra o sexismo, a LGBTfobia, o adultocentrismo é lutar contra a violência, que desumaniza simbolicamente, preparando o terreno para a desumanização literal.

O SR. PRESIDENTE (Alberto Fraga) - Muito obrigado, Deputada.